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sexta-feira, 2 de junho de 2023

Ópera dos farsantes - Augusto Nunes

Revista Oeste

Lula e Maduro espancam os fatos para ocultar o verdadeiro rosto da ditadura venezuelana

O presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, durante reunião com presidentes de países da América do Sul, no Palácio Itamaraty | Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
Ópera dos farsantes

Lula e Maduro espancam os fatos para ocultar o verdadeiro rosto da ditadura venezuelana

“Chorei de emoção!”, derreteu-se no Twitter o presidente Hugo Chávez no começo da madrugada de 16 de julho de 2010. “Que momentos impressionantes vivemos esta noite! Vimos os ossos do grande Bolívar! Aquele esqueleto glorioso é de Bolívar, pois sua chama pode ser sentida! Bolívar vive!”. Como prometera aos venezuelanos, o militar que se considerava a perfeita reencarnação do herói nacional resolveu exumar os restos sepultados numa tumba em Caracas para provar que El Libertador não morreu de tuberculose, como afirmam todos os historiadores. 
Na cabeça do presidente, foi assassinado por conspiradores liderados por um general colombiano. 
Durante uma semana, dezenas de especialistas em distintas ciências perseguiram a verdadeira causa mortis e, por determinação do chefe, examinaram com especial empenho a hipótese de envenenamento. Ao fim de sete dias, o bolívar de hospício informou que as investigações haviam sido “inconclusivas” e devolveu à sepultura a ossada original.
 
Abatido pelo câncer, Chávez avisou meses antes da morte que seu sucessor seria Nicolás Maduro. Em 2 de abril de 2013, descobriu-se que continuava por aqui, mas em forma de ave. “Eu estava sozinho numa sala quando, de repente, entrou um passarinho pequenininho que me deu três voltas por cima”, contou Maduro, girando o anular sobre a cabeça. “Parou numa viga de madeira e começou a cantar. Então eu disse: ‘Se você canta, também canto’. Comecei a cantar. O passarinho me estranhou? Não. Cantou mais um pouquinho, deu uma volta e foi embora. Eu senti o espírito de Hugo Chávez.” O fenômeno alado foi reprisado pelo menos cinco vezes. Não é pouca coisa. Mas não seria tudo: graças aos conselhos do padrinho, Maduro sentiu-se pronto para façanhas muito mais audaciosas. Em 20 de janeiro de 2019, por exemplo, procurou tranquilizar venezuelanos atormentados pelo presente com a informação animadora: “Já fui ao futuro. Vi que tudo estava bem e voltei. A união cívico-militar garante a paz e a felicidade ao nosso povo”.
 
Conversa de vigarista. A taxa de miséria é desesperadora, a inflação alcança dimensões siderais, milhões de habitantes cruzaram as fronteiras em busca da sobrevivência. A consolidação da ditadura chavista eliminou direitos humanos, liberdades democráticas, partidos de oposição, imprensa independente. Centenas de adversários do regime foram executados, outros continuam encarcerados sem julgamento. O que parecia sólido nos anos 1970 desmanchou-se no ar. Conheci a Venezuela Saudita. Não existe mais. Decidido a permanecer no trono até o fim, Maduro recorre ao petróleo para assegurar o apoio de militares corruptos, milícias homicidas, burocratas assassinos, policiais. O país está subordinado a uma ditadura sórdida. Sabem disso até os ossos de Simón Bolívar. Só Lula não sabe de nada. Nesta semana, enquanto procurava um ângulo que aumentasse seu 1,68 metro de altura, e reduzisse a diferença de 22 centímetros que acentua o status de anão diplomático, o presidente brasileiro repetiu a obscenidade: tudo o que se diz de ruim sobre a Venezuela não passa de “narrativa”. Ou “desinformação”. Ou fake news. Ou ato antidemocrático. Ou coisa de golpista.
 
“Narrativas” são versões. Há muitas. A verdade é uma só, e se ampara em fatos. O animador de auditório fantasiado de presidente não sabe disso — ou finge não saber, o que dá na mesma. De cinco em cinco minutos, reiterava o convite: “Apresente a tua narrativa, Maduro”. O visitante mentia: tudo vai bem por lá
O sorriso de Lula berrava que as coisas por aqui não param de melhorar. Ele não conseguiu ressuscitar a Unasul e deixar Maduro melhor no retrato dos governantes sul-americanos. 
Em contrapartida, estreitaram-se os laços entre a Presidência da República e o Supremo Tribunal Federal. 
 Num churrasco na Granja do Torto, ficou acertada a transferência para o Egrégio Plenário do principal advogado do ex-presidiário.
Outras combinações guilhotinaram o mandato do deputado federal Deltan Dallagnol, colocaram na mira do STF o presidente da Câmara e mandaram recados a parlamentares oposicionistas. A sede da cúpula do Poder Judiciário agora enxerga no espelho o prédio do Congresso.
 
Aos ouvidos dos dois parceiros, a “narrativa” dos deserdados é armação de lacaio do imperialismo norte-americano. Para os compassivos, é um soco no peito. “Ansiedade e repulsa”, resume o costureiro Ricardo Seijas, 26 anos, quando lhe perguntam o que sentiu ao saber da chegada de Maduro ao Brasil. “Foram inevitáveis as lembranças de um passado que me machuca bastante”, disse o jovem que, aos 21 anos, abandonou o sonho de ser dentista na cidade natal para livrar-se da repressão feroz. “Meu mundo caiu quando a diretora da universidade informou que eu estava numa lista de procurados, por participação em protestos estudantis.” Seijas arrumou as malas, despediu-se às pressas da mãe e juntou-se à diáspora venezuelana. Hoje ele é costureiro em Brasília, perto da mãe, que chegou em 2020. “Ela não tinha condições de continuar por lá”, explicou Seijas. “A crise econômica é brutal.” 
 Em 2011, quando era adolescente, o pai comprou um apartamento. 
Com tudo pago e a chave nas mãos, recebeu por telefone o aviso do governo Chávez: como ele tinha outros imóveis, a propriedade fora confiscada para cumprir a obrigatória “função social”.
 
“Eu me senti tremendamente desrespeitada, porque o que o ditador faz na Venezuela é desumano”, lamentou a dona de casa Elizabeth Jimenez, 39 anos. “Fico mais indignada ainda ao ver que isso é ignorado pelo presidente do país que escolhi para ser meu refúgio. Ao receber Maduro e declarar publicamente que o que se passa na Venezuela é ‘narrativa’, Lula legitima todas as violações aos direitos humanos que ocorrem lá.” Elizabeth aparentemente ignora que, se as duas faces dos governos do PT são escuras, é sempre mais sombria a que escancara a política externa da canalhice, que vigorou de 2003 a 2015 e foi ressuscitada no primeiro minuto deste ano.
 
Juscelino Kubitschek afirmava que fora poupado por Deus do sentimento do medo. No caso de Lula, defeitos de fabricação revogaram o sentimento da vergonha e proibiram qualquer espécie de remorso
Em abril de 2006, numa discurseira em Curitiba, Hugo Chávez pediu à plateia que reelegesse “o herói do Brasil”. Em novembro, num comício na Venezuela, Lula recomendou aos espectadores que mantivessem Chávez no poder. Em outubro de 2009, Chávez comparou Lula a Jesus Cristo e virou cabo eleitoral de Dilma Rousseff. Em abril de 2013, o candidato Nicolás Maduro animou a turma no palanque em Maracaibo com a apresentação do vídeo em que Lula afirma que a vitória do sucessor era essencial para a consolidação da Venezuela sonhada pelo bolívar de hospício. Comovido, Maduro agradeceu a Lula “por todo o apoio que deu a Chávez, por todo o apoio que deu à revolução bolivariana”. Em fevereiro de 2017, Lula e Dilma apoiaram publicamente a candidatura de Maduro. Nos anos seguintes, o coração de Dilma Rousseff sempre bateu em descompasso nos encontros com o topete desprovido de cérebro a 1,90 metro de altitude. 
 
“Se Cuba não tivesse o bloqueio dos Estados Unidos, poderia ser uma Holanda”, garantiu o torturador de fatos. Fruto do acasalamento de stalinistas farofeiros do PT e nacionalistas de gafieira do Itamaraty, esse aleijão subiu a rampa do Planalto em 1° de janeiro de 2003. 
Nos oito anos seguintes, fantasiado de novo-rico caridoso, o Brasil acoelhou-se com exigências insolentes do Paraguai e do Equador, suportou com passividade bovina bofetadas desferidas pela Argentina, hostilizou a Colômbia democrática para afagar os narcoterroristas das Farc, meteu o rabo entre as pernas quando a Bolívia confiscou ativos da Petrobras e rasgou o acordo para o fornecimento de gás. Confrontado com bifurcações ou encruzilhadas, Lula fez invariavelmente a escolha errada e curvou-se à vontade de parceiros abjetos.  
 
Quando o Congresso de Honduras, com o aval da Suprema Corte, destituiu legalmente o presidente Manuel Zelaya, o Brasil se dobrou aos caprichos de Hugo Chávez. Decidido a reinstalar no poder o canastrão que gostava de combinar chapelão branco-noiva com bigode preto-graúna, convertido ao bolivarianismo pelos petrodólares venezuelanos, Chávez obrigou Lula a transformar a embaixada brasileira em Tegucigalpa na Pensão do Zelaya.
 
Em 2007, para afagar Fidel Castro, o governo deportou os pugilistas Erislandy Lara e Guillermo Rigondeaux, capturados pela Polícia Federal quando tentavam fugir para a Alemanha depois de abandonarem o alojamento da delegação que participava dos Jogos Pan-Americanos do Rio. Entre a civilização e a barbárie, o presidente da República sempre cravou a segunda opção. 
Com derramamentos de galã mexicano, prestou vassalagem a figuras repulsivas como o faraó de opereta Hosni Mubarak, o psicopata líbio Muammar Kadafi, o genocida africano Omar al-Bashir, o iraniano atômico Mahmoud Ahmadinejad e o ladrão angolano José Eduardo dos Santos. Coerentemente, o último ato do mitômano que se julgava capaz de liquidar com conversas de botequim os antagonismos milenares que sangram o Oriente Médio foi promover a asilado político o assassino italiano Cesare Battisti. 

Herdeira desse prodígio de sordidez, Dilma manteve o país de joelhos e reincidiu em parcerias pornográficas. Entre o governo constitucional do Paraguai e o presidente deposto Fernando Lugo, ficou com o reprodutor de batina. Juntou-se à conspiração que afastou o Paraguai do Mercosul para forçar a entrada da Venezuela. Rebaixou-se a mucama de Chávez até a morte do bolívar de hospício. Para adiar a derrocada de Nicolás Maduro, arranjou-lhe até papel higiênico. Ao preservar a política obscena legada pelo padrinho, a afilhada permitiu-lhe que cobrasse a conta dos negócios suspeitíssimos que facilitou quando presidente, em benefício de governantes amigos e empresas brasileiras financiadas pelo BNDES. Disfarçado de palestrante, o camelô de empreiteiras que se tornariam casos de polícia com a descoberta do Petrolão ganhou pilhas de dólares, um buquê de imóveis e agradecimentos em espécie de países que tiveram perdoadas suas dívidas com o Brasil. Enquanto Lula fazia acertos multimilionários em Cuba, Dilma transformava a Granja do Torto na casa de campo de Raúl Castro, também presenteado com o superporto que o Brasil não tem. 
 
Juscelino Kubitschek afirmava que fora poupado por Deus do sentimento do medo. No caso de Lula, defeitos de fabricação revogaram o sentimento da vergonha e proibiram qualquer espécie de remorso. Essa conjunção de avarias talvez explique a naturalidade com que Lula reincide na louvação de regimes liberticidas. 
 
Ele pertence à subespécie dos criminosos que voltam assoviando ao local do crime. Faz sentido: faltam adversários capazes. Sobram aliados capazes de tudo
E tem ao lado a conselheira Janja. 
É por isso que já não se compara a ninguém. Nossa metamorfose delirante já foi Juscelino Kubitschek, Getúlio Vargas, Tiradentes, Nelson Mandela e Jesus Cristo
Parece ter descoberto que, no paraíso dos culpados impunes, nada é melhor que ser Lula.[o único personagem ao qual o presidente petista pode se comparar é a Judas Iscariotes - quando posava de líder sindical, deixava os companheiros em assembleia no estádio da Vila Euclides e se dirigia para a FIESP para conversar com empresários, após passava no DOPS para cumprir a função de informante do delegado Romeu Tuma - tanto que seu codinome era 'boi']
 
(Com reportagem de Cristyan Costa)
 
 
 
 
Augusto Nunes, colunista - Revista Oeste 


sábado, 26 de janeiro de 2019

O ocaso do chavismo

Além das ações diplomáticas, as autoridades brasileiras devem preparar o País para os desdobramentos da crise venezuelana na região de fronteira

Ainda não é possível atestar o fim da ditadura de Nicolás Maduro na Venezuela porque, no momento, são desconhecidas as posições das Forças Armadas, da Guarda Nacional Bolivariana e das milícias que formam o tripé armado da base de sustentação do regime. O que se sabe é que o governo comprou o apoio das cúpulas daquelas organizações a peso de ouro. É certo, no entanto, que a posição de Maduro nunca esteve tão frágil como agora, submetida a enormes pressões internas e externas.

Na quarta-feira passada, milhares de manifestantes se reuniram nas ruas de Caracas, inclusive nos bairros periféricos mais dependentes das benesses estatais, para pedir a queda de Nicolás Maduro. A data não foi escolhida ao acaso: marcava o 61.° aniversário do fim da ditadura de Marcos Pérez Jiménez (1948-1958). Diante da multidão, o presidente da Assembleia Nacional (AN), Juan Guaidó, autoproclamou-se presidente interino e prestou juramento simbólico invocando o artigo da Constituição da Venezuela que lhe confere autoridade para declarar a vacância da Presidência da República em caso de ruptura constitucional e convocar nova eleição em um prazo de 30 dias.

Nicolás Maduro foi declarado “usurpador” pela AN após tomar posse, dia 10 deste mês, para exercer o segundo mandato (2019-2025). A eleição da qual saiu vitorioso, em maio do ano passado, não passou de um embuste, o que levou os países que integram o Grupo de Lima, à exceção do México, a declarar sua “ilegitimidade” como presidente, posição que foi seguida pela Organização dos Estados Americanos (OEA) e pela União Europeia (UE). Pouco após o discurso de Guaidó, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, reconheceu-o como presidente de facto da Venezuela. O ato diplomático americano foi seguido por outros 14 países, incluindo o Brasil. Em nota, o Ministério das Relações Exteriores afirmou que “o Brasil reconhece o senhor Juan Guaidó como Presidente Encarregado da Venezuela”. O governo brasileiro também reforçou a disposição do País em “apoiar política e economicamente o processo de transição para que a democracia e a paz social voltem à Venezuela”. O Itamaraty ainda orientou os diplomatas brasileiros a “ignorar” medidas baixadas por Nicolás Maduro.

É improvável que a transição política ocorra pacificamente. Reconhecer um segundo governo quando o primeiro ainda tem meios de oferecer resistência é um gesto arriscado cujo desdobramento pode ser um conflito interno. De acordo com a ONG Observatório Venezuelano de Conflito Social, 16 pessoas morreram durante os protestos em Caracas e nos Estados de Táchira, Barinas, Portuguesa, Amazonas e Bolívar, entre terça e quinta-feira.

A Rússia e a China, maiores aliados do governo de Nicolás Maduro, reafirmaram apoio ao regime, o que elevou o grau de tensão da crise. O porta-voz do governo russo, Dmitry Peskov, afirmou que é “inaceitável” a tentativa de destituição de Maduro e que uma eventual ação militar neste sentido, patrocinada pelos Estados Unidos, resultaria em um “banho de sangue”. O governo chinês foi mais comedido e, embora tenha reforçado o apoio a Maduro, pediu que “todos os lados permaneçam calmos para que se possa chegar a uma solução pacífica” para a crise.

Em Brasília, o presidente em exercício, Hamilton Mourão, descartou qualquer participação militar brasileira na Venezuela. “O Brasil não participa de intervenções, não é da nossa política externa intervir nos assuntos internos dos outros países”, disse. Ocorre que o País já interveio por meio do reconhecimento de Juan Guaidó como presidente interino. O ato diplomático produzirá consequências que ainda não estão totalmente claras. É bom, contudo, que o governo descarte, de pronto e claramente, qualquer mobilização de tropas para atuação na Venezuela.


Além das ações diplomáticas, as autoridades brasileiras devem preparar o País para os desdobramentos da crise venezuelana na região de fronteira. É naquela região do País que os efeitos de um eventual recrudescimento das hostilidades serão mais sentidos.

quinta-feira, 8 de fevereiro de 2018

Narcoterror comunista na Colômbia: três atentados no mesmo dia

Os três sangrentos atentados contra a Polícia de Barranquilla, Soledad (Atlântico) e Santa Rosa del Sur (Bolívar), que deixaram um total de nove policiais mortos e 46 feridos (43 policiais e três civis), cometidos no mesmo dia do lançamento, em Bogotá, da campanha eleitoral de Timochenko ante uma centena de convidados, são um sinal abominável, uma maneira sinistra de notificar que há, para a subversão comunista, duas linhas em execução simultânea contra a Colômbia.

É muito difícil pensar que o minguado mitin das FARC em Ciudad Bolívar e tal convergência de atrocidades, tenha sido produto da casualidade e da ação errática de bandos isolados de direito comum. No que ocorreu no sábado 27 de janeiro na Colômbia há coincidências que são muito inquietantes e dizentes ou, que pelo menos, devem ser estudadas com a maior atenção. Nesse mesmo sábado, no extremo sul do país, um carro-bomba explodiu, também na madrugada, em frente ao quartel policial de Esmeraldas, ferindo 28 pessoas e destruindo 37 casas. Esse atentado no território do Equador, mas a só 80 quilômetros da fronteira com a Colômbia, permite pensar que isso também fez parte de uma vasta operação narco-terrorista. É como se os cérebros desse plano quisessem fazer uma demonstração simultânea de força no norte e sul da Colômbia, estilo Al-Qaeda. Em Quito, onde transcorrem as “negociações de paz” entre o governo de Santos e o ELN, várias células do ELN e das FARC passeiam como se estivessem em sua própria casa. Até quando?

Em todo caso, as autoridades equatorianas se vangloriaram de mais clareza do que as colombianas: disseram que por trás do bombardeio em Esmeraldas estava o narcotráfico e o terrorismo das FARC (são palavras do chefe da inteligência militar equatoriana, segundo o diário de Guayaquil) e que farão tudo o que for necessário para que “o terrorismo e o crime organizado não arrebatem a paz” do Equador. Na Colômbia, ao contrário, o que predominou foi a confusão e a falsa candidez. Ninguém quis pronunciar o detestado vocábulo FARC. Chefes policiais de Barranquilla estimaram que o ataque era uma “retaliação de bandos de delinqüência comum”. O procurador-geral Humberto Martínez Neira emitiu a hipótese de que se tratava “de gente de fora que quis perpetrar uma atividade terrorista para gerar confusão na cidade, nesta época de pré-carnaval”. O presidente Santos lançou a idéia de que “uma célula do ELN” era a autora das duas explosões na estação de Polícia San José, de Barranquilla.

Horas depois, apareceu obviamente um “comunicado” do ELN – cuja autenticidade não foi comprovada -, no qual esse bando se atribui o atentado do bairro San José e se inventa uma desculpa: que matou os policiais porque o Governo “se recusa a dar respostas às necessidades da população”. Mais tarde, Santos afirmou que eram quatro os detidos pelos atos de Barranquilla e Santa Rosa del Sur. No dia seguinte insistiu que era só um.
No mesmo fatídico sábado foi assassinado em Buenaventura um líder social, Temístocles Machado. Sobre isso também reina a confusão. O ministro da Defesa, Luis Carlos Villegas, assegurou que essa execução tem a ver “com um assunto de terras”. Outros acreditam ver a mão das FARC e do ELN que têm por política liquidar os líderes rurais dos grupos sociais, étnicos, etc.

Nos atentados de Barranquilla foram utilizados entre 3 e 5 quilos de explosivos de tipo militar, não simples granadas de mão, como a imprensa deu a entender. As bombas no bairro San José foram ativadas por rádio. Com o primeiro detido, Cristian Camilo Bellón Galindo, de 31 anos, que vivia em Bosa, periferia de Bogotá, encontraram “um rádio e duas folhas de papel, nas quais tinha desenhado um croquis e alguns números de celular, dentre esses um que pertence à Venezuela”, segundo revelou El Heraldo. Bellón tratou de se afastar do lugar após a matança. Impávido, não resistiu à captura e solicitou um advogado de ofício, como se seus chefes lhe tivessem garantido que judicialmente nada tem a temer. O perfil do detido, o telefone venezuelano e o estilo dos ataques em Atlántico, Bolívar e Esmeraldas, mostra uma organização de alcance nacional e internacional com experiência na realização de operações terroristas sofisticadas. Entretanto, a imprensa tenta fazer crer que é um assunto de delinquência local.

Os atentados geraram grande rechaço e comoção na Colômbia. Entretanto, a opinião pública continua na incerteza: não sabe nem pode sequer supor quem é o autor de semelhante ofensiva contra a polícia e a população civil. O clima de confusão após os atos brutais de sábado é uma das técnicas preferidas da guerra assimétrica.  As FARC não só mentem e tratam de atribuir a outros seus feitos, como conseguiram fazer crer que elas abandonaram as armas e se converteram em um partido político como os demais, e que só estão trabalhando para chegar com grande urbanidade às eleições de março e maio próximos. Suas frentes armadas já não são das FARC, senão “dissidências das FARC”. 

O ELN, dizem, não tem pactos ofensivos com elas, apesar de que as duas organizações pactuaram a defesa de seus interesses nas próprias barbas de Humberto de la Calle, durante conclaves fechados em Havana que, graças à autorização de Santos, os chefes das FARC e ELN, Timochenko e Gabino, mantiveram em fins de abril de 2015 e em maio de 2017. Foi tão escandaloso o primeiro encontro Timochenko-Gabino que a Comissão de Investigação e Acusação da Câmara de Representantes da Colômbia abriu uma investigação preliminar contra o presidente Santos, a qual foi deixada no limbo pouco depois.

Graças a essas montagens e crenças impostas à consciência coletiva, as atrocidades de agora não têm rosto nem autores, e o que predomina ante a barbárie fariana é o despiste, o desvio e a anulação da cólera popular. Isso faz parte dos mecanismos construídos pelo terrorismo para continuar na impunidade e não pagar sequer eleitoralmente por isso.  Os inventores da estratégia para anular a ressonância dos ataques mais sangrentos, para que eles sejam apagados rapidamente da memória das pessoas, aplicam um esquema comunicacional pouco conhecido: criar dilemas, paradoxos e raciocínios contraditórios para dividir a opinião pública nos momentos de crise.

Tal é a situação na Colômbia. Isso explica a paralisia da população após cada onda de atentados: a onda de indignação ascende e depois reflui ante as opções contraditórias e, finalmente, a tensão decai e a paralisia se instala. E os terroristas continuam com as mãos livres. A guerra que as FARC fazem à Colômbia inclui esse tipo de jogos macabros. Graças à negligência dos serviços de investigação e de defesa do país, desorientados por um governo que busca a todo custo mostrar no estrangeiro que alcançou “ a paz”, o terrorismo opera sem maiores obstáculos.

As forças que sustentam a galáxia FARC-ELN e seus aparatos legais não esperam tomar Bogotá militarmente – tentaram no passado mas foram vencidas. Sua estratégia é mais sutil e perversa: submeter as vontades, controlar os espíritos e levar uma parte da sociedade à capitulação psicológica e política. Isso tem uma tradução eleitoral nestes momentos: a esquerda que apoiou a aventura entreguista de Santos proclama que, em que pese tudo isso, ela “conseguiu a paz” e merece continuar no poder para “implementar os acordos” e “aprofundar a paz”. As pesquisas refletem esse estado de confusão: as amplíssimas maiorias detestam as FARC e rechaçaram seus pactos com Santos, porém não vêem os laços que elas estendem para as facções de esquerda. Assim, os candidatos mais favorecidos nas pesquisas são precisamente os que não estabelecem ruptura alguma com as FARC. Esse paradoxo, essa inconsistência lógica, é o resultado das técnicas de desinformação aqui descritos. Os partidos de oposição que não levem em conta estas coisas têm poucas possibilidades de mobilização sob sua bandeira e tirar os eleitores da confusão.


 Graça Salgueiro - MSM