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sexta-feira, 22 de janeiro de 2021

“SÓ” ESTADO DE DEFESA, PROCURADOR GERAL DA REPÚBLICA? Sérgio Alves de Oliveira

Parece que efetivamente o PGR, Dr.Augusto Aras, não foi nada feliz por ter aventado, mesmo que nas entrelinhas, a hipótese do Presidente da República decretar o “Estado de Defesa”, consentido no artigo 136 da Constituição Federal, para combater a eventual desordem pública e ameaças à paz social, frente à grave e iminente instabilidade institucional, ou calamidades de grandes proporções na natureza, eventualmente decorrentes da pandemia do novo coronavirus.

Não consegui entender as reações de certo modo “histéricas” de ministros do Supremo Tribunal Federal, de protestos de 6 dos 10 integrantes do Conselho Superior do Ministério Público Federal, e da própria Associação Nacional dos Procuradores da República, frente à essa alegada suposição de decretação do Estado de Defesa, com restrições temporárias de direitos, após ouvidos o Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional, se fosse o caso, pelo que estaria plenamente autorizado na constituição, o que teria que ser do pleno conhecimento dos “guardiões” da Constituição.

Primeiro porque a sua vigência seria temporária, de curto prazo,no máximo de 60 dias, já computado nesse tempo uma possível prorrogação da medida. Em segundo lugar, porque dependeria do “aval” do Congresso Nacional, que poderia inclusive denegá-lo. Com pequenas diferenças, o outro estado de exceção previsto na Constituição, o Estado de Sítio, da mesma forma de competência exclusiva do Presidente da República,também dependeria do “aval”, dessa vez “prévio”, do Congresso Nacional, e também teria curta duração,conforme estatuído no artigo 137 .da Constituição.

Mas além do Congresso Nacional, também o Poder Judiciário poderia intervir,ou  “meter a sua colher”, indevidamente, na decretação dos estados de defesa ou de sítio. Por tal razão, a única “ameaça” que poderia realmente “assustar” Suas Excelências seria a medida “excepcional” prevista no artigo 142 da Constituição,que por não ter nenhum nome de “batismo” na carta magna, passou a ser conhecida na prática como intervenção militar, intervenção constitucional, ou intervenção militar-constitucional.

Mas essa medida, tanto quanto o “Estado de Defesa” e o “Estado de Sítio”, está textualmente autorizada na constituição, desde que presentes os seus pressupostos,e tem duas modalidades, sendo a primeira delas para DEFESA DA ORDEM E DA LEI, e a segunda para DEFESA DA PÁTRIA E DOS PODERES CONSTITUCIONAIS.

Mas até hoje somente as “intervenções” para defesa da ordem e da lei foram diversas vezes acionadas, e são mais conhecidas nos meios políticos e militares por “GLO” (garantia da lei e da ordem). Mas o que “eles” mais temem, ao ponto de “tremerem” as pernas, não é essa “simples” intervenção, e sim a “outra”, que jamais foi decretada por nenhum Presidente da República, representando na verdade um “tabu” ameaçador nos meios políticos e judiciais.

Com absoluta certeza, os instrumentos constitucionais do Estado de Defesa, e do Estado de Sítio, jamais funcionariam para colocar alguma ordem nos “chiqueiros” políticos e judiciais, erguidos no Brasil a partir de 1985, com a instalação da tal “Nova República” ,e do domínio esquerdista depravado nos Três Poderes Constitucionais, os quais aparelharam o estado,as leis, e todas as instituições públicas, de tal sorte, que a mudança havida em 1º de janeiro de 2019, com a eleição de Jair Bolsonaro, não levou a quase nada, necessitando prosseguir com uma medida mais impactante que uma simples decretação de Estado de Defesa, como eventualmente ”sugere” o Dr. Aras, o que apesar disso certamente seria boicotado e sabotado, do início ao fim, pelos Poderes Legislativo e Judiciário,ao contrário da “intervenção” do artigo 142 da CF, que teria por trás dela a força, o respeito,e a moral necessárias às mudanças requeridas.

E se isso porventura vier a acontecer, o maior problema a ser resolvido seria arranjar as vagas necessárias nas prisões para “acomodar” tantos criminosos contra o povo brasileiro, que roubaram desse povo quantia calculada de 10 trilhões de reais, mas que apesar de tudo não seria problema tão grave quanto o hoje enfrentado pela falta de vagas nos hospitais, de UTIs , de respiradores, e de oxigênio, no enfrentamento da pandemia da peste chinesa.

Sérgio Alves de Oliveira - Advogado e Sociólogo


quinta-feira, 4 de abril de 2019

Guedes e seu trilhão

“Enquanto Guedes tenta aprovar a reforma ideal, o presidente da República fala em reforma possível, sinalizando para a própria base do governo que lava as mãos em relação às mudanças que forem feitas no Congresso”


A atribulada audiência do ministro da Economia, Paulo Guedes, na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, ontem, revelou que ele está só na busca de economizar R$ 1 trilhão em 10 anos com as mudanças. Guedes foi muito atacado pelos petistas, mas deu seu recado de que não é possível o país continuar gastando R$ 700 bilhões com a Previdência e apenas R$ 70 bilhões com a Educação. Entretanto, deixou no ar falta de apoio na base do governo ao projeto integral, e também revelou certo desconforto com o fato de a própria base querer modificar a proposta. O presidente Jair Bolsonaro tem emitido sinais de que o problema da aprovação da reforma é do Congresso, e não do governo.

Guedes insistiu muito na tese de que uma reforma meia boca custará mais caro no futuro. No entrevero com os petistas, rechaçou cobranças ao atual governo, acusando a oposição de desperdiçar a oportunidade de ajustar a Previdência à realidade atuarial por um custo muito menor nos 18 anos que esteve no poder. Para o ministro, “faltou coragem”. Segundo ele, o aspecto fiscal da reforma é imperativo: “A principal componente de alta dos gastos foi com pessoal e, dentro disso, o elemento do deficit galopante tem sido a Previdência”, disse.

O ministro da Economia afirmou que o Brasil tem despesas previdenciárias muito elevadas, mesmo tendo uma população bastante jovem. Comparou a situação do Brasil com a de outros países: “Existem sistemas que quebraram, a Grécia, e estamos vendo o exemplo de Portugal. Imaginamos como não deve estar o problema previdenciário na Venezuela hoje”. Na sua avaliação, a economia de R$ 1 trilhão que pleiteia é essencial para que se possa fazer uma transição do sistema de repartição para o de capitalização, que, na sua opinião, é a solução definitiva para o problema previdenciário.

Mudanças
A reforma da Previdência, porém, está perdendo base de sustentação por causa da ausência do presidente Jair Bolsonaro nas articulações políticas. Enquanto Guedes tenta aprovar a reforma ideal, o presidente da República fala em reforma possível, sinalizando para a própria base do governo que lava as mãos em relação às mudanças que forem feitas no Congresso. Há, sim, parlamentares governistas que defendem, integralmente, a proposta do governo, mas são uma minoria. A maioria já decidiu, por exemplo, fulminar as novas regras de concessão da aposentaria rural e do Benefício de Prestação Continuada (BPC) concedido a idosos de baixa renda na própria Comissão de Constituição e Justiça.

Por enquanto, além de Guedes, somente o ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, e o secretário de Governo, general Santos Cruz, estão empenhados no corpo a corpo com os parlamentares para articular a base do governo no Congresso. Bolsonaro ainda não entrou em campo, espera-se que faça isso nesta volta de Israel, onde foi pródigo em declarações polêmicas e econômico na defesa da reforma. Não é normal o presidente da República e o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), não terem sentado para conversar sobre a aprovação da reforma.

Ontem, a expectativa na base do governo era de que o presidente da República mudaria de atitude em relação à reforma, se reunindo com a base para tratar do assunto após chegar da viagem a Israel. Com o tempo perdido, o ambiente favorável à reforma no Congresso começa a mudar; o governo perde apoio popular, em razão das confusões criadas por alguns ministros e declarações polêmicas do próprio presidente da República. Bolsonaro precisa se comprometer efetivamente com a aprovação da reforma.

Orçamento
Do outro lado do Congresso, o Senado aprovou, por ampla maioria, a proposta de emenda à Constituição do Orçamento Impositivo, que engessa ainda mais as contas do governo, ao tornar obrigatória as emendas de bancadas estaduais, a exemplo do que já acontece com as emendas individuais de deputados e senadores. Um acordo com o líder do governo, Fernando Bezerra (MDB-PE), para evitar um desastre no Tesouro, estabeleceu regras de transição para reduzir o impacto no Orçamento dos próximos dois anos. Um acordo de lideranças permitiu que a emenda constitucional fosse examinada na Comissão de Constituição e Justiça e votada em plenário duas vezes, num único dia. A proposta voltará à Câmara, para nova apreciação.

Nas Entrelinhas - Luiz Carlos Azedo - CB
 

segunda-feira, 25 de março de 2019

Descompasso entre MPF e Bretas ajudou Temer




O desembargador Antonio Ivan Athié, do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, mandou soltar Michel Temer e Cia. O magistrado não entrou no mérito das acusações de grossa corrupção que pesam contra o ex-presidente e seus supostos comparsas. 

Apenas considerou que, soltos, os encrencados não impedem a Lava Jato de realizar o seu trabalho. Foi como se dissesse aos procuradores: "Mãos à obra, doutores." Em seu despacho, o desembargador foi cirúrgico. Dono de uma biografia turbulenta, Antonio Athié cuidou vacinar-se, por assim dizer, contra o 'efeito Gilmar Mendes'. Elogiou a competência do juiz Marcelo Bretas, que ordenou as prisões agora revogadas. Enalteceu também as qualidades dos procuradores da força-tarefa do Rio, que pediram as detenções. De resto, declarou-se um defensor da Lava Jato:
"Ressalto que não sou contra a Lava Jato, ao contrário, também quero ver nosso país livre da corrupção que o assola. Todavia, sem observância das garantias constitucionais, asseguradas a todos, inclusive aos que a renegam aos outros, com violação de regras não há legitimidade no combate a essa praga", escreveu o juiz.

Complementando a autoimunização, o desembargador reconheceu que há nos autos indícios que podem levar à responsabilização criminal dos encrencados. Sustentou, entretanto, que não há fatos novos que justifiquem as prisões. Nesse ponto, o descompasso entre o juiz Bretas e os procuradores da Lava Jato socorreu Temer. O que os procuradores consideravam novo, Bretas não achou relevante. O que Bretas considerou importante, o desembargador Athié tratou como coisa antiga.

Por exemplo: os procuradores valorizaram relatório do Coaf sobre uma suposta tentativa de depósito de R$ 20 milhões em dinheiro vivo numa conta da Argeplan, empresa na qual Temer seria sócio oculto do seu faz-tudo, o coronel da PM João Baptista Lima. Não há vestígio de menção ao depósito no despacho de Bretas, Os procuradores também realçaram que investigadores estariam sendo monitorados pela quadrilha. De novo, Bretas deu de ombros. Desprezando o que seria novo, o juiz encostou a ordem de prisão em fatos antigos. Citou, por exemplo, evidências de que provas poderiam estar sendo destruídas na sede da Argeplan. Tais evidências foram recolhidas numa operação policial batizada de Patmos. Coisa de 2017. Quer dizer: se havia documentos a serem destruídos, eles já foram para o espaço há dois anos. 

Apegando-se a um velho brocardo da advocacia —O que não está nos autos, não existe— o desembargador Antonio Athié sentiu-se à vontade para concluir que, soltos, Temer, o ex-ministro Moreira Franco, o coronel Lima e os demais envolvidos não oferecem perigo a outras pessoas, não comprometem a ordem pública, não atrapalham uma instrução criminal que está praticamente concluída, não embaraçam a aplicação das leis e não impedem a adoção de providências para a recuperação de valores eventualmente desviados. Por isso, madou abrir as celas. A decisão do magistrado é liminar (temporária). Se quiser, o Ministério Público Federal pode recorrer. Entretanto, parece mais produtivo a essa altura seguir o conselho que salta das entrelinhas do despacho de Antonio Athié: "Mãos à obra, doutores".



domingo, 6 de maio de 2018

Revirando o lixo da História

A condição humana é dada não pela atividade laboral, um meio de sobrevivência, mas pelo agir e pensar politicamente, em regime de plena liberdade


Exumei das redes sociais um velho texto (lá se vão três anos) publicado nessas “Entrelinhas” para analisar o colapso do governo Dilma. O título da coluna era “A lata do lixo da História”, o nome de uma peça dos anos 1970 do sociólogo Roberto Schwarz, então professor de teoria literária da Universidade de São Paulo (USP), na qual fazia uma sátira ao regime militar. A expressão “vai para a lata do lixo da História” era muito usada por setores de esquerda na época, servia para menosprezar o papel dos liberais na luta pela democracia; hoje, serve aos liberais que consideram toda a esquerda ultrapassada e não apenas os setores ligados ao PT. É um erro. O Brasil precisa de uma esquerda moderna que dialogue com os liberais para reconstruir o centro democrático.

Essa lembrança veio a propósito do discurso do presidente da China, Xi Jinping, ao comemorar o bicentenário do nascimento de Karl Marx, no Grande Palácio do Povo: “O marxismo, como um amanhecer espetacular, ilumina o caminho da humanidade na sua exploração das leis históricas e na busca da sua própria libertação”. Em resumo, disse que os comunistas chineses precisam voltar às origens. Entretanto, Karl Marx é um dos sujeitos mais mal interpretados de todos os tempos, por esta razão: seus escritos partem do princípio de que a ação política não pode estar descolada do pensamento intelectual.

Após sua morte, em 14 de março de 1883, a teoria de Marx foi simplificada e instrumentalizada para a luta política, inclusive por seu amigo Frederico Engels e seu genro, Paul Lafargue. Social-democratas, socialistas e comunistas usaram sua crítica como estratégia política, mas Marx nunca teve uma fórmula para construir um mundo diferente do capitalismo. Mesmo assim, os conceitos de “valor” e “fetichismo”, suas grandes contribuições à compreensão do capitalismo, perderam espaço e influência para o conceito de “luta de classes”.

Grande exemplo é um livro de Josef Stalin intitulado Problemas econômicos do socialismo na URSS, de 1953, com o qual o líder comunista puxou as orelhas dos economistas da Academia de Ciências: “Por isso, estão absolutamente errados os camaradas que declaram que, uma vez que a sociedade socialista não liquida as formas mercantis de produção, então todas as categorias econômicas próprias do capitalismo deveriam alegadamente ser restabelecidas no nosso país: a força de trabalho como mercadoria, a mais-valia, o capital, o lucro do capital, a taxa média de lucro etc.”

Stálin varreu para debaixo do tapete problemas que mais tarde levaram ao colapso a antiga União Soviética: “Além disso, penso que precisamos igualmente abandonar alguns outros conceitos, retirados de O Capital, no qual Marx procedeu à análise do capitalismo, e que são artificialmente apensos às nossas relações socialistas. Refiro-me, entre outros, a conceitos como trabalho necessário e sobretrabalho, produto necessário e sobreproduto, tempo necessário e suplementar. A conta chegou para Gorbatchov na década de 1990: quando o líder comunista quis retomar a discussão, na Perestroika, o socialismo real já era. Talvez Xi Jinping esteja diante do mesmo debate no seu país, onde os operários são superexplorados e florescem uma nova burguesia e uma robusta classe média.

Parêntesis: na teoria de Marx, valor é aquilo que permite comparar duas mercadorias. A quantidade de trabalho que foi incorporada à mercadoria é que determina o seu valor. Já o fetiche é uma consequência disso: uma cortina que nos impede de ver a mercadoria em si. No caso de um celular, por exemplo, não conseguimos perceber todo o processo produtivo que está por trás da sua fabricação — na China, por exemplo —, mas somente o produto final, como se o aparelho, em si, tivesse vida própria na loja.

Grande jogo
A gênese dos partidos operários é velha tese marxista da centralidade do trabalho na luta política, que parte da ideia de que a contradição entre o trabalho e o capital é o motor da história e o eixo de atuação política do partido, ou seja, a luta de classes. Vem daí o glamour perdido do PT e o fascínio de intelectuais e artistas pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A filósofa alemã Hanna Arendt, uma democrata radical, via nessa concepção que absolutiza o trabalho uma das raízes do totalitarismo. Para ela, a condição humana é dada não pela atividade laboral, um meio de sobrevivência, mas pelo “agir e pensar politicamente”, em regime de plena liberdade, o que tanto o fascismo como o stalinismo não permitiram. Essa crítica “racionalista” hoje faz ainda mais sentido, porque o trabalho humano está sendo substituído pelo “não trabalho” dos robôs e sistemas de inteligência artificial.

A China hoje é o nosso principal parceiro comercial, seguida dos Estados Unidos. Ambos disputam o controle do comércio mundial, cujo eixo se deslocou do Atlântico para o Pacífico. O “grande jogo” da política mundial e a globalização, porém, para muitos setores da esquerda, continuaram sendo vistos na óptica dos velhos paradigmas, ou seja, o inimigo principal é o imperialismo norte-americano; o capitalismo de Estado, após a tomada do poder, é a antessala do socialismo. Não importa que os Estados Unidos sejam uma democracia e a China, uma ditadura. Nunca é demais lembrar que o colapso do governo Dilma se deveu às ideias políticas e econômicas fora de lugar, que apostavam numa aliança com a China, a Rússia, a África do Sul e a Índia como aliados principais, contra os Estados Unidos e a Comunidade Europeia, seguidas por práticas patrimonialistas estimuladas por Lula, que enlamearam toda a esquerda e jogaram as lideranças do PT na cadeia. Todas essas ideias velhas não morreram, estão vivíssimas nestas eleições de 2018. E não na lata do lixo da história.

Entrelinhas - Luiz Carlos Azedo - CB