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terça-feira, 8 de outubro de 2019

Máquina de guerra - Eliane Cantanhêde

O Estado de S.Paulo

Após estrago no meio ambiente, metralhadora ideológica mira a cultura

Quando surgiu a notícia de que o Ministério da Cidadania havia demitido 19 funcionários do Centro de Artes Cênicas da Funarte, a primeira reação foi de aplauso. Afinal, o governo afastava o diretor Roberto Alvim, que, entre outras barbaridades, ofendeu Fernanda Montenegro como “mentirosa” e “sórdida”. Ledo engano. Era bom demais para ser verdade. Logo ficou claro o contrário: foram demitidos os coordenadores, gerentes e subgerentes, menos... o chefe Alvim! Ou seja, o governo “limpou a área” para Alvim fazer o que bem entender. [está certa a afirmação de que o governo limpou a área, visto que os demitidos compunham um parte da corja lulopetista, da esquerda, que tenta manter a política petista da Ancine prestigiar a contracultura,aquela que valoriza a pornografia, [o que inclui, sem limitar, artistas voltado a produções 'culturais' que atentam contra valores básicos da FAMÍLIA.]

Esse é apenas mais um capítulo da nova guerra ideológica do governo Jair Bolsonaro, com o mundo todo já espantado com sua visão e suas declarações sobre meio ambiente – aliás, o tema central do Sínodo que ocorre neste momento no Vaticano, sob a liderança do papa Francisco. É enorme o estrago à imagem do Brasil no exterior, por desmatamento, queimadas e, agora, a gravíssima mancha de óleo [até os animais que estão morrendo sabem que a mancha de óleo não surgiu por acaso e nem é fruto da irresponsabilidade do comandante de algum navio e sim um ato de sabotagem, na tentativa, felizmente inútil, de comprometer o governo Bolsonaro com política de agressão a vida marinha.] nas praias de todo o Nordeste, mas principalmente pela nova política para o setor. Ainda enfrentando essa frente, o governo já aprofunda os ataques, investidas e ingerências na área da cultura, onde habitam velhos fantasmas do bolsonarismo, embolados no tal “marxismo cultural”.

A expressão, sempre presente nos escritos e nas falas do chanceler Ernesto Araújo, é também frequente no mundo e nas fantasias do diretor Roberto Alvim, que também vê inimigos esquerdistas e perigosos por toda a parte, prontos a implodir a “cultura judaico-cristã do Ocidente”. Alvim, que quer transformar o Teatro Glauce Rocha em “teatro evangélico”, seja lá o que isso seja, também já vinha conclamando “profissionais conservadores” a integrarem uma “máquina de guerra cultural” na Funarte. Ai, que medo! Imaginem só o que vai virar o Centro de Artes Cênicas. Um amontoado de críticos à nossa produção cultural, nossos diretores, nossos atores.

A Funarte, porém, é só mais um dos alvos do Planalto e do Ministério da Cidadania, que engoliu o da Cultura já na posse. A artilharia contra a cultura se expande por todas as áreas do governo, até a financeira. No mesmo dia do anúncio das demissões na Funarte, veio a notícia de que a produção cultural da Caixa Econômica Federal agora é sujeita ao crivo ideológico da presidência do órgão e da Secom do Planalto. Isso remete ao veto de Bolsonaro a uma peça publicitária do Banco do Brasil dedicada ao público jovem, porque incluía a diversidade racial e sexual. Ou ao ataque que ele fez à Ancine, condenando seus “filmes pornográficos” e defendendo que deveriam enfocar os “heróis nacionais” – leia-se, os heróis do próprio Bolsonaro, como o coronel Brilhante Ustra, fartamente apontado como torturador?[sugestão anotada - está entre os dez primeiros heróis nacionais.]

Do outro lado, Chico Buarque, excelente escritor e ícone da música de várias gerações, além de não ser “herói”, é tratado como inimigo: a embaixada brasileira em Montevidéu acaba de suspender um documentário sobre o Chico. O Chico! É inacreditável, mas pode acreditar. A reação já começa, com manifestações de apoio e a devida reverência à diva Fernanda Montenegro e com decisões judiciais como a de ontem, da juíza Laura Bastos de Carvalho, da 11.ª Vara do Rio, que suspendeu por liminar uma portaria do Ministério da Cidadania sobre projetos da Ancine para TVs públicas. [trata-se de liminar que pode ser cassada;
caso a decisão judicial seja mantida, nada impede que outras medidas sejam tomadas para impedir o uso de dinheiro público para promover obras inadequadas - mantendo sempre o devido respeito ao Poder Judiciário, sem abrir mão do direito de contestar legalmente suas decisões.]

A juíza atendeu a um pedido do Ministério Público, que apontou na portaria, além de prejuízo ao erário, “inequívoca discriminação por orientação sexual e identidade de gênero”. O STF, diga-se, acaba de criminalizar a homofobia. Demissões, perseguições e censura, além de asfixia financeira da cultura... Isso, sim, é muito “sórdido”.
 
Eliane Cantanhêde, jornalista - O Estado de S. Paulo 
 
 

quarta-feira, 22 de maio de 2019

Testando os limites - Presidente testa limites e não gosta do que vê

Jânio pensou que o povo impediria sua saída, Bolsonaro tenta usar o povo para não ter que sair

A manifestação a favor, uma incoerência em termos numa democracia, só serve a ditadores que precisam mostrar força popular, como Nicolas Maduro na Venezuela.
Um presidente democraticamente eleito há cerca de cinco meses não precisa disso, a não ser, como acho que está acontecendo, que se sinta desconfortável com as limitações que as instituições democráticas lhe impõem.

Por isso a manifestação do próximo fim de semana é contra o Congresso e os políticos, contra o Supremo Tribunal Federal (STF) e contra a imprensa, justamente as instituições que têm como finalidade impedir que o Poder Executivo exorbite de seus poderes, sobretudo em um presidencialismo como o nosso, que dá preponderância quase imperial ao presidente da República.  Ainda bem que o presidente Bolsonaro, apesar de ter publicado em sua rede social uma convocação para a manifestação, avalizando, portanto, seus objetivos, desistiu de participar, como chegou a ser aventado. E orientou seus ministros a não irem. Ao chamar à noite o presidente do STF, Dias Tofolli, para uma conversa sobre a conjuntura atual, o presidente Bolsonaro deu um sinal claro aos seus seguidores, confirmando o que seu porta-voz dissera: não autoriza manifestações que oponham seu governo aos outros poderes da República.

O que tira um ar oficialesco da convocação, que só o comprometeria. Desde o início, aliás, o presidente deveria ter se apartado desses movimentos que querem emparedar os demais poderes do Estado, mas esse parece ser a sua natureza. Como é de seu feitio, a meu ver numa tentativa de testar até onde pode ir, o presidente desde o início de seu governo vem voltando atrás em uma série de medidas polêmicas, rejeitadas, ou pela opinião pública, ou pelos líderes políticos. Um exemplo dessa atitude cambiante, que atribuo a uma tática, é a autorização, vislumbrada no decreto de liberação de porte de armas, para a venda de um fuzil antes classificado como de uso restrito às forças de segurança do Estado.

A fábrica Taurus, que supostamente é especialista em decifrar normas e legislações para ampliar seu escopo de venda, entendeu que o decreto assinado por Bolsonaro a autorizava a vender tal fuzil. O mercado para esse tipo de arma, cujo modelo mais sofisticado, com rajadas de balas, é muito usado por traficantes e milicianos, é tão grande que existem 2 mil pessoas na fila de espera. Diante da reação negativa da maioria, que não pertence ao nicho eleitoral dos Bolsonaros, o governo voltou atrás e garantiu que esse tipo de fuzil continua de uso restrito. Vai ser necessário agora mudar o texto do decreto pelo Congresso para que essa vedação fique explícita.

É certo que Bolsonaro foi eleito também por esse nicho eleitoral que se prepara para sair às ruas em sua suposta defesa, como se estivesse sendo coagido por “forças terríveis”, quiçá as mesmas que levaram Jânio Quadros a denunciá-las e renunciar. Era também um líder populista que não se enquadrava nas limitações que a democracia impõe. Jânio pensou que o povo impediria sua saída, Bolsonaro tenta usar o povo para não ter que sair. Não há como negar que ele foi eleito também para aprovar a flexibilização do porte e posse de armas, o que vem fazendo com rapidez impressionante, ou para interferir no ensino numa direção oposta ao que considera ser o “marxismo cultural”.

Só que ele não foi eleito apenas por aqueles que concordam com esses e outros projetos. E é preciso negociar com a sociedade, através do Congresso e da opinião pública vista de maneira ampla, bases para um consenso nessas questões delicadas de valores e costumes. [uma negociação em que, curiosamente, as forças a favor de que só bandidos e policiais portem armas - estes com restrições - serão sempre as vencedoras.
Bolsonaro deve cumprir as suas promessas de campanha, sendo uma das principais a revogação total do 'estatuto do desarmamento' - que cada um seja livre para possuir e portar quantas armas quiser; 
não vamos mais perder tempo lembrando que nos países com uma relação armas por habitantes bem superior  a do Brasil, ocorrem menos homicidios.
A Suíça cada cidadão, ao término do serviço militar vai para casa, levando consigo um fuzil que fica sob sua guarda, sendo obrigado de tempos em tempos a comparecer a uma unidade militar para treinamento.]

Nesse ponto voltamos ao fulcro do debate, às tais limitações institucionais que Bolsonaro parece querer superar pela pressão popular. Ele tem razão em criticar as corporações que impedem as mudanças, mas não conseguiu que sua própria corporação, a dos militares, abrisse mão de muitas das condições especiais que tem.
Sem dúvida é preciso levar em conta as características específicas da atuação das Forças Armadas, mas há também outras corporações com especificidades a serem analisadas, como a dos professores, e esse é o problema das mudanças, em todos os países. [os professores do básico e do intermediário - que ganham pouco, trabalham muito e em péssimas condições de trabalho; os professores das universidades tem muitos com o salário ultrapassando, em muito, o teto estadual ou mesmo federal. 
Na USP tem um que recebe pouco mais de R$60.000,00.]

A negociação deve ser feita, então pelo Congresso, e, mais uma vez tem razão, não pode se dar em troca de favores menores. Mas não é desafiando o Congresso que o governo vai conseguir fazer as reformas.


quarta-feira, 9 de janeiro de 2019

Glossário de ‘bolsonarês’ para entender o novo governo


Do 'marxismo cultural' ao 'globalismo', conheça o que o alto escalão da administração federal quer dizer com as expressões que chegaram a Brasília


Em suas primeiras palavras dirigidas ao país no parlatório do Palácio do Planalto, o presidente Jair Bolsonaro prometeu libertar” o Brasil do que considera socialismo e do que chamou de “politicamente correto”. No dia seguinte, seus ministros reforçaram a retórica. Entre os exemplos, estão os titulares das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, e da Educação, Ricardo Vélez Rodriguez, que tomaram posse em pé de guerra contra o “globalismo” e o “marxismo cultural”, respectivamente.

São expressões agora em voga nos altos escalões do governo federal, marcando a mudança do léxico político proporcionada pela chegada ao poder de uma direita que faz questão de explicitar seu conservadorismo e reedita no ano de 2019 o clima de vigilância anticomunista dos tempos da Guerra Fria.
Conceitos que pareciam soterrados pelos escombros do Muro de Berlim,
ou antes ficavam restritos às discussões acadêmicas e virtuais entre pessoas que seguem essa linha de pensamento, chegaram à Esplanada e serão inseridas com todo vigor no dia a dia do brasileiro.

Mas o que, afinal, significam cada uma dessas expressões? O que Jair Bolsonaro e aliados querem dizer quando falam de “ideologia de gênero” e “excludente de ilicitude”? Abaixo, VEJA lista um glossário com as principais expressões adotadas na campanha e nos primeiros dias do novo governo, de acordo com a visão que o presidente e seus auxiliares têm de mundo.

Globalismo
Processo de enfraquecimento das identidades nacionais e da soberania política dos diversos países ao redor do mundo, em detrimento de uma ordem global. Neste processo, os valores morais e culturais de cada nação são gradualmente substituídos por um conjunto de ideias internacionais e comuns a todos, que desconsidera as características históricas e regionais de cada povo. Equivale à versão de direita da palavra “imperialismo”, tão comum nos círculos de esquerda.

Marxismo cultural
A influência que ativistas políticos e teóricos de esquerda exercem em diversas áreas da produção cultural, como música, teatro, cinema, mídia e a própria educação, a fim de disseminar conceitos políticos comunistas e socialistas. Para o presidente, representa o enfraquecimento de valores morais nacionais e a promoção da ideologia de gênero.

Doutrinação
Na lógica bolsonarista, é a imposição, por parte de professores, de valores morais e políticos vinculados à esquerda aos estudantes.

Viés ideológico
Além de um mecanismo de “doutrinação”, é a opção de abordagem de qualquer questão a partir apenas da ótica de esquerda.

Socialismo
Mesmo que este sistema político jamais tenha sido efetivamente implementado no Brasil, é a identificação de que governos anteriores implementaram políticas de esquerda e compactuaram com as práticas do marxismo cultural.
(...)

Foro de São Paulo
Entidade internacional formada por partidos políticos de 26 países da América Latina, fundada em 1990 com a intenção de promover os ideais de esquerda na região. Para Bolsonaro, é a força por trás dos alegados mecanismos de dominação comunista no continente.

Escola Sem Partido
É um movimento e um projeto de lei homônimos que pretendem coibir a discussão de questões morais, políticas e sexuais em sala de aula, como forma de evitar a suposta doutrinação dos estudantes por professores. Em discursos, a expressão também é utilizada para definir de forma genérica o sistema educacional onde não estejam presentes, em especial, as ideias políticas de esquerda e a ideologia de gênero.

Ideologia de gênero
Apelido dado à teoria que estabelece sexo biológico e gênero como sendo coisas independentes, permitindo que um indivíduo biologicamente homem possa ter uma expressão de gênero feminina, se identificando socialmente como mulher, por exemplo. Também está relacionada ao papel social de homens e mulheres e contra a discussão em sala de aula sobre a desigualdade de oportunidades entre gêneros na sociedade.

Kit gay
Material didático do programa Escola Sem Homofobia, promovido pelo governo federal em 2011, produzido com a finalidade de estimular em sala de aula o respeito às pessoas LGBT — e que jamais chegou às escolas. Segundo Bolsonaro, o material acaba por sexualizar precocemente os estudantes e promover a homossexualidade e a bissexualidade

(...) 
Humanos direitos
Uma variante do “cidadão de bem”, define para quem devem ser garantidos os direitos humanos básicos.

Excludente de ilicitude
É a garantia de que policiais e demais agentes do estado que executem criminosos em serviço e em sua defesa pessoal não sejam punidos, mesmo que porventura venham a ser investigados. .
 
Talkei
 Para o fim de todos os assuntos, o presidente eleito complementa as ideias com “talkei”. É uma expressão para certificar que a pessoa com quem ele fala está entendendo e, também, para ele conseguir completar a linha de raciocínio sem conseguir se perder, talkei?

Politicamente correto
É a defesa, criticada pelo presidente, de que expressões, brincadeiras e outras manifestações jocosas dirigidas a setores vulneráveis da sociedade e minorias devem ser coibidas. Para o presidente, trata-se de vitimismo e de restrição à liberdade de expressão.
 
 
Glossário Completo na Veja