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domingo, 18 de outubro de 2020

Ibaneis Rocha fez filantropia com dinheiro da Viúva - Elio Gaspari

Folha de S. Paulo - O Globo 

Governador doou 12 mil máscaras a prefeito que pediu 5 mil  -   A filantropia de Ibaneis Rocha

Governador de Brasília, Ibaneis Rocha, doou 22,5 mil equipamentos de proteção sanitária ao município piauiense de Corrente [os moradores tentaram, muitos ainda tentam, realizar testes rápidos de covid-19 e não conseguem - enquanto milhares de testes vencem nos próximos dias = milhões de reais desperdiçados, indo para o lixo.]

quarta-feira, 5 de agosto de 2020

Fake News - Alexandre Garcia: "A quem interessa calar opinião?"

 Correio Braziliense


''Não cesso de ver fake news em lugar de fatos, e o estranho é que só agora o Supremo, a Câmara e o Senado passaram a se preocupar com isso''

Quase 100 mil vidas ceifadas, milhões de empregos estraçalhados, milhares de empresas fechadas. No entanto, dois dos três poderes da República têm como prioridade fake news. 
Como se a desgraça imposta por esse estranho e atípico vírus fosse resolvida quando o brasileiro recebesse vacina obrigatória contra notícias falsas. 
Nos meus anos de vida, a primeira fake news de que lembro foi em janeiro de 1952 — eu tinha 11 anos —, em O Cruzeiro, a revista de maior circulação na época. O fotógrafo Ed Keffel fez fotos numa montagem e a revista publicou como discos voadores na Barra da Tijuca. E vendeu muito por isso. Desde então, não cesso de ver fake news em lugar de fatos, e o estranho é que só agora o Supremo, a Câmara e o Senado passaram a se preocupar com isso.
Parece mais um movimento comercial contra o fim de monopólio da informação.

César Maia, pai do presidente da Câmara, denunciou algo mais pérfido que uma notícia falsa: o factóide. Parece fato, tem aparência de fato, é embrulhado como fato, mas serve para “embrulhar” o leitor, o ouvinte, o telespectador. O Wall Street Journal acaba de ter uma espécie de rebelião na redação, exigindo que notícia e opinião venham separados, não misturados. Fofocas e mexericos costumam vir disfarçados de notícia. A preocupação do Congresso e do Supremo, no entanto, só visa as redes sociais, exatamente o instrumento pelo qual todos ganharam voz, para reivindicar, desabafar, sugerir, opinar, criticar. Como se trata de gente, não de anjos, também há ódios, mentiras, maus conselhos, ofensas. Para esses, a própria comunidade digital tem os anticorpos: a capacidade de pesquisar e derrubar a mentira, de responder, de boicotar, de expor o ofensor.

E as leis também têm os remédios, o Código Penal e até a Lei de Segurança Nacional. O que querem inventar então? 
A quem interessa calar opinião, restringir a liberdade de expressão, a censura prévia, o direito de defesa, acusar de crime não previsto na legislação? 
Fica no ar o mau cheiro da fumaça de totalitarismo. Uma caça às bruxas, mais parecendo um macartismo de sinal invertido.

Que personagens da ficção esses agentes da censura estariam personificando? 
O perigoso Big Brother, o Irmão mais Velho, de George Orwell, que policiava até pensamento?
Melhor que seja um risível Mago de Oz, que, atrás do biombo que o protegia, ameaçava com fogo e trovões, mas acabou desmascarado como charlatão pela menina Dorothy.

Alexandre Garcia, jornalista - Coluna no Correio Braziliense



segunda-feira, 8 de janeiro de 2018

A banalidade do mal

Biografia de chefe de polícia de Vargas demole o mito do carrasco poderoso e expõe um tipo mais perturbador: o homem que cumpre ordens cegamente

 

O título com forte apelo comercial faria sentido se o brasilianista americano R.S. Rose tivesse confirmado, nas pesquisas que lhe permitiram reconstituir a saga de Filinto Müller, o personagem sombrio, brutal e desumano desenhado por desafetos extraordinariamente inventivos e jornalistas sem compromisso com os fatos. A honestidade intelectual do autor resultou numa biografia que exuma não O Homem Mais Perigoso do País (The Most Dangerous Man in the Country, no original em inglês), mas “O Temido Chefe de Polícia da Ditadura Vargas”, como informa já na capa o subtítulo acrescentado pela editora. Nada disso reduz a relevância da obra: o resgate do Filinto Müller de verdade oferece aos leitores a contemplação, em toda a sua perturbadora pequenez, de uma espécie humana que se reproduz com impressionante intensidade nas ditaduras e tem por hábitat as cercanias dos cativeiros: o homem que executa as ordens que vêm de cima. Quaisquer ordens. Sem jamais contestá-las, sem remorsos, sem crises de consciência, sem hesitação.

Até agora, o retrato oficial de Filinto Müller foi o desenhado a quatro mãos por Assis Chateaubriand, um barão da imprensa que ignorava fronteiras éticas, e David Nasser, um ficcionista fantasiado de repórter. [David Nasser é autor do livro FALTA ALGUÉM EM NUREMBERG; 
clicando no link acima o leitor terá oportunidade de ler na íntegra a obra de Nasser e fazer sua própria avaliação.] 
 
Rompido com Getúlio Vargas, Chatô escalou o jornalista de confiança para vingar-se do chefe de polícia com quem antipatizava. Para associar o inimigo à Alemanha hitlerista, Nasser localizou na família do alvo um segundo sobrenome teutônico e criou o supervilão Filinto Strubling Müller, desancado impiedosamente na série de reportagens publicadas na revista O Cruzeiro que depois seriam reunidas no livro Falta Alguém em Nuremberg. O Müller criado por Nasser tornou-se o único integrante do movimento tenentista expulso da Coluna Prestes, “por traição”. Teria sido dele a ideia de deportar Olga Benário Prestes. [Olga Benário Prestes além de conspirar junto com Prestes e outros comunistas para transformar o Brasil em mais um satélite soviético, veio para o Brasil fugindo da Justiça alemã que a condenou pela prática de vários atos terroristas na Alemanha - condenação proferida bem antes de Hitler se tornar chanceler do Terceiro Reich. 
Tanto que sua deportação além de atender justa solicitação do Governo alemão, teve também fundamentação nos atos praticados por Olga aqui no Brasil e que  tornaram nociva sua permanência no Brasil.
Não houve, ao deportá-la nenhuma atitude perseguidora por parte do governo Vargas.]  

Por sugestão de Chatô, Nasser qualificou de “nazista” o sorriso de Müller. Era com esse sorriso que o esbirro de Vargas teria acompanhado com entusiasmo e prazer as sessões de tortura que ocorreram diariamente enquanto durou o regime de exceção. Hábil inventor de tipos, Nasser fez de Müller uma versão piorada do alemão Heinrich Himmler. Na biografia publicada por Rose, as fantasias são demolidas por fatos. Müller não foi expulso da Coluna Prestes pela simples razão de que a coluna não existia quando o tenente mato-grossense desistiu de derrubar a bala o governo Artur Bernardes e se exilou na Argentina. 

É verdade que o Estado Novo institucionalizou a tortura, destinada a quebrar o físico e a alma dos participantes da rebelião comunista de 1935 e do levante integralista de 1938. Mas a CPI criada no Congresso para apurar as violências nos porões da polícia política terminou sem que nenhum depoente denunciasse a participação de Müller em alguma sessão de tortura, como carrasco ou espectador. Sobram evidências de que o biografado sabia que os métodos usados no interrogatório de quem guardava informações relevantes incluíam invariavelmente agressões selvagens. Porém as atrocidades só começavam depois que o chefe encerrava o expediente e ia para casa jantar em companhia da família. 

Rose também demonstra que, por mais poderoso que fosse, um chefe de polícia jamais se atreveria a ordenar deportações. No Estado Novo, tal atribuição era privativa do ditador. Foi Getúlio, portanto, quem determinou a viagem que levaria a mulher de Prestes à Alemanha e ao campo de concentração onde seria assassinada. Coube a Müller desincumbir-se de mais uma missão com a habitual eficiência.

Sempre que confrontado com perguntas sobre a face escura da era Vargas, Müller repetia que apenas cumprira ordens. Quem fez da mesma frase um mantra foi Adolf Eichmann, o carrasco alemão sequestrado na Argentina em maio de 1960, julgado no ano seguinte por um tribunal israelense que o condenou à morte e executado em 1962. “Era assim que as coisas eram, essa era a nova lei da terra, baseada nas ordens do Führer; tanto quanto podia ver, seus atos eram os de um cidadão respeitador das leis”, resumiu Hannah Arendt no extraordinário Eichmann em Jerusalém — Um Relato sobre a Banalidade do Mal. “Ele cumpria o seu dever, como repetiu insistentemente à polícia e à corte; ele não só obedecia a ordens, ele também obedecia à lei.” Todas as ditaduras são igualmente repulsivas, mas há um cósmico buraco negro a separar o III Reich do Estado Novo. Nem mesmo David Nasser acreditava que o banco dos réus de Nuremberg só ficaria completo se Müller estivesse lá. Não há semelhanças notáveis entre Müller e Himmler. Mas há visíveis traços comuns ao chefe de polícia de Vargas e Adolf Eichmann. Fosse qual fosse a ideologia do regime a que servissem, ambos fariam com aplicação e eficácia o serviço determinado pelos superiores hierárquicos.

Depois de duas derrotas na eleição para o governo estadual, Müller conformou-se com o papel de senador vitalício por Mato Grosso. Foi líder do governo JK, aliou-se aos militares em março de 1964, encontrando em Emilio Médici o presidente que se juntaria a Getúlio no altar dos seus santos particulares e encerraria a orfandade política decretada pelo suicídio. Tinha 73 anos quando decolou rumo a Paris, em 1973, acompanhado pela mulher, Consuelo, e pelo neto, Pedro. A poucos minutos do Aeroporto de Orly, um incêndio provocou um dos mais terríveis acidentes da aviação brasileira. A presença de várias celebridades a bordo obrigou Müller a socializar o espaço jornalístico reservado à tragédia. Ele não foi o número 1 sequer no noticiário que registrou a morte do líder no Senado do governo Médici — tão indissociável da tortura de presos políticos quanto a ditadura de Vargas.

Publicado em VEJA de 10 de janeiro de 2017, edição nº 2564