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quarta-feira, 20 de janeiro de 2021

"O marketing contagiou uma questão de saúde pública" - Alexandre Garcia

Coluna no Correio Braziliense

''Os brasileiros, assustados, já não sabem o que é fato e o que é factóide político, tanto nas redes sociais quanto no noticiário tradicional''

A abertura da temporada de vacinação marcou o auge da politização do que deveria ser um caso técnico de saúde pública e não uma disputa de poder, um terceiro turno da última eleição presidencial, uma campanha eleitoral antecipada, um digladiar ideológico. Por motivos políticos, tivemos a disputa entre o “fique em casa e volte quando tiver dificuldade de respirar, porque cloroquina dá arritmia” versus o “previna-se com ivermectina e vitamina D e trate ao primeiro sintoma com hidroxicloroquina, azitromicina e zinco”. Era a receita pró e contra Bolsonaro. Depois, o governador Doria entrou na campanha, levando a vacina como mote. Aí, a disputa política foi reforçada por “vacina chinesa de 50% pioneira versus vacina Oxford de 70% que ainda está na Índia”.

O racionalismo ficou de lado, diante das emoções fabricadas pelo amplo marketing do coronavírus, que matou 101 mil brasileiros menos que as demais doenças respiratórias, conforme site do Registro Civil. Os brasileiros, assustados, já não sabem o que é fato e o que é factóide político, tanto nas redes sociais quanto no noticiário tradicional. Quantas vidas e empregos teriam sido poupados não fosse esse componente de campanha dogmática que inocula os fatos.

São dois lados da mesma intolerância, esquecendo do público que precisa da verdade despida de tintas ideológicas.  
Agora, temos a vacina do Doria e a vacina do Bolsonaro. Um lado não comemora o início da vacina do outro, enquanto o adversário festeja a demora da vacina que virá da Índia. O marketing contagiou uma questão de saúde pública e criou expectativas que vão muito além da realidade. Vacinas não deveriam ter propaganda enganosa.

Usar vacinas experimentais, como é o caso, tem a mesma lógica de usar um tratamento preventivo e uma terapia precoce –– é o que temos para tentar, incluindo as vacinas precoces, como são todas. Esse barulho político pode ter contribuído para não se ouvir o riso dos corruptos nas compras de respiradores, hospitais de campanha, material de proteção, culminando com a falta de oxigênio no centro do pulmão do mundo.

Alexandre Garcia, jornalista - Coluna no Correio Braziliense


quarta-feira, 5 de agosto de 2020

Fake News - Alexandre Garcia: "A quem interessa calar opinião?"

 Correio Braziliense


''Não cesso de ver fake news em lugar de fatos, e o estranho é que só agora o Supremo, a Câmara e o Senado passaram a se preocupar com isso''

Quase 100 mil vidas ceifadas, milhões de empregos estraçalhados, milhares de empresas fechadas. No entanto, dois dos três poderes da República têm como prioridade fake news. 
Como se a desgraça imposta por esse estranho e atípico vírus fosse resolvida quando o brasileiro recebesse vacina obrigatória contra notícias falsas. 
Nos meus anos de vida, a primeira fake news de que lembro foi em janeiro de 1952 — eu tinha 11 anos —, em O Cruzeiro, a revista de maior circulação na época. O fotógrafo Ed Keffel fez fotos numa montagem e a revista publicou como discos voadores na Barra da Tijuca. E vendeu muito por isso. Desde então, não cesso de ver fake news em lugar de fatos, e o estranho é que só agora o Supremo, a Câmara e o Senado passaram a se preocupar com isso.
Parece mais um movimento comercial contra o fim de monopólio da informação.

César Maia, pai do presidente da Câmara, denunciou algo mais pérfido que uma notícia falsa: o factóide. Parece fato, tem aparência de fato, é embrulhado como fato, mas serve para “embrulhar” o leitor, o ouvinte, o telespectador. O Wall Street Journal acaba de ter uma espécie de rebelião na redação, exigindo que notícia e opinião venham separados, não misturados. Fofocas e mexericos costumam vir disfarçados de notícia. A preocupação do Congresso e do Supremo, no entanto, só visa as redes sociais, exatamente o instrumento pelo qual todos ganharam voz, para reivindicar, desabafar, sugerir, opinar, criticar. Como se trata de gente, não de anjos, também há ódios, mentiras, maus conselhos, ofensas. Para esses, a própria comunidade digital tem os anticorpos: a capacidade de pesquisar e derrubar a mentira, de responder, de boicotar, de expor o ofensor.

E as leis também têm os remédios, o Código Penal e até a Lei de Segurança Nacional. O que querem inventar então? 
A quem interessa calar opinião, restringir a liberdade de expressão, a censura prévia, o direito de defesa, acusar de crime não previsto na legislação? 
Fica no ar o mau cheiro da fumaça de totalitarismo. Uma caça às bruxas, mais parecendo um macartismo de sinal invertido.

Que personagens da ficção esses agentes da censura estariam personificando? 
O perigoso Big Brother, o Irmão mais Velho, de George Orwell, que policiava até pensamento?
Melhor que seja um risível Mago de Oz, que, atrás do biombo que o protegia, ameaçava com fogo e trovões, mas acabou desmascarado como charlatão pela menina Dorothy.

Alexandre Garcia, jornalista - Coluna no Correio Braziliense



segunda-feira, 1 de julho de 2019

Afinal quem é esse Alcolumbre?

A estreia de Alcolumbre nas ruas

Presidente do Senado é chamado de canalha


O deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), presidente da Câmara, já está acostumado a ser alvo de cartazes e imprecações ofensivas nas manifestações de ruas promovidas pelos seguidores de Jair Bolsonaro e do ex-juiz Sérgio Moro.

Mas David Alcolumbre (DEM-AP), presidente do Senado, não. Jamais fora lembrado. Ontem, em Brasília, finalmente foi, segundo registro do fotógrafo Orlando Brito. Em um dos cartazes, ele apareceu como “canalha”, e Maia como “corrupto e oportunista”. [Alcolumbre responde por crimes eleitorais -  Inquérito 4353 - e Maia é acusado na Lava Jato pelo recebimento de propinas.]

[Maia é velho conhecido, filho do ex-prefeito do Rio,  César Maia - precursor do uso das fake news, com o uso do factóide - está envolvido na Lava Jata, em 2014 foi eleito por pouco e em 2018 teve setenta e mil e poucos votos;

Alcolumbre começou a carreira como vereador do AP, três mandatos de deputado federal, senador e foi eleito presidente do Senado por diferença de um voto e em uma eleição com três desistências.
Tudo indica que é um seguidor de Maia - para onde, nem ele sabe.]

Numa faixa estendida na Esplanada dos Ministérios, Alcolumbre teve a sorte de ser poupado, mas Maia, não, acusado de “bandido”. Outra faixa, essa dirigida ao Congresso e ao Supremo Tribunal Federal, ameaçava: “Ou intervenção ou vocês vão morrer, covardes”.  Maia e Alcolumbre atuam em parceria. Não fossem eles, a reforma da Previdência não teria a mínima chance de ser aprovada uma vez que o presidente Jair Bolsonaro pouco liga para ela. Mas nem Maia nem Alcolumbre reagiram bem aos ataques dos manifestantes. Por telefone, ontem à noite, líderes de partidos combinaram se solidarizar com os dois esta semana e defender com veemência o Congresso e a Justiça em discursos na Câmara e no Senado.

Blog do Noblat - Veja