Hélio Schwartsman
É especialmente na infância e na juventude que as pessoas devem ser livres para experimentar
Antes mesmo de o programa do governo federal de militarização de escolas
públicas engrenar, a moda se espalhou e fincou raízes Brasil afora.
Como mostrou reportagem da Folha, só na Bahia já são 83 as instituições
que adotaram esse modelo, em que a parte pedagógica da escola segue sob
comando de professores, mas policiais militares aposentados recebem um
ordenado complementar para cuidar das questões disciplinares.
Para mim, o tipo de disciplina imposto aos alunos, com continências,
uniformes, padrões para corte de cabelo e maquiagem, além da vigilância
extrema, é um cenário de pesadelo. É especialmente na infância e na
juventude que as pessoas devem ser livres para experimentar. É claro que
escolas precisam de um pouco de ordem para funcionar, mas não penso que
seja necessário convocar militares para estabelecê-la. Um bom diretor é
em tese capaz de fazê-lo.
[o ilustre articulista esquece que um bom diretor poderia até ser capaz de manter a disciplina nas escolas - nos meus tempos de ginásio isto era possível e, provavelmente, nos tempos do colunista, mas, agora as coisas estão mudadas.
Se o diretor resolve agir com energia e o aluno, ou alunos, decide (m) pelo confronto, o diretor corre o risco de ser espancado - ainda que o rebelde seja só um, outros a ele se juntarão para enfrentar o diretor;
optando o diretor pela expulsão é quase certo que haverá retaliação por parte do punido - as vezes apoiados por familiares e até mesmo por parentes, ou os próprios pais.
O policial resolve o assunto e o aluno, ou mesmo familiares, quase sempre se curvam ao decidido pela escola - polícia sempre é polícia.
Continência é apenas uma forma de cumprimento e a disciplina ensina os alunos a obedecer, respeitar e ter senso de hierarquia, de cumprir ordens, ficam imbuidos do sentimento que o importante é cumprir a missão, custe o que custar.
A prova que a militarização das escolas veio para crescer e expandir-se é que em Brasília já temos escolas particulares, militarizadas e houve aumento dos alunos, da disciplina e do próprio aproveitamento escolar.]
Também me parece preocupante que muitas dessas escolas exijam que o
aluno arque com o custo das fardas, quando não pedem uma contribuição
voluntária às famílias. Isso, aliás, explica parte dos tão propalados
efeitos acadêmicos positivos da militarização. A correlação entre renda e
performance educacional é conhecida e robusta. Assim, um modo eficaz
para melhorar o desempenho de uma instituição é aumentar suas
mensalidades, excluindo os alunos mais pobres. Não sou, contudo, um xiita. Não pretendo que as minhas preferências
pessoais sejam universalizáveis. Quem gosta de uma educação mais rígida e
vê valor no corte escovinha deve ter a opção de matricular seus filhos
num colégio com essas características.
O que me incomoda é a proliferação dessas instituições, pois cada escola
militarizada significa uma escola normal a menos. [se uma escola para ser normal precisa oferecer espaço para a indisciplina, para o desrespeito aos professores e funcionários, aguma coisa está errada, e muito, em nossa Pátra Amada Brasil.] E sou daqueles que
pensam que o ensino público básico deve ser universal, gratuito, civil,
laico e, dada a impossibilidade da neutralidade, tão plural quanto
possível.