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domingo, 25 de setembro de 2022

Justiça eleitoral proíbe realização de lives dentro do governo

Ministro do TSE manda tirar do ar a transmissão em que Bolsonaro anuncia apoio a aliados e o impede de usar bens públicos para campanha da reeleição

[Podem tudo?  NÃO, não podem mandar o eleitor votar no Lula = vitória do presidente Bolsonaro.]

O corregedor-geral do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Benedito Gonçalves, mandou tirar do ar a live de Jair Bolsonaro (PL), da última quarta-feira, quando fez propaganda eleitoral para aliados usando a estrutura do Palácio da Alvorada. O magistrado também proibiu que o presidente da República utilize recursos e instalações públicas para fazer transmissões com cunho eleitoral, além de impedi-lo de usar até mesmo o intérprete de libras que serve nos eventos de governo.
 

 Ministro Benedito Gonçalves, do TSE, recebe do companheiro Lula um carinhoso tapinha no rosto. - Foto: Reprodução/ Twitter [inserção do Blog Prontidão Total.]

A decisão do ministro foi tomada na última sexta-feira. Segundo o corregedor do TSE, "os indícios até aqui reunidos indicam que, no caso, tanto o imóvel destinado à residência oficial do presidente da República quanto os serviços de tradução para libras custeados com recursos públicos foram destinados à produção de material de campanha. Trata-se, ademais, de recursos inacessíveis a qualquer dos demais competidores".

Gonçalves salienta, também, que "os elementos presentes nos autos são suficientes para concluir, em análise perfunctória, que o acesso a bens e serviços públicos, assegurado a Jair Messias Bolsonaro por força do cargo de chefe de governo, foi utilizado em proveito de sua campanha e de candidatos por ele apoiados", disse Gonçalves.

O ministro determinou, ainda, que as plataformas YouTube, Instagram e Facebook retirem do ar a live presidencial da última quarta-feira — que embasou a ação. Na ocasião, Bolsonaro anunciou que por causa da proximidade das eleições, faria transmissões diárias para promover candidaturas de deputados e senadores aliados do Palácio do Planalto. A liminar barra a estratégia eleitoral do presidente de atrelar a comunicação de governo à da campanha.  "Faz-se necessário tanto determinar a remoção do material potencialmente irregular quando vedar que seja reiterada a conduta — especialmente em razão do anúncio de que as lives poderão ser veiculadas diariamente até a véspera do pleito", salienta Gonçalves.

A decisão atende a pedido formulado pelo PDT, partido do presidenciável Ciro Gomes, e foi assinada pelos advogados Walber Agra e Ezikelly Barros. A ação pede, ainda, que seja declarada a inelegibilidade e a cassação do registro da candidatura de Bolsonaro. O mérito das solicitações ainda será analisado pelo TSE.

Fabio Wajnagrten, um dos coordenadores da campanha de Bolsonaro, reagiu com indignação à determinação de Gonçalves. "Proibir o presidente Bolsonaro de fazer lives da sua própria casa é o maior absurdo jurídico que já testemunhei em toda a minha vida. Vou propor para fazermos as lives da calçada da rua. Venceremos mesmo assim", tuitou.

Sem investigação
O ministro André Mendonça, do Supremo Tribunal Federal (STF), negou, ontem, o pedido do senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) para investigar o clã Bolsonaro. Horas antes, o magistrado suspendera os efeitos de uma liminar que mandava tirar do ar reportagens do portal Uol sobre a compra, com dinheiro vivo, de imóveis pela família do presidente da República, nos últimos 30 anos. "Observo que as imputações apresentadas pelo peticionante foram extraídas e estão lastreadas, exclusivamente, em reportagem de veículo de comunicação, sem que tenham sido apresentados indícios ou meios de prova minimamente aceitáveis que corroborem as informações contidas na referida matéria jornalística. A própria empresa responsável pela matéria reconhece não ter feito qualquer imputação de crime ao Presidente da República ou a membros da sua família", observou Mendonça, em resposta à petição de Randolfe. [em nossa opinião, o despacho do ministro do STF, André Mendonça, vale como declaração da falta de autenticidade da matéria publica pelo portal Uol.]

O ministro, ainda na sexta-feira, decidiu favoravelmente ao Uol, restabelecendo a volta das reportagens ao ar — liminar concedida pelo desembargador Demetrius Cavalcanti, a pedido do senador Flavio Bolsonaro (PL-RJ), determinou que as matérias deixassem de ser exibidas. De acordo com os textos portal, [ sem nenhuma prova de autenticidade] dos 107 imóveis comprados pela família nos últimos 30 anos, em 51 deles houve uso de dinheiro vivo.

Política - Correio Braziliense


quarta-feira, 6 de novembro de 2019

Pacote terá problemas no Congresso - O Estado de S. Paulo

João Domingos 

O Congresso é formado em sua maioria por parlamentares que se dizem municipalistas

O governo pode se preparar. O Congresso não aprovará as propostas do Plano Mais Brasil do jeito que foram entregues. Em alguns casos, haverá resistências intransponíveis, como a extinção de cerca de 1,2 mil municípios com menos de 5 mil habitantes e arrecadação menor do que 10% da receita total. Em outros, os projetos serão tocados, mas com mudanças. A única parte com chance de andar, talvez com votação em pelo menos uma das Casas este ano, é a que trata dos gatilhos para reduzir gastos.
O Congresso é formado na sua maioria por parlamentares que se dizem municipalistas. E, mesmo que nem todos saibam direito o que isso significa, sabem que precisam do apoio dos prefeitos para garantir a eleição. Acabar com mais de mil municípios é acabar com mais de mil cargos de prefeito e outro tanto de vices, além de cerca de 12 mil mandatos de vereador, todos cabos eleitorais importantes. Sem contar os servidores, eleitores que podem perder o emprego.
Para o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, tudo leva a crer que essa iniciativa tem cheiro de jabuti em cima de uma árvore. “Tem segunda intenção por parte desse projeto”, disse Maia a este repórter ontem. Deve-se levar em conta para o futuro do pacote dois fatores: a total dependência que Bolsonaro tem de Maia e do presidente do Senado, Davi Alcolumbre. Sem base parlamentar, e com o único partido do governo, o PSL, em guerra interna, o presidente terá de contar com a boa vontade dos dois. Como contou na aprovação da reforma da Previdência.
Só que o momento é diferente. Maia está descontente com a forma como o ministro da Economia, Paulo Guedes, tem se comportado quanto à reforma tributária. [Mais não se conforma em não ter emplacado o parlamentarismo branco e com isso ele defenstrado, antecipadamente, do cargo que pretendia ocupar 'primeiro ministro'. Já o Alcolumbre segue o 'líder' - não seguir o  líder no sentido real, caso dos torcedores,  e também dos adversários,  o MENGÃO - e sim o ex-quase futuro primeiro-ministro.] A impressão que Guedes passa é a de que não deseja que nada seja feita. Outro tema que levanta o debate no Congresso são as crises que Bolsonaro e seus filhos criam do nada. Muitos líderes começam a demonstrar cansaço com a usina de crises do clã Bolsonaro.

João Domingos - O Estado de S. Paulo

terça-feira, 9 de abril de 2019

Olavista de carteirinha

“A nomeação de Weintraub foi uma solução doméstica para uma disputa entre olavistas, militares e técnicos do próprio ministério, com objetivo de melhorar a gestão sem mudar a orientação ideológica”


A nomeação do economista Abraham de Bragança Vasconcelos Weintraub para o comando do Ministério da Educação, pelo presidente Jair Bolsonaro, no lugar do atrapalhado colombiano Ricardo Vélez Rodrigues, reforça a orientação ideológica que o antecessor tentou implementar na pasta, ao contrário do que muitos que criticavam o ministro defenestrado esperavam. Weintraub é discípulo do escritor Olavo de Carvalho, ideólogo do clã Bolsonaro, e militante de primeira hora da campanha eleitoral do atual presidente da República. A diferença é a experiência como gestor, no mercado financeiro, além de pertencer à cozinha do Palácio do Planalto, pois participou da equipe de transição do governo e é muito ligado ao ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, de quem era o braço direito até agora.

Um vídeo na internet intitulado “Marxismo cultural x Economia”, no qual faz uma palestra ao lado de seu irmão Arthur, revela as ideias básicas do novo ministro, que estão em linha com as de Bolsonaro e do seu ministro de Relações Exteriores, Ernesto Araujo. Na visão dos Weintraub, é preciso fazer uma cruzada contra o “marxismo cultural”, que domina as universidades do Brasil e do mundo, entre as quais, a de Harvard. Numa leitura enviesada de Max Weber, sociólogo alemão, os dois irmãos fazem uma defesa enfática do protestantismo como eixo de resistência às ideias de esquerda e católicas, que seriam responsáveis pelo atraso da Europa ibérica e da América Latina. Citando Alemanha, Japão e China, também fazem apologia da política de terra arrasada como via de crescimento.

A nomeação de Weintraub foi uma solução doméstica para uma disputa entre olavistas, militares e técnicos do próprio ministério. Em tese, Weintraub tem mais capacidade de articulação política e trânsito no Palácio do Planalto, mas nada garante que o ministro terá autonomia para formar a própria equipe. Provavelmente, terá que arbitrar os conflitos existentes e, ao mesmo tempo, enfrentar os que surgirão quando começar a implantar a nova política educacional de Bolsonaro. A Educação não é a especialidade do novo ministro, que sempre esteve mais focado na reforma da Previdência.

Lista tríplice
Embora a prioridade do governo seja o combate ao analfabetismo e a implantação de novos currículos escolares, o ministro Vélez notabilizou-se por declarações e propostas polêmicas, além de uma sucessão de nomeações e demissões na pasta. Entre as trapalhadas, um e-mail do ministro pedindo aos gestores de escolas que enviassem ao MEC vídeos mostrando as crianças cantando o Hino Nacional e lendo o slogan da campanha eleitoral de Bolsonaro.

Vélez anunciou dois novos secretários executivos que não foram aceitos pelo governo. A educadora evangélica Iolene Lima foi demitida antes de ter assumido; a secretária da Educação Básica, Tânia Leme de Almeida, em seguida, pediu demissão após descobrir que o nível de alfabetização das crianças não seria mais avaliado. A mudança fora pedida pelo seu secretário de Alfabetização ao presidente do Instituto Nacional de Pesquisas e Estudos Educacionais (Inep), Marcus Vinícios Rodrigues, que foi demitido. Vélez manteve a avaliação. O ministro também criou, no Inep, uma comissão para vigiar o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) e identificar “questões com teor ofensivo a tradições”.

A grande interrogação sobre a nova política é a gestão das universidades, cujas listas tríplices para nomeação de reitores são mera formalidade, pois há eleições diretas e o mais votado costuma ser escolhido reitor. A eleição mais recente foi a da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), a maior subordinada à pasta, na qual foi eleita a médica Denise Pires (Chapa 10), professora do Instituto de Biofísica (IBCCF). Das 76.957 pessoas aptas a votar (4.270 professores, 9.189 técnicos e administrativos e 63.498 estudantes), apenas 20.887 votaram (3.189 professores — 74,6%; 4.591 técnicos — 49,9%; e 13.107 estudantes — 20,6%).

A chapa 10 obteve 9.427 votos. A chapa 40, liderada pelo professor Oscar Rosa Mattos, da Escola Politécnica e da Coppe/UFRJ, obteve 8.825 votos, e Chapa 20, encabeçada por Roberto dos Santos Bartholo Junior, da Coppe/UFRJ e da Faculdade de Letras, teve 2.281 votos. Não existe vinculação formal entre a eleição e a indicação da lista tríplice pelo Colégio Eleitoral da UFRJ designado para fazer as indicações ao ministro, mas o resultado da consulta sempre é respeitado.

Nas Entrelinhas - Luiz Carlos Azedo - CB



domingo, 17 de fevereiro de 2019

Clã Bolsonaro negocia migrar para nova UDN





Filhos do presidente articulam deixar PSL e ingressar em sigla em formação que pretende reeditar antiga União Democrática Nacional, símbolo da centro-direita no País

 O presidente Jair Bolsonaro e os filhos políticos Flávio (à esq.), Eduardo e Carlos (à dir.) Foto: FAMÍLIA BOLSONARO

[SUGESTÃO:  presidente, seus pimpolhos podem ser úteis, só é preciso que o senhor os enquadre, lembre que são seus filhos e não seus ministros;

isto feito lembre que na condição de filhos tem livre acesso ao senhor - fora das reuniões institucionais, óbvio - e podem lhe apresentar sugestões, que o senhor gostando poderá encaminhar a quem de direito para estudos.

Entregue a sugestão eles devem silenciar sobre - não podem, nem devem, sair tuitando que propuseram isso ou aqui. 

Qualquer manifestação do pai JAIR BOLSONARO será feita em privado e qualquer manifestação institucional será efetuada pelo porta-voz.

Se isto for seguido, acabam as encrencar e eles poderão continuar dando ideias sobre assuntos de governo, sem tocar fogo no governo.] 

Com o PSL em crise e sob suspeita de desviar verba pública por meio de candidaturas “laranjas” nas eleições de 2018, os filhos do presidente Jair Bolsonaro (PSL) negociam migrar para um novo partido, que está em fase final de criação. Trata-se da reedição da antiga UDN (União Democrática Nacional).
Segundo três fontes ouvidas pela reportagem em caráter reservado, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) se reuniu na semana passada em Brasília com dirigentes da sigla para tratar do assunto. Ele tem urgência em levar adiante o projeto. Eleito com 1,8 milhão de votos, Eduardo teria o apoio de seu irmão, o vereador Carlos Bolsonaro (PSC-RJ). Com esse movimento, a família Bolsonaro buscaria preservar seu capital eleitoral diante do desgaste do partido. 

Enquanto ainda estava internado no hospital Albert Einstein, em São Paulo, Jair Bolsonaro acionou o ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro, para que determinasse investigações sobre o caso. As suspeitas atingiram o presidente da legenda, deputado federal Luciano Bivar (PSL-PE), e foram pano de fundo da crise envolvendo o ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência da República, Gustavo Bebianno, que foi chamado de mentiroso por Carlos Bolsonaro depois de afirmar que tratara com o pai sobre o tema. Após cinco dias de crise, Bebianno deve ser exonerado do cargo nesta segunda-feira, 18, por Bolsonaro.

Além de afastar a família dos problemas do PSL, a nova sigla realizaria o projeto político de aglutinar lideranças da direita nacional identificadas com o liberalismo econômico e com a pauta nacionalista e conservadora, defendida pelo clã Bolsonaro. No começo do mês, Eduardo foi ungido por Steve Bannon, ex-assessor do presidente americano Donald Trump, como o representante na América do Sul do The Movement, grupo que reúne lideranças nacionalistas antiglobalização. 

O projeto do novo partido é tratado com discrição no entorno do presidente. Em 2018, a UDN foi um dos partidos – embora ainda em formação e sem registro no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) – sondados por interlocutores do presidente para que ele disputasse a eleição, mas a articulação não avançou. Depois de anunciar a adesão ao Patriota, Jair Bolsonaro acabou escolhendo o PSL.
 
Assinaturas
A nova UDN é um dos 75 partidos em fase de criação, conforme o TSE. Segundo seu dirigente, o capixaba Marcus Alves de Souza, apoiadores já reuniram 380 mil assinaturas – são necessárias 497 mil para a homologação da legenda. O partido já tem CNPJ e diretórios em nove Estados, como exige a legislação eleitoral para a homologação. Ela tem em Brasília um de seus principais articuladores, o advogado Marco Vicenzo, que lidera o Movimento Direita Unida e coordena contatos com parlamentares interessados em aderir ao novo partido. A articulação envolveria ainda o senador Major Olímpio (PSL-SP), que nega.

Souza prefere não comentar as tratativas do partido que estão em curso. Ele, porém, admitiu que a intenção é criar o maior partido de direita do País. Como se trata de uma sigla nova, a legislação permite a migração de políticos sem que eles corram o risco de perder seus mandatos. “O único partido que tem o DNA da direita é a UDN. A gente não pode ter medo de crescer, mas com responsabilidade”, afirmou.

Souza deixou o Espírito Santo, onde atuou na Secretaria da Casa Civil do ex-governador Paulo Hartung, e mudou-se para São Paulo para concluir a criação da nova UDN, que adotou o mesmo mote de sua versão antiga: “O preço da liberdade é a eterna vigilância”. “Nosso sonho é que a UDN renasça grande e se torne o maior partido do Congresso”, afirmou seu presidente. Ele disse ainda que a legenda pretende apoiar o governo Bolsonaro e está aberta “para receber pessoas sérias do PSL e de qualquer partido”. 

Palácio
Procurada pelo Estado, a assessoria do Palácio do Planalto informou que não ia se manifestar sobre o assunto. A reportagem procurou ainda as assessorias do senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), do deputado Eduardo Bolsonaro e do vereador Carlos Bolsonaro, mas nenhuma delas se manifestou.
Bivar, presidente da legenda, também foi procurado, mas não respondeu ao Estado

‘Sigla tem forte apelo popular’, diz historiador
Em processo de homologação no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), a UDN, sigla que pode abrigar o clã Bolsonaro, foi inspirada no partido que nasceu em 1945 para aglutinar as forças que se opunham à ditadura de Getúlio Vargas. Com o discurso de moralização da política e contra corrupção, a frente unia originalmente desde a Esquerda Democrática – que romperia um ano depois com a sigla e fundaria o Partido Socialista Brasileiro – a antigos aliados de Vargas, como o general Juarez Távora e o ex-governador gaúcho Flores da Cunha, rompidos com o ditador.

Em 1960, o partido apoiou a eleição de Jânio Quadros, eleito presidente, e, em 1964 , a deposição do governo de João Goulart. “O PSL é um partido de aluguel, já a UDN tem um apelo histórico e popular. Os Bolsonaros podem usar isso”, disse o historiador Daniel Aarão Reis, professor da Universidade Federal Fluminense (UFF).

Líderes
Ele lembra que a antiga UDN, embora “muito ideologizada”, tinha um perfil heterogêneo. O mesmo pode acontecer com a nova versão do partido. Enquanto a versão original da UDN tinha líderes como o brigadeiro Eduardo Gomes, o jurista Afonso Arinos e os ex-governadores Carlos Lacerda (Guanabara), Juracy Magalhães (Bahia) e Magalhães Pinto (Minas), a nova legenda tem potencial para atrair lideranças do DEM ao PSDB, passando pelo MBL.
Entre os políticos que são vistos como “sonho de consumo” da UDN em 2019 está o governador de São Paulo, João Doria, que descarta a ideia de deixar o PSDB.

O Estado de S. Paulo

sábado, 3 de novembro de 2018

Está tudo muito confuso, tá ok?

Boa comunicação faz parte da arte de bem governar, por isso o presidente eleito deveria migrar para outro estilo de transmitir suas ideias e decisões


O presidente eleito Jair Bolsonaro gosta de uma comunicação de frases curtas, vocabulário estreito, ideias simples e uma interjeição final. O seu “tá, ok?” costuma se seguir a ideias controversas e é posto muitas vezes como uma prévia interdição ao contraditório. Nessa primeira semana após a eleição tudo foi muito confuso. É natural. O governo nem começou. A decisão de barrar jornais numa coletiva mostra autoritarismo. A cena de Paulo Guedes e Sérgio Moro, na sexta-feira, desistindo da entrevista, em frente ao pelotão de jornalistas exibe o improviso.

Bolsonaro acredita na força do seu próprio canal de comunicação e se baseia no fato de ter sido com a mídia alternativa, criada pelo filho 02, que ele contornou a falta de recursos eleitorais tradicionais, como acesso ao fundo partidário e tempo de televisão. Só que agora tudo mudou. Ele é o presidente eleito e a boa comunicação faz parte de bem governar.  Após o primeiro turno, em vez de falar com os repórteres como fazem todos os candidatos que vencem essa etapa inicial, Bolsonaro fez um live no Facebook.  

Ao vencer o segundo turno, teve que fazer três falas de vitorioso para cumprir de forma incompleta o ritual democrático de qualquer eleição, que é se comunicar com o país após as urnas. Sua primeira fala foi ainda de conflito, via Facebook. Na segunda, que foi mais organizada pelo esforço dos órgãos de imprensa que se uniram para isso, ele preferiu ler um texto em que faltavam pontos importantes, como uma palavra indispensável aos eleitores que não votaram nele. Na terceira, Bolsonaro voltou ao Facebook para completar o que havia esquecido. No meio de tudo isso, uma oração, que seria normal sendo feita internamente, mas exposta como primeira cena do governante eleito parecia revogar a sadia separação entre Igreja e Estado, um dos primados da Reforma Protestante de 500 anos.

Tem havido ruído demais em todos os canais de comunicação. Na entrevista do Jornal Nacional, ele teve oportunidade de se comprometer com a imprensa livre e deu duas informações no sentido contrário. Primeiro, que pretende usar as verbas publicitárias como forma de punir e premiar segundo o critério do que considera ser o papel da imprensa. Segundo, que escolheu como primeiro alvo a “Folha de S.Paulo”.  Nas primeiras entrevistas que Bolsonaro deu na segunda-feira a várias televisões ele disse coisas que ecoavam à campanha e que não ajudam em nada nesse momento de olhar o futuro e governar. Ele afirmou à “Band” que não se arrepende de ter dito que a ditadura deveria ter matado mais, porque foram desabafos no contexto de um Congresso cheio de anistiados. [muita coisa ruim que aconteceu ao Brasil pós Governo Militar, teria sido evitada se muitos dos hoje 'anistiados', tivessem sido abatidos.] Justificou a censura com uma explicação inusitada: as matérias censuradas teriam “a palavra-chave para executar um assalto a banco, ou até mesmo uma autoridade em cativeiro”. Sobre a morte de opositores pelo regime, ele disse que “como tinha a lei de vadiagem, tinha que ter o documento”, e o “elemento” ia assaltar um banco, e por isso era morto. Ele tem direito a ter a sua opinião positiva da ditadura militar, mas em que serve, a esta altura, o uso dessas versões fakes para fatos históricos, como se estivéssemos na distopia orwelliana de um regime de força que reescreve o passado? O Brasil tem enormes dificuldades à frente e essa agenda deveria ocupar a mente do novo governante que saiu consagrado das urnas. Após ser eleito, ele deveria ampliar ao máximo o alcance do seu discurso. Afinal, isso aumenta as chances de sucesso do seu governo.

Se o clã Bolsonaro está convencido de que apenas os canais alternativos sob seu exclusivo controle serão suficientes para se comunicar está enganado. 
[Trump vai muito bem com sua postura e Bolsonaro foi eleito com ampla maioria. Algunsd ajustes podem ser necessários, mas nada importante, apenas retoques.] Não existe essa dicotomia de velhas e novas mídias no complexo mundo da comunicação atual. O presidente Donald Trump hostiliza parte da imprensa, elege veículos que não podem entrar em entrevistas, e usa o twitter para provocações agressivas. Bolsonaro pode estar escolhendo copiar esse modelo. Mas na sexta, os semblantes de perplexidade de Sérgio Moro e Paulo Guedes diante da natural pluralidade de perguntas da imprensa mostra que talvez eles precisem de menos improviso. Governar não é cavar trincheiras. A comunicação faz parte da arte de administrar bem o país.

Miriam Leitão, jornalista - O Globo