Lucena (duas vezes), ACM (duas), Sarney (quatro) e
Renan (quatro) presidiram o Senado mais de uma vez, mas nunca foram
reeleitos na mesma legislatura; existe, porém, precedentes na Câmara
O primeiro impacto das eleições municipais na política nacional se
dará nas disputas pelas Mesas do Congresso, principalmente a da Câmara.
Do ponto de vista da composição das duas Casas, não houve grande mudança
na correlação de forças, apesar dos suplentes que deverão assumir,
porém, o desempenho dos partidos na eleição de prefeitos e vereadores,
que estão na base da reprodução e renovação dos mandatos dos deputados,
influencia — e muito — os humores dos congressistas. As articulações
para o comando do Senado e da Câmara ganharam nova dinâmica já a partir
desta semana.
A premissa a se resolver é a questão da reeleição na mesma
legislatura, que a Constituição de 1988 proíbe. Um parecer da
consultoria jurídica do Senado diz que o assunto é regimental e que,
portanto, dependeria apenas de decisão dos senadores. [desde quando consultores jurídicos do Senado possuem poder para mudar a Constituição? - interpretações criativas do texto constitucional, para satisfazer conveniências, interesses e vaidades, são tão nocivas aos princípios democráticos, quanto é o Supremo legislar, ação que ofende o principio de harmonia e independência dos poderes = cada Poder no seu quadrado.] Essa questão,
porém, será dirimida pelo Supremo Tribunal Federal (STF). As
articulações para que os ministros do Supremo lavem as mãos, como
Pilatos, seguem o percurso que todos conhecem: as relações entre
senadores e ministros, tecidas ao longo do tempo. Entretanto, não dá
para apostar que o Supremo aceitará a mudança das regras de jogo, pelo
precedente que abre.
Na hipótese de que a reeleição seja permitida, o presidente do
Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), está com quase tudo dominado. Já se
acertou com as bancadas do MDB e do PT. O seu problema é o grupo Muda
Senado, que originalmente foi um esteio de sua vitória contra o senador
Renan Calheiros (MDB-AL). Na Câmara, o deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ),
que é contra a reeleição, caso isso seja permitido, não terá adversários
capazes de derrotá-lo. Essa possibilidade lhe cairia no colo, pois quem
trabalha abertamente para a reeleição é Alcolumbre.
No período republicano, foram poucos os presidentes da Câmara que se
reelegeram na mesma legislatura: Sabino Barroso (1909-1914), Arnolfo
Rodrigues de Azevedo (1921-1926) e Ranielli Mazzini (1958-1965), que,
por duas vezes, assumiu a Presidência da República em situação de crise
institucional. A primeira, na renúncia de Jânio, em 1961; a segunda, na
deposição do presidente João Goulart, em 1964, mas acabou tendo de
entregar o cargo para o marechal Castelo Branco. No Senado, nunca houve
esse precedente. Embora Humberto Lucena (duas vezes), Antonio Carlos
Magalhães (duas), José Sarney (quatro) e Renan Calheiros (quatro) tenham
presidido a Casa mais de uma vez, nunca foram reeleitos na mesma
legislatura.
Bolsonaro
Caso não seja mesmo permitida a reeleição na mesma legislatura, no
Senado, o candidato mais forte à sucessão de Alcolumbre é o senador
Eduardo Braga (MDB-AM), líder do governo na Casa. O circo pega fogo,
porém, na Câmara, onde está instalada a disputa entre o líder do PP,
deputado Arthur Lira (AL), e o líder do MDB, deputado Baleia Rossi (SP).
O primeiro, é o candidato apoiado pelo Palácio do Planalto, com
objetivo de domar a Câmara, controlando a sua pauta. O fortalecimento do
PP nas eleições municipais, nas quais saltou de 495 para 682
prefeituras, foi resultado da estratégia de aproximação com Bolsonaro
desenvolvida pelo senador Ciro Nogueira (PI), presidente do PP, e Arthur
Lira, que, por isso mesmo, aumentou o seu cacife na disputa da Câmara
junto ao Palácio do Planalto.
Do outro lado do balcão, Baleia Rossi, que também é presidente do
MDB, candidato apoiado por Rodrigo Maia, amarga a perda de 261
prefeituras (caiu de 1.035 para 774). Entretanto, o MDB continua sendo o
partido mais forte do país em termos de prefeitos, vereadores e número
de votos. Além disso, para Baleia, o apoio do DEM foi robustecido pelo
desempenho eleitoral dessa legenda, que aumentou o número de prefeituras
de 266 para 459 (193 a mais). Seu problema é a resistência da esquerda,
o que faz de Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), mesmo com candidato avulso, um
azarão. É óbvio que essa matemática não se reflete automaticamente na
eleição da Câmara, mas mexe com os ânimos dos deputados, que se envolvem
diretamente nas eleições municipais e captam os humores do eleitorado.
É aí que a derrota dos candidatos apoiados por Bolsonaro no primeiro
turno pesa na balança. Fragiliza sua relação com os partidos do Centrão,
entre os quais o PSD de Gilberto Kassab. Se tivesse mais senso
estratégico, Bolsonaro não teria se envolvido, como se envolveu, no
primeiro turno. Nada garante que não repita o erro no segundo turno,
correndo risco de ter o apoio rejeitado pelos candidatos com quem tem
afinidade. Mesmo no caso de Crivella, no Rio, seu apoio pode ser
desastroso, pois as primeiras pesquisas mostram que o eleitorado de
esquerda e centro-esquerda já desembarcou na candidatura de Eduardo Paes
(DEM), e a eleição está praticamente perdida. Além disso, envolver-se
diretamente na disputa pelo comando da Câmara é um jogo perigoso. Por
exemplo, custou muito caro para a ex-presidente Dilma Rousseff, que foi
derrotada por Eduardo Cunha (MDB-RJ), de quem era inimiga figadal. Ele
abriu o processo de impeachment da ex-presidente da República, antes de
ser afastado do cargo e preso por causa do Petrolão.
Nas Entrelinhas - Luiz Carlos Azedo, jornalista - Correio Braziliense