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domingo, 16 de maio de 2021

A (boa) vida sexual na terceira idade



Mostra nas ruas do Reino Unido traz fotos de idosos em cenas sensuais e deflagra o debate sobre o assunto

Há poucos dias, as ruas do Reino Unido foram tomadas por centenas de imensos painéis com fotos em preto e branco expondo cinco casais nus, em situações sensuais. Eles mostram beijos ardorosos, mulheres insinuando o prazer da masturbação e homens em abraços íntimos. Não fariam muito barulho, em cidades que aos poucos retomam a rotina da pandemia controlada, não fosse a idade dos personagens, dos 65 aos 87 anos. A campanha, batizada de Vamos Falar sobre a Alegria do Sexo na Terceira Idade, foi criada pela ONG britânica Relate em parceria com a agência de publicidade Ogilvy. “Há um grande pudor a respeito do tema, e no Brasil não é diferente”, disse a VEJA o brasileiro Dedé Laurentino, diretor-geral da empresa de propaganda. “O silêncio não significa que não tenham vida sexual.”

A ruidosa ação publicitária escancara uma discussão que já deveria ter sido deflagrada há tempos. O estereótipo de uma velhice assexuada vem sendo derrubado por pesquisas recentes. Levantamento feito com idosos, conduzido pela Universidade de Michigan, nos Estados Unidos, mostrou que para 74% dos entrevistados o sexo é fundamental no relacionamento (veja no quadro abaixo). No Brasil, o pioneiro site de relacionamento Coroa Metade, cujo inventivo nome e os seguros protocolos de acesso ajudaram a atrair mais de 600 000 cadastrados, pediu, em uma pesquisa recente, que os inscritos, todos na maturidade, indicassem o grau de relevância de diversas características dos pares em busca de companhia. Para 42% dos homens, ser “bom de cama” foi classificado como “muito importante”.

A vida sexual longeva, porém, é conquista recente. Ela está associada às mudanças morais da sociedade, especialmente em relação às mulheres. Até bem pouco tempo atrás, era comum, aos primeiros sinais do envelhecimento do corpo, elas deixarem de procurar um parceiro. 
Com a menopausa, o estrógeno diminui drasticamente, atingindo o desejo e a lubrificação. 
No corpo masculino, a produção da testosterona, o hormônio sexual, começa a cair aos poucos a partir dos 40 anos, mexendo na libido e na ereção. A medicina hoje, contudo, é capaz de driblar parte dos problemas.
 

Os homens são os mais beneficiados, com uma diversidade de remédios que estimulam e ereção. Na ponta do lápis: cerca de 70 milhões de prescrições do Viagra, o mais antigo medicamento de sua categoria, já foram emitidas em todo o mundo. As mulheres podem recorrer à reposição hormonal e a cremes. São avanços notáveis. “Um homem e uma mulher de 70 anos podem ter hoje uma qualidade no relacionamento sexual semelhante ao que mantinham aos 50 anos”, diz a psiquiatra Carmita Abdo, coordenadora do Programa de Estudos em Sexualidade da USP.

A atividade sexual, não há dúvida, prolonga a vida. O hábito regular, seja na frequência que for, eleva os níveis de hormônios, como a oxitocina, que ajuda a reduzir o stress, e aumenta os níveis de imunoglobulinas, responsáveis pelo combate a infecções. Convém dar as mãos ao poeta irlandês William Butler Yeats, que, em 1938, cunhou uma bela frase: “Parece-te horrível que luxúria e ira cortejem a minha velhice; quando jovem não me flagelavam assim”.

Publicado em Saúde - VEJAedição nº 2738, de 19 de maio de 2021


terça-feira, 22 de outubro de 2019

Togada e tatuada: a juíza que tirou Marcelo Crivella do sério - VEJA

Por Giovanna Romanno

Mirela Erbisti, do Rio de Janeiro, ostenta desenhos no ombro e no braço, é ativa nas redes sociais e youtuber nas horas vagas



O prefeito Marcelo Crivella criticou sua decisão de interditar a Avenida Niemeyer e citou o fato de a senhora ser tatuada, mulher, jovem e youtuber. O que achou? Sobre esse comentário do prefeito, não tenho nada a dizer. Toda a minha fundamentação técnica sobre o caso da Niemeyer está lançada nas decisões lá proferidas (ela apontou risco de deslizamento, e a via continuava interditada até a última quarta, 16).

A senhora já foi discriminada por ter tatuagens?
Elas não me restringem no meu ambiente de trabalho. Não poderia ser diferente. A Casa da Justiça não é lugar para preconceitos e discriminações. Em 2016, o STF firmou a tese de que os editais de concursos públicos não podem estabelecer restrição a pessoas tatuadas, salvo se a imagem tiver conteúdo que viole valores constitucionais. [a famosa, sempre citada e cada vez mais adequada frase de Rui Barbosa para explicar o supremo entendimento do STF:
"a Suprema Corte é a corte que tem o direito de errar por último".  A mais alta Corte do país reconheceu que a tatuagem é uma autêntica forma de liberdade de manifestação pessoal.

A senhora posta fotos na praia, no Rock in Rio, em festas, praticando esportes. Considera-se fora do estereótipo de um magistrado? 
Estereótipo é outro nome para preconceito. Talvez o estereótipo da figura do juiz ainda seja o daquele senhor sisudo e sedentário sentado atrás de uma pilha de processos. No entanto, temos muitos juízes com atividades e interesses externos que se contrapõem a essa imagem: ciclistas, bateristas, corredores, skatistas, surfistas, ironmen, lutadores de jiu-jítsu. Os tempos são outros.

Por que criou um canal no YouTube?
 A sociedade se renova, o direito se renova, e o juiz não pode ficar vendo pela janela o mundo se transformar. O Justo Eu é um projeto meu e da juíza Tula Mello que visa a assegurar direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a Justiça. Há direitos que não são exercidos pelo simples fato de que não são conhecidos. Abordamos em mais de quarenta aulas temas relevantes como feminicídio, racismo, violência moral, adoção e impunidade.

Qual tem sido a repercussão?
A iniciativa recebeu em 2018 o Prêmio Patrícia Acioli de Direitos Humanos, um dos mais importantes da área do direito, na categoria Trabalhos dos Magistrados, e teve enorme receptividade tanto por parte do público (tem quase 22 000 inscritos) quanto da comunidade jurídica.

Por Giovanna Romanno - VEJA



Publicado  edição nº 2657 de VEJA, de 23 de outubro de 2019


sexta-feira, 1 de março de 2019

‘O réu não possui o estereótipo padrão de bandido, possui pele, olhos e cabelos claros’, diz juíza




Lissandra Reis Ceccon, da 5.ª Vara Criminal de Campinas (SP), condenou acusado de latrocínio a 30 anos de prisão, mas ressaltou suas peculiaridades físicas, em sentença de 2016 que agora circula em grupos de WhatsApp de advogados

Luiz Vassallo
01 de março de 2019 | 12h08
Sentença
‘O réu não possui estereótipo padrão de bandido, possui pele, olhos e cabelos claros’. A frase é da juíza Lissandra Reis Ceccon, da 5.ª Vara Criminal de Campinas (SP), em sentença na qual condenou um homem ‘de pele, olhos e cabelos claros’ a 30 anos de prisão pelo crime de latrocínio.

A magistrada fez a observação ao relatar, nos autos, o fato de Klayner Renan Souza Masferrer ter sido ‘firmemente reconhecido’ por uma vítima e uma testemunha de um roubo de carro seguido de tiros que mataram seu condutor. A decisão foi revelada pela repórter Sarah Brito, do portal ACidadeON e obtida pelo Estado.

O caso foi denunciado pelo Ministério Público Estadual de São Paulo ainda em 2013 e sentenciado em 2016. A anotação da juíza sobre o ‘estereótipo padrão de bandido’ começou a circular em grupos de WhatsApp de advogados.   Consta dos autos que, em fevereiro de 2013, Romário de Freitas Borges ‘estacionava o veículo na via pública, quando Klayner, de arma em punho, exigiu a entrega do veículo’.
Inconformado, ‘Romário saiu ao encalço de Klayner, abriu a porta e puxou o assaltante do carro, entrando com ele em luta corporal”.

Diz a denúncia que ‘Klayner realizou disparos que atingiram a cabeça e o abdômen de Romário, ocasionando ferimentos que foram causa de sua morte, e o abdômen de Arthur’ – que foi baleado também para ‘assegurar a impunidade do crime’.
Ao sentenciar Klayner, a juíza relata que ele ‘foi firmemente reconhecido pela vítima e testemunha’.
“A vítima sobrevivente mencionou que realizou o reconhecimento do réu entre outras fotos, entrando o delegado no Facebook do réu, voltou a reconhece-lo na delegacia e posteriormente em juízo”.

“Em juízo, diga-se o réu foi colocado entre outras pessoas e vítima e a testemunha Maristela em nenhum momento apresentaram qualquer hesitação no reconhecimento. Ao contrário, a testemunha Maristela apresenta um depoimento forte e contundente, dizendo que antes do réu sair da caminhonete a atirar contra seu pai e seu filho, olhou nos olhos dele, não se podendo duvidar que esta filha/mãe jamais o esquecerá”, escreve.
E assim ressaltou. Vale anotar que o réu não possui o estereótipo padrão de bandido, possui pele, olhos e cabelos claros, não estando sujeito a ser facilmente confundido”.

O Estado de S. Paulo