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quinta-feira, 19 de agosto de 2021

ESTA DEVERIA SER A NOTÍCIA; O RESTO É NARRATIVA - Perrcival Puggina

Solidariedade aos que têm tolhida a liberdade de opinião.

O jornalismo brasileiro vive tempos funestos. A notícia morreu; viva a narrativa!

Sempre fui leitor de jornais. Minha mãe alfabetizou-me aos quatro anos, sentado no chão, lendo manchetes do velho Correio do Povo. Minhas primeiras lembranças de informação jornalística remontam ao ano seguinte, acompanhando a demorada contagem dos votos da eleição presidencial de 1950, com a derrota do brigadeiro Eduardo Gomes, candidato da minha família, e a vitória de Getúlio Vargas. Nunca mais deixei de ler jornais. Num pluralismo sadio, havia muita diferença entre eles. Eram assinados ao gosto do freguês.

Desastrosamente, nem nos tempos em que houve censura à imprensa vi mesmice semelhante à que percebo hoje. A boa e velha notícia, produto multiforme das ações humanas, razão de ser das empresas de comunicação e ganha pão dos jornalistas através dos séculos – pasmem – virou narrativa!

Todas as matérias passam por essa reciclagem. A informação se converteu em esforço de convencimento do público.

Os filósofos sabem que essa é a fase mais primária do discurso. Dispensa a retórica, a dialética e a análise. Quando, em programas ou textos mais longos, a narrativa se encontra com a análise, surge outro gravíssimo desvio – a fake analysis. Ela é aquele primor do sofisma, proporcionado por “especialistas” valorizados exatamente pelo comprometimento com a narrativa em curso.

O fenômeno ganha dimensões pandêmicas. As exceções são raras e não estão nos grandes grupos de comunicação, que se afiguram combinados, ensaiados, orquestrados, no repertório e na execução. Mesmo perante um ato jurídico disforme, como aquele em que se estruturam os dois inquéritos sucessivos abertos no STF contra os “atos antidemocráticos”, esses veículos se submetem à regência da narrativa, seguem-lhe a batuta e silenciam contra as anomalias. O Granma, jornal cubano, faz a mesma coisa.

Ao solicitar o bloqueio de toda monetização de alguns youtubers e canais digitais, o ministro corregedor–geral da Justiça Eleitoral escreveu que de fato existe uma rede vasta, organizada e complexa para contaminar negativamente o debate político e estimular a polarização" (1). E ninguém redigiu uma linha a respeito!

Ninguém saiu da narrativa para ensinar que a polarização é elemento natural do ambiente político. Não é invenção, não é surto, não é crime, nem algo perigoso.

Temível é a política de um pólo só, como estou vendo acontecer desde quando os poucos conservadores ativos no Brasil perceberam não estar solitários e levaram à loucura o pólo até então hegemônico. O que houve no Brasil foi uma ruptura da hegemonia. 

         Essa deveria ser a notícia. O resto é narrativa.

Percival Puggina (76), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.

 

sexta-feira, 6 de agosto de 2021

Decisões equivocadas do STF e intromissões no dia a dia da política estão minando a democracia brasileira

J. R. Guzzo

STF

Faz parte do noticiário político de todos os dias a repetição de que a democracia no Brasil está sob ameaça direta e permanente. A oposição, a mídia e o “centro equilibrado”, que anuncia que quer salvar o país ficando distante dos “extremos”, estão convencidos que o culpado pelo desastre é o governo claro, quem mais poderia ser? 
 Ninguém foi capaz, até agora, de fazer uma relação objetiva e factual, uma por uma, dessas ameaças, mas e daí? O que interessa é o que se diz, não o que acontece.

Além da produção nacional, há também abundância de material estrangeiro; é obra dessas ONGs que, supostamente, monitoram a situação da democracia pelo mundo afora. O Brasil tem sido um freguês e tanto. As organizações de vigilância raramente se interessam pelo atual estado das liberdades democráticas na Venezuela, Cuba ou China, mas se escandalizam o tempo todo com o Brasil; num planeta com 200 países, vivem socando a gente entre o 190º e o 200º lugar na lista dos piores, ou coisa parecida. É uma piada, mas os nossos atuais defensores da democracia levam isso tudo terrivelmente a sério.

STF Foto: Valter Campanato/Agência Brasil

A única coisa que não se diz, naturalmente, é quem de fato ameaça a democracia no Brasil de hoje. Não é o Poder Executivo nem o governo federal: é o Supremo Tribunal Federal, que há bom tempo deu um golpe branco com o apoio maciço das elites, da maior parte da classe política e do mundo habitado pelos intelectuais e seus assemelhados. Cada vez mais, é o STF quem governa de fato o país: decide [quase sempre em decisões monocráticas]  o que é a lei, sem levar em conta o que o Congresso possa ou não dizer, aproveita-se da subserviência, da cumplicidade e do medo que hoje reinam no Poder Legislativo, e dá a si mesmo o comando de uma ditadura de fato.

Linguagem neutra, usada em anúncio do Museu da Língua Portuguesa, é uma aberração

O STF prendeu um deputado federal no exercício do mandato, anulando a sua imunidade parlamentar, e um jornalista, ambos por delitos de opinião; isso faz do Brasil o único país da América Latina a ter presos políticos, ao lado da Venezuela e de Cuba. Um dos seus ministros conduz um inquérito inteiramente ilegal para apurar “atos antidemocráticos” — sem a participação do Ministério Público, operado por policiais pessoalmente comandados a ele, sem controle de ninguém, sem prazo para acabar, sem o pleno direito de defesa para os indiciados.

Agora, usando o TSE, o Poder Supremo acaba de abrir um inquérito administrativo contra o presidente da República — e, ainda por cima, quer inclui-lo entre os investigados no processo ilegal sobre os “inimigos da democracia”, aquele que se coloca acima de todas as leis do Brasil. É mais um ato de guerra contra o Executivo, com a certeza de que todo mundo vai continuar de cabeça baixa.

O STF desfaz decisões do governo e leis aprovadas no Congresso, sob a alegação que são “inconstitucionais”. Interfere diretamente em qualquer área da administração pública. Opera como polícia. Investiga, acusa e julga, tudo ao mesmo tempo. Age como partido político — atendendo requerimentos da oposição, sempre que ela é derrotada em alguma votação, e mandando tanto o Executivo como o Legislativo obedecerem às ordens dos ministros.

O presidente do Senado não quer abrir a CPI da Covid, valendo-se do direito que lhe é conferido pela lei? O STF manda abrir, o Senado cala a boca e o governo passa a ser hostilizado todos os dias, durante seis meses, por uma operação política de extermínio — e que dá a si própria a licença de cometer qualquer tipo de delito na busca de seus objetivos.

A democracia, de fato, vai muito mal no Brasil de hoje — está no seu ponto mais baixo desde a revogação do Ato Institucional nº 5. O viés é de piora.

J. R. Guzzo, colunista - Gazeta do Povo - VOZES

quinta-feira, 23 de abril de 2020

Sim, voltaremos às ruas - Carlos Alberto Sardenberg

Coluna publicada em O Globo - Economia 23 de abril de 2020


O comércio eletrônico (E-commerce) será o grande vencedor, assinala a revista Economist, numa análise do que virá depois da pandemia. Cita números: enquanto shoppings, redes de lojas e restaurantes demitem, a Amazon contratou 100 mil pessoas em março e mais 75 mil neste mês. A um dado momento, teve que limitar o movimento para reforçar e adequar sua infraestrutura. Há movimentos semelhantes no Brasil, como a decisão de Luiza Trajano de abrir seu site para outras empresas, com o lançamento da enorme Magalu.

Faz sentido. Na verdade, o comércio já estava nesse caminho das vendas on line. Mais ainda, toda a economia mundial – com alguns países mais à frente, outros atrás – já avançava para a digitalização. A pandemia deu mais urgência a esse movimento. Na indústria, pequenas empresas têm feito coisa extraordinárias com as impressoras 3D. As operadoras de telefonia correm para aperfeiçoar os instrumentos de comunicação on line, de simples conversas entre pessoas ansiosas com o isolamento, até conferências de chefes de estado. Nós mesmos, jornalistas, estamos diretos no on line.

Dia desses, um colega comentou: quando isso tudo voltar ao normal, nunca mais teremos aquelas redações. Aliás, já estavam diminuindo exatamente pelo uso de mais tecnologia. Há estúdios de televisão que funcionam com um único operador comandando câmeras e luzes. Muita gente acha que algo parecido ocorrerá no varejo físico. Grandes lojas, como grandes redações, estariam condenadas. A loja física funcionaria como um pequeno mostruário, onde o freguês poderia ver, manusear a coisa, sentir – seja lá o que isso signifique.

Sendo verdade, isso muda completamente o quadro de empregos. Haverá menos vagas nas lojas físicas e muito, mas muito mais nos centros de operação on line e na infraestrutura de distribuição. Estas últimas vagas exigirão trabalhadores mais educados, o que, de sua vez, exigirá escolas mais eficientes. E aqui está um grande problema para o Brasil, com seu sistema de ensino muito atrasado. As lojas físicas devem ser menores e mais, digamos, amigáveis, simpáticas, um bom lugar para se dar uma olhada. Sem aglomerações, o mesmo valendo para restaurantes.

Companhias aéreas, nessa linha, serão perdedoras. As viagens de negócios serão reduzidas ao extremo, dada a eficiência das reuniões on line. De novo, essa já era uma tendência, mas enfrentava muita resistência. Muitas pessoas não confiavam nas compras on line. Muitos executivos desconfiavam das conferências eletrônicas – temiam hackers, vazamento de segredos. 
Se não sumiram, esses temores se reduziram bastante.
Então, continuamos mais em casa do que nas ruas, nos shoppings, nos escritórios?
Sei não.

Digo por mim. Assim que permitirem, volto para a redação, um ambiente animado onde transitam ideias, novidades e as melhores piadas do mundo. Muita gente chegou a conclusões parecidas: o escritório não é só aquela chatice. A caminhada nos shoppings não é aquele horror. Um cineminha, então, em boa companhia. E uma reunião de negócios em Paris não é um sacrifício. Vem daí a pressão difusa que se nota no mundo todo pelo relaxamento do confinamento. Governantes estão dizendo a seus cidadãos algo assim: calma, pessoal, daqui a pouco começamos a nos encontrar de novo por aí.

Não digo que vamos jogar no lixo toda a parafernália eletrônica, desligar os sistemas de comunicação. No nosso caso, dos jornalistas, haverá numerosas ocasiões em que será mais eficiente produzir longe das redações. Não raro, inevitável. Mas ao menos uma passadinha para saber das últimas, será um grande prazer. Enfim, mudaremos, mas a vida dos encontros sociais sobreviverá. Assim como o mundo passará por mais esta, assim como, só para provocar, o modo de produção capitalista. Na crise de 2008/09, sobraram vaticínios desse tipo: o capitalismo morreu.

Agora, dizem que não sobreviverá ao novo coronavírus. Passará. Mas como já ocorreu tantas vezes na história, teremos mais um momento de demanda pelo governo, tão expandido na crise. Mas logo se perceberá, de novo, que falhas de governo podem ser tão ou mais danosas que falhas de mercado.
A ver.

Carlos Alberto Sardenberg, jornalista 


terça-feira, 28 de agosto de 2018

O eleitor como freguês

A pobreza de ideias da campanha presidencial reflete a incapacidade dos políticos de tratar o eleitor como alguém apto a assumir responsabilidades

É espantosa a facilidade com que vários candidatos à Presidência da República, à moda das eleições de antigamente, alimentam de forma descarada a ilusão de que ao eleitor basta votar em alguém que lhe resolva os problemas particulares imediatos para que tudo melhore e reine a felicidade no País.  Diante dos imensos desafios que se apresentam à Nação, nesta que se afigura a mais importante eleição presidencial dos últimos tempos, é lamentável que alguns dos principais postulantes recorram ao populismo desbragado e rasteiro, tratando o eleitor como freguês de quitanda, que se satisfaz com a bisnaga de sempre, em vez de convidarem esse mesmo eleitor a refletir sobre seu papel, como cidadão, na reconstrução do Brasil.

Para que isso acontecesse, teria de estar em vigor no País uma outra cultura política, diferente desta em que parecem ganhar pontos os candidatos que se apresentam como “antissistema”. Em sua radicalização, que até este momento tem seduzido parcela considerável do eleitorado, à esquerda e à direita, esses candidatos procuram deslegitimar as instituições democráticas, vistas como inimigas ─ especialmente o Judiciário, o Congresso e a imprensa. Os eleitores estão sendo incitados não a apoiar soluções racionais para o País nem a aceitar sua parcela de responsabilidade nessa empreitada, e sim a dedicar seus melhores esforços para desmoralizar os adversários, repudiar o establishment e eleger um “salvador da Pátria”.

Essa radicalização torna muito mais difícil construir o necessário consenso para que, depois das eleições, seja qual for o resultado, o País avance. Mais do que isso: ao invés de deixarem claro que o futuro imediato exigirá sacrifícios de todos e participação ativa dos cidadãos na vida política, alguns dos candidatos mais bem posicionados nas pesquisas estimulam os eleitores a imaginar que os recursos do Estado são e continuarão a ser infinitos, distribuídos aqui e ali na forma de “direitos sociais” e de “estímulo ao crescimento”.
No plano imediato, que diz respeito à penúria das contas públicas, quase nenhum candidato competitivo se comprometeu nem com uma ampla reforma da Previdência nem com a manutenção do teto dos gastos. Das duas, uma: ou esses candidatos imaginam que não há necessidade nenhuma de austeridade, ou, o que é mais provável, sabem que o País está quebrado, mas, mesmo assim, decidiram deliberadamente engambelar o eleitor, mercadejando ilusões.

Já no longo prazo, não apareceu, até agora, nenhuma proposta séria para valorizar a educação, único caminho sólido para formar cidadãos conscientes de seu papel na construção de um país melhor. Como salientou o editorial A educação e as eleições, publicado no dia 24 neste espaço, os candidatos “esquecem-se de que, se o próximo governo não oferecer educação com qualidade a milhões de crianças e jovens, o Brasil não terá capital humano para adotar novas tecnologias, modernizar a economia e retomar o crescimento”. Acrescente-se que, sem educação adequada, se inviabiliza o exercício da cidadania ─ cujo déficit talvez seja hoje o que mais prejudique o País.

A pobreza de ideias da campanha presidencial reflete a incapacidade dos políticos de tratar o eleitor como alguém apto a assumir responsabilidades. Apostam na cômoda promessa de um Estado que tudo oferece ─ sem ter condições de entregar. Não se fala a sério em alterar o arcabouço constitucional que engessou o Orçamento, hoje vinculado quase totalmente a despesas com benefícios sociais e salários de servidores públicos, deixando pouquíssima margem para os investimentos necessários ao desenvolvimento.

Assim, empresários continuarão a esperar favores do governo para manter intacto o capitalismo sem riscos, e cidadãos comuns continuarão a esperar caraminguás estatais, dispensando-se do difícil encargo de pensar em sua vida financeira no longo prazo. Mas os eleitores hoje enamorados das promessas impossíveis de candidatos que os tratam como incapazes devem saber que, passada a eleição, serão chamados ao sacrifício, seja na forma de duros ajustes na economia, seja em razão de uma mais do que previsível crise, causada por outro governo irresponsável.

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