TCU rejeita, por
unanimidade, contas de Dilma de 2015 e
favorece atos de Temer
Decisão
deixou de fora indícios de irregularidades em MPs com características
semelhantes das editadas pelo peemedebista
O
Tribunal de Contas da União (TCU) aprovou por unanimidade, nesta quarta-feira, parecer pela rejeição
das contas de 2015 da ex-presidente Dilma Rousseff, conforme revelou o GLOBO. Ao mesmo tempo, o tribunal fez um arranjo na decisão que
beneficia o governo do presidente Michel Temer. Ficaram de fora do parecer
indícios de irregularidades relacionados à edição de medidas provisórias por
Dilma. Conforme a acusação inicial, essas MPs não atendiam a critérios
constitucionais de urgência e imprevisibilidade. O ministro relator do
processo, José Múcio Monteiro, deixou este ponto de fora da lista de
irregularidades. Temer editou MPs com características semelhantes, inclusive com
aval do próprio TCU.
A aprovação de um parecer pela
rejeição das contas ocorre pela segunda vez consecutiva. Há um ano, o TCU aprovou
parecer pela rejeição das contas de 2014 e iniciava, ali, um movimento concreto
pelo impeachment da petista. A novidade neste ano era a discussão sobre as MPs,
editadas em 2015 para abrir crédito extraordinário na ordem de R$ 49,6 bilhões. O plenário do TCU
seguiu o relator e decidiu excluir esses apontamentos, antes listados pelo
Ministério Público junto ao TCU, o que
favorece Temer e abre espaço para novas MPs neste sentido. Temer, por
exemplo, editou uma MP para liberar dinheiro para a realização da Olimpíada do
Rio.
A palavra
final sobre as contas, se serão aprovadas ou rejeitadas, é do Congresso
Nacional. O parecer referente a 2014 ainda não foi votado nem pela Comissão
Mista de Orçamento. Para pedir a rejeição da execução do orçamento em 2015, o
TCU listou 10 irregularidades. São 13 a menos do que a quantidade listada no
primeiro julgamento do processo, em junho, quando os ministros deram um prazo
de 30 dias – prorrogado duas vezes –
para Dilma apresentar suas explicações sobre 23 indícios de irregularidades. — Não trataremos este novo governo de
forma diferente do tratamento dado ao governo anterior. Se o comportamento for
semelhante, o tratamento desta Corte será o mesmo — disse o ministro
relator ao fim do voto pela rejeição das contas de 2015 de Dilma.
O
pedido de impeachment da petista foi baseado em documentos produzidos pelo
Ministério Público (MP)
junto ao TCU logo após a aprovação do parecer pela rejeição das contas de 2014.
No documento, o MP argumentou que as "pedaladas"
fiscais se repetiram em 2015 e que Dilma voltara a editar decretos de abertura
de créditos suplementares sem aval do Congresso.
Dilma foi afastada em definitivo
em 31 de agosto. Trinta e cinco dias depois, o TCU aprovou o parecer pela
rejeição das contas de 2015, basicamente em razão dos mesmos argumentos
usados para justificar o impeachment: "pedaladas"
fiscais no Plano Safra e edição dos decretos antes de o Congresso aprovar a
nova meta fiscal.
O parecer
pela rejeição afirma que "não houve
observância plena aos princípios constitucionais e legais que regem a
administração pública federal". E defende a rejeição das contas pelo
Congresso Nacional. O documento
corrobora os dois argumentos técnicos utilizados no processo de impeachment de
Dilma no Congresso. Segundo o TCU, houve uma "pedalada" fiscal envolvendo o Plano Safra no Banco do
Brasil, no valor de R$ 8,3 bilhões, e a edição de seis decretos que abrem
créditos suplementares sem aval do Legislativo. — Devido à relevância dos efeitos das irregularidades relacionadas à
execução dos orçamentos, não elididas pelas contrarrazões apresentadas, não
houve observância plena aos princípios constitucionais e legais que regem a
administração pública federal, às normas constitucionais, legais e
regulamentares na execução dos orçamentos da União e nas demais operações
realizadas com recursos públicos federais. As contas não estão em condições de
serem aprovadas, recomendando-se ao Congresso Nacional a sua rejeição —
disse Múcio no voto proferido em plenário.
O
documento elenca outras "pedaladas"
além do Plano Safra – a manobra consistiu em atrasar repasses de recursos aos
bancos oficiais, que se viram obrigados a arcar com programas do governo. As "pedaladas" com o BNDES, mais
especificamente os atrasos nos repasses de auxílio nas taxas de juros, chegaram
a R$ 28,2 bilhões, conforme o parecer do TCU.
A omissão de passivos da União nas estatísticas da dívida pública
é outra irregularidade listada. Os
passivos se referem a Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal, BNDES e FGTS. Múcio
decidiu não manter como irregularidades a edição de quatro MPs que criaram
gastos extraordinários de R$ 49,6
bilhões sem atender a critérios de urgência. Os créditos criados têm
características de suplementares, e não de extraordinários, o que fere a
Constituição, segundo o entendimento do Ministério Público junto ao TCU,
responsável pelo apontamento inicial dessas irregularidades no julgamento das
contas. A área técnica havia concordado com o MP.
O
presidente Michel Temer editou MPs com natureza semelhante às MPs editadas por
Dilma. O Ministério Público sustentou que se trata de coisas distintas: — O conteúdo das MPs de 2016 impede que seja
aplicado o mesmo raciocínio das MPs de 2015. No caso da MP da Olimpíada, por
exemplo, já se sabia do evento, mas os problemas surgidos não eram culpa do
presidente interino. O TCU recebeu consultas sobre a emissão das MPs num
contexto excepcional, de uma administração que tinha acabado de tomar posse
— disse o procurador-geral do Ministério Público junto ao TCU, Paulo Soares
Bugarin.
Pela
tarde, o plenário volta a analisar a prática das "pedaladas" fiscais, desta vez no processo original sobre
a manobra, que tramita desde 2014. Em abril de 2015, o TCU listou 17
responsáveis pelas "pedaladas"
– Dilma não é alvo deste processo. Agora,
após a individualização das responsabilidades, o mais provável, segundo fontes
do TCU, é que a punição se concentre no
ex-secretário do Tesouro Nacional Arno Augustin, considerado o artífice das
"pedaladas". Ele poderá ser
inabilitado para o exercício de funções públicas. A punição pode atingir ainda o ex-ministro da Fazenda Guido Mantega.
O ministro José Múcio Monteiro também relata este processo.
Fonte: O Globo