Luiz Carlos Mendonça de Barros
O aumento da arrecadação e o controle estrito do orçamento devem reduzir bastante o déficit e gerar, mais à frente, o tão esperado superávit
O primeiro ano do governo Bolsonaro se aproxima do fim com sinais de que
poderá ser mais exitoso do que muitos previam no início de seu mandato. Depois de 30 anos em que nos acostumamos a um padrão de cooperação
entre o Executivo e o Legislativo para levar adiante o plano de governo,
a forma de governar de Bolsonaro foi um choque para a grande maioria
dos analistas. A relação quase conflituosa do Planalto com o Legislativo foi lida muito
cedo como um caminho direto para crises constantes e uma paralisia das
ações do governo em um momento de crise econômica grave e da necessidade
de reformas importantes. A falta de uma base política estruturada para
aprová-las seria o caminho natural para tal situação.
Além disto, o jeito tosco e truculento do presidente ao comunicar para a
sociedade alguns de seus valores ideológicos criou um mal-estar na
elite do país e na mídia. Citaria ainda como origem deste desconforto
inicial, certo radicalismo do todo poderoso ministro Paulo Guedes na
defesa de seus planos para a economia. Dizia ele que estava tudo errado e
que seria preciso uma verdadeira revolução liberal na busca de um
estado mínimo na relação com a sociedade. Alguns símbolos importantes da
ação social do Estado brasileiro, como a Zona Franca de Manaus, teriam
que ser sacrificados ao longo do caminho de uma reforma fiscal radical.
Mas o que vimos ao longo deste ano foi uma adaptação pragmática
progressiva de vários atores a esta nova forma de governar, com o
Legislativo ampliando seu espaço de ação política para buscar não um
conflito sistêmico com o Executivo, mas um trabalho conjunto para
construção de uma agenda comum para o país. O melhor exemplo desta nova
forma de governar foi o desenho a quatro mãos da PEC da reforma da
Previdência e, posteriormente, sua aprovação, em dois turnos, nos
plenários da Câmara dos Deputados e do Senado Federal.
Neste processo despontou Rodrigo Maia como uma liderança política do
Legislativo capaz de articular junto a seus pares as ações do Executivo,
tornando funcional esta nova forma de governar do presidente Bolsonaro.
E com o tempo, e principalmente com os conflitos que viveu, Paulo
Guedes aprendeu os limites de seu poder e a necessidade da negociação
política com os representantes eleitos pelo povo para viabilizar sua
agenda liberal.
Neste choque de realidade, sua própria vontade revolucionária foi
domada, como indica sua foto em Manaus declarando enterrado o projeto de
acabar com a Zona Franca. A crise social no Chile - e a convocação de
uma Assembleia para modificar a Constituição outorgada pela ditadura
Pinochet - também veio a tempo para moderar os anseios do ministro da
Economia nas suas negociações com o Congresso, facilitando o processo de
aprovação das reformas liberais necessárias para o Brasil.
Uma fotografia interessante da avaliação do governo Bolsonaro neste
final de primeiro ano pode ser encontrada na pesquisa de opinião mensal
do Ipesp e da corretora de valores XP relativa a novembro. Apesar de ser
realizada por telefone, a sua repetição mensal nos dá um quadro
evolutivo a ser visto com confiança pelo analista. Hoje para 39% dos
entrevistados o governo Bolsonaro é ruim ou péssimo. Por outro lado, 32 %
o avaliam como ótimo ou bom e 25% como regular, somando 57% dos
entrevistados que, segundo o critério europeu de avaliação de
mandatários no poder, apoiam o governo do presidente.
A mesma pesquisa mostra que Bolsonaro poderá ter em 2022, no final de
seu mandato, 45% de ótimo e bom e 16% de regular, somando 61% de apoio.
Os que acreditam que seu governo será ruim ou péssimo chegam a 32% dos
entrevistados. Esta é uma medida, ainda que precária, do resultado das
eleições de 2022.
No segundo ano de seu governo o presidente Bolsonaro deve encontrar um
cenário bem mais favorável na economia, o que poderá facilitar o
enfrentamento da questão fiscal. Um grande número de analistas de
mercado já trabalha com uma previsão de crescimento do PIB da ordem de
2,5% em 2020. Neste cenário, o aumento da arrecadação de impostos, que
acontecerá naturalmente, e um controle estrito do orçamento como vem
sendo feito, deve reduzir bastante o déficit primário e gerar, mais à
frente, o tão esperado superávit. Por outro lado, a nova estrutura a
termo dos juros vai permitir inverter a curva de crescimento da dívida
pública federal bruta.
Se este cenário realmente ocorrer o governo terá um tempo maior para
aprovar no Congresso as PECs que devem tratar da questão das despesas
obrigatórias estabelecidas na Constituição. Estas medidas são
necessárias para permitir que ocorra, com possibilidade de sucesso, a
discussão de uma reforma tributária que realmente abra espaço para uma
mudança em nossa estrutura de impostos e a tão necessária redução da
carga tributária que onera hoje as empresas brasileiras. O cenário descrito mostra uma oportunidade que não pode ser perdida pela
sociedade brasileira depois de tantos anos de crise e sofrimentos.