Bruna Komarchesqui
13 retrocessos de Lula nos primeiros dias na Presidência
O
terceiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva na Presidência da
República completa uma semana neste domingo (8), com uma série de
retrocessos, que têm colocado em alerta mercado investidor, pagadores de
impostos e cidadãos comuns.
Já nas primeiras canetadas, Lula revogou
decretos de Jair Bolsonaro, trazendo insegurança para áreas importantes
do país, como o saneamento, que afetam diretamente a vida da população
mais pobre. O petista também cancelou privatizações, desfez estruturas
que davam bons resultados na educação, restringiu o acesso a armas –
mesmo com a diminuição no número de homicídios no Brasil nos últimos
anos – e apostou em medidas que aumentam os gastos públicos e oneram
empresas e a população.
Confira 13 medidas desastrosas do governo Lula nesta primeira semana:
1. Alteração no marco do saneamento
Medida do governo Lula: A
Agência Nacional de Águas e Saneamento (ANA) passou a ser vinculada a
dois ministérios diferentes (Meio Ambiente e Cidades) e perdeu seu papel
de editar normas de referência para serviços de água, esgoto e
resíduos, contrariando o marco legal do saneamento, sancionado em julho de 2020.
O
ministro-chefe da Casa Civil, Rui Costa, disse antes da posse que a
legislação teria travado obras na área e, por isso, passaria por
revisão. Segundo ele, todas as mudanças seriam feitas em diálogo com o
setor privado e empresas públicas estaduais, responsáveis por mais de
85% do saneamento brasileiro, o que não ocorreu.
Por que é ruim: A
nova situação tem gerado insegurança jurídica, com o temor de
retrocessos, já que o marco legal do saneamento é baseado no papel da
ANA como reguladora do setor.
O mercado de energia brasileiro teme que
estatais ineficientes sigam atuando por muito tempo, sem um dispositivo
que permita garantir que empresas e municípios operem com eficiência e
cumpram as metas de universalização na próxima década.
O marco legal do
saneamento estimulou a concorrência no mercado de coleta e tratamento de
esgoto e de fornecimento de água potável, ao vedar, por exemplo,
contratações de estatais sem licitação pelos municípios.
O dispositivo
também estabelecia metas de saneamento, com pelo menos 99% da população
tendo fornecimento de água até 2033, e 90% dos domicílios tendo acesso a
coleta e tratamento de esgoto ao fim do período.
2. Ministério da Verdade petista
A Procuradoria Nacional da União de Defesa da
Democracia, criada dentro da Advocacia Geral da União (AGU), coloca à
disposição de qualquer membro do poder público representantes judiciais
em casos que envolvam “desinformação”.
Já o Departamento de Promoção da
Liberdade de Expressão, inaugurado na Secretaria de Comunicação Social
(Secom) da Presidência da República, pretende “propor e articular
políticas públicas para promoção da liberdade de expressão, do acesso à
informação e de enfrentamento à desinformação e ao discurso de ódio na
Internet, em articulação com o Ministério da Justiça e Segurança
Pública”.
Em nota à Gazeta do Povo,
a AGU afirmou que “sob nenhuma hipótese” a Procuradoria "cerceará
opiniões, críticas ou atuará contrariamente às liberdades públicas
consagradas na Constituição Federal”. O órgão afirmou, ainda, que a
atuação se balizará em “precedentes recentes do Supremo Tribunal Federal
(STF) sobre o assunto”. Já a Secom não retornou os pedidos de
esclarecimentos feitos pela reportagem.
Por que é ruim: Ambos os dispositivos devem facilitar processos de censura no país também por parte do Executivo. Um jurista ouvido pela Gazeta do Povo
acerca da nova Procuradoria avalia que “a pretexto de se defender a
democracia, o que se terá é um órgão voltado diretamente à busca de
conformação de discursos. Ou seja, eles decidirão o que é ou não
defensável em uma democracia". Sobre o Departamento, a adoção de termos
subjetivos como “desinformação” e “discurso de ódio” em decretos
governamentais é um preocupante sinal de censura, na avaliação do
especialista. “Quando eu uso ‘discurso de ódio’, eu me furto a dizer que
leis foram violadas, qual o limite do ordenamento jurídico foi
ultrapassado", explica.
3. Uso de linguagem neutra
Medida do governo Lula:
A abolição de terminações indicativas de gênero feminino e masculino
nas palavras, que exprimiriam sexismo e discriminação, é uma das pautas
da esquerda incentivada pelo PT e já adotada por ministros do novo
governo.
Pelo menos seis deles usaram a chamada linguagem neutra,
defendida por ativistas LGBT e criticada por especialistas, durante a
cerimônia de posse. “Todos, todas e todes” foram saudações adotadas
pelos ministros da Fazenda, Fernando Haddad; da Secretaria-Geral de
Governo, Márcio Macêdo; da Cultura, Margareth Menezes; da Mulher, Cida
Gonçalves; das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, e dos
Direitos Humanos e Cidadania, Silvio Almeida. Por que é ruim: Além
de comprometer a língua portuguesa, a adoção do gênero neutro é uma
forma de impor a agenda identitária e ideológica esquerdista a toda a
população.
4. Fim da Secretaria de Alfabetização
Medida do governo Lula: Extinção da Secretaria de Alfabetização (Sealf),
criada no governo de Jair Bolsonaro. “De nada adianta manter estrutura
que não traga qualquer resultado efetivo, inclusive por estar fora da
visão sistêmica que queremos para a educação, como era a Sealf. A
alfabetização brasileira regrediu absurdamente nos últimos anos”, justificou o ministro da Educação, Camilo Santana, pelo Twitter.
Por que é ruim: A Política Nacional de Alfabetização (PNA) promovida pela extinta Sealf obteve bons resultados, reconhecidos pela OCDE.
Em 2017, após quase uma década e meia do PT na Presidência, 33% dos
estudantes do 5º ano do ensino fundamental apresentavam níveis sofríveis
de escrita e leitura no Brasil.
5. Mais ministérios
Medida do governo Lula: Lula
criou novos ministérios, indo de 23 no governo Bolsonaro para um total
de 37, o que representa um aumento de 60%. Entre as pastas criadas ou
reativadas estão Portos, Povos Originários e Igualdade Racial.
O
governo alega que não haverá aumento de custos. “A delegação que o
presidente me deu foi ampliar para 37 ministérios sem elevar o número de
cargos, e sem elevar os custos com isso. Apesar de alguns duvidarem
disso, nós conseguimos fazer. Temos a boa notícia que já está concluído,
e já está feito, sem haver criação de cargos, exceto, porque a lei
exige, nos cargos dos ministros”, declarou Rui Costa, em dezembro.
Por que é ruim: Embora
haja a preocupação com o aumento de gastos (uma vez que cada ministério
precisa de espaço físico, insumos, funcionários e que o salário de um
ministro, legalmente, é superior ao de um chefe de secretaria), a
criação de novos ministérios também impacta a eficiência da gestão. De
acordo com especialistas, o governo tende a se tonar mais burocrático com o aumento de pastas.
6. Incerteza sobre a OCDE
Medida do governo Lula: Por
meio de decreto, extinguiu a Secretaria Especial de Relacionamento
Externo na Casa Civil, que coordenava os trabalhos no Palácio do
Planalto para a entrada do Brasil na Organização para a Cooperação e
Desenvolvimento Econômico (OCDE). Com isso, paira uma incerteza sobre a
continuidade do processo, iniciado em janeiro de 2022, quando a OCDE
aceitou a candidatura do Brasil. Na Argentina, por exemplo, Alberto
Fernández nunca retirou o pedido feito pelo governo anterior, mas não
tomou providências para o ingresso do país na Organização.
No
ano passado, Celso Amorim, agora assessor especial de Lula, já havia
dito que “não há grandes benefícios em entrar na OCDE. Temos que ver
isso com muito cuidado". E a poucos dias da posse, Fernando Haddad,
afirmou que Lula revisitaria em janeiro o processo de adesão do Brasil.
A Gazeta do Povo procurou a Casa Civil para saber como fica o andamento do processo, mas não obteve retorno até o fechamento desta reportagem.
Por que é ruim: Entre
as vantagens de integrar o grupo, formado por 38 países que
compartilham boas práticas internacionais, está a atração de recursos
para o Brasil. "Muitos fundos de investimento, fundos de pensão, fundos
soberanos têm estatutos que os obrigam a investir só em países que têm
grau de investimento ou são da OCDE. É dinheiro em energia, saneamento,
transportes que não conseguimos atrair”, analisa o jornalista Daniel Rittner.
7. Negacionismo na Previdência
Medida do governo Lula: Ao
tomar posse, o novo ministro Carlos Lupi disse não acreditar no déficit
da Previdência e atacou a reforma aprovada em 2019. Para ele, não há
motivo para enrijecer regras de aposentadorias e pensões, já que não
haveria déficit entre contribuições feitas e benefícios pagos. “A
Previdência não é deficitária. Vou provar com números, dados e
informações”, disse na terça-feira.
À Gazeta do Povo,
a assessoria de Lupi afirmou que estão “dando uma revisada nos números
e, por enquanto, o ministro não vai falar sobre o assunto”.
Por que é ruim: De
acordo com dados divulgados pelo próprio governo, em 2021, a
Previdência Social registrou um déficit de R$ 262 bilhões. O número sobe
para R$ 361 bilhões no ano, se forem somados servidores públicos e
militares. A proposta de Orçamento de 2023 prevê um déficit
previdenciário na mesma faixa, de cerca de R$ 370 bilhões. Negar os
números da Previdência é perigoso para o país, uma vez que a pasta é a
principal responsável pelo saldo negativo orçamentário (a gestão
Fernando Haddad na Fazenda tem falado em buscar um déficit inferior aos
R$ 230 bilhões previstos no Orçamento de 2023).
“Previsibilidade
e segurança são importantes para o mercado financeiro. A ideia de que
se possa dar previsibilidade e uma meta que seja factível dão o caminho
vamos perseguir. Não pretendemos executar o déficit que está previsto.
Tem que ser menos do que isso”, afirmou o secretário-executivo
do Ministério da Fazenda, Gabriel Galípolo, na terça-feira (3).
8. Privatizações canceladas
Medida do governo Lula: Por
meio de um despacho publicado na segunda-feira (2), Lula determinou que
os novos ministros tomem providências para interromper os processos de
privatização de oito estatais. A lista inclui a Petrobras, os Correios e
a Empresa Brasil de Comunicação.
Por que é ruim: Logo
após a determinação, as cinco principais estatais listadas na B3 (a
bolsa de valores do Brasil) perderam juntas quase R$ 32 bilhões em valor
de mercado. As ações da Petrobras registraram queda superior a 6%. A
debandada de investidores reflete a insegurança criada pela medida do
governo federal.
9. Irresponsabilidade fiscal
Medida do governo Lula: Durante a posse, Lula qualificou o teto de gastos como uma “estupidez”, prometendo derrubar a âncora fiscal do país.
Por que é ruim: Juntamente com o cenário de incertezas criado pela revogação de leis e de privatizações, o receio fiscal tem deixado os investidores alertas
em relação ao Brasil. Principal indicador da Bolsa brasileira, o
Ibovespa chegou a uma queda próxima de 4%, nos três primeiros pregões do
ano. O dólar valorizou 3% frente ao real, indo para R$ 5,45. Já o
Contrato de Depósito Interfinanceiro (CDI), que funciona como um
termômetro do comportamento dos juros, passou de 13,41%, na virada de
ano, para 13,75%, na última quarta-feira (4). Além disso, o governo
corre o risco de ficar sem recursos para bancar promessas de campanha, como o reajuste do salário mínimo.
10. Oneração de grandes empresas
Medida do governo Lula: Entre
as primeiras medidas assinadas por Lula está a revogação de um decreto
de Bolsonaro que reduzia em 50% a cobrança de PIS e Cofins para empresas
que optam pelo regime não cumulativo. Lula também revogou um decreto de
dezembro que prorrogava incentivos concedidos pelo Programa de Apoio ao Desenvolvimento Tecnológico da Indústria de Semicondutores (Padis).
Por que é ruim: Ao
onerar grandes empresas, Lula mostra que quem vai pagar a conta pelo
aumento de gastos públicos são os pagadores de impostos. Outra
consequência disso é o custo de vida mais alto, onerando os cidadãos
brasileiros. “Lula, sem dúvidas, poderia utilizar outras alternativas
para ter recursos para investir em programas sociais, inclusive no longo
prazo. A reforma administrativa, por exemplo, que daria fim a
privilégios do alto escalão do setor público como licença-prêmio e
férias de 60 dias, pode economizar cerca de R$ 330 bilhões (considerando
União, estados e municípios) em dez anos”, analisa o colunista da Gazeta do Povo Paulo Uebel.
11. Restrição de acesso a armas
Medida do governo Lula: Por meio de decreto, Lula restringiu o acesso a armas e munições,
suspendendo o registro de novas armas de uso restrito de caçadores,
atiradores e colecionadores (CACs). O objetivo seria a necessidade de
aumentar a segurança da população.
Por que é ruim: Segundo dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2022, houve redução no número de homicídios
na última década, enquanto o total de armas registradas por civis no
Brasil cresceu no período. Além disso, em um referendo em 2005, 63% da
população se manifestou a favor do comércio de armas no país.
12. Ameaça abortista
Medida do governo Lula: A ministra das Mulheres, Aparecida Gonçalves, declarou que "o aborto é questão de saúde pública" para o novo governo, afirmando que "o que for possível avançar, nós vamos avançar".
Por que é ruim: Embora
o governo preveja dificuldades com o avanço da pauta abortista no
Congresso, Lula nomeará ainda em 2023 dois novos ministros do STF, o que
evidencia uma Corte ainda mais ativista que a atual.
Embora
os dois ministros na iminência da aposentadoria tenham sido indicados
por presidentes do PT (Rosa Weber foi indicação de Dilma Rousseff, em
2011, e Ricardo Lewandowski, de Lula, em 2006), Lewandowski, votou
contra o aborto em caso de anencefalia, em 2012. De acordo com especialistas ouvidos pela Gazeta do Povo,
a tendência é que novas nomeações ao STF tenham posicionamento menos
conservador em pautas caras à população, como aborto, ideologia de
gênero e descriminalização de drogas.
13. Confusão com a educação bilíngue
Medida do governo Lula:
O governo decretou o fim da Diretoria de Políticas de Educação Bilíngue
de Surdos (Dipebs), criada em 2019, dentro do Ministério da Educação
(MEC). A pauta era encabeçada por Michelle Bolsonaro.
Por que é ruim: Parlamentares
de oposição e entidades de defesa de pessoas surdas criticaram a
medida, recordando que, durante a campanha, Lula havia assinado termo de
compromisso concordando com a manutenção da Diretoria no MEC. Após a
repercussão negativa, o governo voltou atrás na quinta-feira (5) e disse
que a Dipebs fará parte da Secretaria de Educação Continuada,
Alfabetização de Jovens e Adultos, Diversidade e Inclusão (Secadi),
reativada por Lula.
A Gazeta do Povo
procurou o Ministério da Justiça e Segurança Pública, a Casa Civil, a
Fazenda e o MEC, mas não obteve retorno até o fechamento deste texto.