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quinta-feira, 23 de março de 2023

O - Percival Puggina

       

Agora se entende por que o governo Lula está, visivelmente, empenhado em um processo de destruição nacional. 
Após a fala do presidente é o que se depreende dos anúncios da área econômica, do retorno à política do bandido armado e do cidadão à própria sorte, da volta do MST aos negócios fundiários, do desemprego que cresce, das empresas que desistem do Brasil, da bolsa que despenca, da criminalidade que volta a se elevar, dos regabofes servidos ao setor privilegiado do mundo cultural, da partidarização das estatais.

Lula nunca leu uma vírgula de Alexandre Dumas. No entanto, cercado de amigos, sente-se como o personagem Edmond Dantès de “O Conde de Monte-Cristo” voltando afortunado do exílio para se vingar de seus malfeitores. Só não sabe que, diferentemente dele, o injustiçado personagem era inocente. E mesmo assim, a vingança o fez mais perverso e infeliz do que os homens que o acusaram em juízo.

         Ai! Que vale a vingança, pobre amigo. Se na vingança, a honra não se lava? (Castro Alves, no poema “Anjo”).

Ela está encardida. Todos os brasileiros sabem quem é Lula e metade não se importa com o que ele fez. “Essa gentevai sofrer duplamente. 
Sofreu com as consequências do déficit moral de seus governos e agora padece com o preço da vingança do malfeitor. 
Assim vai a nação, cativa na trama de uma novela que parece não ter fim nem moral alguma.

O que ele falou, ocupando o cargo que ocupa – Chefe de Estado e Chefe de Governo é o mais eloquente discurso de ódio que já ouvi. Por muito menos, um deputado federal foi preso e acabou perdendo seu cargo e seus bens; por muito menos, cidadãos comuns sofreram restrições de direitos enquanto outros estão no exílio.

Imaginem se Bolsonaro tivesse falado algo assim, o que não estariam dizendo a mídia do consórcio, os companheiros do mundo jurídico, o saltitante senador pelo Amapá e os acelerados ministros do STF.

Que tudo isso sirva para pensarmos sobre a tragédia institucional e moral do país.

Percival Puggina (78), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.


quarta-feira, 27 de julho de 2022

Bandeira é nosso símbolo maior. Pisoteá-la é uma agressão a todos - Alexandre Garcia

Os símbolos são importantes. As pessoas os têm, as famílias, as empresas, as religiões, os clubes esportivos. E o nosso símbolo maior é a bandeira, como é a constituição, como lei maior. Pisotear uma e outra são agressões a todos nós 

A juíza gaúcha que ameaçou proibir a Bandeira Nacional e a cantora brasileira, [deveria ser punida no mínimo com cassação da nacionalidade brasileira,se tornando uma apátrida.] num palco californiano, pisoteou a bandeira de seu próprio país, levaram para o topo as atenções nas redes sociais o nosso símbolo nacional. 
Ainda menino, via meu avô hastear a bandeira na fachada de casa em todos os feriados nacionais e durante a Semana da Pátria
no grupo escolar, ainda nos anos 40, hasteávamos e arriávamos a bandeira todos os sábados, cantando o Hino Nacional e o Hino à Bandeira — que tem letra de Olavo Bilac. Eu ainda não tinha 2 anos de idade, e Sílvio Caldas gravava Fibra de herói, com simples e bela letra do poeta Theófilo Barros Filho e  música do consagrado maestro Guerra Peixe.
 
Hoje, os quartéis adotaram a vibrante Fibra de herói, que tem por estribilho Bandeira do Brasil/Ninguém te manchará/Teu povo varonil/Isso não permitirá.  
Na época, o mundo estava em guerra, mas o Brasil ainda não, embora naquele ano tenha sido afundado o primeiro mercante brasileiro. Hoje há uma quase guerra por causa da eleição de outubro, e ações contra a bandeira têm causado indignação ou indiferença. Eu me senti pisoteado. 
Cheguei a tuitar que a cantora pisoteava meus avós, meus pais, meus filhos — todos simbolizados pelo auriverde pendão da esperança, do poema de Castro Alves. Porque ela simboliza todos nós, brasileiros — os vivos, os mortos e os que vão nascer. Li que a cantora fora beneficiada com R$ 1,9 milhão da Lei Rouanet em 2011, quando a tia dela era ministra da Cultura. Assim, ela não pisoteava a bandeira, mas esperneava sobre o símbolo do Brasil. [não tínhamos conhecimento da existência da tal cantora, até desconhecíamos o nome da infeliz que tão grave ofensa causou a milhões e milhões de brasileiros; desejamos que  não retorne ao Brasil e passe a residir na Coréia do Norte.]
 
A juíza gaúcha, coitada, recebeu um chega-pra-lá do TRE; a cantora alega que se arrependeu no momento seguinte, passando atestado de ciclotimia grave. Elas não têm noção sobre os valores da nacionalidade, as raízes que nos unem num país. 
Os símbolos são importantes. As pessoas os têm, as famílias, as empresas, as religiões, os clubes esportivos. 
E o nosso símbolo maior é a bandeira, como é a Constituição, como lei maior. Pisotear uma e outra são agressões a todos nós. 
São amálgamas, que nos unem, numa época em que parece haver no Ocidente um movimento que visa à separação, ao apartheid, quem sabe para nos enfraquecer. Divide et impera
Ou seja, fracciona uma nação, separando seus nacionais, para facilitar a tomada do poder e impor a vontade do conquistador.
 
A bandeira tem quatro cores. As cores dos brasileiros têm todos os tons de pele, numa mistura genética que formou uma gente bonita, graciosa, bondosa, muito especial, a ocupar este país-continente tropical. 
Quando estudávamos nossos heróis, no grupo escolar, Marcílio Dias me impressionava, porque defendeu a bandeira que os inimigos queriam arrancar do mastro de seu navio
E morreu misturando seu sangue com as cores do pavilhão sagrado, verde-e-amarelo. 
A juíza e a cantora que atacaram a bandeira servem para sacudir nossas consciências a lembrar que somos todos guarda-bandeiras e que a indiferença de muitos mostra que o nosso símbolo maior — que nos une na união que faz a força — está esquecido nas escolas e, talvez, em nossas casas.

 Alexandre Garcia, colunista - Correio Braziliense

 

quarta-feira, 10 de junho de 2020

"Será que pensar dói?" - Coluna do Alexandre Garcia

Correio Braziliense


''Pode-se xingar o presidente todos os dias, inclusive ameaçá-lo, e fazer o mesmo com os presidentes da Câmara e do Senado, mas não se permite fazer isso com juízes do Supremo''

Domingo, em São Paulo, quando um grupo de mais de 500 pessoas no Largo do Batata se dispersou, alguns foram pacificamente para casa, outros foram quebrar vidros do Bradesco e do Itaú. Na Avenida Paulista, um grupo diferente se manifestava, uns com bandeiras nacionais, outros com cartazes pedindo fechamento do Supremo e do Congresso. Em Copacabana, umas 200 pessoas de um lado e de outro, se manifestavam, falando em democracia e antifascismo. No Centro do Rio, outro grupo levava barras de ferro, coquetéis molotov e facas. [os quebradores de vidros e portadores de barras de ferro, molotov e facas são das quadrilhas da esquerda, incluindo membros de gangues também conhecidas como 'torcidas organizadas'.]

“Esquecemo-nos, muito frequentemente, não só de que ‘há sempre um fundo de bondade nas coisas más’, mas muito geralmente também, de que há um fundo de verdade nas coisas falsas” –– palavras do filósofo Herbert Spencer (in Primeiros Princípios), em brilhante tradução de Irapuan Costa Junior, ex-governador de Goiás. Parecia assim em manifestações ocorridas em cidades brasileiras, no domingo –– não se poderia dividir manifestantes em democratas e fascistas. Aliás, democracia e fascismo provavelmente não encontrariam padrões por estas bandas.

Havia pessoas defendendo a democracia com a maior boa fé, sem se dar conta de que já estamos numa democracia, à nossa moda. Pode-se xingar o presidente todos os dias, inclusive ameaçá-lo, e fazer o mesmo com os presidentes da Câmara e do Senado, mas não se permite fazer isso com juízes do Supremo. [qual o fundamento de ministros do Supremo - pessoas e não a instituição  - receberem tratamento diferenciado? afinal, integram o órgão máximo de um dos Poderes, enquanto os outros presidem a Câmara e o Senado, órgãos máximos do Poder Legislativo, e o presidente preside, na condição de Presidente da República, à Nação = atribuição do Poder Executivo e lá está por ter recebido nas eleições 2018, quase 60.000.000 de votos.]  Também havia pessoas, com a maior boa-fé, pedindo intervenção militar. Havia pessoas autointituladas antifascistas e havia pessoas se expressando como anticomunistas. Todos exercendo o direito democrático e constitucional de liberdade de opinião, de expressão e de manifestação.

O que está fora da lei é armar-se para agredir quem pensa diferente, ou se preparar para incendiar ou sair quebrando. A linguagem da violência é falada por quem carece dos argumentos da razão. E a Constituição só garante direito de reunião sem armas. Num lado e no outro das manifestações há um fundo de verdade e coisas falsas, num lado e noutro há supostas boas intenções a justificar coisas más e ilegais. Em Curitiba, rasgaram a Bandeira, talvez sonhando com o Navio Negreiro, de Castro Alves (mas que bandeira é essa? […] antes te houvessem roto na batalha, que servires a um povo de mortalha!). Mentes que bailam em ideais revolucionários, embriagadas em rótulos que, repetidos, se tornam verdade, mesmo sem ter fatos que justifiquem o carimbo. E mentes que sonham com as armas para calar e impor. Repetem processos de Lênin e Goebbels. Nada de novo. Será que pensar dói?

Alexandre Garcia, jornalista - Coluna no Correio Braziliense



segunda-feira, 3 de junho de 2019

A decadência do ensino começa pela falta de leitura

Nas aulas seguintes, depois de copiado o poema Navio Negreiro, o que facilitou memorizá-lo, os versos passaram a ser recitados por todos

Deonísio da Silva
Não era só questão de conhecer o significado das palavras. Os alunos precisavam também entender o que e de quem se falava, quando, onde e por que daquele modo.  Havia um exemplar do livro na biblioteca e não podia ser retirado. Aconteceu assim conosco, como acontecera no século anterior a João da Cruz e Souza, o maior poeta de Santa Catarina e um dos maiores do Brasil.

Ele quisera levar para casa o livro de um autor francês, escrito em francês, e lhe foi dito que ele deveria ler no recinto onde estava o volume, isto é, na biblioteca da escola, pois o livro era de todos e para todos.  De passagem ficássemos sabendo que um menino, filho de escravos alforriados, lia em francês, não apenas em português. Mas nós, que estávamos sendo preparados para o sacerdócio, deveríamos ler também em latim, em grego, em italiano .
“Homens que Fídias talhara/ Vão cantando em noite clara/ Versos que Homero gemeu”.

Foi este o trecho que o padre professor pegou ao acaso para explicar o método, que, aliás, era muito simples. Deveríamos copiar o poema de Castro Alves e decorá-lo para recitar nas próximas aulas.
“Porém, não sejam papagaios. Não basta saber de cor o poema, temos que entendê-lo e para isso primeiramente façamos um vocabulário”.
“Mas entender as palavras é só o começo. Quem foi Fídias? Por que o famoso escultor da Grécia Antiga, que viveu no Século V a.C. e fez as estátuas da deusa Atena e do deus Zeus, apareceu no Brasil, justamente durante a Guerra do Paraguai, invocado por um poeta para falar dos negros escravizados no Brasil?”;

“Outra coisa. Podem ver que o verbo talhar, que, como o outro professor poderá explicar, veio do Latim taliare, cortar, é posto no mais-que-perfeito para rimar com clara, de noite clara, constituindo-se, pois, em rima rica, uma vez que combina duas classes gramaticais diferentes, um verbo (talhara) com um adjetivo (clara)”.  Nas aulas seguintes, depois de copiado o poema Navio Negreiro, o que facilitou memorizá-lo, os versos passaram a ser recitados por todos, primeiramente de olhos postos nas próprias cópias que cada um fizera, depois recitados em uníssono e por fim declamados aluno por aluno.

Mas havia entre nós os de memória prodigiosa e destacou-se como o melhor de todos um neto de imigrante italiano que casara com uma neta de imigrante alemã. Ele não apenas recitava, como dava àqueles versos uma aura que nos deixava boquiabertos de admiração, no que era ajudado pelo timbre claro da voz, as sílabas bem escandidas e a teatralidade dos gestos.  Findo o estudo atordoante daquela obra magistral, éramos orientados a ler do mesmo autor A Cruz da Estrada, que começava com uma frase de Lutero em latim, proferida diante dos túmulos que contemplava: Invideo quia quiescunt (eu tenho inveja porque eles descansam).
A poesia ensinava a quem passava pelo sertão e visse uma cruz abandonada que soubesse estar ali enterrado um escravo: “É de um escravo humilde sepultura/ Foi-lhe a vida o velar de insônia atroz/ Deixa-o dormir no leito de verdura/ Que o Senhor dentre as selvas lhe compôs”.

A Guerra do Paraguai terminou em 1870. O Brasil tinha naquele tempo estudantes de Direito que ao redor dos vinte anos faziam poemas como aqueles que líamos. Hoje, a maioria deles, depois de formados, tropeçam numa simples petição, a ponto de ter sido necessário introduzir a disciplina de Português no curso de Direito para que os juízes possam entender o que os advogados peticionam. Pobres clientes! Nem seus advogados sabem dizer o que eles querem.

No Brasil de um século depois daquele famoso conflito vamos encontrar meninos, quase crianças, lendo e entendendo o que aquela rapaziada, saudada por Ruy Barbosa em sua célebre Oração aos Moços, escrevia e pensava.  Mas, hoje, passados 150 anos anos de Navio Negreiro, escrito por um estudante de Direito de apenas 22 anos, lido e estudado minuciosamente, além de recitado por milhares de brasileiros, senão milhões, que estão vivos e atuantes, lemos muito pouco em nossas escolas, sejam de ensino médio, sejam de curso superior, e esta é a principal razão de o Brasil desabar nas classificações internacionais que medem a qualidade de nosso ensino.
 


*Deonísio da Silva
Diretor do Instituto da Palavra & Professor
Titular Visitante da Universidade Estácio de Sá
http://portal.estacio.br/instituto-da-palavra








 

quarta-feira, 18 de maio de 2016

Enfim, temos governo

Duas boas notícias de Temer: há governo e o presidente fala a nossa língua. Mas elas não bastam..

Alvíssaras, brasileiros! Temos governo. Fazia muito tempo que administração não havia mais, pois, instalada no posto mais alto da República, com legitimidade garantida pela maioria dos votos válidos na eleição presidencial, Dilma Rousseff abusou de sua autoridade tentando forçar a própria permanência.
 
 Por determinação de 367 (71%) dos 513 deputados federais e de 55 (68%) dos 81 senadores, o vice Michel Temer tomou posse interinamente na Presidência e escolheu ministros que já começaram a tomar providências efetivas, anunciando a evidência de que, no mínimo, há uma gestão em marcha.

Com alívio, a Nação ouviu um chefe de governo que fala a língua de todos nós, o português cuidado com engenho e arte por Camões, Eça, Pessoa, Castro Alves e Machado. Pois é: nossa língua materna, em que os gerúndios têm dê, ou seja, andando, e não andano; os pronomes pessoais, mesmo nas formas coloquiais, devem ser usados corretamente (pra eu fazer, em vez de pra mim fazer); e adjetivos têm gênero, com mulheres falando obrigada, não obrigado, reservado apenas para emprego masculino. Ao discursar apresentando-se à Nação, Temer tratou as instituições e quem as ocupa em nome da cidadania com o devido respeito. E deu ao distinto público – escorchado por uma carga tributária indecente e afligido por crise moral, econômica e política como “nunca houve antes na História deste País” – esperança de que os cidadãos sejam tratados com decência. Não tendo de arcar com o ônus da desmoralização desta República desgovernada à matroca.

Dois dos ministros que assumiram autorizam a esperança de que, pelo menos, algo será feito para resgatar a fé e o respeito que o Brasil merece. Tendo presidido uma grande instituição financeira internacional e nosso Banco Central, com gestões que o fizeram gozar de boa fama nos mercados financeiros interno e externo, Henrique Meirelles, ex-tucano e várias vezes sugerido a Dilma por Lula para ocupar o lugar que assumiu, é o que se chama no turfe de pule de dez.

No Itamaraty, o senador José Serra (PSDB-SP) começou com o pé direito. Em plena turbulência causada pelo inconformismo dos derrotados no processo legal do impeachment, ele teve a serenidade e a ousadia de não deixar sem resposta a impertinente tentativa de intromissão em nossos assuntos internos feita por aliados bolivarianos no autoritarismo e no malogro econômico. Com sua tirania de 57 anos, que aprisiona adversários políticos e homossexuais, Cuba não tem autoridade para denunciar o tal “golpe jurídico-parlamentar”. Desde o golpe comunista do clã Castro, a ilha, sustentada antes pelo extinto império soviético e depois pela Venezuela, que não ampara mais ninguém, devia calar-se.
A dura nota do Itamaraty, repetindo o tom utilizado pelo ex-rei de Espanha Juan Carlos quando refutou a molecagem malcriada de Hugo Chávez – “por qué no te callas?” –, pôs em seu devido lugar o sucessor deste, Nicolás Maduro, e os aliados sul-americanos do Partido dos Trabalhadores (PT). Falta a Maduro um espelho no Palácio de Miraflores para ver a falência de sua gestão. E perceber que, tendo a Justiça a seus pés, não tem como criticar decisões do Supremo Tribunal Federal brasileiro. Pois este convalidou, com amplas maiorias e até unanimidade, o afastamento de sua comadre repetidas vezes, tornando lana caprina o uso de chicanas em sua defesa. Isso vale ainda para o boliviano Evo Morales, o equatoriano Rafael Correa e o uruguaio José Mujica que já não é presidente nem, ao que se saiba, fala por Tabaré Vázquez.

Atitude corajosa, similar à de Serra, foi tomada pelo ministro da Educação e Cultura, deputado Mendonça Filho (DEM-PE). Ele enfrentou e calou baderneiros que foram desmoralizá-lo e saíram do confronto derrotados por sua argumentação lógica, lúcida, respeitosa à democracia e que deveria ser imitada em enfrentamentos públicos do tipo.

Recriar o Ministério da Cultura (MinC) ou subordinar a secretaria à Presidência seria recuo que dificultaria ao governo adotar as providências necessárias para desmontar o deletério legado da desastrada gestão petista nesses 13 anos e quatro meses e meio. O MinC foi uma má iniciativa de José Sarney para pôr ao menos um amigo no Ministério, então só composto por indicações do titular morto, Tancredo Neves. Um de seus ministros foi o economista Celso Furtado. Mas a biografia impoluta do grande mestre foi maculada por seu injustificável apoio à censura ao filme Je vous Salue, Marie (Ave, Maria[), de Jean-Luc Godard, imposta ao então presidente pela devota mãe, dona Kiola.

À exceção de Ipojuca Pontes, que ousou extinguir a Embrafilme e por isso é hostilizado, Antonio Houaiss e Francisco Weffort, a pasta foi sempre usada para uma ação entre amigos, à nossa custa. Lula e Dilma a aparelharam para servir ao PT e à indústria fonográfica. E a usaram para tungar direitos de nossos autores e aumentar os lucros das multinacionais da cultura e de artistas nativos que se beneficiam da “bolsa show”, sob as bênçãos de Xangô e do Senhor do Bonfim. Enquanto as traças devoram a Biblioteca Nacional e os museus sob sua égide se tornam inaptos para visitas públicas.

A Cultura é um detalhe simbólico, mas também relevante, tendo em vista as dificuldades com imagem do presidente em exercício. Urge ao governo-tampão evitar que Dilma e seus asseclas completem o desmanche do País, sob os aplausos dos decadentes aliados subcontinentais. Para tanto basta que os senadores contra seu afastamento cheguem a 25 (um terço de 81), três a mais do que os obtidos na votação da abertura do processo.

Essa tarefa não é impossível, mas fácil também não é. Dois passos são exigidos: demitir não 4 mil, mas todos os comissionados que for possível, para que não sabotem a gestão; e fazer de tudo para pôr de novo as contas públicas nos eixos. Esta luta terá de ser travada com lisura e na guerra pela paz.
 

Fonte: José Nêumanne - O Estadão