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terça-feira, 29 de agosto de 2023

O imposto da inveja - Rodrigo Constantino

Gazeta do Povo 

Um blog de um liberal sem medo de polêmica ou da patrulha da esquerda “politicamente correta”.

O presidente Lula escreveu: "Vamos colocar o rico no imposto de renda e o pobre no orçamento. É isso que fizemos ontem, ao sancionar a lei de valorização do salário mínimo e propor a Medida Provisória para taxar os super-ricos. Proporcionalmente, o mais pobre paga mais no imposto de renda que o dono do banco. Vamos mudar isso".

Gregorio Duvivier comemorou: "Pra isso que eu fiz o L". "Muitas vezes eu vejo na imprensa isso ser tratado como ação Robin Hood, revanche, e não é nada disso. O que estamos levando à consideração do Congresso, com muita consideração e respeito, é aproximar nosso sistema tributário do que tem de mais avançado no mundo", afirmou o ministro Fernando Haddad.

O governo também defende o PL que trata da tributação anual de rendimentos de capital de residentes no Brasil aplicados no exterior, o que inclui offshores e as chamadas trusts. As alíquotas são progressivas e variam de 0% a 22,5%. O texto é similar ao que estava na MP que ampliou a isenção na tabela do IR, mas agora foi transformado em projeto de lei, em razão de resistência no Congresso.

Tudo isso é música para a esquerda populista. O socialismo é a idealização da inveja. Com base na premissa claramente falsa de que economia é um jogo de soma zero, onde João é rico porque tirou algo de José, o governo surge em cena como um instrumento da "justiça social", para combater as "desigualdades". Não importa que o empreendedor que fica rico tenha criado riqueza e empregos...

Se "valorizar o salário mínimo" fosse uma política desejável, então alguém precisa explicar porque não colocar logo em R$ 5 mil o piso salarial
Todos entendem que isso traria desemprego e informalidade, pois o patrão não paga o salário que quer para explorar funcionários, e sim aquele de mercado, pela lei da oferta e demanda, dependente da produtividade do trabalho. 
Há quem aceite trabalhar por menos do que o mínimo, por ser menos experiente e/ou mais jovem, e este ficará sem emprego. O inferno está cheio de boas intenções...
 
Quanto aos "super-ricos", fica claro que isso é demagogia pura. O que chamam de ricos num país como o Brasil é a classe média americana
E ao taxar fundos de investimentos, isso cria desincentivo para o acúmulo de capital, que é fundamental para o crescimento sustentável da economia. Ao taxar offshores e trusts, isso afugenta cidadãos com poupança, que podem dar saída fiscal e se tornar cidadãos em outros países.

Em suma, as medidas atendem ao discurso sensacionalista da esquerda, mas não entregam resultados positivos. E, no fundo, o governo petista só pensa em arrecadar mais e mais, pois não entra sequer na equação dessa turma a possibilidade de reduzir gastos de um estado hipertrofiado e ineficiente. É preciso taxar mais e mais! E vai ter humorista bobinho - e rico - comemorando, pois a mistura da ignorância com a inveja é algo explosivo...

Rodrigo Constantino, colunista - Gazeta do Povo 

 

 

segunda-feira, 5 de junho de 2023

Cuba cai no esquecimento - Fernando García, La Vanguardia

        Cuba não produz açúcar suficiente para abastecer a cotas esquálidas do cartão ou cesta de racionamento.  
A ilha terá que importar grandes quantidades do produto que durante séculos a engrandeceram e agora, com uma colheita próxima à da guerra de independência, vergonha.

O All-Star Game do beisebol cubano, expoente máximo da paixão dos ilhéus pelo desporto nacional, tornou-se suspensa na época do que deveria ser o 60º aniversário desta emulação das ligas principais americanas com o nata dos jogadores de beisebol do país. O problema não é só isso faltam estrelas do beisebol na ilha porque muitos têm emigrou, é que faltam bolas, faltam tacos e em momentos chave faltaram-lhes uniformes.

Na famosa sorveteria Coppelia em Havana, aquela das filas sem fim em qualquer dia do ano, se caminhe na calmaria. A mídia local crítica que, após um fechamento temporário, mas histórico, em janeiro por falta de sorvete, agora a qualidade é tão baixo que o estabelecimento teve que vender sua alma e começar a vender kits de refrigerantes, sucos, biscoitos e chocolates; tudo para cobrir a impotência na oferta de "sabores e especialidades" em que Fidel Castro concebeu como “a melhor sorveteria do mundo”.

Quando o açúcar, o beisebol e o sorvete faltam em Cuba, por não falar sobre música e balé após inúmeras fugas de artistas para o norte, é claro que lá “a diversão acabou” e não no significado que o compositor Carlos Puebla deu à frase em sua famosa canção de boas-vindas à revolução: “E nisso veio Fidel”.

Não é à toa que Cuba vive uma crise migratória sem precedentes que nos lembra as de 1994. No ano passado, o número de cubanos que entraram nos Estados Unidos por via terrestre pulverizaram o tristes recordes anteriores ao se aproximar de 300 mil. E outros 6.182 fugitivos deixaram a ilha por mar no ano fiscal de 2022.

Outros 30 mil receberam autorização de viagem pelo procedimento de liberdade condicional. Mas na fila para conseguir isso visto especial existem mais de 380 mil pedidos.

“A crise que o meu país atravessa é pior do que a dos anos noventa”, causada pela queda da União Soviética e sua grande ajuda. Esta é a opinião do professor emérito de Economia na Universidade de Pittsburgh e um dos melhores conhecedores das finanças de Cuba, Carmelo Mesa-Lago. "A situação – acrescenta em uma conversa telefônica– é o pior que mora lá desde a Grande Depressão" de 1929. [caso o apedeuta petista não seja impedido, seguindo o rito estabelecido pelas leis vigentes e com a maior brevidade possível, Cuba se somará a Albânia em mais um exemplo de fracasso a ser imposto ao Brasil, pela notória INcompetência do atual presidente.]

Trecho de um artigo atualíssimo e revelador - Clique aqui e leia na íntegra.


quinta-feira, 2 de dezembro de 2021

Um dos piores sintomas do antibolsonarismo psicótico: a ignorância arrogante - Gazeta do Povo

Paulo Polzonoff Jr.

Em mais um episódio dessa tragicomédia chamada “antibolsonarismo psicótico”, o Correio Braziliense anunciou com estrondo que o presidente foi a um concerto da FAB cujo repertório incluía uma peça de Richard Wagner – o compositor preferido de Hitler. A jornalista que escreveu essa pérola não hesitou em sugerir que Bolsonaro teria uma quedinha pelas ideias do Terceiro Reich só porque estava escutando Wagner.

Não quero ser cínico e, aqui, partir do pressuposto de que a jornalista e seu editor (supondo que a matéria tenha passado por uma cadeia hierárquica dentro jornal) tenham produzido e divulgado essa notícia com o intuito apenas de chamar a atenção para o veículo e, assim, gerar engajamento e publicidade. Tampouco apostaria na hipótese da maldade pura e simples.

O antibolsonarismo psicótico é, em grande medida, fruto de uma ignorância que se traveste de esperteza e, dependendo das conjunções usadas, se fantasia até de inteligência porque precisa desfilar na passarela da virtude. Isto é, nas redes sociais. Por trás dessas vestes, contudo, o que há é apenas ignorância, uma ignorância tão profunda que não se enxerga e, em não se enxergando, não sente que precisa ser superada.

Wagner era um pulha. Um ser humano abjeto. Repulsivo mesmo. Os problemas de caráter de Wagner, a julgar pelo que nos dizem os biógrafos, eram tantos e tamanhos que o antissemitismo, pecado dos pecados no mundo pós-Holocausto, era apenas mais um. No entanto, e causando uma confusão profunda em quem tem fé, Wagner era dotado de um talento musical extraordinário. Quem não se perguntar como pôde Deus dotar um homem tão vil de um talento tão nobre não é humano.

Se, pois, Wagner entrou para a história e é simbolicamente imortal, não foi por causa de seu antissemitismo. Foi por causa de sua música. Uma música intensa, sedimentada na ideia de heroísmo e que bebeu muito da mitologia germânica e escandinava. Daí, aliás, o interesse de Hitler pelo compositor. Hitler, uma mente igualmente degenerada, provavelmente era incapaz de ligar dó com si. O que o fascinava em Wagner era o apelo psicopolítico da megalomania. Hitler usou Wagner para seduzir as massas e fazer com que elas acreditassem no destino grandioso do Reich. Não que a música de Wagner tenha sido composta com essa intenção, claro.

De acordo com Alex Ross, crítico da New Yorker e autor de “Wagnerism: Art and Politics in the Shadow of Music” (Wagnerismo: arte e política à sombra da música), antes de virar trilha sonora do nazismo Wagner foi extremamente influente entre os representantes daquela que, ironia das ironias, Hitler chamava de “arte degenerada”. Cézanne, Buñuel e Thomas Mann (cujos livros queimavam nas fogueiras nazistas) eram fascinados pela obra de Wagner. Artistas contemporâneos como o escritor Philip K. Dick e o diretor Francis Ford Coppola (quem não se emociona com os helicópteros norte-americanos atacando um vilarejo no Vietnã ao som de “A Cavalgada das Valquírias”?) também foram influenciados pelo poder do wagnerismo.

A genialidade de Wagner é tamanha que muitos judeus, não sem algum tipo de conflito interno, optam por ignorar o antissemitismo do compositor, atendo-se ao que ele tem de divino. Isto é, sua música. O ator inglês Stephen Fry, ele próprio um gênio, em minha humilde opinião, tem um documentário em que fala sobre sua conturbada relação com Wagner. Fry é judeu e, ao longo de “Wagner & Me”, não esconde seu incômodo com o antissemitismo de Wagner. Mas o que fazer se a música é irresistivelmente boa?

O mais deprimente dessa história é que, por uma ignorância arrogante, ao associar Bolsonaro ao nazismo por meio de Richard Wagner a repórter acaba por usar do mesmo expediente que Hitler usou para desumanizar e, posteriormente, tentar exterminar os judeus. Ela cria um “inimigo nacional”o bolsonarismo – que ameaça os “valores puros brasileiros” e que, por isso, precisa de alguma forma ser extirpado. Mas sabe o que é pior? O pior é fazer isso sabendo que, por mais absurda que seja a ideia, ela encontrará aplausos.

Paulo Polzonoff Jr, colunista - Gazeta do Povo - VOZES


sábado, 23 de outubro de 2021

Não vou mais criticar o STF - Rodrigo Constantino

Revista Oeste

Vivemos num estado policialesco, numa “ditadura da toga”. Não há mais império das leis, até porque as leis podem ser inventadas do nada  

O recado foi dado. E compreendido. Há crime de opinião em nosso país. Grupos em redes sociais podem virar “milícias virtuais” perigosas se algum ministro supremo assim entender. Até mesmo um jornalista pode ser preso se subir o tom nas críticas contra o arbítrio do STF
Caso ele tenha ido para um país mais livre, com receio desse tipo de perseguição, isso poderá ser encarado como fuga da Justiça, e um pedido para extraditar o “fugitivo” será acatado pela Corte Suprema, apesar de a PGR discordar.

Traduzindo de forma direta, vivemos num estado policialesco, numa “ditadura da toga”. Não há mais Estado Democrático de Direito, império das leis, até porque as leis podem ser inventadas do nada. Não há, afinal, crime de opinião em nosso sistema, tampouco o de espalhar fake news — sabe-se lá por quem definidas essas mentiras. Logo, a lei hoje é aquilo que Alexandre determina. E o tucano não gosta muito de “bolsonaristas”. Conta com a cumplicidade da imprensa para persegui-los em paz, inclusive jornalistas, que serão chamados de “blogueiros” para não despertar a necessidade de uma reação das entidades de classe.

A corda não foi esticada; ela já arrebentou. Aquela conversa entre Bolsonaro e o ministro não foi um apaziguamento, mas uma rendição, pelo visto. E isso depois de milhões tomarem as ruas justamente para defender a liberdade, a Constituição. Foi um rugido forte, de um leão acuado. Mas foi só barulho. A montanha pariu um rato. O lado de lá continuou avançando, e subindo o sarrafo. 
Mudou de patamar, escolheu alvos mais relevantes, demonstrou todo o seu poder ilimitado. Ninguém mais está seguro, ao menos não quem enxerga graves defeitos na postura do atual STF.

Vou escrever sobre música, sobre culinária, sobre alienígenas

E o pior de tudo é ver a turma “liberal” aplaudindo, por não gostar do jornalista alvo do pedido bizarro de prisão. Essa gente não tem princípios, e não se dá conta de que a arma sem freios que hoje mira em seus adversários amanhã poderá se voltar contra qualquer um. O ambiente é tóxico, e a tática está produzindo o efeito desejado: aqueles independentes começam a praticar a autocensura, com medo das consequências de uma crítica mais dura.

Falo por mim. Muitos leitores elogiam minha coragem, mas não tenho vocação para mártir. Está claro que o arbítrio supremo não tem limites, e que ninguém tem como parar o homem. É por isso que decidi não mais criticar o STF. 
Está claro que se trata de um tribunal de exceção, de uma corte política, não constitucional. Impossibilitado de saber a priori o que configura crime ou não, já que não tenho como me calcar na Constituição ou no Código Penal, prefiro então simplesmente encerrar qualquer análise sobre o Supremo. Vou escrever sobre música, sobre culinária, sobre alienígenas.
 
Resolvo também só chamar os ministros de vossas excelências, ou mesmo deuses, se eles assim preferirem
Reconheço em Alexandre uma figura acima do bem e do mal, das leis, da Constituição. Admito sua vitória absoluta, assim como seu poder absoluto.  
E é por essa razão que comunico ao todo-poderoso que, a partir de hoje, ele tem total controle sobre a minha vida. 
Se Alexandre decidir que devo me tornar um vegano, adeus carne. 
Se Alexandre resolver que é para eu ser abstêmio, adeus vinho. 
Posso até ver o copo meio cheio: ao menos vou perder uns quilos…
 
Estou numa peregrinação espiritual que vem me aproximando mais de Deus, mas absorvi o alerta de Jesus Cristo, e saberei separar as coisas: a César o que é de César. E nosso César é Alexandre, o Grande. 
No Juízo Final terei um julgamento que, estou certo, será mais justo. 
Mas, aqui na Terra, nesta vida, abandonei as esperanças e entreguei minha liberdade ao homem mais poderoso do Brasil, quiçá do planeta. Espero apenas que Alexandre não ache ruim meu hobby de tocar bateria, pois isso seria triste de perder. Mas estou disposto a só tocar as músicas que agradam ao ministro.
 
De tempos em tempos lanço mão da ironia como artifício retórico, mas se Alexandre julgar isso inadequado, adeus ironia. A partir de hoje, prometo andar na linha. Qual? Difícil dizer, pois não tenho bola de cristal para inferir o que Alexandre pensa. Mas farei meu melhor para tentar antecipar seus passos e atender a suas expectativas. 
Reconhecer virtudes neste governo, por exemplo, está fora de cogitação. Já penso até mesmo em me filiar ao PSDB, só por precaução. Imagino que seja um ato merecedor de muitos pontos com o ministro. Se for necessário dizer uma ou duas palavras de elogio ao governador oportunista de São Paulo, tomo um Engov e digo. Alexandre é quem manda.

Tenho família para sustentar, filhos para criar e, como já disse, não tenho a menor vontade de ser mártir. Alexandre foi bem claro em transmitir seu recado. Captado, amado mestre. Diga-me o que pensar sobre cada assunto polêmico, e este será meu pensamento. Ou ao menos a minha expressão do pensamento em público. Manda quem pode; obedece quem tem juízo. Não vou mais criticar o STF ditatorial a partir de hoje.

Leia também “A constituição do atraso” 

Rodrigo Constantino, colunista - Revista Oeste

 

sábado, 23 de maio de 2020

Atropelamento com fratura exposta - IstoÉ

Sou obrigado a concordar com os políticos que dão apoio a Jair Bolsonaro. O vídeo da famigerada reunião ministerial de 22 de abril, liberado nesta sexta-feira pelo STF, não foi uma bala de prata contra o presidente. Foi mais um atropelamento com fratura exposta, que pode, como dizem os médicos, “evoluir para o óbito”.
[Por favor, tenham presente que além de não provar nada contra o presidente, a divulgação do vídeo ainda traz no despacho do decano do STF - que, indiscutivelmente, não é bolsonarista ou mesmo neutro -uma declaração de que o presidente Bolsonaro é fiel cumpridor = servidor da Constituição.] 

Para ser bala de prata, o vídeo teria de flagrar Bolsonaro, concretamente e para além de qualquer dúvida, procurando desviar a PF da sua missão institucional. Só isso obrigaria o procurador geral da República Augusto Aras a denunciar o presidente. Como se sabe, Aras está doidinho para arquivar o inquérito. Do ponto de vista jurídico, mostrar que Bolsonaro fez pressão para trocar o superintendente da PF no Rio de Janeiro não leva a lugar nenhum. É algo que está dentro de suas prerrogativas.

Foi pura inépcia do presidente se enredar numa história capenga a respeito desse assunto. Ele disse que, ao reclamar que não conseguia fazer trocas “na segurança no Rio”, se referia à equipe que cuida da sua proteção pessoal, não à PF. Sua trinca de ministros militares — Augusto Heleno, Braga Netto e Luiz Eduardo Ramos — repetiu a história em depoimentos à Justiça. Mas a versão foi rapidamente desmentida. Em março, a equipe de segurança do presidente no Rio de Janeiro teve trocas importantes. As mudanças não foram para punir, mas para premiar o comando com promoções. Em outras palavras, aquele não era um foco de dificuldades ou insatisfação. A lorota desnecessária pode cobrar um preço mais adiante.

No vídeo, Bolsonaro também exige receber relatórios de inteligência mais detalhados. Reclama de todo o aparato de informações, incluindo Abin, Gabinete de Segurança Institucional, PF. Isso tampouco é crime. A PF de fato tem o dever de abastecer a Presidência com informações.
Repita-se: o que importa é provar que a mudança de superintendente no Rio era um modo de transformar a PF numa extensão dos interesses políticos ou pessoais de Bolsonaro.

Essa prova não aparece no vídeo de maneira cabal. Aliás, o vídeo até enfraquece um dos indícios de que Bolsonaro queria uma PF para chamar de sua. Antes que fosse liberado, especulava-se que a frase “não vou esperar &@%*$! minha família toda… porque eu não posso trocar alguém da segurança na ponta da linha” dizia respeito aos filhos Flávio e Carlos Bolsonaro, e à possibilidade de que sejam atingidos por investigações sobre rachadinhas e fake news criminosas. Mas os parentes mencionados logo antes dessa exclamação são os irmãos do presidente. Bolsonaro reclama que eles são perseguidos pela imprensa.

Curiosamente, uma chance para que Augusto Aras não engavete o inquérito surgiu no começo da noite, Bolsonaro resolveu falar com a imprensa. Queria cantar vitória, bradando que o vídeo é “um traque”, “um furo n’água”. Acabou dando um tiro pé. Ele mencionou uma trama que teria sido desbaratada por amigos policiais. Disse que agentes do país todo lhe passam informações de modo informal, explicando que essa é a misteriosa “segurança particular” que mencionada no vídeo — e que seria mais eficiente que a dos órgãos de governo.
Na trama, a casa de seu filho Carlos seria alvo de uma busca judicial. Provas falsas seriam plantadas no local e o presidente se veria refém de chantagens. Bolsonaro revelou que depois desse episódio chamou Sérgio Moro às falas. Pediu que ele o protegesse. “Ele tem o dever de me defender”, disse. [em qualquer país do mundo, do mais democrata a uma ditadura, o presidente da República tomando conhecimento do risco iminente de uma ilegalidade, não comparece à delegacia do bairro para BO e sim procura um dos seus ministros, preferencialmente, com o da Justiça ou,  no mínimo, o chefe da sua segurança pessoal.] 
Isso sim é uma amostra contundente do desejo de instrumentalizar a PF de forma indevida. O dever de proteger o presidente é do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), comandado pelo general Augusto Heleno. Não é do ministro da Justiça, seja ele Moro ou qualquer outro. Trata-se de uma novidade que pode dar sobrevida à investigação, juntamente com a história esquisita da segurança particular. [receber informações de amigos, obtidas e passadas  de forma não ilegal, não constitui crime.]
Quer dizer então que o vídeo da reunião ministerial é uma bobagem? Um traque? Nada disso. Se as consequências jurídicas imediatas podem não ser as que se imaginava, as consequências políticas não são nada boas.

Primeiro, um parêntese. Quando se assiste o vídeo, fica claro que Bolsonaro estava fervendo de raiva. Queria exigir dos ministros mais combatividade, mais ação política. Moro era o principal alvo de irritação. Sem dúvida, é no ex-juiz que Bolsonaro está pensando quando cobra que auxiliares preocupados com a própria imagem “tirem a cabeça da toca” para defendê-lo na imprensa. “Tem que fazer a sua parte!”, diz o presidente. Também é para Moro que ele olha quando avisa que vai intervir em qualquer ministério se achar necessário. Ele se volta para o ministro da Justiça no exato momento em que pronuncia a palavra “intervir”. [está na competência do presidente da República intervir em qualquer ministério - são órgãos que auxiliam o presidente, portanto, se espera que trabalhem afinados com as determinações  presidenciais.].

Sobre o restante do vídeo, a baixaria na fala do presidente e de seus ministros é deplorável. Pior ainda, não há lucidez nenhuma por baixo do jorro de palavrões. Numa reunião de quase duas horas, pouco se fala de governar, e muito tempo se gasta com delírios e rancores. Uma inacreditável confusão entre as restrições à locomoção adotadas por todas as democracias do mundo para combater a pandemia do coronavírus e um desejo diabólico de escravizar as pessoas atravessa a conversa. Daí derivam considerações sobre a necessidade de armar os cidadãos para evitar o surgimento de ditaduras (Bolsonaro), mandar para a cadeia os “bandidos do STF” (Abraham Weintraub) e processar e prender governadores e prefeitos que recomendam o isolamento social (Damares Alves).

O núcleo duro do bolsonarismo gosta de ouvir essa música. Mas ela deve causar um enorme desalento naqueles cidadãos que votaram em Bolsonaro, mas não o apoiam sem reservas. O vídeo deve acirrar ainda mais os ânimos no Brasil. A esperança de que o governo possa pôr o país nos trilhos vai ser ainda mais corroída. Acredito que a investigação sobre a tentativa do presidente de interferir politicamente na PF será arquivada em breve por Augusto Aras. Mas não há tranquilidade política no horizonte. E o governo está no chão, atropelado por suas próprias palavras.

Carlos Graieb - Revista IstoÉ