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sexta-feira, 19 de agosto de 2022

O racha litigioso (e milionário) entre os advogados das vítimas de Mariana - O Globo

O escritório de advocacia internacional Pogust Goodhead (ex-PGMBM) — que defende as vítimas de Mariana (MG) em um ação coletiva histórica contra a mineradora BHP na Justiça britânica está vivendo um racha litigioso entre alguns de seus principais sócios. 

Em ação e em arbitragem nos EUA, o escritório está processando uma prestadora de serviço brasileira que é controlada por sócios do próprio Pogust Goodhead. No Brasil, o fundador do escritório londrino entrou com pedido de antecipação de provas contra seus sócios brasileiros nessa mesma empresa, alegando ter identificado irregularidades no balanço da companhia. Procuradas pela coluna, as duas partes sustentam que as diferenças estão sendo resolvidas de maneira amigável, mas as ações são recentes e ainda estão em curso.  

 O racha litigioso (e milionário) entre os advogados das vítimas de Mariana

Tragédia de Mariana (MG) Arquivo/Agência O Globo

No fim de julho, o Pogust Goodhead entrou com processo em tribunal do Condado de Miami-Dade, na Flórida, contra a MG—Gestões e Serviços Administrativos. Sob o nome fantasia de Somos, a companhia baseada em Belo Horizonte foi criada em 2019 para oferecer serviços de apoio, call center, tradução e “back office” para o Pogust Goodhead em alguns dos seus casos.

Tom Goodhead, um dos fundadores do escritório londrino, foi o maior acionista inicial da Somos, mas o dia-a-dia era tocado por dois sócios brasileiros, os advogados Tomás Mousinho e Pedro Henrique Martins. Os dois se tornariam sócios também do escritório inglês, então chamado PGMBM. Ambos atuaram diretamente na ação de Mariana.

US$ 4,2 milhões retidos
Segundo a petição, em março deste ano, a gestora Jive investiu cerca de US$ 11 milhões no escritório por meio de um fundo de litígio — veículo que financia batalhas judiciais na expectativa de ficar com uma parcela dos ganhos se a causa for vitoriosa no futuro. Só que o dinheiro não foi enviado diretamente ao Pogust Goodhead, passando primeiro pela Somos. De acordo com o processo, cerca de US$ 4,2 milhões foram retidos pela Somos.“No entanto, após receber esses recursos significativos, a Somos e seus administradores brasileiros, incluindo Mousinho e Martins, assumiram uma postura preocupante, fazendo uso indevido dos fundos para despesas alheias à sua finalidade e impedindo Goodhead, cofundador da Somos e um de seus acionistas, de obter informações sobre sua própria empresa”, argumenta o processo.

O Pogust Goodhead diz que moveu, no fim de julho, uma arbitragem na Câmara Internacional de Comércio. Na Justiça, o escritório pediu que a Somos fosse impedida de usar os US$ 4,2 milhões até que a arbitragem tenha uma conclusão. O juíz Jose Rodriguez concedeu o pedido de liminar do Pogust Goodhead.

Hamlet em Belo Horizonte
Já na 32ª Vara Cível da Comarca de Belo Horizonte, Tom Goodhead processa Mousinho, Martins e a Somos. O britânico afirma que, embora tenha tido prejuízo de R$ 1,6 milhão em 2021, a Somos fez uma distribuição de lucros de R$ 4,9 milhões apenas três meses depois.“Isso, por si só, já era bastante suspeito, visto que não houve, no melhor conhecimento do autor Tom Goodhead, nenhum evento extraordinário que justificasse tal lucro repentino após um prejuízo substancial”, diz o britânico em sua petição.

Em abril, a Somos reportaria ainda R$ 25,4 milhões em lucros.

“Parafraseando Shakespeare, parece evidente que há algo podre no reino da Dinamarca. Os réus Pedro Martins e Tomás Mousinho utilizaram um dinheiro que ninguém sabe de onde surgiu (se é que esse dinheiro efetivamente existe) e ainda utilizaram esses recursos para integralizar capital social da Somos diluindo a participação do autor, o que constitui indício gravíssimo de simulação e, possivelmente, até mesmo de ilícitos criminais”, acusam os advogados de Goodhead.

(...)

Sobre o processo no Brasil, disse:“Este tinha como objeto a requisição de documentos apenas. Todos esses documentos também já foram disponibilizados. A alegação de que a Somos estava tomando decisões de posse de uma procuração dada pelo Tom Goodhead e outras alegações feitas na peça infelizmente foram equívocos cometidos pelos advogados deste, que o levaram a erro, mas isso foi esclarecido na segunda-feira na segunda petição de resposta da Somos e reconhecido pelos próprios advogados dele nos esclarecimentos entre as partes. Nenhum documento ou dispositivo foi utilizado sem sua autorização. Felizmente, o mal entendido entre os sócios foi solucionado sem repercussões e de forma amigável.”

(...)

O Pogust Goodhead acrescentou: “Após o sucesso recente dos acordos extrajudiciais na Inglaterra e a decisão que garante que as vítimas do pior desastre ambiental da história do Brasil sejam agora ouvidas nos tribunais ingleses, podemos confirmar que todos os nossos casos no Brasil seguirão como de costume. Estamos mais comprometidos do que nunca em buscar justiça para as vítimas de desastres ambientais e outros erros judiciais sofridos devido à má-conduta corporativa.”

(...)

(Atualização: a matéria foi atualizada na manhã desta sexta-feira para inclusão de posicionamento do Pogust Goodhead, recebido após a publicação do texto devido à diferença de fuso horário.)


Rennan Setti - Capital - O Globo

[COMENTÁRIO: sempre consideramos que por trás das indenizações das tragédias tipo Mariana, Brumadinho, existe uma indústria milionária de indenizações - em várias postagens neste Blog aventamos tal possibilidade.
O negócio é simples:  ocorre uma tragédia - sempre lamentável, mas infelizmente a possibilidade de tais desastres existe - e logo começam as indenizações.Sabem como é: tragédias naturais sempre envolvem o meio ambiente e no mundo atual o meio ambiente é tudo e mais alguma coisa - especialmente com o envolvimento de ONGs, muitas a serviço do capital estrangeiro (que se vendem tais como Iscariotes que são). Se envolve a Vale então já se viu: indenizações são pagas por mortos cujos cadáveres foram localizados e por mortes não comprovadas - sem a localização dos corpos e muitas vezes sem comprovação segura de que estavam no local e no  momento da tragédia.
O 'racha milionário' de agora fortalece a existência do que muitos não aceitam sequer tratar como possibilidade.]

sábado, 2 de janeiro de 2021

Aberrações legais protegem o crime e facilitam impunidade - J. R. Guzzo

O Estado de S.Paulo

Após dois anos de governo Bolsonaro, há uma situação em que o poder público incentiva ainda mais a atividade criminosa no Brasil

Um dos maiores projetos do governo do presidente Jair Bolsonaro, exposto em volume máximo durante toda a sua campanha eleitoral, era o combate ao crime um dos piores inimigos da população brasileira nas últimas décadas, em razão da impunidade dos criminosos, da baixa eficiência do aparelho policial e judiciário e da aberta submissão da lei aos interesses dos escritórios de advocacia penal mais prósperos deste país. Passam dois anos e o que se tem hoje? Uma situação em que o poder público incentiva ainda mais a atividade criminosa no Brasil.

Não apenas não foi feito o prometido. Inventaram-se, com a cumplicidade objetiva do governo federal, novas aberrações legais para proteger o crime e deixar sem punição os criminosos. Uma das mais perversas foi a criação dojuiz de garantias”, pela qual todo processo penal no Brasil passa a ter dois juízes – isso mesmo, dois juízes diferentes – um para cuidar da papelada e outro para encontrar motivos que possam ser utilizados para soltar bandidos presos em flagrante.

Com a desculpa de que esse tipo de juiz existe “em outros países”, e como se o Brasil fosse um exemplo mundial em matéria de criminalidade baixa, deputados e advogados espertos enfiaram num “pacote anti-crime” apresentado pelo governo – justo aí – o contrabando desse segundo juiz. O presidente da República poderia vetar o texto de lei, aprovado no final de 2019. Não vetou. Também poderia vetar, e não vetou, outro presentaço para os criminosos e seus advogados: a soltura de réus que estejam presos há mais de 90 dias sem terem “condenação definitiva”. Em nenhum governo anterior o crime conquistou duas vitórias como essas.

Sabe-se muito bem o uso que já se fez dessa história dos 90 dias: o ministro Marco Aurélio mandou soltar um traficante de drogas milionário que teve como advogado um ex-assessor dele mesmo, Marco Aurélio. O homem estava condenado, em duas sentenças, a 25 anos de cadeia, e obviamente desapareceu assim que saiu do xadrez. Agora, um grupo de advogados que costumam cobrar honorários de milhões entrou com um habeas corpus coletivo contra a liminar do presidente do STF, Luiz Fux, que suspendeu em janeiro último a existência do “juiz de garantias”. É o “pacote pró-crime” do governo de novo em ação. 

É abusivo e ilegal: não cabe a apresentação de habeas corpus contra decisão do presidente do STF. E daí? A ala do tribunal que está o tempo todo ao lado da impunidade quer dar um troco no presidente Fux, que já há tempo se tornou um dos seus desafetos – e vai jogar tudo para recuperar os benefícios que o crime espera obter com o “juiz de garantias”. Fica aberto, tecnicamente, o caminho para que sejam soltos todos os criminosos que não passaram pelo segundo juiz 24 horas depois da sua prisão.

O “processo civilizatório” do Brasil é isso aí.

J.R. Guzzo, jornalista - Coluna em O Estado de S. Paulo

 

 

quinta-feira, 5 de novembro de 2020

Que susto, hein? - Carlos Alberto Sardenberg

Coluna publicada em O Globo - Economia 5 de novembro de 2020

Que susto, hein? Quando Donald Trump derrotou Hillary Clinton em 2016, fazendo jogo sujo, fazia sentido supor que isso tivesse acontecido por falta de conhecimento. Os americanos conheciam Trump como apresentador de tevê e, digamos, um milionário metido a besta. Era razoável supor também que boa parte dos eleitores estivesse farta da velha política, ali representada pela figura de um clã. Ok, Bill Clinton havia sido um bom presidente, Hillary tinha uma carreira pessoal de muito sucesso, mas de novo?

Também dava para imaginar que depois de Obama, os americanos estariam decididos a experimentar uma virada à direita, como acontecia em outras partes do mundo. Mas tudo isso se pensou depois da eleição. Porque antes era difícil imaginar que depois de eleger o primeiro presidente negro, com o nome Barack Hussein, os americanos passassem para Trump. Passaram, ganharam o benefício da dúvida. 

Mas passados quatro anos e Trump confirmando todo o jogo sujo que se esperava dele, e sendo agora amplamente conhecido como político – admito que me surpreendi com a competitividade dele. E mais ainda com alguns números apanhados nestes primeiros momentos, com dados do NY Times. Por exemplo: em comparação com 2016, Trump perdeu votos entre homens brancos com e sem diploma universitário. Em compensação, ganhou votos entre latinos de Miami (ok, são cubanos, em geral), mas também entre os mexicanos do Arizona. Os mexicanos, aqueles foram simplesmente xingados por Trump.

De outro lado, Biden foi pior que Hilary entre negros (homens e mulheres) e latinos (também homens e mulheres). Era de se imaginar o contrário depois de tudo que Trump e seu pessoal haviam feito. As primárias mostraram um Partido Democrata bastante dividido num amplo espectro político. Sim, há socialistas na esquerda democrata, embora não haja um programa propriamente claro. Não há ninguém propondo a expropriação dos meios de produção, mas há muita gente contra o “grande capital”. Isso até vem de longe: Al Gore, por exemplo, fez campanha contra o “big pharma” e o “big oil”.

Binden, talvez para atender essa esquerda, criticou o “big oil” e propôs algum tipo de controle de preços ou distribuição social de remédios. Tudo na direção de evoluir o Obamacare, que não pode ser chamado de socialista, talvez nem de social-democrata. Mas isso, em parte do eleitorado americano, deu alguma credibilidade às acusações de Trump de que há uma conspiração socialista e anti-cristã que precisa ser varrida dos EUA e do mundo. 

Aliás, Trump voltou à ideia ontem quando se declarou vencedor e que estava sendo roubado – não se importando nem um pouco em criar uma crise institucional de proporções inimagináveis. Por outro lado, há republicanos do bem, gente que quer reorganizar o país. Aliás, Binden foi senador por muitos anos, presidiu o Senado quando foi o vice de Obama, conhece republicanos. Pode, portanto, ser uma fonte de entendimento na direção do centro. Mas tanto os republicanos quanto os democratas também elegeram os seus radicais. Permanecerão nos seus partidos ou haverá divisões?

De todo modo, para o mundo, a quarta-feira terminou melhor do que começou. Binden agora é o favorito e isso muda para melhor o panorama global. Com Binden, os EUA voltam ao Acordo de Paris, à OMS, à aliança atlântica. Claro que continua a disputa com a China pela hegemonia econômica, militar e tecnológica, mas será uma disputa, digamos, mais inteligente e com muito menos chance de descambar para algum conflito.

Mas que há muita confusão política/ideológica nos EUA e no mundo, disso não há dúvida. E para terminar, uma vitória de Binden deixa Bolsonaro inteiramente isolado nas Américas. E será bem feito. A tal amizade com Trump não trouxe nada de significativamente lucrativo para o Brasil. Mas os bolsonaristas continuam por aí. Vão dizer que Trump foi roubado, assim como Bolsonaro acha que foi roubado numa eleição que ganhou. Aliás, tem uma ironia aí. As nossas urnas eletrônicas saíram-se muito bem, obrigado. [Quanto às urnas eletrônicas o que melhorou o seu conceito foi que o presidente Bolsonaro foi eleito em eleição na qual foram utilizadas - e sabemos que a eleição do capitão não foi aceita pelos inimigos do Brasil = adeptos do 'quanto pior, melhor' + mais 'turma do mecanismo' + inimigos da democracia + corja esquerdista - assim, se ele foi eleito não foi por falta de vontade daqueles inimigos de  fraudar as eleições, e sim por impossibilidade.]

Carlos Alberto Sardenberg, jornalista