Jânio de Freitas
Impeachment de Bolsonaro ganhou mais exposição agora do que em dois anos
O
impeachment não apenas como solução, mas sobretudo como necessidade, avançou mais
e ganhou mais exposição nos últimos dias do que nos dois anos
de Bolsonaro até a tragédia pandêmica em Manaus. Temores
e dúvidas esvaneceram em grande escala, pulverizados pela visão imaginada das mortes
por asfixia à falta de oxigênio hospitalar, causada por incúria
e suspeita indiferença do governo Bolsonaro. E, por horror ou por cautelas
tardias, nem foram ainda relatadas, como devido, essas mortes em hospitais,
casas, em fila para socorro. [Que DEUS dê vida longa aos meus inimigos, para que eles assistam de pé a minha vitória!
Frase, cuja autoria desconhecemos, caso não conste das anotações do capitão, deve ser memorizada e dita ao amanhecer e anoitecer da cada dia.
Esperando um terceiro turno que não ocorreu,um impeachment que não ocorrerá, resta aos inimigos do presidente Bolsonaro, aguardar que conclua seu segundo mandato e, caso não se candidate a um terceiro, saia da política.]
Bolsonaro
combate o avanço do impeachment, de início, com gigantesca atividade de
corrupção política. É o velho compra-e-vende de deputados, agora para eleger
o futuro
presidente da Câmara, em fevereiro. Nessa
operação encontram-se, ao lado de velhos embolsadores antes desprezados pelos
militares, generais como Luiz Eduardo Ramos, na função de coordenador político
e intermediário com os congressistas. Eleger
um tipo como Arthur Lira é, para Bolsonaro, a melhor garantia de bloqueio ao
impeachment na Câmara, o primeiro estágio. É a permanência comprada com
dinheiro público de cargos ou verbas. Além da sempre patriótica caixinha
empresarial.
Há,
no entanto, destituições que só a custo muito alto, em variados males e mais
ainda em vidas, poderiam aguardar o possível impeachment. Um desses é gritante.
Seja qual for ainda a permanência do general Eduardo
Pazuello como ministro da Saúde, por isso haverá muito mais
vidas brasileiras em risco. Senão perdidas. A
responsabilidade desse general pela tragédia em Manaus é inequívoca. Seu reconhecimento
de que foi prevenido do então próximo esgotamento do oxigênio diz muito, mas
não tudo. Além de advertências sobre o problema durante sua estada na cidade,
dias antes do colapso hospitalar, a Força Nacional do SUS convocada pelo
próprio general informou-o até da data de eclosão da tragédia — o oxigênio a
zero.
Levantamento
do repórter Vinicius Sassine, na Folha, [temos dificuldades de entender as razões de 'esquecerem' o governador do Amazonas! qual será o motivo???] permite constatar que
relatórios e pedidos de providências, quase diários, informaram Pazuello desde
ao menos uma semana antes do colapso total.
A
fornecedora, White Martins, fez também sua advertência: a necessidade crescia
além da capacidade de fornecimento imediato. Apesar disso, o secretário de
Atenção Especializada em Saúde (!) do ministério, Luiz Otavio Franco Duarte,
claro que um coronel, quis culpar e autuar a fornecedora. Era como se Pazuello
e Bolsonaro [e o GOVERNADOR] de nada soubessem. Nenhuma providência em tempo de evitar as mortes
terríveis e o desespero inapagável dos médicos, enfermeiros, atendentes.
Os
casos de Covid-19 continuam crescentes no Amazonas, agora também
no interior, onde não há sequer um leito de UTI. Pior, está previsto
o agravamento da crise já nas próximas semanas e ao longo de fevereiro. Mas a
precaução adotada por Pazuello é a nomeação de novo superintendente das ações
do Ministério da Saúde no estado, Ricardo Loureiro. Coronel, naturalmente. Da
infantaria, [a Rainha das Armas.]ordinário marche.
Não
é menos comprometedor de Bolsonaro e do general Pazuello a recomendação, no
site do ministério, de tratamento
da Covid-19 com cloroquina. E seu uso em “tratamento precoce”,
portanto, em “tratamento” do que ainda não é doença. Retirar
o aplicativo no mesmo dia em que foi notícia de jornais é,
claro, o reconhecimento da impropriedade do tratamento recomendado. Os efeitos
dessa vigarice criminosa, porém, circulam por aí na companhia dos vírus
inatacados. A saída do
general Eduardo Pazuello é uma necessidade da vida. E é muito
pouco pelo que ele deve em vidas.
A
permanência de Pazuello será um desafio a mais de Bolsonaro ao Estado de
Direito, às representações institucionais da Constituição e ao que reste de
dignidade no país. Mas será também útil contribuição à onda que se forma. A poderosa
entrevista do ex-ministro Carlos Ayres Britto à Folha, sendo ele uma das perdas do Supremo muito lastimadas, continua revertendo
reservas ao impeachment e liberando vozes e escritos. É o lado ainda vivo do
país, nestes tempos de duas epidemias letais.
Janio de Freitas, colunista - Folha de S. Paulo