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quinta-feira, 24 de agosto de 2023

Por que o STF não deve legislar - Revista Oeste

Loriane Comeli

 Segundo a Constituição, os ministros do Supremo Tribunal Federal não deveriam agir como se fossem parlamentares eleitos pelo voto popular

 

 Foto: Montagem Revista Oeste/Shutterstock/STF

A criação de leis no Brasil é atribuição do Poder Legislativo. E, no entanto, o Supremo Tribunal Federal (STF) legisla
E legisla sobre temas importantes e polêmicos. 
O aborto de fetos anencéfalos, o crime de homofobia e a união homoafetiva são algumas das “leis” criadas pela Corte nos últimos dez anos. Independentemente da opinião que se tenha sobre esses assuntos, sobressalta-se um fato: o STF não tem competência para legislar.

Apesar disso, o Supremo está em vias de criar uma nova “lei”: a que descriminaliza o porte de drogas para consumo pessoal. 
Hoje, a Lei Antidrogas não prevê prisão ao usuário, mas estabelece penas como advertência sobre os efeitos das drogas; prestação de serviços à comunidade; e medidas educativas. 
Isso foi o que o Congresso decidiu em 2006, ao aprovar a Lei Federal nº 11.343.

Agora o Supremo pretende abolir essas punições. O ministro Alexandre de Moraes, o último dos quatro que já votaram pela descriminalização do porte de drogas, num voto proferido em 2 de agosto, propôs a tese de que será considerado usuário quem
“adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trazer consigo de 25 a 60 gramas de maconha ou seis plantas fêmeas”. 
O Supremo está em vias de criar uma nova “lei”: a que descriminaliza o porte de drogas para consumo pessoal - Foto: Nelson Jr./SCO/STF

O ministro Luís Roberto Barroso acha que a descriminalização deve valer para até 25 gramas de maconha.  
Edson Fachin não estipulou quantidade, mas defende a regra apenas para quem for pego com a erva.  
Gilmar Mendes votou pela liberação geral do porte de qualquer droga para consumo pessoal.

No fim, a tese vencedora vai se tornar “lei”, ao arrepio do processo legislativo previsto na Constituição Federal. 
Esse ativismo judicial da Suprema Corte — que usurpa poderes não apenas do Legislativo, mas o fez com frequência em relação ao Executivo, no governo de Jair Bolsonaro — começou a se delinear há pouco mais de uma década.

A primeira intromissão
Uma das primeiras decisões que atropelaram o Congresso Nacional foi a liberação da união homoafetiva
, em maio de 2011.
Embora a Constituição mencionasse especificamente a relação entre homem e mulher para tratar da união estável, o STF reconheceu a união homoafetiva como um núcleo familiar igual a qualquer outro. [tudo foi 
consequência da ausência do advérbio apenas no artigo 226 da CF; no entender do supremo ministro se o legislador pretendesse restringir a união em discussão para homem e mulher,  teria redigido incluindo o advérbio: "...apenas entre homem e mulher...". A tese foi acolhida e liberou geral.]

Dois anos depois, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ)
[que pela CF não tem poderes para legislar, porém, mesmo assim,  revogou, por Resolução, o artigo 1.565 do Código Civil.] , também contrariando o artigo do Código Civil onde está previsto que “pelo casamento, homem e mulher assumem mutuamente a condição de consortes, companheiros e responsáveis pelos encargos da família”, proibiu, por resolução, os cartórios de se recusarem a fazer casamentos entre pessoas do mesmo sexo.

Em 5/5/2011, o STF deu um passo muito importante para a garantia de direitos das famílias formadas por pessoas do mesmo sexo. Ao julgar a ADI 4277 e a ADPF 132, a Corte reconheceu a união homoafetiva. As ações foram ajuizadas, respectivamente, pela PGR e pelo governo do RJ. ⤵️➕ pic.twitter.com/jIPlinkcP9— STF (@STF_oficial) May 5, 2021

No ano seguinte ao reconhecimento da união homoafetiva, o STF criou a “lei” do aborto dos bebês anencéfalos. 
O Código Penal prevê duas circunstâncias em que a interrupção da gravidez não é penalizada: quando não há outro meio de salvar a vida da gestante e se resulta de estupro. 
a “lei” criada pelo STF proveio do julgamento de uma Arguição por Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF), ajuizada em 2004 pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde (CNTS).

Naquela ocasião, foram votos vencidos apenas os então ministros Ricardo Lewandowski e Cezar Peluso. Lewandowski, que se aposentou em abril deste ano, fundamentou a maior parte de seu voto com o argumento de que o tema é de competência do Legislativo, e não do STF. “Os parlamentares, legítimos representantes do povo, já tiveram tempo de legislar sobre o tema e não o fizeram”, disse Lewandowski. Além disso, a lei sobre o aborto era clara e, portanto, “não há espaço para interpretação”.

Peluso tentou convencer os colegas de que o aborto de feto anencéfalo é conduta vedada de forma frontal pela ordem jurídica e declarou que “não há malabarismo hermenêutico ou ginástica dialética” que possa permitir interpretação contrária. Prevaleceu o ativismo.
 
Homofobia, o crime criado por decisão judicial
Daí para a frente, os casos se multiplicaram. E a avidez do Supremo afrontou uma das regras mais básicas do Direito brasileiro e de todo o Ocidente:
não há crime sem lei anterior que o defina e não há pena sem prévia cominação legal
Ignorando solenemente o comando do artigo 5º, inciso XXXIX da Constituição Federal, e do artigo 1º do Código Penal, os ministros criaram, em 2019, o crime de homofobia.

O malabarismo linguístico para explicar a aberração jurídica foi a omissão do Congresso Nacional por não editar lei que criminalize atos de homofobia e de transfobia. Com isso, analisando dois processos sob a relatoria do então ministro Celso de Mello e do ministro Edson Fachin, equiparam as agressões motivadas pela condição sexual ao crime de racismo.

Por maioria, o Plenário do @STF_oficial reconhece a omissão inconstitucional do Legislativo em não editar lei criminalizando a homofobia e enquadrou o crime na Lei de Racismo enquanto o Congresso Nacional não cria legislação específica para o tema.— STF (@STF_oficial) June 13, 2019

Lewandowski, Dias Toffoli e o então ministro Marco Aurélio Mello votaram contra a invasão de competência do Legislativo. “A normatização cumpre ao Congresso”, defendeu Lewandowski, o primeiro a votar contra a criação de crime por decisão judicial, naquela ocasião.

Durante a pandemia de covid-19, em evidente usurpação de competência do Executivo, o STF proibiu operações nas favelas do Rio e autorizou os governos dos Estados e dos municípios a decidirem sobre lockdowns e outras medidas para conter a doença. Também é dessa época uma decisão do ministro Luís Roberto Barroso, depois chancelada pelo plenário, que criou uma “lei” para exigir passaporte vacinal de pessoas que chegassem ao Brasil. Atendendo a pedido da Rede Sustentabilidade, os ministros afirmaram que o STF “tem obrigação constitucional de proteger os direitos fundamentais à vida e à saúde”.
 
O aborto e o ativismo
Com o aborto de bebês anencéfalos já estabelecido por decisão judicial há 11 anos
, o STF poderá, agora, ir “mais fundo” na questão, ignorando, mais uma vez, o Congresso. Tema sensível ao qual, assim como ocorre com as drogas, a maioria da população é contrária, o aborto pode deixar de ser crime no Brasil. A relatora do processo é a ministra Rosa Weber, que se aposentará em outubro, ao completar 75 anos.

Enquanto o governo se empenha nessas pautas identitárias, o Sistema Único de Saúde (SUS) tem quase 60 mil pacientes esperando na fila de transplantes

A ação para descriminalizar o aborto até a 12ª semana de gestação foi ajuizada pelo Psol, em 2017. 
Um dos que certamente votarão a favor é o ministro Luís Roberto Barroso. Em 2019, adentrando numa pauta progressista de gênero, ele declarou publicamente que, “se homens engravidassem, esse problema já estaria resolvido há muito tempo”.
 
O progressismo de Barroso
Com o viés “progressista” de Luís Roberto Barroso,
que em outubro assumirá a Presidência do STF, outros temas sensíveis podem ir para votação em breve
Um deles é um caso que trata de banheiros unissex em locais públicos. Sem discussão no Congresso, os ministros vão decidir se exigir que o transexual utilize banheiro do sexo oposto ao qual escolheu configura conduta ofensiva à dignidade da pessoa humana e aos direitos da personalidade.  
O caso, sob relatoria de Barroso, chegou ao Supremo em 2014 e está liberado para julgamento.

As pautas do STF vão exatamente ao encontro das políticas do governo Lula. Com a chancela do Ministério da Saúde e da ministra Nísia Trindade (que até hoje usa máscara contra a covid-19), o Conselho Nacional de Saúde aprovou, em julho, uma resolução estabelecendo como metas temas que não foram discutidos no Congresso. Entre as pautas, a liberação da maconha e do aborto. Além disso, outra meta é reduzir de 16 para 14 anos a idade mínima para que o adolescente possa iniciar tratamentos com hormônios para mudar de sexo. Enquanto o governo se empenha nessas pautas identitárias, o Sistema Único de Saúde (SUS) tem quase 60 mil pacientes esperando na fila de transplantes.

Também pode ir em breve para votação do STF o marco temporal das terras indígenas, apesar de a Câmara ter aprovado um projeto de lei que fixa o dia da promulgação da Constituição como a data até a qual os indígenas podem reivindicar terras.  
O projeto aguarda votação no Senado. 
Outra intromissão do STF é no Marco Civil da Internet. 
Está explícito na lei que as plataformas somente respondem por eventuais danos se não retirarem conteúdo do ar depois de uma decisão judicial. Entretanto, o Supremo reconheceu a repercussão geral, e o processo pode entrar em pauta em breve.

A reação do Congresso
No Congresso, o avanço do STF nas competências do Legislativo foi alvo de críticas. A mais recente — e inesperada — veio do presidente do Senado. Rodrigo Pacheco (PSD-MG) disse que a descriminalização das drogas, como pretende fazer o STF, sem discussão no Congresso, é “invasão de competência do Poder Legislativo”. “Houve, a partir da concepção da Lei Antidrogas, uma opção política de se prever o crime de tráfico de drogas com a pena a ele cominada, e de prever também a criminalização do porte para uso de drogas.

(.....)

Rodrigo Pacheco acusa STF de invadir competência do Poder Legislativo ao descriminalizar porte de maconha para uso pessoal.

De quem se irá comprar a droga? De um traficante, que pratica um crime gravíssimo, equiparado a hediondo”, afirmou o presidente do Senado ao ressaltar que… pic.twitter.com/ClwU4nOiJQ— Metrópoles (@Metropoles) August 3, 2023

Em 2019, a deputada Bia Kicis (PL-DF) protocolou projeto semelhante ao de Cavalcante, que foi apensado à proposta do colega. O texto da parlamentar previa a abertura de processo de impeachment quando o ministro instituísse “mediante decisão, sentença, voto, acórdão ou interpretação analógica, norma geral e abstrata de competência do Congresso Nacional”.
 
 
 
 

quarta-feira, 8 de dezembro de 2021

A sabatina de André Mendonça e o laicismo que exclui a fé da esfera pública - Opinião

 Na quarta-feira, o ex-ministro da Justiça e ex-advogado-geral da União André Mendonça foi confirmado pelo Senado como o mais novo ministro do Supremo Tribunal Federal, conquistando maiorias de 18 votos na Comissão de Constituição e Justiça e 47 votos no plenário. 
 
Sua sabatina transcorreu sem grandes sobressaltos ou declarações bombásticas: houve as protocolares e esperadas declarações de respeito ao Estado Democrático de Direito e à separação de poderes, defesa da liberdade religiosa e rejeição do ativismo judicial – todas afirmações que ainda serão comprovadas ou desmentidas ao longo dos próximos anos. Mas a sabatina de Mendonça, que é evangélico e pastor presbiteriano, também teve momentos que demonstram claramente o tipo de pressão existente em certos setores da sociedade para negar à religião uma dimensão pública que está na essência do modelo brasileiro de laicidade colaborativa. [sempre surgem perguntas inadequadas, visto que o objetivo da sabatina é apurar se o sabatinado possui o notável saber jurídico  exigido pela Constituição Federal (a exigência reputação ilibada não é apurada na sabatina). Só que alguns senadores ignoram tal objetivo e apresentam perguntas que deveriam ser vetadas já que cuidam de assuntos que o indicado poderá ter que vir a julgar quando ministro.
Paciência,  já que bom senso, noção e inteligência nem sempre acompanham os votos que um senador recebe e o sabatinado no anseio de agradar e mostrar competência apresenta uma resposta que permite várias interpretações.]

 Supremo

André Mendonça durante sabatina no Senado: aprovação da indicação dele ao Supremo é vitória do governo Bolsonaro.| Foto: Marcos Oliveira/Agência Senado
 
Mendonça foi questionado pelo senador Fabiano Contarato (Rede-ES) sobre como seria seu voto se o casamento homoafetivo estivesse sendo discutido no Supremo e coubesse a Mendonça desempatar o julgamento. O sabatinado acabou tentando se esquivar, levando Contarato a insistir no assunto. Eu tenho a minha concepção de fé específica. Agora, como magistrado da Suprema Corte, eu tenho que me pautar pela Constituição. Eu defenderei o direito constitucional ao casamento civil das pessoas do mesmo sexo”, respondeu Mendonça.
 
A fé é elemento constituinte da personalidade de inúmeras pessoas, e não se pode pretender que ela seja “descartada” em sua atuação pública
O debate sobre as uniões homoafetivas, é preciso lembrar, não é um embate entre “religiosos” de um lado e “laicos” de outro; ambas as posições contam com argumentos filosóficos, históricos, éticos e antropológicos em sua defesa, apresentados em inúmeros debates, artigos e livros. Além disso, escapa a muitos brasileiros o fato de que em 2011, quando o Supremo reconheceu a união homoafetiva, não a equiparou ao casamento
- isso só começou a ocorrer em 2013, e não pelas mãos do Supremo, mas do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), demonstrando que a instituição do casamento homoafetivo não chegou a ser vista pela corte como decorrência automática do texto constitucional. [O CNJ não se manifesta sobre temas que envolvam matéria constitucional]

Apesar disso tudo, é claro que o assunto não foi escolhido aleatoriamente. Temas como a união ou casamento homoafetivo estão entre aqueles que geram oposição entre as convicções pessoais de boa parte da população brasileira incluindo muitos evangélicos – e os valores de setores específicos, mas muito influentes, da sociedade, incluindo a academia, a imprensa e a política. Ao fazer sua pergunta, Contarato não estava interessado em argumentos “laicos” contra o casamento homoafetivo; ele apenas pretendia levar Mendonça a admitir que sua fé ficaria de fora do prédio do Supremo, seguindo assim o exemplo do próprio senador, que, durante a pergunta, se declarou cristão, mas acrescentou: “nunca pauto minha vida levando para o lado da religiosidade”.  
 
O sabatinado, no fim das contas, caiu na armadilha do senador e permitiu que ficasse estabelecida, assim, uma contraposição entre fé religiosa e atuação pública, como se aquela dissesse respeito única e exclusivamente à vida privada ou ao culto público nos locais específicos a ele destinados. [uma opinião: aos evangélicos, até mais de forma mais literal do que aos católicos, o que consta da Bíblia Sagrada é LEI. Seja o o que conste dos Evangelhos ou das Epístolas.]
 
Veja Também:  Em busca do “voto religioso”: o que os presidenciáveis fazem para atrair os evangélicos
Momento decisivo para a prisão em segunda instância
Caderneta de poupança deve render mais após nova alta na Selic.


O que Contarato – e outros que participaram da sabatina, a julgar por certas frases ditas ao longo da sessão propõe não é a laicidade escolhida pelo constituinte brasileiro, mas o modelo francês, que nega a dimensão pública da religião, chegando ao ponto de proibir manifestações públicas de fé como o uso de adereços ou indumentárias
Este modelo, no entanto, ignora que a fé é elemento constituinte da personalidade de inúmeras pessoas, e não se pode pretender que ela seja “descartada” em sua atuação pública, até porque muitas religiões não são apenas sistemas de crença a respeito do sobrenatural, por exemplo, mas também apresentam códigos de moralidade e conduta
Um cristão, um muçulmano, um umbandista, um judeu, um budista, um hindu etc. não deixam de sê-lo quando saem de casa ou do local de culto, ou quando entram no local de trabalho. Seus valores e suas crenças também influenciam a maneira como atuam em público – aliás, tanto quanto muitos outros sistemas de pensamento e ideologias –, e pretender o contrário é violentar a consciência dessas pessoas, que teriam de assumir personalidades diferentes na vida privada e na vida pública.

Ninguém há de esperar que Mendonça, uma vez instalado em sua cadeira no Supremo, fundamente seus votos em citações da Bíblia ou tente usar o cargo para impor dogmas religiosos aos brasileiros
No entanto, ele certamente terá de lidar com questões filosóficas, éticas, biológicas e antropológicas, mas que a intelligentsia chama de “religiosas” porque algumas confissões religiosas (inclusive a de Mendonça) participam destes debates defendendo certos posicionamentos – é o caso de temas de comportamento, de defesa da vida e da família.  
Pode ocorrer que, em certas ocasiões, a aplicação ou interpretação que Mendonça dê à Constituição esteja em linha com a posição de sua igreja? Obviamente que sim, mas, antes de afirmar que este ou aquele voto foi determinado por convicções religiosas ou se apenas coincide com elas, será preciso analisar seu conteúdo. 
Está embasado em sólidos argumentos, doutrina e jurisprudência? 
Está expresso em termos acessíveis e compreensíveis por todos, independentemente de religião? Se assim for, não haverá base para acusações de interferência ou de violação da laicidade do Estado.

    No Brasil, as pessoas de fé convicta gozam dos mesmos direitos que todas as demais, inclusive o direito de atuar na esfera pública


Insinuar que Mendonça, por ser evangélico, não poderá ser um bom ministro do Supremo é demonstração de preconceito semelhante à que Amy Coney Barrett, católica, enfrentou – de forma muito mais ostensiva – ao ser indicada à Suprema Corte norte-americana e sabatinada pelo Senado daquele país. É supor que a fé seja algo irracional, quando na verdade uma fé esclarecida é perfeitamente compatível com o respeito às instituições e também com grandes avanços sociais, como demonstraram o pastor Martin Luther King e o abolicionista britânico William Wilberforce, para ficar em apenas dois exemplos de pessoas que conseguiram feitos notáveis movidas por fé profunda.

Como afirmou o colunista da Gazeta do Povo Guilherme de Carvalho após a aprovação do nome de Mendonça no Senado, “alguns setores de nossa sociedade estão dispostos a aceitar evangélicos nessa democracia, desde que eles deixem sua fé de fora do Executivo, do Legislativo e do Judiciário. Mas essas condições seriam inaceitáveis. Seriam laicismo, não laicidade”. No Brasil, as pessoas de fé convicta gozam dos mesmos direitos que todas as demais, inclusive o direito de atuar na esfera pública. A laicidade do Estado não justifica nem a exclusão destas pessoas, nem a tentativa de sufocar sua fé como elemento definidor da personalidade, restringindo-a aos ambientes privados ou de culto.
 
 
 

terça-feira, 8 de dezembro de 2020

Reeleição no Congresso - A maneira de frear Bolsonaro não é atropelando a Constituição - Merval Pereira

O Globo

Supremo com a lei

Não seria a primeira vez em que o Supremo Tribunal Federal interpretaria a Constituição alargando seu alcance, mas seria a segunda em que as palavras teriam seu sentido tão alterado, transformando o “não” em “sim”. Na primeira vez, não foi o sentido de uma palavra, mas a inclusão de uma não existente no texto constitucional que mudou sua aplicação, livrando a presidente impedida Dilma Rousseff da perda dos direitos políticos.

O ministro Ricardo Lewandowski, então presidente do Supremo, no comando da sessão do Senado, fez uma leitura criativa do Artigo 52 da Constituição, que é explícito em seu parágrafo único: “Nos casos previstos nos incisos I e II, funcionará como Presidente o do Supremo Tribunal Federal, limitando-se a condenação, que somente será proferida por dois terços dos votos do Senado Federal, à perda do cargo, com inabilitação, por oito anos, para o exercício de função pública, sem prejuízo das demais sanções judiciais cabíveis”.

Lewandowski permitiu a votação separada do impeachment e da perda dos direitos políticos, como se um “e” metafórico separasse as duas punições, que para o legislador era uma apenas. Coube aos eleitores mineiros corrigir a decisão, não elegendo a ex-presidente na eleição seguinte.

Desta vez, coube ao ministro Gilmar Mendes encontrar uma interpretação diferente para o parágrafo 4 do artigo 57 da Constituição que determina ser “vedada a recondução para o mesmo cargo na eleição imediatamente subsequente”. O ministro tem alguns pontos válidos. É preciso compatibilizar a permissão de reeleição nos Executivos federal, estadual e municipal com o Legislativo. Também é necessário dar ao Legislativa espaço para “conformação organizacional” que garanta a independência entre os Poderes.

Mas é preciso lembrar que foram os próprios parlamentares que colocaram essa norma na Constituição. Sobretudo, lembrar que o Congresso tem uma maneira de alterar essa proibição, que é aprovar uma emenda constitucional.

O próprio Gilmar Mendes teve a experiência de estar nos dois lados em uma discussão político-jurídica importante, a permissão para a prisão em segunda instância. Na primeira vez, em 2016, votou a favor, acatando a interpretação de que o trânsito em julgado dava-se após a condenação em segunda instância, pois os recursos aos tribunais superiores (STJ e STF) não têm a capacidade de alterar o mérito da decisão, mas são usados para protelar a aplicação da pena e, em muitos casos, para até mesmo evitar que o condenado vá para a cadeia.

Já em 2019, votou a favor da literalidade da Constituição, contra a prisão em segunda instância, que considerou estar desvirtuada, especialmente pela Operação Lava-Jato. Sempre que, nos últimos anos, o Supremo tem alargado sua visão constitucional, ou, como quer o ministro Luis Roberto Barroso, empurrado a História, usou a interpretação como ferramenta jurídica para acompanhar a dinâmica da sociedade, permitindo que o formalismo dê lugar a decisões exigidas pela sociedade, como a união homoafetiva, o aborto anencefálico, acordos individuais entre patrões e empregados. [na liberação da união homoafetiva o Supremo optou pela interpretação criativa de que a falta do advérbio apenas impedia que o casamento fosse limitado a família,  sendo esta formada apenas pela união estável do homem e da mulher (destacamos o apenas exigido pelo Supremo para cumprir a Constituição e assim impedir o casamento entre pessoas do mesmo sexo.)

Na liberação do aborto anencefálico, 'esqueceu' que a Constituição que está, ou deveria, sob sua guarda, consagra o direito à vida.

Na equiparação da  'homofobia' e similares ao racismo, legislou por analogia, criou tipo penal inexistente e apequenou o crime de racismo. ]

No caso recente que provocou celeuma, não havia nenhuma demanda social para que se permitisse que o deputado Rodrigo Maia e o senador David Alcolumbre pudessem disputar a reeleição para presidir suas respectivas Casas Legislativas. Há um contexto político por trás das escolhas futuras, por óbvio, mas não é possível tomar uma decisão contraria à Constituição para conformar as presidências da Câmara e do Senado a uma visão política, mesmo que ela esteja correta para muitos.

O presidente Jair Bolsonaro pretende eleger o próximo presidente da Câmara para controlar a pauta e, sobretudo, não ser retirado do governo por uma ação de impeachment. Claro que muita gente acredita que o ideal seria que ele não tivesse esse poder, mas a maneira de impedi-lo não é atropelando a Constituição.  [atropelar a Constituição apenas fornece argumentos para novos atropelamentos;

quanto ao tão desejado impeachment do presidente Bolsonaro, e que nunca será alcançado, necessita para se tornar realidade  não apenas  da aceitação do deputado que presidir a Câmara e sim que os adeptos do impeachment, os inimigos do Brasil, consigam 312 votos favoráveis a que o processo seja instaurado - lembrando que qualquer número inferior a 342 parlamentares, não permite sequer a instalação da sessão.]

 Merval Pereira, jornalista - O Globo


domingo, 25 de outubro de 2020

Declarações do Papa Francisco - Análise leiga sobre interpretações errôneas das declarações

O papa e os gays - Folha de S. Paulo - Opinião

Sem mudar a doutrina, declarações de Francisco aproximam a igreja da realidade

Desde que ascendeu ao posto de líder dos católicos, em 2013, o papa Francisco vem se notabilizando por introduzir pontos de vista mais avançados em temas que são tabus para a igreja, como o aborto ou o divórcio — embora, na prática, pouco ou nada tenha sido alterado na doutrina oficial da instituição.
O papa Francisco - Guglielmo Mangiapane/Reuters

Esse é o caso da recente defesa feita pelo pontífice da união homoafetiva. Mostrando-se muito mais aberto e afinado com a modernidade que seus predecessores, Francisco declarou, num documentário lançado há pouco, que “pessoas homossexuais têm o direito de estar em uma família” e defendeu uma legislação de união civil.

Trata-se de posição semelhante à expressada na época em que era cardeal em Buenos Aires, quando defendeu a aprovação de meios de proteção legal para casais do mesmo sexo — ainda que tenha se oposto a equiparar essa união ao casamento entre homem e mulher. Já como papa, deu declarações favoráveis a homossexuais. “Quem sou eu para julgá-los?”, questionou.

As novas manifestações, as mais incisivas já feitas por um pontífice, têm decerto o potencial de influenciar os debates sobre o status legal de casais do mesmo sexo ao redor do mundo, além de conter a oposição de bispos e outras lideranças a essas mudanças. Não é algo cuja importância deva ser desprezada. Hoje, apenas 28 nações permitem a união homoafetiva, quase todas nas Américas, incluindo o Brasil, e na Europa. [a propósito:  a união civil entre duas pessoas do mesmo sexo - na realidade um contrato civil - ganhou no Brasil 'status' de casamento devido uma suprema interpretação criativa da ausência do advérbio 'apenas' no  texto do § 3º, art.226 da CF.]As relações homossexuais são criminalizadas em 70 países, e em 6 deles a punição é a pena de morte.

Apesar da lufada de ar fresco, as palavras do papa em nada alteram a doutrina.  Embora os ensinamentos católicos não considerem um pecado ser gay, estabelecem que atos homossexuais são “intrinsicamente desordenados” e, por extensão, a orientação é vista como “objetivamente desordenada”.[a BÍBLIA SAGRADA contém vários trechos com rejeição expressa a práticas comuns no homossexualismo:

" -Também nos escritos dos Apóstolos se formulam catálogos de pecados, sobretudo em São Paulo. A lista mais completa e impressionante encontra-se na Carta aos Romanos (cf. 1, 24-32), onde achamos denunciado, de maneira muito especial, o nefando pecado da união homossexual entre homens ou entre mulheres (cf. 1, 26-28 = "26.Por isso, Deus os entregou a paixões vergonhosas: as suas mu­lheres mudaram as relações natu­rais em relações contra a natureza. 

27.Do mesmo modo também os homens, deixando o uso natural da mulher, arderam em desejos uns para com os outros, cometendo homens com homens a torpeza, e recebendo em seus corpos a paga devida ao seu desvario. 

28.Como não se preocupassem em adquirir o conhecimento de Deus, Deus entregou-os aos sentimentos depravados, e daí o seu procedimento indigno."

Romanos, 1 - Bíblia Católica Online  Leia mais em: https://www.bibliacatolica.com.br/biblia-ave-maria/romanos/1/).

Vale alertar que os textos citados não foram alterados. Oportuno ter presente os DEZMANDAMENTOS não foram alterados, nem adaptados aos tempos modernos.

Os valores da Igreja Católica Apostólica Romana  são perenes, eternos e diante da eternidade não existe tempo, não existe antiguidade nem modernidade.

Sua Santidade, Papa Francisco, em seu pronunciamento - que muitos, usando de má fé, tentam apresentar como uma aprovação da Igreja Católica Apostólica Romana às práticas homossexuais, à aceitação de 'casamento' entre pessoas do mesmo sexo e outras semelhanças. NADA DISTO. As DOUTRINAS católica, seus ensinamentos não mudam.

Sua Santidade apenas reconheceu o direito dos homossexuais a conduzirem suas vidas conforme o principio do LIVRE ARBÍTRIO e segundo o Ensinamento de JESUS CRISTO: “Dai pois a César o que é de César, e a Deus o que é de Deus”. ((Mt 22, 15-21). Com tal entendimento, o papa Francisco deixou claro que os homossexuais são pessoas humanas, filhos de Deus, cidadãos da mesma forma que os católicos, ateus também são. O papa Francisco passa uma aceitação de  uma legislação civil que contemple um contrato de união civil - que muitos poderão considerar casamento, obviamente sem nenhum valor religioso.

Quando exercendo o livre arbitrio praticam atos não aprovados pela Igreja Católica, violam dos DEZ MANDAMENTOS, incorrendo em pecado.]

É pouco realista esperar mudanças da água para o vinho numa instituição tradicional e conservadora como a Santa Sé. Ainda mais num tema que suscita oposição cerrada de muitas de suas lideranças. O antecessor de Francisco, Bento 16, ainda vivo, chegou a comparar o casamento entre pessoas do mesmo sexo ao “anticristo”. São visíveis, contudo, as inclinações do papa a promover uma necessária atualização da moral familiar católica, aproximando-a da realidade vivida pelos fiéis. [os fiéis católicos que se adaptem aos princípios da Igreja Católica, princípios estes que são imutáveis. Ser católico exige vivência e não adaptação do  INFINITO  aos desejos do finito.] 

 Opinião Folha de S. Paulo 


quarta-feira, 25 de janeiro de 2017

Esquerda quer que Temer indique esquerdista para o STF!

Os ditos progressistas acham que um católico contra o aborto não pode ser ministro do Supremo... É mesmo?

[para começo de conversa progressista é que não pode ser ministro do Supremo; os progressistas são em sua maioria incompetentes e ladrões e o cargo de ministro do STF exige notório saber jurídico (incompatível com incompetência) e reputação ilibara (o que tira do páreo os ladrões = progressista, sem esquecer que os favoráveis ao aborto são também assassinos.] 

Bem, conforme antevi aqui anteontem, não demorou para Ives Gandra Martins Filho, presidente do Tribunal Superior Trabalho, virar um alvo das correntes de esquerda. Ele é um dos nomes que o presidente Michel Temer leva em consideração para ocupar a vaga aberta no Supremo com a morte de Teori Zavascki. A exemplo do pai, o filho é ligado ao Opus Dei — nota: “o” Opus Dei, não “a” —, uma prelazia papal de corte conservador. Bem, dizer o quê?

Católico e conservador? Tal perfil já mobilizou a esquerda, que, ora vejam, passou a considerar que ele não pode ser nomeado de jeito nenhum! Os vermelhos rejeitam ainda o nome de Alexandre de Moraes, ministro da Justiça. No caso deste, alguns nichos da extrema direita também arreganham os dentes porque, contra todas as evidências, o veem como inimigo da Lava Jato, o que é mentira. Voltemos a Martins Filho.  Dizer o quê? Isso expõe o que essa gente entende por democracia.

Vamos lá. Então se considera normal que haja no Supremo ministros francamente favoráveis à descriminação do aborto, como Roberto Barroso. Mas é inaceitável que haja um contrário? Atenção! A Primeira Turma do Supremo, ao arrepio da lei, tomou a absurda decisão de descriminar o aborto até o terceiro mês de gravidez. O relator da matéria foi justamente Barroso.

Reportagem publicada na Folha de hoje informa, referindo-se a um artigo do presidente do TST: “Martins Filho diz no texto ser contra decisões do Supremo como o reconhecimento da união homoafetiva, a liberação de células-tronco embrionárias para pesquisa e a permissão para destruir embriões humanos em pesquisas. É também contrário ao aborto, ao divórcio e à distribuição de pílulas anticoncepcionais em hospitais públicos”.
 
Muito bem! E onde está o crime de pensar o que pensa?  Não é só Barroso que chegou ao Supremo levando uma militância. Quando indicado por Dilma, Edson Fachin era diretor de um tal Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), que promove três causas no tribunal. Prestem atenção:  
1: o IBDFAM acha que a amante tem de dividir com a mulher legítima a eventual pensão por morte do marido; 
2: o IBDFAM acha que cirurgias de esterilização devem dispensar a autorização dos dois cônjuges; 
3: o IBDFAM acha que transexuais que não se submeteram a cirurgias têm o direito de usar o nome pelo qual são conhecidos, o chamado nome social”.

Então parece razoável aos patrulheiros que um presidente da República indique para o Supremo ministros com esse pensamento, certo? E por que não com “o outro”  Terei de fazer uma pergunta incômoda: os críticos da indicação de Martins Filho ou de Alexandre de Moraes esperam o quê? Que Michel Temer indique para o Supremo um esquerdista? Nos EUA, presidentes democratas escolhem para a Suprema Corte nomes com viés de esquerda; já os republicanos apostam nos que têm viés conservador. Não é essa a natureza do jogo, desde que se aceite o primado da lei?

Vamos parar com essa patrulha asquerosa e autoritária!  Um conservador, na democracia, busca, acima de tudo, a conservação das instituições, não das iniquidades. E esse pensamento está a fazer falta no Supremo.
Que o presidente Temer não se deixe intimidar!

Fonte: Blog do Reinaldo Azevedo