Presidente fez chegar aos líderes militares, contrariados com a sugestão, que não dará curso à ideia
[para um bom inicio de Governo, até que as coisas peguem um rumo, a divisão ideal seria:
economia: Presidente Bolsonaro e Paulo Guedes;
assuntos militares: Presidente Bolsonaro, Alto Comando das Forças Armadas em articulação com o general Fernando Azevedo;
demais assuntos: Presidente Jair Bolsonaro e ministro da área envolvida.]
Em mais um recuo após a má repercussão da
ideia, o presidente Jair Bolsonaro (PSL) fez chegar aos comandantes militares e
oficiais generais da cúpula das Forças Armadas a informação de que não
haverá nenhuma base americana instalada no Brasil durante seu mandato. Segundo a Folha apurou com oficiais
generais que receberam o recado, a mensagem foi passada pelo ministro da
Defesa, general Fernando Azevedo e Silva.
Bolsonaro havia citado a possibilidade da instalação de uma base dos
EUA, país com o qual vem travando uma aproximação agressiva desde que
foi eleito, durante na semana passada.
Seu chanceler, Ernesto Araújo, confirmou a intenção na sequência. Ela
foi elogiada, em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, pelo
secretário de Estado dos EUA, Mike Pompeo, que esteve na posse do
presidente no dia 1º. A declaração pegou os militares de surpresa, ainda mais vinda de um
egresso das fileiras do Exército conhecido pela retórica nacionalista.
O Alto Comando do Exército, centro de gravidade do poder militar
brasileiro, expressou seu descontentamento em conversas de seus membros
—os generais de quatro estrelas, topo da hierarquia. Azevedo e Silva,
que foi do colegiado e hoje está na reserva, conversou com Bolsonaro.
Os EUA possuem mais de 800 bases em cerca de 80 países, mas nenhuma
ativa na América do Sul. Estiveram presentes na Colômbia em acordo com o
governo local, dando apoio ao combate às FARC (Forças Armadas
Revolucionárias da Colômbia).
Atuaram no Paraguai e, de 1999 a 2009, ocuparam uma base no Equador.
No caso colombiano, há talvez mil militares americanos ainda em solo
após o acordo de paz entre governo e Farc, em 2016. Mas o plano de
estabelecimento de bases locais foi rejeitado pela Justiça do país.
No Brasil, a simples ideia de haver militares americanos instalados
permanentemente causa urticária ao alto oficialato. O grau do
desconforto, ou de alívio com o recuo, será aferível nesta terça
(8JAN2019): Bolsonaro estará em um almoço em homenagem ao comandante da
Marinha.
A ideia da base contraria os princípios de soberania e busca de meios
de autodefesa estabelecidos pela Política Nacional de Defesa e pela
Estratégia Nacional de Defesa.
Mesmo que prosperasse, ela precisaria de autorização do Congresso, após o presidente consultar o Conselho Nacional de Defesa.
O Brasil só abrigou militares americanos durante a Segunda Guerra
Mundial. Em 1942, a ditadura de Getúlio Vargas cedeu áreas em Natal para
operações aeronavais aliadas no Atlântico, em troca de favorecimento
político e econômico.
Outra preocupação levantada pelos militares diz respeito a precedentes.
A Rússia conversa há anos com a ditadura chavista da Venezuela sobre
instalar uma base na costa caribenha do país, e poderia se sentir
estimulada por um movimento do gênero do Brasil.
De quebra, uma base russa cairia como uma luva para o acossado governo
de Nicolás Maduro, cuja reeleição foi denunciada por Brasil e outros.
A China, que vem comprando posições na exploração de commodities e na
área de energia na região, também poderia buscar alguma parceria,
trazendo elementos exógenos à tradição neutra da região.
A sugestão de Bolsonaro também causou preocupação na Força Aérea
Brasileira, mediadora das negociações para o estabelecimento de um
acordo com os americanos para o uso comercial da Base de Alcântara, que
tem uma das melhores posições geográficas para lançamento de foguetes do
mundo.
O temor era que a discussão de uma outra base americana fosse levada ao
Congresso, confundindo com o papel da base de foguetes, totalmente
diverso, melando o acordo.
Todo esse contexto leva à dúvida: como Bolsonaro deu curso à possibilidade? Não existe certeza, mas o núcleo militar do governo, formado por
generais da reserva em altos cargos, não havia sido ouvido sobre o caso.
A Folha ouviu de oficiais da ativa que as suspeitas todas recaem sobre o
novo chanceler, que é um fã declarado do governo de Donald Trump e
considera o presidente americano um líder no suposto embate entre os
valores ocidentais e o globalismo.
Segundo a visão que esposou em artigos e em seu discurso de posse, o
globalismo seria um ataque de raiz marxista a esses valores, e apenas a
união de países de tradição cristã poderia enfrentá-lo.
Isso casa com as ideias do escritor Olavo de Carvalho, que indicou
Araújo. Como o fiador do chanceler no cargo é Eduardo Bolsonaro,
deputado pelo PSL-SP e filho do presidente, os militares crêem que a
ideia emergiu por meio da influência familiar. De uma forma ou de outra, assim como teve a decisão de subir impostos
desmentida pela área econômica na sexta (4), Bolsonaro teve de recuar. E o fez numa área delicada, já que há um complicado equilíbrio entre os
influentes militares de sua equipe e as Forças Armadas, que os apoiam,
mas que temem politização de suas fileiras.
Nota DefesaNet
Duas matérias publicadas no mesmo dia (08JAN2019), que devem ser lidas em conjunto.
Valor