A relevância do tema corrupção, ainda mais acrescido de uma dimensão de
guerra partidária, tem poder incomum de concentrar atenções. Mas não de
justificar o quase segredo em que avançam no Congresso as discussões e
negociações de importância fundamental para a vida dos brasileiros, a
partir já de futuro próximo.
São medidas com influência na vida de cada um, sejam quais forem
religião, cor, etnia, profissão, ideologia e nível de instrução. Mas,
pode-se dizer sem maior exagero, ninguém sabe que tais medidas estão em
processo de elaboração. Ou seja, os interessados, mais do que alheios,
estão excluídos da definição de opções em que têm direito pleno de
participação, não importa por qual dos tantos meios possíveis.
A eleição só dos mais votados, por exemplo, extinguindo-se a
possibilidade de novos Enéas e Tiriricas puxarem candidatos que não
receberam votos nem na família, mudaria muito a composição de Câmara e
Senado. Logo, da representatividade hoje ausente dessas Casas. E
influiria na feição dos partidos, no seu grau de individualidade
política e mesmo no número deles. Diz respeito, portanto, às relações da
população com o "seu" Congresso.
E a eleição deve continuar como é, ou realizar-se por processos novos
como o voto distrital, o distrital misto ou distrital regionalizado?
Distritão ou distritinho, que os eleitores nem sabem como são? Com os
candidatos financiados por dinheiro público, como quer o PT; por doações
de empresas só para um partido e até um limite, na proposta do PMDB;
por doações de empresas como hoje, como o PSDB prefere, ou só por
doações pessoais, tese com adeptos em muitas áreas?
Estas e outras opções, sob o título geral de reforma política, podem
manter o país tal qual é, mudá-lo pouco ou dar-lhe a oportunidade de
transformações profundas e extensas, cada uma delas influindo à sua
maneira, inclusive, nas raízes políticas e negociais da grande
corrupção.
Tudo muito importante, vê-se, para estar só na mão dos que têm interesse
material e financeiro nas escolhas. No Senado há vários projetos em
curso, a Câmara de Eduardo Cunha já tem até uma "comissão especial da
reforma política", cujo relator, o piauiense Marcelo Castro, do PMDB,
quer uma pesquisa de opinião para orientar o relatório. Mas não, como
suporia um democrata otimista, uma sondagem pública. Pesquisa, isto sim,
das preferências dos deputados. Pois é isso mesmo que você pensou.
Mas não é o caso de responsabilizar deputados e senadores pelo
desconhecimento da população sobre o seu futuro como discutido e
decidido ao gosto dos congressistas. A internet, em si mesma, também é
inocente. As tais "redes" que dela fazem usos e não menos abusos, os
demais meios de comunicação, os sindicatos e suas centrais sindicais, as
modistas "organizações sociais", e os meios de comunicação
convencionais são os alienados causadores da alienação involuntária dos
cidadãos. São aqueles mesmos que atacam a inércia antirreformista do
governo e do Congresso e clamam pela reforma política.
Informação e ação pública andam a reboque. Agora mesmo, o PSDB, até há
pouco notório defensor da terceirização contrária aos direitos
celetistas dos assalariados, passou a ter posição moderada para não se
confirmar, ante a reação pública à proposta, como antissocial. Indício
claro de que o Congresso, repleto de divisões, não obtém da sua aparente
força atual as condições para fechar os ouvidos aos eleitores.
Nem sempre quem cala consente. Depende de estar ou não informado.
Jânio de Freitas - Folha de São Paulo
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