Novo relator do maior caso de corrupção do país, Luiz Edson Fachin é um ministro discreto, que costuma seguir o padrão das decisões tomadas antes pelo Tribunal
Menos de 24 horas após ser escolhido como o novo relator da Operação Lava Jato pelo complexo algoritmo que comanda o sorteio dos processos em tramitação no Supremo Tribunal Federal (STF), o ministro Luiz Edson Fachin reuniu-se com o procurador-geral da República, Rodrigo Janot. Queria checar a metodologia de trabalho dos procuradores e conhecer a extensão da delação da Odebrecht. Conhecido por ser um ministro técnico, Fachin chegou ao Supremo em meados de 2015 por indicação da ex-presidente Dilma Rousseff e em menos de um ano e meio assume o que será seu maior desafio em sua carreira como juiz. Nas próximas semanas, ele terá de lidar com a maior delação já feita por uma empresa brasileira. No total, 77 executivos da Odebrecht concordaram em falar às autoridades brasileiras sobre as relações que mantinham com políticos de todos os matizes e níveis hierárquicos. O acervo contém desde doações de campanha em troca de favores pessoais até superfaturamento de contratos com a Petrobras para o pagamento de propinas. A delação guarda uma inédita capacidade de convulsionar o país.
Fachin recebia o governador do Rio de Janeiro, Luiz Fernando Pezão, em seu gabinete, na quinta-feira, quando o resultado do sorteio eletrônico que o tornou relator da Lava Jato foi divulgado. O ministro, consciente do desafio que o aguarda, agiu rápido ainda naquela manhã. Chamou a seu gabinete o juiz Márcio Schiefler, braço direito que auxiliava Teori Zavascki na condução da Lava Jato no Supremo. Eles conversaram rapidamente para iniciar o processo de transição. O juiz, convocado da Justiça de Santa Catarina para auxiliar nos trabalhos do STF, pediu na última semana à ministra Cármen Lúcia para voltar a sua jurisdição de origem. Contudo, por ser considerado uma espécie de backup humano dos trabalhos feitos por Teori, morto em acidente aéreo no dia 19, o juiz Schiefler deve atender aos apelos feitos por Cármen e pelo próprio Fachin e postergar seu retorno em alguns dias para ajudar na transição que migrará a Lava Jato do 3o andar (onde ficava o gabinete de Teori) para o 5o (onde Fachin despacha).
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Desde que foi anunciado, em maio, até sua sabatina e aprovação pelo Senado, um mês depois, a vida de Fachin foi vasculhada por políticos, jornalistas e usuários de redes sociais. Entre os pontos questionados sobre sua conduta estava o apoio público declarado por ele à candidatura de Dilma Rousseff ao Palácio do Planalto em 2010. Além disso, foi questionado se o então professor de Direito da Universidade Federal do Paraná poderia ter advogado ao mesmo tempo que ocupava o cargo de procurador-geral daquele estado. Fachin ainda teve de se explicar publicamente sobre a proximidade com movimentos sociais, como o Movimento Sem Terra. Ainda que com muita resistência, 27 votos contrários à escolha de seu nome, Fachin passou e, com sua aprovação, essa primeira crise foi contornada.
De certa forma, a escolha de Fachin para relatar a Lava Jato no Supremo agradou à Procuradoria-Geral da República e também ao juiz Sergio Moro, que afirmou em nota que o ministro é “jurista de elevada qualidade”. Fachin e Moro têm em comum o Paraná. Embora gaúcho de nascimento, o ministro fez toda sua formação acadêmica naquele estado. Ainda que vejam com bons olhos a escolha de Fachin, investigadores aguardam atentos o resultado da reformulação pela qual seu gabinete deve passar para dar conta do aumento no volume de trabalho.
Em um ano e meio de atuação como ministro do Supremo, Fachin já deixou algumas marcas. Ele adota um jeito próprio de falar, considerado muitas vezes confuso por aqueles que o ouvem ou leem. Tem um linguajar técnico, acadêmico. Recorre com frequência a vocábulos pouco usuais, até para juristas, e usa a ordem indireta para construir frases. Já em suas decisões, o ministro vem cumprindo o que afirmou em sua sabatina na Comissão de Constituição e Justiça do Senado: reafirma a jurisprudência da Corte. Não é do time de ministros que, diante de um caso igual, surpreende com um entendimento inesperado. Se seguir o padrão na Lava Jato, Fachin deve manter as decisões tomadas pela primeira instância, pois é assim que o Tribunal tem decidido.
Fachin fez assim em agosto do ano passado quando, ao voltar do recesso do Judiciário, mandou prender o prefeito de Marizópolis, na Paraíba. Com o ato, desfez uma decisão tomada pelo então presidente do Supremo, Ricardo Lewandowski, durante o plantão no recesso. Lewandowski entendeu que o prefeito poderia recorrer à última instância em liberdade. Fachin, contudo, mandou que se cumprisse a jurisprudência da Corte – meses antes, o Supremo decidira que um réu deve iniciar o cumprimento da pena após a condenação em segunda instância.
Por outro lado, o ministro surpreendeu no exame do impeachment da presidente Dilma Rousseff. No começo de dezembro de 2015, Fachin mandou suspender a tramitação do impeachment na Câmara, ao acatar um pedido de liminar impetrado pelo PCdoB. Semanas depois, quando o tema foi levado ao plenário, Fachin decidiu pela manutenção do rito estabelecido por Cunha. Acabou vencido. A maioria do plenário seguiu o voto do ministro Luís Roberto Barroso.
Fachin é também o relator de uma ação penal da qual Renan Calheiros, do PMDB de Alagoas, é alvo. O ministro levou para plenário a denúncia que estava parada no Supremo desde 2013, sob relatoria de Lewandowski. Fachin recebeu críticas inicialmente quando, em meados do ano passado, retirou o tema de pauta a pedido dos advogados. Nos bastidores circula a informação de que ele aceitou os pedidos para que a Procuradoria corrigisse algumas imprecisões na denúncia e evitasse, assim, uma nulidade do processo no futuro. Contudo, apenas dois meses antes de deixar o comando do Senado, Renan virou réu pelas mãos de Fachin e da maioria do colegiado da Corte.
Com a relatoria definida, o Supremo ainda tem uma cadeira vaga que deverá ser ocupada pelo ministro a ser indicado pelo presidente Michel Temer. Ao deixar o velório de Teori Zavascki, em 21 de janeiro, o presidente da República disse que aguardaria a presidente do Supremo, Cármen Lúcia, definir a relatoria da Lava Jato para indicar o próximo magistrado que vai compor a Corte. Esse foi o combinado entre Executivo e Judiciário, para que o 11o ministro não chegasse ao Tribunal sob a pena de julgar a Lava Jato como tarefa primeira.
O novo ministro julgará a Lava Jato apenas nos casos que forem levados para o plenário.
De acordo com uma modificação feita no regimento interno em 2014, as matérias penais são julgadas majoritariamente nas duas Turmas da Corte, composta cada uma delas por cinco magistrados. Apenas o presidente do STF fica fora desses dois colegiados. Para o plenário são endereçados apenas aqueles casos que são referentes a presidentes de Poder: casos de Temer, do presidente da Câmara, Rodrigo Maia, e do presidente do Senado, Eunício Oliveira. Os três estão entre os citados em delações da Odebrecht.
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