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sábado, 14 de março de 2020

Difícil proteção da economia - Míriam Leitão

O Globo 

Guedes tem que achar recursos e atenuar crise

A arrecadação vai cair porque a atividade econômica está se enfraquecendo, a privatização da Eletrobras pode não acontecer — ou por não ser aprovada pelo Congresso, ou pela volatilidade dos preços das ações — os royalties de petróleo serão menores do que o previsto. O crescimento será mais baixo ainda do que a nova previsão feita pela equipe econômica. O déficit vai aumentar. É improvável que o governo consiga cortar despesas na mesma dimensão da perda de receitas. Por isso o déficit vai subir. A dúvida é sobre a dimensão do pacote de estímulo econômico para mitigar os efeitos do coronavírus.

O Ministério da Economia ainda não concluiu as projeções da redução da receita com a queda da expectativa de crescimento que fez esta semana. Reduziu de 2,3% para 2,1%. Terá que diminuir mais. A cada revisão precisará cortar a receita prevista e fazer o contingenciamento da despesa. Uma coisa se sabe nesta altura da pandemia: não poderá cortar em saúde, a maior despesa do orçamento. Pelo contrário, terá que  elevar. As convicções fiscalistas da atual equipe econômica serão testadas.

Esta semana marca o momento importante em que a equipe econômica sai da negação. Até agora, a resposta do ministro Paulo Guedes era que enfrentaria a crise com as reformas que estão no Congresso e as que não consegue tirar da mesa do presidente. A administrativa foi esvaziada, e a tributária é muito tímida. Se as propostas fossem boas e amplas, elas produziriam avanços estruturais, mas o governo precisa ter medidas emergenciais para o atual momento de incerteza e eventuais inesperados. Portanto, aprovar reformas pode ser bom, mas não resolve problemas agudos. [impossível cobrar, no curto prazo,  medidas do governo Bolsonaro de recuperação do crescimento econômico.
O coronavírus não é uma ocorrência de rotina e exige esforços concentrados, retardando medidas previstas para a recuperação da economia.
Até que comece a queda das ocorrências de covid-19 - antes de cair tem que passar pelo pico -  a recuperação da economia passa a segundo plano.]

Esses dias em que a bolsa teve quedas abissais e recuperações dramáticas levaram a crise da saúde para dentro da economia. Mesmo um governante irresponsável como o presidente Donald Trump, que negava a gravidade do problema até outro dia, estava ontem decretando emergência nacional. No Brasil, em que o presidente Jair Bolsonaro compartilha tanto com Trump, houve também a compreensão de que era preciso partir para algum tipo de programa de emergência para atenuar os efeitos econômicos da pandemia.

As primeiras medidas anunciadas foram poucas, mas boas. Suspender a  prova de vida, evitando que o aposentado ou a pensionista tenha que ir a  um local cheio de gente é sensato. É impressionante que isso não tivesse sido pensado antes. A segunda decisão, de antecipar o pagamento de metade do 13º, não eleva gastos e coloca já R$ 23 bilhões na economia. Há outras ideias sendo ventiladas, nem todas elas boas: estimular o endividamento através do consignado, inventar novos truques com o FGTS, a Caixa oferecer mais dinheiro para empréstimos.

A mais importante medida foi a mudança de atitude, da negação de que algo além das “reformas” precisasse ser feito à criação de um grupo que ficará dedicado no Ministério da Economia a pensar no assunto.
Alguns setores podem sucumbir, o mais vulnerável talvez seja a área da cultura. De um lado, os produtores culturais e artistas já enfrentavam um governo hostil e estatais que fazem escolhas ideológicas no patrocínio. De outro, passarão a viver a fuga do público e, em alguns casos, a proibição, como São Paulo e Rio de Janeiro, da abertura de cinemas e teatros por 15 dias. [se o público foge dos espetáculos é por não aguentar mais a péssima qualidade do que a chamada cultura nacional produz.]

Em momentos de emergência, em que a conjuntura muda completamente, a equipe econômica tem que mudar a abordagem, preservando o essencial da política econômica. Isso é que não se soube fazer na crise de 2008. No primeiro momento, o Banco Central agiu com precisão cirúrgica, garantindo liquidez. O BNDES ajudou a financiar fusões de empresas que sozinhas não sobreviveriam. O erro veio depois, quando não se soube o momento de parar as desonerações setoriais, que acabaram virando moeda de troca na eleição de 2010.

Em 2008, o país estava com superávit primário de 3,85% e dívida de 55% do PIB. Hoje o déficit é de 0,72% e a dívida, 76%. Os erros de depois da crise é que pioraram as contas públicas. Não há espaço fiscal, já que o país tem déficit, mas os avanços recentes com a reforma da Previdência e a queda dos juros reduziram a pressão de duas grandes despesas. Nesse caminho estreito o governo terá que encontrar respostas para evitar que a economia piore muito e ter recursos para proteger a vida dos brasileiros. [apesar de óbvio, por recorrente, é sempre bom lembrar que o quadro atual foi passado para Bolsonaro - além da maldita  herança petista, fruto da ladroagem do multicondenado e sua genial pupila, impediram (com denúncias que até hoje não foram provadas) que Temer conseguisse governar.]

Míriam Leitão, jornalista - Com Alvaro Gribel, de São Paulo - O Globo


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