Eu teria curiosidade de, um dia, espiar o universo paralelo onde vivem alguns analistas e comentaristas dos nossos grandes meios de comunicação. Deve ser quase como no STF, só que com menos LSD.
Sei que jamais me será dada tal oportunidade, mas deve ser uma experiência muito doida ver em Trump, subitamente, a encarnação do divisionismo na sociedade norte-americana e em Bolsonaro sua réplica brega. Os Estados Unidos sempre tiveram um elevado grau de consenso. As diferenças entre republicanos e democratas eram sutis e esse consenso contribuía para a solidez e pujança daquela sociedade. Acontece que nas últimas décadas passou a atuar sobre ela o mesmo ideário esquartejador que agiu aqui por dentro do poder, como se toda nação fosse um grande açougue onde retalhistas malucos passaram a dividir a sociedade em frações antagônicas.
De fato, perdida a luta de classes, dezenas de outras lutas foram imediatamente chamadas aos tablados e nunca para conversar porque manter os ânimos alterados é parte da estratégia. Talvez você não tenha se interessado ou visto isso acontecer nos Estados Unidos, mas aqui no Brasil, querendo ou não, foi parte contada da armação.
Em matéria de ontem, 01 de novembro, O Globo reuniu um grupo de “especialistas” para concluir que os EUA vivem uma crise identitária causadora de uma “guerra de narrativas”. Ou seja, exatamente como aqui, só que tais especialistas livram Barack Obama e o Partido Democrata de suas responsabilidades na gestação e gestão desses conflitos e os trazem – claro! – para 2016 com a eleição de Donald Trump. Assim, num passe de mágica, no universo paralelo em que vive o movimento revolucionário no Brasil, Trump (e Bolsonaro) deixam de ser consequência para se tornarem causa das divisões criadas durante décadas ao longo das quais ambos viveram à margem do poder político real.
Se as estratégias estabelecidas por influência dos autores da Escola de Frankfurt foram capazes de fracionar desse modo a sociedade norte-americana, imagine o que poderia acontecer em nosso país. Cabe, então a pergunta: quando haverá um novo ano de 2018 se o poder político retornar a qualquer dos partidos que há apenas dois anos perderam a hegemonia no Brasil? [todos, estaremos ferrados e mal pagos, pior é que o Brasil também se ... .]
Percival Puggina (75), membro da Academia Rio-Grandense de Letras e Cidadão de Porto Alegre, é arquiteto, empresário, escritor e titular do site Conservadores e Liberais (Puggina.org); colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil pelos maus brasileiros. Membro da ADCE. Integrante do grupo Pensar+.
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