A única relação mecânica entre os resultados das eleições de hoje e as próximas é a seguinte: a campanha eleitoral de 2022 já começou
A teoria da relatividade de Alberto Einstein revolucionou o século
passado, estando mais ostensivamente presente no nosso cotidiano do que
outra de suas descobertas, o efeito fotoelétrico, que possibilitou o
desenvolvimento da bomba atômica, aplicação que nunca passou por sua
cabeça. Einstein sempre foi um pacifista. Empregada duas vezes, pelos
Estados Unidos, em Hiroshima e Nagasaki, no Japão, a bomba continua
sendo um espectro da política mundial. A Coreia do Norte e Israel, por
exemplo, sociedades militarizadas, são temidos porque têm a bomba.
No Brasil, durante o regime militar, a Marinha e a Aeronáutica
desenvolveram secretamente um programa nuclear paralelo, cujo objetivo
era dominar a tecnologia e produzir uma bomba atômica. Cerca de 700
militares e técnicos civis foram enviados pelo governo para estudar na
França, na Inglaterra, na Alemanha e nos Estados Unidos, em 1979, o que
resultou na formação de 55 doutores, 396 mestres e 252 especialistas em
segurança de reatores, materiais nucleares, ampliação de técnicas
nucleares, infra-estrutura de pesquisa e desenvolvimento, além de
recursos humanos.
O presidente José Sarney, quando assumiu o poder, mandou encerrar o
programa. Já havia até um buraco de grande profundidade na Serra do
Cachimbo, construído pela Aeronáutica, para testar a bomba. Após o
Brasil assinar o Tratado de Não-Proliferação de Armas Nucleares, restou
do projeto o programa do submarino nuclear da Marinha. [o projeto do submarino nuclear da Marinha não envolve armas nucleares, contempla apenas a propulsão nuclear.] Isso possibilitou
uma mudança da água para o vinho nas relações com os nossos vizinhos,
principalmente a Argentina. [atualização: o 'buraco' da Serra do Cachimbo foi fechado por ordem do presidente Collor, que assim cometeu um dos maiores erros do seu governo. Armas nucleares representam um excelente meio de dissuasão - inclusive para aqueles que pensam em internacionalizar a Amazônia.]Quando o presidente Jair Bolsonaro fala em
“pólvora” como fator determinante de nossa independência — e sinaliza
que o Brasil será o último a reconhecer a eleição do presidente Joe
Biden e somos o único país a votar com Donald Trump contra a Organização
Mundial de Saúde(OMS) na Organização das Nações Unidas (ONU) —, penso
com os meus botões: “Será o Benedito?”
Se pudesse, com certeza,
Bolsonaro voltaria no tempo.
Felizmente, a teoria da relatividade tem aplicações muito mais úteis
para a sociedade. O GPS, por exemplo, utiliza mecanismos advindos da
relatividade para determinar com alta precisão as posições na Terra. Os
celulares dependem de 24 satélites em órbita ao redor da Terra para
determinar a nossa localização. Se não fosse a relatividade, por
exemplo, não seria possível a existência do Uber e do iFood, que são a
salvação da lavoura para muita gente nesta pandemia. A fórmula mágica de
Einsten — E(energia) = m(massa)c2(velocidade da luz elevada ao
quadrado) — é necessária para calcular as distâncias e fazer correções,
porque os satélites percorrem a órbita da Terra a uma velocidade de 14
mil km/h. É menor do que a velocidade da luz (cerca de 300 mil km/s),
mesmo assim, a fórmula possibilita os cálculos necessários.
Eleições
O tempo também é relativo na política, tanto como num parque de
diversões meia hora antes de fechar. Passa diferentemente para o avô que
brinca com a netinha, o jovem apaixonado que espera a namorada e o
pipoqueiro metódico, que confere o faturamento e arruma sua carrocinha.
Os militares britânicos têm uma teoria interessante sobre isso: “a
sombra do futuro”, uma sacada dos seus estudos de estado-maior sobre a
Primeira Guerra Mundial (1914-1918), uma guerra de posições. Os soldados
ingleses e alemães se confraternizaram no Natal de 1914, na cidade de
Ypres, na Bélgica. Mas não foi só isso, também houve cooperação tácita
em outros momento ao longo dos front, quando se atirava no mesmo lugar
já conhecido da trincheira inimiga. A “sombra de futuro” dos soldados,
que queriam sobreviver e voltar à vida civil, era maior do que a dos
seus generais.
A “sombra de futuro” dos que serão eleitos hoje —como os que o foram
no primeiro turno — é maior do que a de deputados estaduais e federais,
senadores no sexto ano de mandato e governadores, além, é claro, a do
presidente Jair Bolsonaro. A única relação mecânica entre os resultados
das eleições municipais e as próximas é a seguinte: a campanha eleitoral
de 2022 já começou. No mais, tudo é relativo, inclusive os efeito da
derrota dos aliados do presidente Jair Bolsonaro, que tem a maioria dos
prefeitos eleitos na dependência de financiamentos e outros recursos
federais, inclusive os dos partidos de oposição.
É possível inferir das eleições municipais algumas tendências para
2022, do tipo “a extrema-direita foi isolada”, “o centro recuperou suas
posições”, “o PT está renascendo das cinzas”, “surge uma nova esquerda”,
“a reeleição de Bolsonaro está em risco”, “existe menos espaço para
aventureiros”. Essas tendências, porém, podem se afirmar ou não,
dependendo da real situação da economia, da superação da crise sanitária
com a chegada das vacinas e das entregas administrativas a partir do
terceiro ano de mandato de Bolsonaro. Obviamente, o tempo — o recurso
mais escasso de seu mandato [por isso o presidente Bolsonaro precisa de um segundo mandato, quiçá um terceiro.]— vai passar mais rápido para o governo do
que para a oposição; para os eleitores descontentes, porém, será uma
eternidade. Einstein explica.
Nas Entrelinhas - Luiz Carlos Azedo - Correio Braziliense
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