Fachin bagunçou o coreto eleitoral, bem na hora mais dramática; Lula e Bolsonaro agradecem penhoradamente
Tudo
já caminhava para a anulação das condenações e o
resgate da elegibilidade do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para
2022, mas o ministro Edson Fachin arranjou um atalho e
chegou direto lá. E justamente no dia em que o presidente Jair Bolsonaro reclamou,
enigmático, que “alguns estão se excedendo”. Ganha Lula,[???; sua lenga-lenga não convence a mais ninguém, além do que ele não foi inocentado, apenas será submetido a novo julgamento] de volta ao palanque,
ganha Bolsonaro, com o pretexto e o desvio do foco na pandemia, e ganha, enfim,
a polarização que tantos prejuízos causa ao País. [perdem: os inimigos do Brasil, os inimigos do presidente, os arautos do pessimismo - as poucas chances que ainda restam de atrapalhar o governo Bolsonaro sofrem mais redução, e terão que optar entre um criminoso condenado e um presidente que insistem em não deixar governar.]
“Eu quero paz, tranquilidade, democracia, respeito às instituições, mas... alguns estão se excedendo”, disse Bolsonaro depois de falar no “meu Exército” e horas antes da decisão monocrática de Fachin. Referia-se a outras questões, como lockdown e toque de recolher na pandemia, e a ameaça velada era a outros atores, como governadores e prefeitos. Mas a decisão de Fachin pode servir de pretexto...
Indiretamente, isso remete à “advertência” do então comandante do Exército, general Eduardo Villas Bôas, na véspera de uma decisão do mesmo Supremo sobre a prisão do mesmo Lula. Mas com uma diferença: em 2018, Lula era forte e o objetivo era tirá-lo do páreo para a Presidência; para 2022, o Planalto considera Lula o melhor adversário para Bolsonaro. [sempre destacando que quase 30 meses após o alerta do general Villas Bôas, é que o ministro Fachin que na época silenciou, partiu para críticas, gerando provocações e atiçando o 'deputado Daniel Silveira'. Só não se instalou uma crise entre a Câmara dos Deputados e o Supremo, devido aquela Casa Legislativa ter optado por abrir mãos de sua competência constitucional - imagine se os deputados revogam a prisão do parlamentar.]
Logo,
se o Comando do Exército liberou seu comandante e sua conta no Twitter para
tentar impedir a soltura e a candidatura de Lula há três anos, hoje, ao
contrário, há uma dissimulada comemoração no governo do capitão e dos generais.
“O melhor oponente do presidente é o Lula! Sem estresse”, reagiu uma das
chamadas “altas fontes” do governo ontem. O
processo em curso no Supremo começou com a liberação, para a defesa de Lula,
dos diálogos dos procuradores da Lava Jato de Curitiba com o então juiz Sérgio Moro. Foi o start para,
depois, declarar a suspeição de Moro e anular as condenações de Lula – primeiro
pelo triplex do Guarujá, pelo qual ele foi preso, e depois pelo sítio de
Atibaia, pelo qual foi condenado em duas instâncias. O gran finale seria a
elegibilidade para 2022. [as condenações foram anuladas, os crimes existiram e as provas continuam válidas. O acusado será julgado e condenado por outro magistrado = mais uma sentença a corroborar as anuladas. Lembrando sempre que uma das duas condenações foi proferida por Moro e a outra pela juíza Gabriela Hardt - sendo que a primeira foi corroborada por todas as instâncias, faltando apenas o Vaticano.]
O preço, porém, sairia caríssimo: a anulação em cascata das condenações e prisões dos demais implicados e até dos R$ 4 bilhões devolvidos por corruptos de diversas estirpes aos cofres públicos. Fachin facilitou as coisas, logo ele que une duas personas aparentemente inconciliáveis: uma tem vínculo de alma com o ex-presidente Lula, outra tem sido voto certo pró-Lava Jato. Assim, sua decisão beneficia Lula, mas tenta preservar a Lava Jato.
Após anos, Fachin decidiu que, como os processos de Lula não envolviam só a Petrobrás e não tinham a ver com Lava Jato, não eram de competência da 13.ª Vara de Curitiba e, sim, da Justiça Federal no DF. Pronto. Tudo que se refere a Lula volta à estaca zero, mas o STF não precisa, por “perda de objeto”, decretar a suspeição de Moro – que seria a morte da Lava Jato. A dúvida é se Gilmar Mendes vai deixar por isso mesmo.
Para
além das formalidades e atalhos jurídicos – que ainda têm muito chão, já que a
decisão de Fachin foi monocrática –, o efeito mais explosivo é político. Com
Lula, a eleição de 2022 é uma. Sem ele, é outra. Se Bolsonaro é absurdo e
perigoso na pandemia e em tudo, ainda conta com firmes seguidores e com a alta
rejeição a Lula para repetir 2018: ruim comigo, pior com ele! Ontem, teve duas
vitórias: a pandemia em segundo plano e as Bolsas em queda por ojeriza a
Lula. [a pandemia continua presente, está sendo combatida e será vencida. Se o agora condenado é rejeitado pela maioria dos brasileiros e as Bolsas, sabiamente, o rejeitam - por ser ele a pior opção para o Brasil - a culpa não é do presidente Bolsonaro.]
Resta saber, agora, se o PT e as esquerdas vão finalmente cobrir o inacreditável vácuo de oposição e se o tal centro, tão difuso, desconjuntado, tem como cavar algum espaço entre Lula e Bolsonaro. Fachin bagunçou o coreto eleitoral, bem na hora mais dramática da pandemia e do próprio Bolsonaro. Lula e Bolsonaro agradecem penhoradamente.
Eliane Cantanhêde, jornalista - O Estado de S. Paulo
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