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segunda-feira, 13 de setembro de 2021

O Circo Brasil Vermelho - Revista Oeste

Augusto Nunes
 

Ainda não desisti de juntar no mesmo picadeiro todas as subespécies do comunismo à brasileira

Por falta de um BNDES irresponsavelmente perdulário, como o que torrou bilhões de reais nos tempos de Lula e Dilma, jamais saberei se o Circo Brasil Vermelho me transferiria dos apartamentos da classe média para as coberturas dos ricaços. A ideia foi parida pelos eventos de dimensões siderais ocorridos no último quarto do século 20. Como um personagem de Nelson Rodrigues, acompanhei com o olho rútilo e o lábio trêmulo a queda do Muro de Berlim, em 1989, o meteórico derretimento da União Soviética, em 1991, e, num mundo redesenhado em dois anos, o fim da Guerra Fria. Convalescia do espanto quando constatei, assombrado, o sumiço da espécie que proliferava desde 1848 no Velho Continente: o comunista europeu. Nenhum desses filhotes da Mãe Rússia resistira à surpreendente orfandade. Marx, Engels, Lenin, Stalin e outros alvos da adoração da seita pareciam coisa de tempos remotíssimos. Mais grisalhas que o Império Romano, mais antigas que as pirâmides do Egito, as divindades sem devotos não espantariam ninguém se revelassem que haviam testemunhado o desentendimento inaugural entre Abel e Caim.

Todos acham que Cuba só não virou uma Inglaterra em espanhol por causa do bloqueio imposto pelos EUA

E então bateu-me a certeza de que nada disso ocorreria no impávido colosso nascido para desafiar a lógica e desmoralizar a razão. Só o Brasil fala português. No subcontinente amalucado, foi império enquanto a vizinhança proclamava a independência de republiquetas, virou República sem abdicar da nostalgia pelos dois Pedros e, depois de exigir nas ruas a volta das eleições diretas para presidente, é frequentemente governado por vices dispensados da luta pelo voto. Na terra em que se plantando tudo dá, é compreensível que tenha vicejado e seja hoje amplamente majoritário o comunista que esconde que é comunista. Com a morte de Luiz Carlos Prestes e Oscar Niemeyer, comunistas confessos tornaram-se tão raros quanto a ararinha-azul. Os militantes do Partido da Causa Operária (PCO), mesmo quando não estão a bordo da van em que cabe a turma toda, não ocultam o sonho de reprisar no Brasil o pesadelo imposto por 70 anos às nações subjugadas pelo império soviético. 

Em contrapartida, até os filiados ao Partido Comunista do Brasil (PCdoB) preferem negar o que o nome de batismo afirma. Seguindo o exemplo dos primos ideológicos homiziados no PT, no Psol e em outras legendas, declaram-se apenas esquerdistas, recitam juras de amor ao Estado Democrático de Direito e fazem de conta que a busca obsessiva da ditadura do proletariado foi substituída pela construção da sociedade socialista. Todos capricham nas fantasias. Mas não é difícil reconhecer um comunista sob a camuflagem de guerreiro da liberdade..

O disfarce desanda quando a conversa é desviada para questões internacionais. Todos acham que Cuba só não virou uma Inglaterra em espanhol por causa do bloqueio imposto pelos Estados Unidos. Amam o paraíso caribenho, mas rejeitam a socos e pontapés a ideia de lá morar porque antes precisam dar um jeito no Brasil. Queriam ser Fidel quando crescessem e mantêm pendurado num velho guarda-roupa aquele pôster de Guevara. Depois da segunda dose de rum e da terceira baforada, miram a fumaça do charuto enquanto murmuram a doce lição do carrasco do paredón: Hay que endurecer, pero sin perder la ternura

Comovidos com o sofrimento dos palestinos, admitem que não seria má ideia afogar Israel no Mar Vermelho, ou dissolver a única democracia da região com uma bomba atômica de procedência iraniana. Ainda inconformados com a partida precoce de Hugo Chávez, aprovam o desempenho de Nicolás Maduro com um único reparo: na Venezuela há democracia até demais. Torceram pelas FARC contra os presidentes eleitos pelos colombianos, e agora exigem uma anistia ampla, geral e irrestrita para os colecionadores de sequestros e assassinatos.

Quem não tiver paciência para enfrentar o tsunami de cretinices pode chegar à verdade pelo caminho mais curto: basta chamar de “americano”  alguém nascido nos Estados Unidos. O certo é norte-americano, ouvirá no segundo seguinte. Melhor ainda: estadunidense. As incontáveis correntes, tendências, alas e facções em que se divide o conglomerado dos comunistas brasucas aprende ainda no berçário que qualquer filho da América é americano. É preciso, portanto, revogar com urgência urgentíssima outra afronta arquitetada pelo país que, por considerar-se dono do planeta, expropria até palavras. A esquerda não se une nem na cadeia, dizia-se nos botequins em que se agrupavam guerrilheiros de festim. Errado.  Todas as ramificações sempre estiveram unidas no ódio ao imperialismo ianque. É esse o Grande Satã universal, o inimigo comum e irremissível, a origem de todas as angústias, dores e tragédias que afligem o resto do galáxia, o Mal a ser erradicado. 

O balaio esquerdista festejou o 11 de setembro de 2001 e chorou quando Osama Bin Laden virou banquete de peixe.
Agora celebra a reconquista do Afeganistão pelo Talibã. Não está claro se mudará de lado com a entrada em cena da dissidência do Estado Islâmico que acha moderados demais tanto os decepadores de cabeças quanto os que garantem que mulher sem burca é homem — e outro infiel a explodir.
 
A ideia do Circo Brasil Vermelho amadureceu quando entendi que as extravagâncias aglomeradas nas malocas do comunismo à brasileira dariam um zoológico e tanto. 
Por que não juntar num mesmo picadeiro representantes de cada subespécie, e enriquecer com excursões pelo mais civilizado dos continentes?
Quem nasceu depois de 1980 não perderia a chance de conhecer, por um punhado de euros, tantas evidências de que o melhor do realismo mágico é menos delirante que o acervo de esquisitices que abundam por aqui.  Em vez de ursinhos ciclistas, por exemplo, a plateia veria a filósofa Márcia Tiburi, escalada pelo PT, empunhando um megafone para resumir em duas frases a Teoria da Supremacia Anal: “O xx é sobretudo laico. A gente tem de libertar o xx”
Em vez de afligir-se com os voos dos trapezistas, os espectadores se divertiriam com o jornalista designado pelo Partidão. Inventor do Uber gratuito para terroristas, ele contaria como conseguiu resistir bravamente a torturas sofridas por outros presos. 
Um jogral do PCdoB declamaria pensamentos do homicida albanês Enver Hoxha
O decano do PSTU berraria “morte à burguesia” em javanês. 
E o mais recente filiado ao Psol repetiria em linguagem tupi a primeira coisa que diz o filho do casal de devotos que acabou de aprender a falar: “Morte ao imperialismo ianque”. A segunda é “mamãe”. Trinta anos depois da implosão do Leviatã soviético, a paisagem política brasileira não ficou tão diferente. As atrações de picadeiro continuam por aí. Não devo desistir de virar dono de circo.  

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Augusto Nunes, colunista - Revista Oeste

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