Poucas coisas tão postiças quanto a sabedoria dos intelectos vaidosos. E
poucos tão infelizes quanto os que pretendem fruir o poder com esse
canudinho, no próprio copo, como refresco.
A vaidade
corriqueira das celebridades fugazes que causa frenesis em auditórios de
pouco juízo e a decorrente dos atributos físicos são menos maléficas
que a dos enfatuados pelo próprio intelecto. Para estes, todo espelho é
mágico e lhes atira beijos. Lambem seus títulos. Devoram as próprias
palavras após pronunciá-las para que nada se perca de seu sabor. E vão
engordando de lipídios um orgulho autógeno, encorpado pelas lisonjas
alheias e pelas que generosamente dedicam a si mesmos.
De quem falo?
Bem, pessoas assim estão por toda parte. Não posso dizer que formam um
exército numeroso porque não há exército composto apenas por generais de
quatro estrelas. Andam dispersos, portanto. Mas se há um lugar onde,
por dever de ofício, se reúnem expoentes de tal conduta, esse lugar é o
STF.
Chega a ser divertido assisti-los desde a perspectiva pela qual
eles mesmos se veem. Aferi-los pela infinita régua com que se medem.
Apreciar o esforço que fazem para ostentar sabedoria.
As frases lhes
saem lustradas, polidas como corneta de desfile. Não que isso seja mau
em si, mas chama atenção como parte da grande encenação das vaidades
presentes.
Imagino que por vezes se saúdem assim: "E sua vaidade como
vai, excelência?". Ao que o outro retruca, cortesmente: "Bem, bem,
recuperando-se do que li ontem no Twitter, mas as perspectivas são boas,
obrigado ministro".
Nada mais
próprio do que a palavra "corte" para designar aquele colegiado (cuja
institucionalizada importância – esclareço porque não quero ser mal
entendido – ergue-se a despeito dessas fragilidades humanas). É uma
corte.
É uma corte onde todos exercem, sobre o Direito a que estamos
submetidos, uma soberania irrestrita, que flutua em rapapés e infla os
egos à beira do ponto de ruptura.
Ali, cada um
que fala se percebe como o Verbo. As palavras saem numa espécie de sopro
divino, criador, forma verbal das cintilações de astro rei. Ante tal
brilho só se chega usando óculos escuros e protetor solar.
Os membros de
nossa Suprema Corte talvez se bastem com a própria vaidade.
Mas a
vaidade ou a fruição do poder como refresco sorvido nesse canudinho não
são suficientes para os fins que pretendem.
Há uma distinção que já era
bem conhecida dos romanos. O poder (“potestas”) não se confunde com
autoridade (“auctoritas”) aquele se pode dizer inerente ao cargo, esta
porém depende de atributos com reconhecimento social, entre os quais não
se inclui a vaidade.
Foi-lhes
dado, senhores, o poder para decidir o que bem entendam, mas há uma
Constituição. Decidam, mas instituir uma “religião” e verdades
estatizadas como ferramenta do poder não gera autoridade reconhecida
entre cidadãos livres.
Percival Puggina (77), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto,
empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de
dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o
totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do
Brasil. Integrante do grupo Pensar+.
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