Disse alguém, não sei quem: “Cuidado com o que toleras. Podes estar ensinando os outros sobre como devem te tratar”.
É na esteira de sucessivas tolerâncias
que a tirania avança no Brasil. Não preciso mencionar o longo caminho
percorrido. Enquanto o ministro Alexandre de Moraes operava seus
sigilosos, ameaçadores e inconclusos inquéritos, alegando agir em defesa
da democracia e do estado de direito, a tirania estendia as mãos sobre
os demais poderes do Estado e sobre a liberdade de opinião dos cidadãos.
As redes sociais haviam sido o principal
instrumento através do qual a direita democrática, conservadora e
liberal vencera o pleito de 2018. Era preciso minimizar essa influência.
Opiniões “perigosas” sobre liberdade e valores tinham que ser contidas.
O cidadão comum, com essas ideias, cuja propagação se viabilizara com
as plataformas, era o adversário a ser combatido. E foi o que se viu.
Queda de perfis, desmonetizações, multas astronômicas, investigações
criminais abertas para assim ficarem, etc. Os fatos e números da
repressão foram pingados como “gotas de colírio” nos olhos até de quem
não os queria ver.
“Fake news” foi a expressão vadia do vocabulário para justificar tudo, inclusive o silenciamento ou a negação da verdade.
Há meses não se consegue publicar uma
nota sobre assunto de viés político sem que surjam insistentes
advertências sobre o TSE como fonte de informações ou sobre o TSE e o
resultado final da eleição.
Para que raios a onipresença do Estado e de
sua corte eleitoral em todos os conteúdos políticos das redes sociais?
Que coisa mais ostensivamente cubana!
A situação que descrevo não é
antidemocrática?
Não é
antidemocrático suprimir o acesso às redes sociais?
Não é
antidemocrático contratar empresa para soltar cães farejadores no espaço
digital?
Não é mais antidemocrático ainda cancelar redes sociais de
congressistas, suprimindo-lhes os meios modernos para o pleno exercício
da representação constitucionalmente a eles atribuída?
A cada avanço, um recuo. A cada abuso
tolerado, mais um trecho da estrada dos abusos é pavimentado e aberto ao
tráfego. Até que um dia a casa cai. É o que ensina a longa história dos
povos.
Percival Puggina (77), membro da
Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e
titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de
dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o
totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do
Brasil. Integrante do grupo Pensar+.
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