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terça-feira, 19 de dezembro de 2023

Um comunista no STF. E agora?- Revista Oeste

Ana Paula Henkel

Entendo que muitos estão desanimados, mas não há outra opção a não ser seguirmos firmes pelo país que não apenas queremos — mas devemos — deixar para os nossos filhos


 Sabatina na CCJ do Senado do atual ministro da Justiça e senador licenciado, Flávio Dino, indicado para o cargo de ministro do STF | Foto: Lula Marques/Agência Brasil


E agora seguimos. Esta é a única resposta possível para a pergunta do título deste artigo que paira sobre nossos apreensivos corações e mentes desde a sabatina de Flávio Dino para uma cadeira de ministro do Supremo Tribunal Federal, na quarta-feira, 13 de dezembro.

Entendo que muitos estão e estarão desanimados com mais uma pedrada em nossa cabeça, com mais este descalabro contra o país, com mais um deboche do sistema contra uma nação que não aguenta mais tanto cinismo e falta de escrúpulos. Tudo isso nos desanima? Sim. 
A esperança cambaleia? Com certeza. Não fingirei que uma confiança olímpica invade meus pensamentos e, como em um filme inspirador com trilha à la Rocky Balboa, toma conta do meu ser, e eu sigo convicta sem pestanejar. Isso não é verdade. 
Mas não há outra opção a não ser seguirmos firmes pelo país que não apenas queremos — mas devemos — deixar para os nossos filhos. Simplesmente não há. Receio do que está por vir? Claro. Mas agora já é uma questão de sobrevivência. E qualquer medo precisa ser encarado. O problema não é ter medo, é não enfrentá-lo.Flávio Dino (centro), posa ao lado de foliões, no Carnaval de São Luís (MA) – 18/02/2023 | Foto: Reprodução/Instagram 
 
No rescaldo de uma batalha política desafiadora que coloca muito do nosso futuro em jogo, o primeiro passo para a recuperação envolve a introspecção. 
A resiliência é a base sobre a qual se pode reconstruir após o tumulto de uma queda brutal. 
Resiliência, palavra tão usada hoje em dia como quem troca de roupa, vai além da mera resistência; envolve o cultivo ativo de uma mentalidade que prospera diante da adversidade. 
Desenvolver resiliência requer um compromisso com o autocuidado, tanto mental quanto emocionalmente. Resiliência não consiste apenas em resistir à tempestade, mas em usar sua força para se impulsionar para a frente.

Não, não é fácil abrir os jornais apenas um dia depois da sabatina “chá das cinco” de Flávio Dino (e da pífia performance de alguns senadores de oposição, completamente despreparados para enfrentar o que estava diante de nós) e ver a aprovação de mais um peão ideológico do Foro de São Paulo, agora para a corte mais alta do país, com Lula conclamando o feito: “Vocês não sabem como eu estou feliz hoje. Pela primeira vez na história desse país, nós conseguimos colocar na Suprema Corte um ministro comunista, um companheiro da qualidade do Flávio Dino”.

Como não se abater,
já que tudo isso batia em nossa porta já havia algum tempo? Para mim, mergulhando na história e nos exemplos de quem enfrentou exatamente os mesmos tentáculos ideológicos e perversos do comunismo e suas vertentes, e que chicotearam nações com muito mais crueldade.

Sem conseguir dormir, fui ontem até João Paulo II, o papa que viu e viveu o nazismo e depois o comunismo de perto em sua querida Polônia. Em tempos estranhos para os brasileiros, que nunca tiveram que enfrentar as barbáries desses regimes totalitários, recorri à força de um homem que venceu o exército da destruição com armas que eles não tinham. 
As armas da fé. Para muitos historiadores, nenhuma das realizações do falecido papa parece maior do que seu papel no final da guerra fria e na queda do comunismo soviético. A oposição de João Paulo II ao totalitarismo surgiu de sua devoção à ideia dos direitos humanos dados por Deus. O legado de João de Deus, como era carinhosamente chamado pelos cristãos brasileiros, não foi deixado apenas para aqueles que vivem na fé católica, mas para todos aqueles que entendem o real significado da palavra liberdade e do que o comunismo traz em várias esferas.

John Lewis Gaddis, professor de História Militar na Universidade de Yale, certa vez escreveu que quando João Paulo II beijou o chão no Aeroporto de Varsóvia, em 2 de junho de 1979, em sua primeira viagem como papa à terra natal, ele iniciara o processo pelo qual o comunismo na Polônia — e finalmente em todos os lugares — chegaria ao fim. E a resiliência de milhões foi testada durante anos. Acredito que todos atrás da cruel Cortina de Ferro viviam sob uma apreensão infinitamente maior do que a nossa. Felizmente, hoje temos páginas e páginas que mostram que o mal, em algum momento, sempre sucumbe diante da fé.
O professor de Yale, que não é católico, escreve sobre sua perspectiva de que a queda do Muro de Berlim, dez anos depois, em 1989, e, posteriormente, do comunismo começou naquele dia de junho. Um milhão de poloneses se espalharam pelas ruas de Varsóvia e ao redor da Praça da Vitória, onde uma missa papal seria celebrada, e mostraram ao regime soviético, com medo, mas também coragem, que a Polônia lutaria com o que tinha.

Diante de milhões, pelas ruas, nas TVs e rádios, João Paulo II pregava a verdadeira história da Polônia — a história de um povo formado por sua fé. Enquanto o papa falava, um canto inesperado ecoava pelas ruas até a praça: “Queremos Deus! Queremos Deus!”. Era a voz da Polônia, parte do bloco comunista, onde a guerra contra a religião da doutrina marxista-leninista imperava, gritando “Queremos Deus!” para todo o mundo ver e ouvir que a fé e a esperança não sucumbiriam ao comunismo — regime fortalecido quando o ateísmo é enaltecido.

Confesso que algumas lágrimas brotam dos olhos ao escrever essa passagem da Polônia e seu povo. Criada em um lar cristão, eu tive a sorte de crescer vendo e ouvindo o papa João Paulo II. O nome do meu irmão era João Paulo por causa dele. Após a sua morte, em 2005, eu mergulhei em sua obra, sua vida e seu legado, e foi uma viagem sem volta. Hoje, as imagens desse evento fazem uma conexão em minha cabeça, de alguma maneira, com a nossa gente. 0

Papa João Paulo II em Munique, em 1980 | Foto: Wikimedia Commons

Diante de um imenso aperto no coração pelo Brasil, olho para João Paulo II como um pai espiritual. Há tantos motivos para agradecer a Deus por esse homem, e tantos motivos pelos quais busquei inspiração nele em tantas ocasiões da minha vida, como agora. Sua coragem, seu espírito de missão, sua defesa intransigente da dignidade da pessoa humana, seu amor pelos jovens, seu trabalho pela paz e sua contribuição para a queda do comunismo no Leste Europeu são um refúgio em tempos de grandes tempestades.

De muitos dos caminhos que podem ser tomados para um alento no santo pontífice, talvez o fio de ouro que pode ser profundamente útil para todos nós neste momento seja a virtude que João Paulo II impregnava em tudo o que ele representava: a esperança. O papa São João Paulo II foi e continua a ser, conforme identificado por seu principal biógrafo, George Weigel, uma “Testemunha da Esperança” (“Witness of Hope“).

Depois de um baque como o desta semana, é preciso beber na fonte da esperança real de São João Paulo II, fundamentada na convicção de que a vitória final pertence a Cristo, uma vitória que Ele já conquistou na cruz. Uma esperança, na verdade, fundada na promessa de Jesus na Última Ceia: “No mundo, tereis aflições, mas tende coragem, porque eu venci o
mundo” (João 16:33).

 

João Paulo II em 1988 | Foto: WIkimedia Commons

João Paulo II viveu a perda de toda a sua família, o horror da Segunda Guerra Mundial, a devastação do comunismo. Ele foi baleado e quase morto, teve um câncer no intestino, foi acometido pela doença de Parkinson e muitas outras provações. No entanto, ele nunca perdeu a esperança e mostrou ao mundo que se manteria de pé até o fim de seus dias.

Em uma entrevista publicada no final de sua vida, ele relembrou a crueldade dos regimes nazista e comunista que testemunhou na pele, descrevendo-os como “ideologias do mal” que surgiram por causa da rejeição de Deus como Criador e fonte determinante do respeito à vida. Mesmo nas terríveis memórias, e através de tudo isso, João Paulo olhou para trás e falou sobre os limites que Deus impôs ao mal naquela época da história europeia. De acordo com os ensinamentos do pontífice, o exemplo de que os limites ao mal já foram impostos pelo bem divino está em Cristo e Sua vida — a batalha heroica contra o pecado, contra a morte e a vinda da ressurreição vitoriosa. Para o papa, querido por muitos até fora da Igreja Católica, esse era o poder divino que havia entrado de vez na história e seria para sempre a fonte de esperança para aqueles que acreditam Nele. Com Cristo, explicou, o mal sempre seria vencido e a esperança triunfaria em todos os lugares e circunstâncias.

Essa era a fonte inabalável da esperança real de João Paulo como sacerdote, bispo, papa e um dos grandes líderes mundiais da história.


A força da oração, do pensamento baseado nessa esperança real de João Paulo II de que um mal maior que permeia o mundo vai ser vencido, começa com “pequenas” esperanças cotidianas

Hoje, precisamos de esperança. Há sinais preocupantes à nossa volta de que as pessoas estão perdendo a fé e se anestesiando com o desespero e o sentimento de inércia. Somos tentados a perder o fio da fé quando confrontados com os muitos desafios que nosso amado país enfrenta. Todo santo dia.

Em um deserto sem palavras para expressar nossa indignação, medo e desalento, qual pode ser a razão de nossa esperança? A mesma de São João Paulo II: que Cristo, escorraçado e morto na barbárie, já venceu todas as coisas e continua presente e ativo no mundo, mesmo em meio a todos os ditadores e regimes totalitários. Seu amor vencerá todo o mal, a escuridão e o desespero. Lá fora e dentro de nós. E isso é um fato.
Um exemplo dentro de nossa geração, e que precisa ser passado adiante, é exatamente o que João Paulo II testemunhou durante toda a sua vida de cristão. E é o que testemunharemos — por mais que as circunstâncias mundanas nos mostrem outra coisa, por mais que sejam reais e doloridas aos nossos olhos, elas ainda são “apenas” mundanas. A força da oração, do pensamento baseado nessa esperança real de João Paulo II de que um mal maior que permeia o mundo vai ser vencido, começa com “pequenas” esperanças cotidianas.

Tive o privilégio de conhecer um ex-assessor de Ronald Reagan que teve a honra de encontrar o papa nos anos finais de sua vida. Ele relata que quando apertou as mãos que abençoaram o mundo por quase 27 anos e que quando ouviu a voz que inspirou milhões em todo o mundo e que, principalmente, quando olhou nos olhos sorridentes de um homem que sobreviveu aos nazistas, aos comunistas, à bala de um assassino e duas doenças graves, ele só conseguia pensar: “Se ele ainda tem esperança, que desculpa encontraremos para não ter?”.

A esperança que nutrimos em nossa família e para a nossa família começa no fato de que estamos unidos pela morte e ressurreição de Cristo — em pequenos e grandiosos atos. E eles começam com apenas um dia sem perder a fé. Só hoje. Como João Paulo II nos lembraria, Deus sempre impôs limites ao mal. E não será diferente agora.

Leia também “O mundo falhou com as mulheres”

Ana Paula Henkel, colunista - Revista Oeste 

 

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