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domingo, 7 de janeiro de 2024
Ditadura indisfarçável, Parte 1: relatos sobre o Brasil pós-8 de janeiro - Marcel van Hattem
Gazeta do Povo - VOZES
Manifestantes na Praça dos Três Poderes, em Brasília, em 8/1/2023| Foto: EFE
Às
vésperas da “comemoração” proposta pelo petismo de um ano dos atos de 8
de janeiro de 2023, visitei novamente os presídios da Papuda e da
Colmeia, em Brasília (DF).
Seguem ali 18 brasileiros presos, ao menos
cinco dos quais com pedido de soltura do Ministério Público há semanas e ainda não analisados pelo ministro do STF, Alexandre de Moraes.
Enquanto Lula, Moraes e convidados estarão no Congresso
na próxima segunda-feira celebrando uma suposta "democracia inabalada”,
centenas de brasileiros seguirão com tornozeleiras eletrônicas em suas
casas sem o devido processo legal, e dezenas deles seguirão encarcerados
no Distrito Federal e nos estados, vítimas de uma perseguição política
somente comparável àquelas ocorridas em Estados de exceção.
Em ditaduras. Na próxima segunda-feira, em Brasília, petistas e seus aliados aduladores de "democracias relativas" como a Venezuela deNicolás Maduro, tentarão continuar a difundir a falsa narrativa de que o Brasil ainda é um país democrático e que aqui a Constituição está sendo respeitada.
No entanto, doze senadores continuam aguardando autorização do ministro Alexandre de Moraes para realizarem seu trabalho de fiscalização nos complexos penitenciários da Papuda e da Colmeia, que abrigam os presos do 8 de janeiro de 2023.
A festa que pretendem promover na segunda-feira é a festa da tirania; é a ode ao reino do abuso e da vilania.
É
isso mesmo que você leu:o direito constitucional de congressistas
fiscalizarem órgãos e espaços da administração pública, que independem
de qualquer decisão judicial, agora está sujeito a uma autorização
concedida por Alexandre de Moraes a si mesmo.
No caso do documento
protocolado por Eduardo Girão e outros onze senadores, incluindo o líder da oposição no Senado, Rogério Marinho,
desde o dia 6 de dezembro aguardam os senhores senadores pelo
beneplácito de Sua Excelência, ministro Alexandre de Moraes, para que
tenham acesso aos presídios.
No
meu caso, no entanto, pude fazer a visita aos presídios neste período
de recesso parlamentar graças a uma autorização concedida pelo ministro
ainda em março do ano passado. Adentrei os complexos penitenciários nas
últimas quarta, 3 e quinta, 4 de janeiro, e vi coisas que nada têm a ver
com o que se deveria ver em democracias e que nada têm a ver com o
cumprimento da Constituição.
As
atrocidades que estão sendo cometidas contra milhares de cidadãos
trabalhadores são dignas do mais profundo repúdio e desprezo.
Os
presos que encontrei seguem sem seus direitos garantidos, não sabem por
que estão sendo processados, seus advogados seguem tendo prerrogativas
cerceadas e seus processos continuam sem a devida individualização das
condutas.
Relembro aos leitores: praticamente 100% dos réus foram
processados com denúncias genéricas, sem provas de envolvimento
individual, um legítimo copia e cola das iniciais oferecidas pelo
Ministério Público.
Para piorar ainda mais: após a morte de Cleriston Pereira da Cunha, o Clezão,
durante o banho de sol no final de novembro e com a notícia da
condenação de vários presos a penas que chegam a 17 anos de reclusão,
dois internos já tentaram colocar fim à própria vida, um dos quais foi
transferido do presídio da Papuda à ala psiquiátrica da Colmeia.
Um
terceiro interno, preso mais recentemente na Operação Lesa Pátria,
tinha esperança de sair da cadeia durante o período de Natal e Ano Novo
para acompanhar o parto de sua esposa.
Ao perceber que permaneceria
encarcerado, desabafou com o médico do IML que, caso acontecesse algo a
sua esposa e ele não estivesse junto, ele certamente viria a fazer
alguma “besteira”.
Este também acabou transferido à ala psiquiátrica.
Felizmente, sua filhinha nasceu com saúde no dia de Natal, mas o pai não
pode acompanhar o parto enquanto traficantes e homicidas eram
beneficiados Brasil afora com saidinhas à cadeia.Saidinhas sem
retornadinhas em muitos casos, como noticia a imprensa nos últimos dias.
Em vez de inabalada, nossa democracia está sendo vilipendiada, abusada. Violentada.
“Não
vamos chegar numa ditadura, já é!”, disse-me um dos presos. Outro, o
único dos réus cujo processo já transitou em julgado e foi condenado
pelo STF a 17 anos de cadeia, divide hoje cela com três homicidas na ala
de criminosos comuns da Papuda, implorou-me: “se puder assinar agora
para ir embora, sem indenização, sem nada, assino na hora. Na hora! Só
quero a minha liberdade, o resto corro atrás!”.
Aos 24 anos, casado há
cinco, tem uma filha de seis meses que conheceu na visita da mãe à
cadeia.
Se cumprida a pena inteira, estará quite com a injustiça
brasileira apenas em 2039, após completar 40 anos de idade.
Na mesma
prisão em que se encontra, há condenados a 8 anos por estupro e a 15 por
homicídio.
Ele pegou 17 por enviar um áudio infeliz à esposa e por ter
adentrado o Congresso Nacional no 8 de janeiro.
Não há provas em seu
processo de que tenha vandalizado ou efetivamente quebrado qualquer bem
público.
Esta é a “democracia inabalada” de Lula e de
Moraes?
É este o país em que supostamente se respeita a Constituição e a
lei é igual para todos?
Não, certamente a festa que pretendem promover
na segunda-feira é a festa da tirania; é a ode ao reino do abuso e da
vilania. As atrocidades que estão sendo cometidas contra milhares de
cidadãos trabalhadores, cuja esmagadora maioria nunca teve passagem
alguma pela polícia, são dignas do mais profundo repúdio e desprezo,
jamais da horrenda pompa e circunstância que se pretende dar no
Congresso Nacional no próximo dia 8 de janeiro.
Aliás:
o governo Lula, se decente fosse, deveria admitir que não apenas nada
fez para impedir os atos de vandalismo como contribuiu para sua
execução, conforme se viu pelos vídeos internos vazados do Palácio do
Planalto ainda quando o GSI era comandado pelo General do Lula, Gonçalves Dias. Já as imagens das câmeras de segurança do Ministério da Justiça nunca apareceram e, como prêmio, o responsável pelo prédio, Flávio Dino, foi indicado e aprovado para ser o novo ministro do Supremo Tribunal Federal. Em vez de inabalada, nossa democracia está sendo vilipendiada, abusada. Violentada.
A
fim de deixar muito claro e expor ao Brasil e ao mundo o que vi na
Papuda e na Colmeia nas minhas visitas aos presídios, bem como os
excessos e abusos que estão sendo cometidos contra brasileiros presos ou
com restrições de liberdade na esteira da depredação e vandalismo
ocorridos na sede dos Três Poderes no dia 8 de Janeiro do ano passado,
publicarei no meu espaço na Gazeta do Povo uma série de
artigos intitulados “Ditadura indisfarçável”.
Contarei aqui histórias
individuais de presos do dia 8 de janeiro que se somam em uma tragédia
coletiva: a violentação da nossa democracia e a consolidação de uma
tirania que abusa dela,inclusive hipocritamente alegando defendê-la.
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