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quarta-feira, 28 de junho de 2023

Bolsonaro pode ficar inelegível por ‘flertar com o golpe’ - O Estado de S.Paulo

J. R. Guzzo

É mais ou menos assim, pelo que deu para entender das acusações feitas no TSE contra o ex-presidente

Um golpe de Estado é um golpe de Estado; todo mundo sabe o que é. Alguém derruba com o uso da força o presidente legítimo, eleito e tudo o mais, para ficar no seu lugar. 
Ou, então, usa essa mesma força para continuar ilegalmente no governo, quando deveria sair porque o seu mandato acabou
Na República Popular Democrática do Brasil, governada pela associação Lula-STF-TSE as coisas são mais complicadas. O sujeito pode ser punido por “flertar com o golpe” – e, como resultado, 140 milhões de eleitores ficam proibidos de votar nele nos próximos oito anos. É mais ou menos assim, pelo que deu para entender das acusações feitas no TSE contra o ex-presidente Jair Bolsonaro
 
Ele não derrubou ninguém para assumir o governo. Também não ficou na Presidência depois que venceu o seu prazo de validade legal – para dizer a verdade, até saiu um pouco antes. 
Obedeceu a todas as ordens que recebeu do TSE durante a campanha eleitoral. Não fez nada para impedir as eleições de 2022, e nem teve qualquer interferência no resultado; concorreu e perdeu, só isso. 
No fim do mandato foi-se embora. O inimigo ficou no seu lugar. Fim do caso.
Por decisão do Comitê Central que hoje manda nas eleições brasileiras, porém, não é preciso nada disso para alguém ser condenado como golpista. Basta pensar em dar o golpe, ou ter um jeitão de quem gosta de golpe, ou incomodar os agentes da polícia eleitoral com a impressão de que vai haver um golpe; pronto, já é golpe
Como provar que o infeliz pensou mesmo em dar esse golpe? 
Não pode haver prova nenhuma de algo assim, é claro. Provar pensamento – de que jeito?  
Mas não é preciso, no atual sistema nacional de justiça, que a acusação apresente provas.  
 
Bolsonaro, segundo a esquadra de execução que trata do seu caso, criou uma “paranoia” com as suas afirmações de que o sistema de urnas eletrônicas do TSE, não utilizado em nenhuma democracia do mundo, estava sujeito a fraudes. 
Espalhou junto ao eleitorado a desconfiança em relação ao sistema eleitoral. 
Não apresentou “provas” do que dizia – como se alguém, no processo, estivesse preocupado em apresentar provas contra ele. 
Chega: ele atentou contra a democracia. Não pode mais tomar parte da vida política do Brasil.
O presidente é acusado até pelas violências do dia 8 de janeiro em Brasília quando já não era mais presidente de nada, não mandava em coisa nenhuma e estava de viagem nos Estados Unidos.  
Nada disso consta da denúncia inicial, como a lei exige de qualquer peça acusatória pelo excelente fato de que aconteceu depois dela. Nenhum problema: o TSE acha que “nesse caso” a lei não se aplica. É assim que funciona.

Clique aqui e saiba mais


J. R. Guzzo, colunista - O Estado de S. Paulo


segunda-feira, 24 de abril de 2023

Imagens de um País sem lei - O Estado de S. Paulo

 J. R. Guzzo

General G. Dias tinha de estar preso enquanto Torres e mais 200 acusados estiverem detidos

Não existe mais um sistema de Justiça no Brasil. Em seu lugar há uma espécie de Comitê Central que tem poderes absolutos, extinguiu as leis em vigor e governa o País em favor de uma facção política – a do presidente Lula e do consórcio de interesses que opera à sua volta. 
A comprovação mais recente disso é o assombroso episódio das imagens, publicadas num furo da CNN Brasil, que mostram o general Gonçalves Dias, chefe supremo da “segurança institucional” de Lula, em atitude de convívio pacífico com os invasores do Palácio do Planalto em 8 de janeiro
Seus subordinados fazem a cortesia de oferecer garrafas de água a eles; eram, de qualquer forma, em número inexplicavelmente reduzido para proteger seja lá o que fosse, embora o general e o governo já soubessem desde a véspera que o ataque iria acontecer. 
Suspeitou-se desde o começo que havia colaboração do Sistema Lula nos “atentados terroristas” – uma farsa para ele se fazer de vítima e para o STF radicalizar ainda mais a sua caçada ilegal à “extrema direita”.

A verdade começou enfim a aparecer e fica explicado por que Lula e o PT vinham lutando tão histericamente contra a CPMI que quer apurar os fatos, e que agora tornou-se inevitável.

O STF, diante desse desastre, age mais uma vez em benefício do governo. O ministro Alexandre de Moraes acaba de decidir que o ex-secretário de Segurança de Brasília, que estava nos Estados Unidos no dia dos ataques, [em gozo de férias e com  substituto legalmente designado.para exercer na plenitude todas atividades exigidas para o perfeito desempenho no cargo.] tem de continuar na cadeia, onde está há mais de três meses. 
O general, que estava dentro do palácio, está solto – demitido, mas solto. 
Ele não deveria estar “depondo na PF”, com tratamento de “Xá da Pérsia”. Tinha de estar preso enquanto estiverem presos o secretário e mais 200 acusados, ou com tornozeleira eletrônica, e sem passaporte.
 
Por conta do 8 de janeiro cerca de 1.500 pessoas foram presas, mais de mil indiciadas, centenas submetidas à tortura da tornozeleira, após meses de prisão ilegal.  
Muitos nem sequer estavam no local do crime, mas apenas na frente dos quartéis; foram enganados por oficiais do Exército, enfiados em ônibus e entregues à polícia. 
O STF faz, agora, julgamentos por “lotes” de cem ou 200 pessoas – aberração que não existe em nenhuma lei deste País.
 
Pior, talvez, do que tudo: mais de mil pessoas estão indiciadas por incitação ao crime e unicamente por isso, segundo o próprio STF.  
A pena máxima que o artigo 286 do Código Penal fixa para esse delito são seis meses de detenção. Todos já cumpriram mais da metade disso, antes de serem julgados e muito menos condenados – e são réus primários, com direito à liberdade após cumprirem um sexto da pena. Justiça? [vale lembrar que a pena de detenção, a cominada pelo artigo 286, CP,  é bem mais leve e cumprida em regime aberto ou semiaberto.]
J. R. Guzzo, colunista - O Estado de S. Paulo

sábado, 2 de julho de 2022

Eles não querem cumprir a lei - Revista Oeste

Luís Roberto Barroso | Foto: SCO/STF
Luís Roberto Barroso | Foto: SCO/STF

Será que o STF não tem mais nenhum processo a resolver — e está sobrando tempo para os ministros viajarem pelo mundo afora? 
Prepare-se para continuar com as suas dúvidas, porque ninguém vai responder pergunta nenhuma e é melhor não insistir, para não ser indiciado criminalmente por “ataques” à suprema corte, “atos antidemocráticos” e outros horrores.[com risco de ser lançado na vala comum do 'inquérito do fim do mundo']
 
O curioso, nas palestras de Barroso no exterior, é que ele não fica em temas ligados à ciência do Direito vira e mexe o ministro se lança a comentários esquisitos sobre a política interna do Brasil.  
Ele já disse, nos Estados Unidos, que o presidente Jair Bolsonaro é o “inimigo”, e que uma de suas missões é “empurrar a história para a frente”. Em outra ocasião, também lá, participou de um seminário cujo tema era “como se livrar de um presidente” e já chamou o regime hoje vigente no Brasil dedictatorship”. 
 
Agora, num discurso que fez em sua própria homenagem em Londres, discorreu sobre os feitos extraordinários que teria realizado durante a pandemia; um deles, segundo disse, foi vencer “o abominável retrocesso” do voto impresso com “contagem manual”. Como assim? Nunca houve nenhum projeto de lei, ato do governo ou qualquer coisa parecida propondo o voto impresso no Brasil, e muito menos a apuração manual. 
Pode ser, até, que tenham falado nisso no debate sobre o sistema eleitoral, mas ficou-se por aí, na conversa. 
O que houve foi um movimento em favor do recibo impresso para o voto eletrônico — o que é claramente outra coisa. Alguns dos presentes chegaram a protestar. Ficou por isso mesmo.

Não há notícia de que juízes da Suprema Corte americana, o modelo universal de excelência quando se fala em fornecer justiça de alta qualidade, venham ao Brasil discutir questões políticas internas dos Estados Unidos. 
Também não fazem esse tipo de coisa os magistrados de primeira grandeza da França, Itália, Alemanha e outras democracias que se respeitam. 
O Brasil já foi assim um dia — mas hoje é outra coisa. 
Por decisão da maioria dos ministros do STF, tomada pouco a pouco ao longo do tempo, não existe mais no Brasil uma corte suprema de justiça. Em seu lugar, em vez de um tribunal dedicado a decidir sobre questões que envolvam a aplicação correta da Constituição, há um Comitê Central, ou uma espécie de Politburo, de militantes políticos que fazem exatamente o contrário do seu dever: desrespeitam abertamente as normas constitucionais para governar o Brasil através de despachos. Ficou assim porque os ministros deram a si próprios o direito e o dever de construir um país e uma sociedade que resultem não da vontade da maioria, expressa nas eleições para o Congresso Nacional e o Poder Executivo, mas num modelo de virtudes que têm dentro das suas próprias cabeças.

A maioria erra, acham os ministros. Elegem governos que o STF considera direitistas, populistas, autoritários e conservadores nas questões ligadas a Deus, pátria, família e costumes em geral algo intolerável para o seu entendimento do mundo e da vida. 
Estão convencidos de que é sua obrigação corrigir isso, mesmo porque, em seu credo, há eleições e eleições: quando perdem, não é porque o adversário teve mais votos, mas porque “usou” as eleições para subir ao governo e, uma vez ali, agir contra a democracia. É o que eles acham que aconteceu com o Brasil em 2018. É o que não querem que aconteça de novo em 2022.

O problema para esta doutrina é simples e insolúvel: não existe em nenhuma lei brasileira, e nem nos artigos 101, 102 e 103 da Constituição Federal, onde são descritas, uma a uma, as 21 tarefas que o STF está autorizado e obrigado a executar, o mais remoto vestígio de permissão para que os ministros façam o que estão fazendo.     Não é permitido a eles, ali, o exercício de nenhuma outra função pública que não seja a de magistrado não se prevê que governem nada, nem que abram inquéritos criminais para apurar “notícias falsas” ou “atos antidemocráticos” e nem que sejam “empurradores” da história.  

Não estão autorizados a criar crimes que não existem no Código Penal, como a “homofobia”, nem a proibir a polícia de subir nos morros do Rio de Janeiro e nem a manter na cadeia por nove meses, e depois condenar a quase nove anos de prisão, um deputado federal no pleno exercício de seu mandato, que não cometeu crime inafiançável e nem foi preso em flagrante. 
Não podem criar a figura jurídica do “flagrante perpétuo”. 
Não têm licença legal para salvar “a democracia”.

Os ministros do STF vêm fazendo há pelo menos três anos e meio tudo o que lhes dá na telha e ninguém age contra isso

Os ministros do STF sabem ler a Constituição tão bem quanto qualquer brasileiro alfabetizado.  
Se não cumprem o que está escrito ali, é porque não querem cumprir e não querem cumprir porque vêm fazendo há pelo menos três anos e meio tudo o que lhes dá na telha e ninguém age contra isso, a começar pelo Congresso Nacional
Ao contrário: embora tenham um índice de aprovação popular de 24%, algo francamente miserável, são apoiados com paixão pela esquerda, as elites, os empresários socialistas, os empreiteiros de obras públicas, os criminalistas que defendem corruptos, a mídia, as classes culturais, o movimento LGBT+ e por aí afora. É quem tem voz; é quem aparece. 
 
Todos têm mais ou menos a mesma visão do STF sobre o Brasil ideal. 
São a favor do aborto; do princípio segundo o qual o criminoso deve ser, acima de tudo, protegido pela lei, e que o policial é o inimigo da sociedade; da pregação nas escolas da noção de que todes são do mesmo sexo até se tornarem adultes, e que menines e menines não se diferenciam por gênero; da crença em que o agronegócio brasileiro destrói a natureza, envenena os alimentos com “agrotóxicos” e mata os índios;  
do controle sobre a liberdade de expressão nas redes sociais; 
das prisões políticas de militantes da direita e por aí se vai, na direção geral que todo mundo sabe.
 
O que a maioria dos ministros faz nesse momento é desrespeitar a Constituição. 
Têm um candidato aberto ao cargo de presidente da República. Perseguem os adversários políticos. 
Eliminam direitos individuais e liberdades públicas. 
Impedem o trabalho de advogados na defesa dos clientes que foram indiciados em seus inquéritos policiais. 
Dão ordens ao Congresso. 
Bloqueiam a ação do Poder Executivo sempre que podem, e interferem o tempo todo em suas decisões administrativas. 
São os únicos cidadãos brasileiros que não prestam contas a ninguém. 
Estão governando o Brasil num regime de exceção.

Leia também “Um projeto para destruir o Brasil”

J. R. Guzzo, colunista - Revista Oeste