Bolsonaro contra institutos, governadores, conselhos, fundações e mais um general
Nas democracias, líderes políticos e governantes devem ter relações
institucionais e ampliar contatos, interlocutores e aliados. O
presidente Jair Bolsonaro faz justamente o oposto: ele parece
determinado a confrontar e irritar todo mundo que não pensa exatamente
igual a ele. Uns são “paraíba”, outros são “melancia”, e só ele sabe o
que é bom para o País. Isso não soma, só divide e acirra os ânimos. Depois de usar um termo pejorativo contra nordestinos e dizer que “não é
para dar nada” ao governador do Maranhão, Flávio Dino (PCdoB),
Bolsonaro não se contentou com a reação em bloco dos governadores da
região – a mais oposicionista do País – e foi cutucar Rui Costa, da
Bahia. O que seria uma festa de inauguração de aeroporto, hoje, em
Vitória da Conquista, virou motivo de guerra.
Na versão do governador, que é do PT, Bolsonaro “excluiu o povo” e
transformou a festa numa “reunião político-partidária” com os seus
apoiadores, com uma claque organizada. De 300 convites, só 70 teriam
sido para o governo local. Rui Costa decidiu não ir e gravou um vídeo de
desagravo. Bolsonaro também partiu para cima do general da reserva Luiz Rocha
Paiva, que considerou “antipatrióticas e incoerentes” suas manifestações
sobre os nordestinos. Segundo o presidente, na tréplica, o general não
passa de um “melancia”. Sabem o que é isso? É um militar com a farda
verde por fora e alma vermelha por dentro. Ou seja, um militar de
esquerda. Ou o general se irritou ou deve ter dado muita gargalhada. E
não só ele... [as posições políticas do general, o que inclui - sem limitar - ser aliado do PCdoB, não desqualificam a classificação que lhe foi conferida pelo presidente da República.]
O diretor do Inpe, Ricardo Galvão, é outro que entrou na mira e não
abaixou a cabeça. Depois de desqualificado publicamente por Bolsonaro,
como se estivesse “a serviço de ONGs”, ele avisou ao Estado que não vai
se demitir e classificou a atitude do presidente de “pusilânime e
covarde”. E o que será que a Ancine e a turma ativa e organizada do
cinema andarão aprontando para se defender dos ataques palacianos? [o Inpe merece todo respeito e também seu presidente - apenas um pequeno reparo: o senhor Ricardo precisa ter em conta que apesar do clima emocional, ele não pode ofender o presidente da República, que merece respeito - ainda que alguns não respeitem o titular do cargo, a dignidade do cargo, sua importância, sua liturgia, se transferem para quem ocupa a função e com isso a obrigação de respeitar a pessoa do presidente da República.
Quanto a defender a Ancine, quem tem prioridade de defesa é o contribuinte brasileiro que banca a Ancine, totalmente inútil, difusora de filmes ofensivos à moral e aos bons costumes e , apologia a prostituição. Salvo engano, a melhor obra da Ancine - sendo única se torna, por falta de opção, obra prima - é aquele filme 'lula, o filho do Brasil' que faz apologia a um ladrão, a um presidiário, a um criminoso.]
As investidas do presidente, porém, não param por aí e agora não são
mais só de tempos em tempos, mas de horas em horas. Ontem, ele voltou as
baterias novamente para os conselhos, tão essenciais para a troca de
experiência, o debate, o contraditório e, principalmente, a definição de
políticas públicas. E atingiu um em cheio: o de políticas sobre drogas,
o Conad. O Supremo já decidiu em junho, por unanimidade, mas provisoriamente, que
o presidente não pode extinguir por decreto conselhos que foram criados
por lei, ou seja, com aval do Congresso. Mas Bolsonaro manteve
exatamente o mesmo discurso de antes, avisando que vai enxugar os
conselhos e extinguir “a maioria” deles. É até possível que haja excesso
de conselhos, mas o corte de Bolsonaro tem motivação particular: é um
corte ideológico.[apesar de não ser possível extinguir conselhos via decreto, e sim por lei, o enxugamento pode ser por decreto e já beneficia o contribuinte e por extensão os combalidos cofres públicos;
existe conselho demais, logo terá conselho para aconselhar os conselhos.]
Detalhe: ele é o presidente que mais governa via decretos, só atrás
(ainda) de Collor. Decretos entram em vigor imediatamente, dispensando
aval de Câmara e Senado. Têm, pois, menos força do que projetos de lei. E
são mais autoritários. [os decretos são, indiscutivelmente, inferiores as leis; mas, se percebe por parte do Congresso, por parte do 'primeiro-'ministro' Maia, no que é seguido pelo seu fiel escudeiro o senador Alcolumbre, nítida intenção de boicotar, no mínimo travar, qualquer projeto do presidente Bolsonaro, diante disso resta ao Chefe do Poder Executivo tentar minorar os efeitos do boicote, fazendo o que for possível via decreto.
Quanto a manter a pesquisadora mencionada no parágrafo abaixo seria trazer o adversário para dentro de casa = colocar um sabotador no Conselho.]
Após submeter o ministro Sérgio Moro ao constrangimento de desconvidar a
pesquisadora Ilona Szabó para o Conselho Nacional de Política Criminal e
Penitenciária, Bolsonaro acaba de excluir do Conad os especialistas que
lidam com drogas no cotidiano: jurista, médico, psicólogo, assistente
social, enfermeiro, educador e cientista. Um espanto! É assim que, depois do Inpe, Ancine, IBGE, FioCruz, Ibama, ICMBio, Funai
e universidades, Bolsonaro atrai contra si chuvas e trovoadas da OAB,
da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (a emblemática SBPC)
e dos conselhos de Medicina, Psicologia, Serviço Social, Enfermagem e
Educação. Já imaginou se o saque do FGTS for só de R$ 500, conforme
antecipou o Estado? [exceto nas situações já previstas em Lei, o FGTS não deve ser liberado. É um patrimônio do trabalhador que pode ser necessário para ajudar na aquisição da casa própria, no tratamento de uma doença grave, na aposentadoria, na velhice, até mesmo na morte - em beneficio dos seus dependentes.
R$ 500 é insuficiente para resolver os problemas do trabalhador, mas, mesmo assim é uma quantia apreciável e que se liberada todo ano, reduz aquele patrimônio.]
Eliane Cantanhêde, colunista do Estado de S. Paulo