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terça-feira, 11 de julho de 2023

PAC Zero - Silvio Navarro

Revista Oeste

Sem dinheiro em caixa nem plano para a infraestrutura do país, Lula recicla o PAC, [no mandato passado do apedeuta presidente o codinome era PACo = lembrança do Conto do Paco.]o programa que acumula milhares de obras paradas até hoje

Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, durante cerimônia de início das obras do Lote 1F do Trecho 1 da Ferrovia de Integração Oeste-Leste (Fiol) | Foto: Ricardo Stuckert/PR
 
No segundo semestre deste ano, o bairro Santo Antônio, no município de Morungaba, na Região Metropolitana de Campinas (SP), vai receber lombadas para reduzir a velocidade dos veículos. Serão 15, espalhadas pelas vias de acesso à pequena cidade, com 14 mil habitantes, ao custo de R$ 125 mil — autorizados pela Caixa Econômica Federal. 
A placa já foi instalada pelo Ministério da Economia. 
É um retrato da atuação na área de infraestrutura do país depois de seis meses de governo Lula.
 
A importância de uma lombada — ou da construção de uma quadra de futebol de salão — não se discute. 
Cada prefeito sabe das necessidades da população que o elegeu. 
Mas se trata de um exemplo preciso da falta de projetos, um rascunho que seja, da atual administração federal
Não há placas como essa anunciando a duplicação de rodovias, a ampliação de portos ou de usinas. 
É raro encontrar um eleitor que conheça o nome dos ministros da área de infraestrutura — e a maioria dos escolhidos tampouco tem acesso ao gabinete do presidente.

Diante desse cenário, Lula decidiu reciclar o Plano de Aceleração do Crescimento (PAC). O anúncio foi feito na segunda-feira, 3, na Bahia. Ele participou do lançamento da Ferrovia Oeste-Leste (Fiol), uma linha inicial com 127 quilômetros de trilhos para ligar o município de Ilhéus a Aiquara.

O anúncio, contudo, era só uma peça de publicidade oportunista. Isso porque esse trecho da ferrovia foi leiloado em 2021, na gestão Jair Bolsonaro. Foi elaborado no modelo do governo anterior: a empresa Bahia Mineração (Bamin) arrematou a concessão de 35 anos, tocada com investimento 100% privado. O término está previsto para 2027 talvez Lula nem seja mais o presidente. 
Ou seja, a participação do governo federal, por enquanto, é nula — o que existe é a promessa de continuar a obra de onde a empresa privada parar, sem data prevista, até chegar a Goiás e Tocantins.

Lula não escondeu a preocupação com a farsa no discurso, mas foi a única obra cuja faixa inaugural conseguiu cortar depois de seis meses. “Façam um pouco de hora extra, trabalhem no final de semana se for necessário, para que a gente possa inaugurar logo. Se não, a gente corre o risco de uma outra ‘coisa ruim’ voltar neste país, e a ferrovia ficar parada outra vez. Vamos tratar de inaugurar logo essa obra”, disse.Foto: Reprodução Poder 360 (3/5/2023)

A farsa do PAC
A sigla PAC foi criada em 2007 pelo marqueteiro João Santana, que ficaria conhecido anos depois pelos milhões que recebeu do Petrolão
O PAC teve duas fases: a primeira com o próprio Lula reeleito, e a segunda para alavancar a candidatura de Dilma Rousseff, apelidada de “Mãe do PAC” na campanha de 2010. 
Foi a maior enganação já alardeada em cadeia nacional nas últimas décadas. 
Os governos do PT prometeram entregar 30 mil obras e investir R$ 1,5 trilhão em cimento, malha ferroviária e recursos hídricos — uma fatia considerável do Produto Interno Bruto (PIB) em dez anos. Quando Dilma sofreu o processo de impeachment, em 2016, o índice de execução do pacote de obras não alcançava 17%.
 
Na época, foi apresentado um estudo feito pela Inter.B Consultoria na comissão temática da Câmara dos Deputados. 
A conclusão dos economistas que estudaram o PAC foi clara: como não concluiu o que prometeu no PAC 1, Lula empurrou a cartilha de obras para o PAC 2 de Dilma.  
Mas aqui entra um detalhe fundamental: as revisões feitas de 2010 a 2014 aumentaram os custos em 50%. Ou seja, quando a era petista no poder terminou, com o impeachment, o país era um canteiro com milhares de obras paradas, e o dinheiro tinha sumido.

O sobrepreço de algumas obras era gritante: a dragagem no Porto de Santos subiu 300%;  a construção da Linha 1 do Metrô de Belo Horizonte, mais de 800%. 

O projeto mais icônico foi o trem-bala que ligaria São Paulo ao Rio de Janeiro até a Copa do Mundo de 2014.

Uma parte dos recursos públicos que desapareceram foi encontrada pela Operação Lava Jato ao longo de sete anos de investigação
O dinheiro saiu do caixa de estatais, ministérios e do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e abasteceu contas clandestinas de partidos, de políticos com ou sem mandato e de empreiteiras — especialmente na Suíça. 
A Lava Jato conseguiu mapear R$ 15 bilhões surrupiados, cifra que seria ainda maior se os acordos de leniência assinados pelas empresas não fossem rasgados pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

Com a volta do PT ao poder, algumas das grandes empreiteiras — Odebrecht, UTC e Andrade Gutierrez — que estavam no centro do escândalo foram reabilitadas até pela Petrobras para voltarem à cena. A Odebrecht foi incluída na “categoria plena”, que libera a participação em qualquer tipo de concorrência.

Além do propinoduto institucionalizado do Petrolão, o aumento desenfreado do gasto público para ganhar eleições agravou a crise fiscal no país e promoveu a escalada da inflação, duas marcas de Dilma Rousseff que levaram o Brasil à ruína econômica e à recessão. ​​”A violência dos números de 2016, informando o prejuízo advindo das obras inacabadas, é mais sentida por meio do comparativo com o valor do estoque da dívida pública federal em abril de 2019. O desperdício representa, aproximadamente, 30% de toda a dívida contraída pela União.”
(O Labirinto das Obras Públicas, um raio X publicado no ano passado pela Câmara Brasileira da Indústria da Construção — CBIC)

Atraso sistemático
Ao anunciar que tem um novo PAC saudosista em mãos, Lula deve apresentar neste semestre nada mais do que uma planilha de obras que ele e Dilma iniciaram e jamais foram concluídas.  

A explicação para o fiasco passa por três caminhos. O primeiro deles foi a corrupção do Petrolão, que exigiu ajustes e cancelamentos em contratos com empreiteiras durante os governos Michel Temer e Jair Bolsonaro. Depois, a pandemia forçou o direcionamento de recursos para a saúde por quase dois anos. Por fim, resta o eterno entrave ambiental e técnico, que ganha fôlego a cada guinada de governo de esquerda e tem forte respaldo do Ministério Público — pressionado por ONGs e grupos ideológicos.

Em 2019, a pedido do Congresso Nacional, o Tribunal de Contas da União (TCU) fez um amplo levantamento do Brasil travado.  
O tribunal informou em acórdão que havia 14 mil obras paralisadas, em mais de 38 mil contratos, com valor estipulado em R$ 144 bilhões.  
Desse universo estagnado, 91% dos recursos eram das enfadonhas exibições de PowerPoint do PAC.“De plano, os números são assustadores. Das 38 mil obras levantadas, mais de 14 mil estão paralisadas. Ou seja, mais de um terço das obras que deveriam estar em andamento pelo país não teve avanço ou apresentou baixíssima execução.

(Acórdão do TCU, de 2019, com o diagnóstico das obras no país)

De lá para cá, mesmo com as limitações impostas pela pandemia, houve avanço significativo na gestão de Paulo Guedes no Ministério da Economia. De acordo com a base de dados atualizada do TCU, consultada nesta semana por Oeste, 8,6 mil obras contratadas estão estagnadas atualmente, de um total de 21 mil — o montante total é de R$ 113 bilhões.

Dos projetos que não saíram do papel, os Estados campeões em ineficiência eram administrados — ou ainda são — por aliados do atual governo petista: Maranhão, Bahia e Pará, respectivamente pelos ministros Flávio Dino (Justiça) e Rui Costa (Casa Civil), que elegeram sucessores, e pelo governador Helder Barbalho, cujo irmão, Jader Filho, é ministro das Cidades.

Segundo o TCU, essas regiões interromperam a construção de creches, escolas, quadras esportivas e até a reforma da Escola de Teatro da Universidade Federal da Bahia. Foram encontradas deficiências técnicas e casos de abandono pelas empresas contratadas.
Nesse cenário de escassez de boas ideias, o governo colocou outra carta na mesa: tem liberado as chamadas emendas parlamentares no varejo para os deputados que aceitam votar projetos do seu interesse — especialmente os que podem ampliar a arrecadação, em debate nesta semana no Congresso. 

Esses recursos, que antes eram chamados de orçamento secreto para desgastar Bolsonaro, servem para pequenas obras em redutos eleitorais. No caso dos deputados, há pressa em entregá-las por causa da eleição municipal do ano que vem.

Mas o fato é que, em meio ao relançamento do programa grandioso de Lula — sem datas de execução, lista de obras nem dinheiro no Orçamento —, chamou a atenção uma declaração da ministra Simone Tebet, aquela a que o petista se referia como “Simone Estepe” na campanha, mas que precisou levar depois para a Esplanada.  
A ministra afirmou: “O governo está para anunciar novas medidas. Uma delas é um novo PAC, que não vai ser um PAC”. Tebet chefia a pasta do Planejamento e Orçamento. Ela sabe do que está falando. “Muita coisa já está aí e só vamos envelopar”, disse. Traduzindo: vem aí o PAC Zero.
 
Silvio Navarro, colunista - Revista Oeste
 


Leia também “Arthur Lira no olho do furacão”

 

 

sábado, 23 de março de 2019

Proposta desidratada de militares pode gerar insatisfação na tropa, diz general


Sem as gratificações, projeto perde a essência de reestruturação da carreira e pode levar à insatisfação, diz Garrido

Principal responsável pela proposta de reestruturação das carreiras das Forças Armadas, o assessor especial do Ministério da Defesa, general Eduardo Garrido, diz que a reforma dos militares ficará “capenga”, caso o Congresso retire as propostas que mexem na remuneração e nas gratificações. Em entrevista ao Estado, o general diz que uma desidratação do projeto poderia levar à insatisfação dos militares nas redes sociais.  
 Na pele. Para o general Garrido, Bolsonaro é mais sensível às demandas da categoria Foto: Dida Sampaio/Estadão
Apresentada nesta semana, a proposta virou alvo de críticas no Congresso Nacional pelo baixo resultado em uma década. O governo prevê economizar R$ 97,3 bilhões em 10 anos, mas vai gastar R$ 86,85 bilhões no mesmo período com a reestruturação da carreira – um saldo positivo de R$ 10,45 bilhões. Para Garrido, os militares já foram submetidos a um sacrifício muito grande. Segundo ele, o presidente Jair Bolsonaro, de carreira militar, é muito mais sensível às demandas da categoria, mas reconhece que o Congresso poderá fazer ajustes na proposta. Na visão do general, os comandantes "precisam ter as tropas na mão". A seguir, os principais trechos da entrevista.  

O líder do PSL chamou o projeto de reforma dos militares de abacaxi...
A nossa proposta é complexa, por isso às vezes gera um certo desentendimento. Nós estamos trabalhando alterando quatro leis e uma MP, que estão interligadas. Ficaria muito difícil mexermos em alguns aspectos e não mexermos em outros que estão relacionados em outras legislações. Ficaria capenga. Temos que casar tudo isso. Hoje, a remuneração do nosso coronel, que é o nosso último posto, é abaixo da maioria dos salários iniciais das carreiras de Estado. 

A avaliação de muitos no Congresso é a de que não era o momento de mexer na remuneração. Não foi um erro estratégico?
Desde 2016, estamos nesse processo. Como militares, temos os nossos limites. Apresentamos o nosso pleito e as autoridades da área econômica avaliaram. Disseram que não era possível. No ano passado, estava tudo mais ou menos encaminhado e aí chegou um momento em que a LRF diz que nos últimos 180 dias de governo não pode ser proposto nenhum tipo de reajuste. Nós acabamos sendo barrados por esse aspecto. Para nós, teria sido muito melhor se tivesse sido tramitado anteriormente.

Ter um presidente da República da carreira militar ajuda? 
Como o presidente vem da carreira, tem uma percepção mais fácil do que é a nossa carreira.

Não é só isso. Na eleição, o presidente Bolsonaro teve como base apoiadores militares. 
Tudo isso facilita. O presidente é mais sensível às nossas demandas. Mas essa sensibilidade veio sendo fortalecida no governo nos últimos anos.

A Força Militar vai reagir se o Congresso retirar do projeto a parte da remuneração? 
As Forças Armadas têm como seus princípios a hierarquia e disciplina. Fizemos os nossos estudos com uma coerência do que é importante para nós e encaminhamos ao Congresso, que é soberano. O nosso papel será mostrar para eles que a separação traz prejuízos por conta das legislações serem muito interligadas. Ajustes poderão ser feitos.

Mas vocês não esperam uma desidratação total? 
Na nossa visão, não seria adequada uma desidratação desse tipo. Aí, perde a essência de um projeto que é a reestruturação da carreira. Para os nossos comandantes, é uma situação complexa. Eles têm que manter os princípios da hierarquia e da disciplina. São os principais fiadores desse processo. Eles precisam ter as tropas na mão. E nós estaremos impondo mais sacrifício a essas tropas. O que nós estamos mostrando é caracterizar “Olha, nós temos um sacrifício, mas veja que esse sacrifício está sendo imposto a todos nós. Quando você olha a progressão dentro da carreira, vai ver que isso será recomposto”. Hoje, quando se faz uma avaliação, o sacrifício é muito grande.

Mas tem risco de uma revolta? 
Falar a palavra revolta é muito forte. Nós verificamos no próprio processo, quando houve um vazamento, tivemos nas redes sociais uma série de pessoas se manifestando em relação às insatisfações. Mas nós acreditamos que, no nível institucional, os comandantes vão estar atuando dentro dos princípios que regem nosso comportamento para que não saia da normalidade. Esse é principal ponto e vai acontecer.

Os militares podem manifestar insatisfação nas redes sociais? 
Dependendo do tipo da insatisfação manifestada, pode ser considerada uma quebra de hierarquia. Nós somos regidos pelos nossos regulamentos.

Como mostrar que os militares não estão tendo tratamento diferente em relação aos demais? 
As Forças Armadas são um seguro da Nação. Temos peculiaridades. Não fazemos jus a hora extra, adicional noturno, tiramos serviço por 24 horas. Eu sei que é difícil, mas você já pensou se os comandantes estou elucubrando uma ideia – dizem “olha, eu não posso cumprir uma missão de GLO (Garantia da Lei e da Ordem) porque eu não tenho dinheiro”? Acaba a essência de ser uma Força Armada. 

O Estado de S. Paulo
 


 


 

quinta-feira, 21 de março de 2019

Defesa diz que afago a militares em reforma compensa perdas da categoria

Economia esperada de mais de R$ 97,3 bilhões em 10 anos com as mudanças previdenciárias das Forças Armadas cai para R$ 10,4 bilhões com reformulação de carreira das tropas. Ministro da Defesa diz que foi uma "compensação" por perdas da categoria 


 (foto: Acácio Pinheiro/Agência Brasília )

O presidente Jair Bolsonaro e a equipe econômica cederam aos apelos dos militares de reestruturação da carreira para conseguir enviar uma proposta de reforma do sistema de aposentadorias das Forças Armadas ontem, no último dia do prazo prometido ao Congresso. O projeto de lei complementar à Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Previdência prevê uma economia líquida de R$ 10,45 bilhões nos primeiros 10 anos de vigência da proposta, ou seja, 1% dos R$ 1,1 trilhão de impacto fiscal previsto na reforma dos demais trabalhadores dos setores privado e público. Quando a PEC da Previdência foi apresentada, em 20 de fevereiro, era esperada uma folga de R$ 28 bilhões somente na área militar até o fim do governo Bolsonaro. Agora, a expectativa de economia caiu para R$ 2,29 bilhões — somente 10% do valor inicialmente calculado.

A reestruturação de carreiras dos militares vai gerar uma despesa de R$ 86,85 bilhões em 10 anos. Enquanto isso, as mudanças no sistema — que elevarão as alíquotas de contribuição previdenciária de 7,5% para 10,5% até 2022, incluindo para pensionistas que não tinham desconto algum, mas não impôs a idade mínima de aposentadorias para os oficiais devem implicar uma redução de despesa de R$ 97,3 bilhões em uma década. A diferença dessas duas medidas resultará no saldo líquido de R$ 10,45 bilhões até 2029, conforme dados do Ministério da Economia divulgados ontem. Essa economia líquida equivale a apenas 11,3% do estimado antes.

Ao apresentar o projeto dos militares ontem, o secretário especial adjunto de Previdência e Trabalho, Bruno Bianco, tentou minimizar a redução na economia e disse que a proposta não está desidratada pelo aumento de despesa da União com militares. “Não é gordura, não é deficit, não é desidratação e não diminui a proposta da reforma. Uma coisa é uma coisa e outra coisa é outra coisa”, disse.

No entanto, a maior parte desse custo adicional de R$ 86,85 bilhões aos cofres públicos com a reestruturação das carreiras será com três gratificações: “Uma nova e duas aperfeiçoadas que devem responder por mais da metade desse custo”, segundo o assessor especial do Ministério da Defesa, general Eduardo Garrido. A mudança incluirá reajustes nos valores do soldo e nas ajudas de custo dos oficiais. Para justificar essa medida, os militares alegaram que não recebem reajustes desde 2001, quando ocorreu a última reestruturação da carreira. No entanto, evitaram comentar que, durante o governo Michel Temer, o soldo dos oficiais teve um aumento de 27,5%. De acordo com os oficiais, o governo gasta, em média, R$ 81 bilhões por ano com a folha de pagamento dos militares e, com a proposta, esse custo teria implemento de cerca de 5%.
Salário mínimo
No projeto de lei enviado ao Congresso, o soldo de militares mais rasos, como aprendiz de marinheiro e de fuzileiro naval, terá um reajuste de 12,6%, passando de R$ 981 para R$ 1.105. Isso evitará que o valor líquido fique abaixo do salário mínimo, devido à cobrança dos 10,5% da contribuição previdenciária, que não existia antes. No entanto, esse reajuste será maior do que o percentual que o soldado pagará para a Previdência. Já no caso de general, brigadeiro ou almirante, o soldo foi mantido em R$ 13.471 mil. Mas se forem consideradas apenas as três gratificações incluídas no projeto, que são maiores quando a patente é mais alta, o reajuste será de 124%, chegando a R$ 30,2 mil, valor próximo ao novo teto do funcionalismo, de R$ 39,3 mil. Nessa conta não estão incluídos as ajudas de custo, que em alguns casos, dobra de valor.

As benesses levantaram críticas até de aliados do governo.  Ao serem questionados sobre o fato de os militares estarem cedendo muito menos que os servidores e os trabalhadores do setor privado na reforma da Previdência, as autoridades desconversaram. Garrido tentou justificar a reestruturação como uma espécie de compensação para a categoria, que não pode fazer greve e não tem direitos trabalhistas, como hora extra. Ele justificou que se as regras se igualassem, a União teria um gasto de, pelo menos, R$ 20,7 bilhões por ano com os militares. “Nós não queremos receber isso, porque perderíamos a nossa essência de ser das Forças Armadas. Mas podemos identificar uma série de direitos que não são aplicados para nós. Há uma espécie de contrato entre a sociedade e os militares, em que nós nos colocamos à disposição do Estado 24 horas por dia e fazemos o juramento de sacrifício da própria vida pela pátria”, afirmou.

Saldo positivo
O secretário de Previdência, Leonardo Rolim, também minimizou e disse que, no conjunto o saldo nas duas medidas é positivo. “Do ponto de vista fiscal, e não o lado previdenciário, temos um ganho de R$ 10,45 bilhões para a União. Fora o ganho fiscal substancial para os estados”, defendeu. Ele ainda disse que, em 10 anos, haverá um ganho de R$ 10,3 bilhões com a compensação previdenciária de militares que deixam as Forças Armadas e migraram para o regime geral de Previdência (RGPS).

De acordo com o secretário especial de Previdência e Trabalho do Ministério da Economia, Rogério Marinho, os estados terão um ganho de pouco mais de R$ 50 bilhões nos próximos 10 anos com projeto da reforma dos militares, pois haverá redução nas despesas com as aposentadorias de policiais e de bombeiros. “Esse foi um esforço que foi feito junto às Forças Armadas e que só foi concluído hoje (ontem) pela manhã, quando o presidente tomou a decisão para o cenário mais confortável para a economia e para as Forças Armadas”, afirmou.

Correio Braziliense



 

domingo, 10 de março de 2019

Toma lá, dá cá

Proposta dos militares tira na Previdência e põe nos soldos. Guedes quer “conta zero”

A proposta das Forças Armadas para a previdência dos militares é, na verdade, um pacote que tira de um lado (o da previdência) e põe no outro (nos soldos). A intenção é cobrar cota de sacrifício até de pensionistas, mas criando gratificações para os da ativa que fizerem cursos, como compensação para perdas acumuladas há décadas.
“Sempre perguntam se nós não vamos contribuir com a reforma. Mas nunca deixamos de contribuir”, diz o ministro da Defesa, general Fernando Azevedo e Silva. Para ele, os militares são sempre os primeiros a sofrer cortes, “para o bem do País”, e acabaram com soldos muito defasados em relação à inflação e às carreiras de Estado. “Em relação ao Judiciário e ao Legislativo, nem se fala.”

O ministro entrega nesta semana a proposta dos militares à equipe econômica e à área jurídica do governo e estima levá-la ao Congresso até início de abril. Esse é um passo importante para esvaziar as desconfianças dos parlamentares, inclusive da base aliada, que resistem a privilégios para militares. Azevedo e Silva foi pessoalmente à residência oficial do presidente da Câmara, Rodrigo Maia, na quinta-feira passada, não só para antecipar a ideia geral da proposta para os militares como para falar das compensações: “Vamos subir a receita, mas também equilibrar melhor as despesas”, resumiu. Maia pensa como o ministro Paulo Guedes e o secretário Rogério Marinho: os militares não podem aproveitar a reforma para compensar defasagens antigas. No mínimo, a conta tem de zerar. Pelo projeto, só vai zerar no quinto ano. Até lá, eles ficam no lucro.

Além de aumentar o tempo de contribuição dos militares, de 30 para 35 anos, a proposta prevê aumento da alíquota para todos, de 11% para 14%, com um detalhe: viúvas, cadetes e recrutas, hoje isentos, também passarão a contribuir com o mesmo porcentual. Do outro lado, está a recuperação de uma das vantagens perdidas com a MP 2215, do final do governo FHC, mexendo nas gratificações pelos vários cursos que, sargentos ou oficiais, eles têm de fazer ao longo da carreira. Gratificação não tem impacto na previdência, aumento de salário teria. Está descartada a volta de auxílio-moradia, pensão para as filhas, ida para a reserva com um posto acima e licença especial. Uma facilidade para aprovação do pacote militar, conforme enfatizou o próprio presidente Jair Bolsonaro, é que não precisa emenda constitucional, só projetos de lei. É fato, mas não exagera! Uma semana na Câmara e outra no Senado, só em sonho.

O grande esforço não só das Forças Armadas, mas da própria cúpula do governo – até porque as coisas se confundem é martelar que os militares não estão incluídos no regime de previdência. Têm regime próprio e, aliás, estão fora das normas trabalhistas: não têm hora extra, adicional noturno, adicional de periculosidade.
Se elas tivessem esses benefícios, um tenente atuando na fronteira com a Venezuela ou nas enchentes na BR 163 (Cuiabá-Santarém) mais do que dobraria seu salário – que é mais baixo do que seus correspondentes civis no serviço público.

Uma terceira frente, além dos soldos e da previdência diferenciada, é o orçamento para as atividades-fim e os projetos estratégicos do Exército, Marinha e Aeronáutica que, como diz o ministro, “precisam de condições para sustentar a paz”.
Ter Bolsonaro, oito militares no topo do Executivo e mais de cem no segundo escalão é faca de dois gumes: é bem mais fácil para as três Forças defenderem seus pleitos no governo, mas gera desconfianças e confrontos fora dele. Principalmente quando se vende o militar como santo e o político como demônio. É melhor para o governo e para o presidente calibrar melhor o tom. A reforma passa e o Brasil ganha.
 
Eliane Cantanhêde - O Estado de S. Paulo

quinta-feira, 6 de abril de 2017

Custo Brasil, custo Governo


O principal problema econômico brasileiro está no rombo das contas públicas e, neste, o déficit geral da Previdência. Quando o governo opera sistematicamente no vermelho, ainda tem maneiras de se financiar, mas sempre de modo danoso. Por exemplo, pode aumentar impostos, em um país em que a carga tributária já é de absurdos 40% do PIB. Tirando mais dinheiro das pessoas e empresas, o setor público bloqueia investimentos e consumo.

O governo pode ainda emitir dinheiro, diminuindo o valor da moeda e gerando inflação. E pode tomar emprestado. Tomando emprestado, paga juros, que variam não por vontade do governo mas pela análise dos credores - instituições financeiras, empresas e pessoas que compram títulos do Tesouro. Se esses credores percebem que o governo não vai conseguir pagar, porque o déficit é crescente e descontrolado, tomam duas possíveis atitudes: ou deixam de emprestar ou passam a cobrar juros absurdos.
Em qualquer caso, o governo quebra, ou seja, fica sem dinheiro para pagar suas contas.  Portanto, a escolha não é fazer ou não fazer o ajuste das contas públicas, incluindo a reforma da Previdência. O ajuste será feito, por bem, via leis votadas no Congresso, ou por mal, quando o governo simplesmente fica sem dinheiro para pagar suas contas, incluindo aposentadorias.
Exemplo, Rio de Janeiro. Mas uma vez feito o ajuste, na boa, nem por isso o país volta a crescer de modo forte e sustentado. O ajuste melhora a confiança e , pois, a atividade econômica. O crescimento, porém, depende de uma profunda mudança no ambiente de negócios, mudança legal, institucional e cultural. Em vez de discutir este ponto na teoria, eis um caso que ilumina o conjunto. 
 Ginástica "hora extra"
Uma usina de açúcar de Jacarezinho, no Paraná, teve a ideia de oferecer 15 minutos de ginástica para os cortadores de cana, diariamente. A prática era facultativa. Quem não quisesse participar simplesmente ficaria descansando. O trabalhador, claro, não pagava nada por esse benefício. Pois um funcionário foi à Justiça do Trabalho para reclamar aqueles 15 minutos como "hora extra". Ganhou na primeira instância. A empresa recorreu ao Tribunal Regional do Paraná e perdeu. Foi ao Tribunal Superior do Trabalho e perdeu de novo.
Os juízes decidiram que a ginástica laboral tem a ver com prevenção e segurança do trabalho, de modo que deve ser computada na jornada.  Como a empresa, claro,  não computava, os 15 minutos se tornaram "hora extra". Não se levou em consideração que a ginástica era escolha do funcionário. Com isso, a Justiça do Trabalho impôs um custo e uma insegurança não apenas à empresa de Jacarezinho, mas a todas as outras.
Qual usina vai oferecer a ginástica sabendo que poderá ser cobrada por isso? Ou qual empresa vai oferecer qualquer vantagem, como uma aula de meditação ou um curso de futevôlei, sabendo que poderá cair na hora extra? Qualquer pessoa de bom senso vê um absurdo nessa situação. Mas não a Justiça do Trabalho. Para seus juízes, o tempo que o empregado leva para trocar de roupa ou lanchar deve ser incluído na jornada. E há também decisões mandando incluir na jornada o tempo que o funcionário passa no fretado da empresa.
Isso mesmo. O trabalhador gasta horas no transporte público, lotado. A empresa oferece um ônibus fretado, em condições claramente superiores. Pois bem, há juízes que entendem que ao entrar no fretado o trabalhador já está à disposição da empresa. Logo, "hora extra". Se isso se tornar uma norma geral, compulsória, de duas, uma: ou as empresas cancelam os fretados, prejudicando os trabalhadores; ou absorvem os custos, perdendo competitividade.
Além disso, reparem: o caso da ginástica laboral percorreu todas as instâncias, foi de Jacarezinho a Brasília. Um tremendo custo da Justiça, para impor custos extras a uma atividade econômica.  Todo esse custo poderia ser anulado com uma medida simples. A empresa simplesmente perguntaria aos trabalhadores, numa assembleia ou numa pesquisa, se desejavam ter a ginástica antes ou depois da jornada. A maioria decidiria. O negociado teria valor. 
Qual proteção tiveram os trabalhadores da usina com a decisão do TST? Nenhuma. O que recorreu, receberá a hora extra. Os demais perdem a ginástica. Sensacional, não é mesmo? Há centenas e centenas e casos assim. O projeto de reforma trabalhista em debate estabelece que o negociado vale mais que o legislado. Se já valesse, os cortadores de cana da usina de Jacarezinho continuariam com sua ginástica. E boa parte da Justiça do Trabalho seria dispensada.


quinta-feira, 29 de dezembro de 2016

‘A gente somos inútil’

Basta ver a situação do FGTS para se verificar que o Estado é justamente o mais incompetente para gerir essas contas

Acontecem situações assim: os trabalhadores perdem horas no transporte público. A empresa resolve oferecer o conhecido fretado. O trabalhador chega a tempo e mais disposto.
Acontece em seguida: trabalhadores demitidos pedem nas indenizações as horas extras passadas nos fretados. Alegam que estão à disposição da empresa desde o momento em que apanham o ônibus, logo, é hora extra, dormindo.

Outra situação: a empresa resolve oferecer um café da manhã. Claro que o sujeito, para pegar o lanchão, tem que chegar meia hora antes de bater o ponto. É optativo, o funcionário pode comer em casa. Mas não. Em qualquer conflito, o trabalhador alega que a hora do lanche matinal é hora extra.  A tese, claro, é invenção de advogados trabalhistas. É argumento jurídico, sustentam, mas, vamos falar francamente: é um truque que não resiste ao bom senso.

Mas o leitor já desconfia. Não raro, a tese vence na Justiça do Trabalho. E quando esse tipo de processo começa a prosperar, a empresa resolve cancelar o fretado e o café da manhã.  Aí voltam os advogados para dizer que o benefício não pode mais ser retirado, porque já havia se incorporado aos vencimentos. Fica, pois, a empresa obrigada a oferecer o fretado e o lanche e a pagar horas extras nos dois casos.

Que os advogados formulem essas teses, vá lá, é da profissão, embora não pareça, digamos, ético.  Mas por que muitos juízes concedem as vantagens? Aqui é mais ideologia. A seguinte: o papel do juiz não é interpretar e aplicar a lei, mas fazer justiça. E quem decide onde está a justiça? O juiz, claro. Mas se ele não precisa e não deve, alegam, observar a letra e o espírito da lei, a decisão torna-se subjetiva. Com critério: a decisão a favor do suposto mais fraco.

Quem é o mais fraco? O empregado, o segurado de um plano de saúde, o cidadão comum que demanda contra o banco ou qualquer grande empresa. Resumindo: qualquer demanda contra o capital é boa.  Em debates, já dividi mesas com juízes que garantiam: “Toda vez que tenho um caso entre o segurado e o plano de saúde, eu decido a favor do segurado, não importa se o procedimento está ou não está previsto no contrato; a vida não tem preço”.

Ora, a vida tem preço: quanto custa uma sala de UTI? Médicos e enfermeiros não trabalham de graça. O remédio custa dinheiro, mesmo sendo fornecido pelo Estado.  Neste caso, o juiz está apenas transferindo a conta para outras pessoasoutros segurados do plano, cujo preço sobe, ou os contribuintes, que pagam um pouco mais de imposto. Ou pacientes do SUS que ficam sem o seu medicamento porque o dinheiro foi aplicado em outros procedimentos mais caros, por decisão judicial.

Instala-se a confusão, e tudo funciona mal. Empresas não concedem benefícios porque estes podem gerar custos trabalhistas. A Justiça do Trabalho fica entupida com três milhões de processos por ano, gerando custos para o contribuinte (na forma de impostos para sustentar a instituição), para as empresas e para os trabalhadores.  Por trás de tudo, há uma visão autoritária, pela qual o Estado tem que tomar conta e proteger o trabalhador, o cidadão comum, ambos considerados incapazes. Isso é cultural.

O caso da Justiça do Trabalho é o mais evidente. E ali está também a evidência do equívoco. Leis e contratos existem para que a justiça seja feita de modo tão objetivo quanto possível. Está suposto que o legislador escreve leis para regular e organizar as relações sociais e os direitos individuais. Sempre há situações em que o juiz tem que interpretar qual lei e como se aplica ali.  Mas se o juiz entende que não precisa da lei para fazer justiça, instala-se a insegurança jurídica para todos — o que atrasa o país e trava negócios.

A ideia de que o trabalhador é incapaz de saber quais são seus direitos faz parte dessa visão autoritária. Assim como, por exemplo, a ideia de que o governo é que deve administrar a poupança do trabalhador, caso óbvio do FGTS. O dinheiro é da pessoa, mas quem dá a taxa de correção e decide sobre a aplicação são os tecnocratas e os políticos.  Aliás, basta ver a situação do FGTS para se verificar que o Estado é justamente o mais incompetente para gerir essas contas. Para não dizer corrupto.

Também faz parte dessa visão autoritária a lei que proibia que comerciantes e fregueses negociassem. O preço deveria ser sempre o mesmo, quer o pagamento fosse em dinheiro ou cartão, à vista ou dez vezes. Uma estupidez. Mas tinha e ainda tem muita gente dizendo que isso protegia o consumidor. Obrigando um a pagar mais para aliviar a conta do outro? E quem mesmo o Estado estava protegendo, o consumidor ou a empresa de cartão de crédito? [Essa 'diferenciação' de preços, resultado de uma  'negociação', prejudica o consumidor, por favorecer a esperteza do comerciante.
Como assim? agora o total parcelado 'sem juros' passa a ser o preço oficial para quem paga à vista, considerando um inexistente desconto negociado para pagar à vista,  e, quem paga parcelado arca com um preço maior em função do parcelamento.
A medida vai contra um fato: apenas uma minoria pode pagar à vista e 'usufruir' do novo preço 'negociado'.
O comerciante passa a ganhar por duas vias:
- ao vender à vista, pelo preço que já embutia juros por ser parcelado em várias vezes, sem juros, se tornou o preço para quem paga a vista - se for 'cash' melhor ainda;
A INsegurança Pública existente em todo o Brasil estimula em  muito carregar dinheiro em espécie.
 - e ao ter permissão para cobrar juros pelo parcelado = juros ocultos + juros declarados, assumidos. ]
Tudo considerado, está correta essa proposta de reforma trabalhista. Diz que trabalhadores e empresas podem resolver livremente diversas questões.

Também está correta essa MP que permite “a diferenciação” de preços e condições de pagamento. Até acharam um jeito de escapar do ridículo que seria uma lei dizendo: é permitida a negociação de preços.
Também foi uma boa ideia liberar uma parte do FGTS. Mas ainda falta: o titular da conta deveria ter o direito de dizer onde vai ser aplicada.

“A gente não somos inútil”.

Fonte: Carlos Alberto Sardenberg,  jornalista