Prazo para a AGU
negociar o fim auxílio-moradia recebido por juízes e procuradores está
no fim. Solução deve passar pela incorporação do valor, o que vai elevar
os gastos de todos os poderes. Outros penduricalhos tiveram reajuste de
3% ontem
O aumento pleiteado pelos juízes na Câmara de Conciliação da
Advocacia-Geral da União (AGU) pode ter um impacto de sete dígitos no
orçamento do Poder Judiciário, cuja proposta está prestes a ser enviada
para 2019 ao Congresso. A questão envolve o pagamento do
auxílio-moradia, cerca de R$ 4,5 mensais, dos quais magistrados e
procuradores só abrem mão se receberem salários maiores. O remanejamento
dos subsídios faz crescer também os problemas fiscais do país, que já
sofre com gastos inesperados após a greve dos caminhoneiros, em meio ao
rombo acumulado pela queda da arrecadação tributária em consequência da
recessão de 2015 e 2016.
No mês passado, a presidente do Supremo
Tribunal Federal (STF), ministra Cármen Lúcia, pediu às associações de
magistrados que resolvessem a questão até junho. É o limite para que a
Justiça redija e encaminhe uma proposta orçamentária para o ano que vem.
O fim do auxílio-moradia é discutido sob sigilo na Câmara de
Conciliação da AGU. Desde abril, juízes, procuradores, representantes
dos estados e do Ministério do Planejamento foram recebidos
separadamente pelo grupo em três ocasiões. Apenas o primeiro encontro
contou com todos os envolvidos.
Enquanto os juízes continuam a pleitear o aumento de salário, comemoram
um benefício concedido ontem. Ganharam reajuste de 3% no auxílio
alimentação e no auxílio pré-escola, segundo determinação publicada no
Diário Oficial da União. A portaria foi assinada pela presidente do STF,
ministra Cármen Lúcia, e pelo presidente do Tribunal Superior Eleitoral
(TSE) Luiz Fux. O auxílio para alimentação sobe para R$ 910,08 — pouco
menos que o salário mínimo, atualmente fixado em R$ 937 — e o
pré-escolar fica em R$ 712,62.
Mesmo com o segredo em torno da
negociação do auxílio-moradia, representantes da categoria afirmam que a
conciliação traz como ideia principal uma reorganização do subsídio
(que pode chegar a R$ 33,7 mil) e a retirada do auxílio-moradia. A
assessoria de imprensa da AGU não antecipou a decisão, mas afirmou que,
como não existe lei que institua o auxílio-moradia, a instituição é
contra seu pagamento. “É uma resolução dos tribunais garantida por
liminar do ministro do STF Luiz Fux. A posição da AGU é a de que o
benefício deve acabar se não houver lei no Congresso tratando sobre o
tema”.
Sem imposto
O auxílio-moradia tem
caráter indenizatório, sem desconto de Imposto de Renda. O valor varia
de estado para estado. Segundo o último relatório do Conselho Nacional
de Justiça (CNJ) encomendado pela ministra Cármen Lúcia, há 17.338
juízes no Brasil e todos recebem o benefício, cujo valor varia entre R$ 4
mil e R$ 5 mil. Os aposentados — cerca de 3 mil pessoas, de acordo com a
Associação dos Magistrados do Brasil (AMB) — e os pensionistas, não
ganham o adicional.
O aumento de salário, entretanto, causaria um
efeito cascata na instituição. “Se você contar que o salário do
Judiciário regula todos os salários dos procuradores da República e dos
juízes, o rombo pode ser muito grande. Como não existe imposto, o
rendimento líquido teria de ser compensado em 20%. Assim, o impacto fica
ainda mais expressivo”, explicou o professor Geraldo Biazoto, do
Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
Ex-coordenador
de política fiscal da Secretaria de Política Econômica do Ministério da
Fazenda, Biazoto lembra que a eventual aprovação de um aumento nos
salários dos juízes é a “validação de um reajuste implícito instituído
via auxílio-moradia”. Ao aprovar essa negociação, abre-se um precedente
para que outras categorias que também são abastecidas por penduricalhos
reivindiquem a oficialização de um reajuste. “Teremos uma fila com
militares, com servidores da Receita Federal e da Polícia Federal, do
Itamaraty. Os aumentos tornarão a situação insustentável”, detalhou.
O
aumento do Judiciário repercute nas demais categorias do serviço
público, ainda que não de forma automática. Os vencimentos dos ministros
são usados como referência para o teto de outras categorias. “As
mudanças podem ativar uma tensão social abastecida pela crise dos
caminhoneiros. Na hora que você pega um segmento já privilegiado e dá um
prêmio desse tamanho, é claro que a sociedade vai reagir”, completou
Biazoto.
Desde janeiro, as 27 associações estaduais de
magistrados e outras do Ministério Público pressionam o Supremo na
questão dos salários e do auxílios-moradia. Ano passado, tanto a
ministra Cármen Lúcia quanto a procuradora-geral da República, Raquel
Dodge, negaram os reajustes. Ambas afirmaram que “não era o momento”.
Tanto os magistrados quanto os representantes do Ministério Público
recebem, além dos salários, o auxílio-moradia. Além disso, têm
benefícios como carro com motorista, gratificações, como a de acúmulo de
jurisdição, e indenizações.
Levantamento do CNJ mostra que quem mais gasta com auxílio-moradia é a
Justiça do Trabalho. Apenas neste ano, ela deve consumir R$ 197,7
milhões exclusivamente com o pagamento deste benefício. “A Justiça do
Trabalho é tão cara e tão lenta em sua prestação de serviços à sociedade
que, caso ela fosse destituída e o Estado indenizasse seus requerentes,
seria mais rápido e mais barato”, acredita a ministra aposentada Eliana
Calmon, ex-corregedora do Conselho Nacional. O auxílio-moradia
dos magistrados é pago desde 2014 a todos os juízes, inclusive àqueles
com imóveis nas cidades onde trabalham. A decisão foi determinada com
base em liminar do ministro Luiz Fux.
STF tira da pauta ação do parlamentarismo
A
presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministra Cármen Lúcia,
retirou da pauta do plenário a ação que discute se é possível migrar do
sistema presidencialista para o parlamentarista por meio de emenda
constitucional, sem a realização de um plebiscito. O processo, de 1997,
seria analisado no dia 20 de junho, mas houve registrou pedido de
desistência de seus autores, assinado pelo deputado federal Arlindo
Chinaglia Júnior, pelo ex-ministro e ex-deputado Jacques Wagner, e pelo
jurista Hélio Bicudo. A solicitação de desistência, protocolada ontem,
ainda não foi analisada pelo relator do processo, ministro Alexandre de
Moraes.