As
manobras de Dilma para angariar apoio não estão dando certo. A reforma
ministerial dá frutos podres
Não, presidente Dilma
Rousseff. Talvez seja tarde para descobrir o óbvio. Fidelidade se
constrói, respeito se conquista, amor se cultiva. Mesmo num país em que os partidos políticos se
desmoralizam a tal ponto que tudo parece estar à venda no Congresso – do voto à consciência –, Dilma percebe que é
hoje uma mulher traída e uma líder mal-amada.
Não importa
quantos cargos ela tenha distribuído, quantas concessões tenha feito. Não
importa quantos mimos tenha oferecido a seus concubinos. Eles traem. Conspiram. Querem mais. A insatisfação costuma
conduzir à infidelidade. Se até os partidos comprados traem Dilma, a
rebeldia não se explica apenas pelo vício da prostituição do poder. Nem os pares de Dilma se afeiçoaram a ela
– muitos, se não falam mal pela frente, o fazem pelas costas.
Toma lá. E não dá cá. De todas as derrotas sofridas por Dilma nos últimos dias – e não foram poucas –,
a falta de quórum na Câmara para votar
seus vetos às pautas-bomba pode ter sido a que mais a magoou. Um sinal
do que vem por aí. Sua maior luta, hoje, é travada nas duas Casas, e não com
juízes, procuradores, jornalistas ou eleitores. “Juntos, somos imbatíveis”, disse Dilma em Barreiras, na Bahia. Juntos... com quem, exatamente? Com senadores e deputados.
As manobras de Dilma para angariar apoio não estão dando certo. A “reforma ministerial”, de custo moral e ético muito alto, dá
frutos podres. Delcídio do Amaral (PT-MS), líder do governo no Senado, diz: “Acho que alguma coisa não está
funcionando”. Acha mesmo ou tem certeza? O líder do PR na Câmara, Maurício
Lessa, afirma: “O governo não pode achar
que resolve a vida só com o PMDB”. Não
mesmo. Há um novo bloco de partidos revoltados. O “baixo clero” pode ser muito
baixo. O que é pior: os dois maridos oficiais – o PT e o PMDB – não estão unidos em torno da matriarca.
O elemento
peemedebista Eduardo Cunha, presidente da Câmara, cada vez
mais afundado em suas contas movediças, familiares e milionárias em dólares na
Suíça, exerce poder avassalador contra
Dilma – mas pode cair antes de qualquer um em Brasília. Comprovadas as
contas secretas e a origem de corrupção, Cunha não poderá continuar a presidir
a Câmara. Simples assim. Não tem moral
para falar de moral. Dilma e Lula sonham em lavar Cunha
a jato.
Não sinto
pena de Dilma. Ela fez por merecer o pesadelo atual.
Muito pior foi o pesadelo em que ela jogou o Brasil, ao usar no
ano passado R$ 106 bilhões em
barbeiragens fiscais para enganar o eleitor mais crédulo. Criou uma Ilha da
Fantasia em que o estudante, a dona de casa, o trabalhador, o pequeno
empresário, o jovem idealista, a classe média e os mais carentes se inspiraram
para reelegê-la.
Dos R$ 106 bilhões, R$ 40 bilhões de bancos
públicos foram usados nas pedaladas – o termo usado para adiar
pagamentos e maquiar as contas públicas. Estamos,
todos nós, pagando agora por isso. Nos primeiros oito meses de 2015 como foi publicado no
jornal O
Globo na sexta-feira, o Tesouro Nacional já repassou a BNDES,
Banco do Brasil e FGTS R$ 14,4 bilhões. Objetivo? Cobrir os gastos com
juros subsidiados de programas federais no ano passado. Esse é o preço, até agora, da
operação-bomba para reeleger Dilma.
Nunca antes
na história um presidente pedalou com um doping dessa magnitude. Nunca antes se usou tamanho artifício para mascarar uma
gestão incompetente e temerária e alimentar o marketing piegas da mãe do PACo. É
uma constatação financeira, técnica, nada ideológica ou política. Basta
examinar os gráficos, ano a ano. São números, não palavras. Não há
subjetividade nem torcida contra.
Quando Dilma vê “luz no fim do
túnel”, é natural. Não tem saída a não ser parecer otimista.
Jaques Wagner, o novo escudeiro imposto por
Lula na Casa Civil, é só elogios: “A
presidente é uma guerreira, ela opera muito bem diante da dificuldade... ela
entende que (a
reprovação das contas pelo Tribunal de Contas da União) é uma página virada e que a batalha definitiva será no Congresso”.
Leia-se batalha para continuar a
governar. Batalha para não sofrer impeachment. Para não desmilinguir.
A
reprovação das contas de Dilma pelo TCU já era esperada. Mas não por essa
goleada de 8 a zero. Unânime, inédita, histórica. Dilma se preocupa
com o uso que o Congresso fará dessa derrota. O país tenta olhar o lado bom. O
da prestação de contas. Contas fiscais e morais. Afinal, quem quer fidelidade
precisa ser fiel, em primeiro lugar. Precisa ser responsável. A moeda que conta
para nós é esta, a da responsabilidade com a nação e com os eleitores. Tanto a
presidente quanto o Congresso deveriam saber que não é possível cobrar
sacrifício ou fidelidade de quem se sente espoliado ou traído.
Fonte: Ruth de Aquino –
Revista Época
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