Dinheiro
de propina arrecadada por Eduardo Cunha na Petrobras, que irrigou campanhas de
prefeitos em 2012 e deputados em 2014, é um novo foco de investigação
No
fim da tarde de um domingo, 18 de setembro de quatro anos atrás, o motorista do Land Rover EIZ 8877 atravessou a barreira eletrônica
da portaria do condomínio Park Palace, na Barra da Tijuca, na Zona Oeste do
Rio, virou à esquerda e estacionou em frente a uma casa de dois andares, de
fachada amarela com detalhes em branco. Já conhecia a residência e escritório
do deputado Eduardo Cunha, no primeiro cômodo à esquerda da entrada.
Logo
saíram para uma reunião no Leblon, a 20 quilômetros. No meio da Avenida das
Américas, o telefone celular (9)9458-6917 buzinou. Fernando Soares, conhecido
como Baiano, confirmou o endereço a Julio Camargo. Meia hora depois, os três
romperam o silêncio dominical de um escritório de advocacia: “Ele (Cunha), extremamente amistoso, dizia
que ele não tinha nada pessoal contra mim, mas que havia um débito meu e que
isso estava atrapalhando”, relatou Camargo em juízo.
O
deputado, atual presidente da Câmara, se associara a Baiano na cobrança de US$ 16 milhões em propina de
Camargo, que atuava num negócio de US$
1,2 bilhão da Petrobras com os grupos Samsung (Coreia do Sul) e Mitsui
(Japão), para compra de dois navios-sonda.
Combinaram
um cronograma de pagamentos. O deputado exigiu prioridade, contou Baiano a
procuradores: “Até abril ou maio de 2012,
porque usaria este dinheiro para campanhas nas eleições municipais”. Aliados de Cunha em diferentes partidos
estavam no centro do poder do governo estadual, da prefeitura da capital e de
25% do interior do Estado do Rio. Ele se preocupava com alianças financeiras
para campanhas de alguns candidatos, dentro e fora do seu partido.
O acordo
de pagamentos não foi cumprido. Camargo alegava dificuldades com os seus
financiadores coreanos. Cunha teve uma ideia, segundo Baiano: “Sugeriu que fosse feita uma doação para o
PMDB. Também não deu certo.” No segundo semestre de 2012, o deputado pressionava “em busca de verbas para a
campanha dos políticos de seu partido”, insistiu Baiano, em depoimento. Foi
encontrá-lo e, na conversa, viu se repetir uma cena.
Cunha
atendeu ao telefone e pediu silêncio para gravar uma mensagem para uma rádio
cuja programação é voltada ao público evangélico: “Ele
chamava os ouvintes de ‘amados’ e terminava falando ‘O povo merece respeito’”. Depois, o deputado, que é dono
da empresa Jesus.com, pediu a Baiano que orientasse Camargo a pagar sua parte
sob a forma de doações a uma igreja. O “consultor”
da Samsung e da Mitsui fez dois
depósitos de R$ 125 mil em 31 de agosto de 2012. Justificou como “pagamento a fornecedores”.
Negociações e pagamentos fatiados
se arrastaram até às vésperas da eleição do ano passado. Cunha mobilizou contribuintes à
própria reeleição e para campanhas de aliados que retribuíram, em fevereiro
passado, elegendo-o à presidência da Câmara. Evidências sobre a distribuição do dinheiro
de propinas supostamente arrecadado por Cunha e transferido a candidatos a
prefeitos em 2012 e a deputados em 2014 passaram a compor um novo alvo na
investigação em andamento. O potencial é
bastante explosivo.
Fonte: José Casado, jornalista.
Nenhum comentário:
Postar um comentário