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terça-feira, 8 de maio de 2018

Testemunha envolve vereador e miliciano em assassinato de vereadora



Ameaçado de morte pela milícia, homem cita o político Marcello Siciliano e Orlando de Curicica, que está preso, em depoimento à polícia

Um homem que trabalhou para um dos mais violentos grupos paramilitares do Rio procurou a polícia para contar, em troca de proteção, que o vereador Marcello Siciliano (PHS) e Orlando Oliveira de Araújo - ex-PM preso acusado de chefiar uma milícia - queriam a morte da vereadora Marielle Franco (PSOL), assassinada com o motorista Anderson Gomes, no dia 14 de março, no Estácio. Em três depoimentos à Divisão de Homicídios (DH) da Polícia Civil, ele deu informações sobre datas, horários e até locais de reuniões entre o vereador e o miliciano, que hoje cumpre pena em Bangu 9. Também deu detalhes de como, segundo ele, a execução foi planejada. As conversas entre os dois teriam começado em junho do ano passado. Procurado pelo GLOBO, Siciliano disse que não conhece Orlando de Curicica e afirmou que se trata de "notícia totalmente mentirosa".


Até agora, foram dois depoimentos nas dependências do Círculo Militar, na Urca, e um na sede da DH, na Barra da Tijuca. O GLOBO teve acesso ao relato da testemunha, que primeiramente procurou a Superintendência da Polícia Federal, na Praça Mauá, onde passou a ser acompanhada pelos delegados federais Hélio Khristian Cunha de Almeida, Lorenzo Martins Pompilio da Hora e Felício Laterça, que, após tomarem conhecimento da gravidade dos fatos, procuraram o chefe de Polícia Civil, delegado Rivaldo Barbosa.


No depoimento, a testemunha contou ter presenciado pelo menos quatro conversas entre o político e o ex-policial que, mesmo preso, ainda chefia uma milícia na Zona Oeste. Além disso, forneceu nomes de quatro homens que teriam sido escolhidos para o assassinato, agora investigados pela polícia. O depoente afirmou que, em junho do ano passado, testemunhou um encontro entre o vereador e o ex-PM em um restaurante na Avenida das Américas, no Recreio dos Bandeirantes, cujo nome foi fornecido aos policiais. Ele disse que ouviu os dois falando sobre Marielle.  — Eu estava numa mesa, a uma distância de pouco mais de um metro dos dois. Eles estavam sentados numa mesa ao lado. O vereador falou alto: “Tem que ver a situação da Marielle. A mulher está me atrapalhando”. Depois, bateu forte com a mão na mesa e gritou: “Marielle, piranha do Freixo”. Depois, olhando para o ex-PM, disse: “Precisamos resolver isso logo”— afirmou a testemunha, referindo-se a um menção feita ao deputado estadual Marcelo Freixo (PSOL), de quem Marielle foi assessora durante a CPI das Milícias, na Assembleia Legislativa do Rio.


Na época da reunião, o ex-PM já era foragido da Justiça. Ele tinha dois mandados de prisão, e, em outubro, acabou sendo preso numa operação da Delegacia de Repressão às Ações Criminosas Organizadas e Inquéritos Especiais (Draco-IE) e da Coordenadoria de Recursos Especiais (Core).O delator afirmou que o vereador e o ex-PM têm negócios em conjunto na Zona Oeste. Em seus depoimentos, ele mencionou os nomes de pelo menos 15 pessoas, incluindo policiais, bombeiros e empresários, que seriam participantes do grupo comandado pelos dois. Segundo a testemunha, o político dá suporte financeiro a várias ações da suposta milícia: — O ex-PM era uma espécie de capataz do vereador, que passou a apoiar a expansão do grupo. Pelo que sei, era apoio político, mas ouvi comentários de que a milícia agia em grilagem de terras na Zona Oeste, especialmente no Recreio dos Bandeirantes. 


A testemunha disse que esteve presente nas reuniões entre o vereador e o ex-PM porque, por aproximadamente dois anos, foi obrigado a trabalhar como segurança do miliciano, depois que o criminoso tomou a comunidade onde o delator instalava equipamentos de TV a cabo - um trabalho que, segundo ele, estava em processo de regularização. Como foi ameaçado de morte na ocasião, acabou coagido a trabalhar para o grupo criminoso chefiado pelo ex-PM, que mesmo preso controla mais de uma dezena de comunidades na Zona Oeste, entre elas, o Terreirão, no Recreio dos Bandeirantes, e a Vila Sapê, em Curicica. A testemunha acredita que o faturamento mensal da quadrilha seria de cerca de R$ 215 mil.  — Fui coagido: ou morria ou entrava para o grupo paramilitar. Virei uma espécie de segurança dele. Também ficava responsável por levar o filho para a escola; acompanhava a mulher de Orlando para compras em shoppings — disse.


Segundo ele, a desavença entre o vereador e Marielle foi motivada pela expansão das ações comunitárias da parlamentar do PSOL na Zona Oeste e sua crescente influência em áreas de interesse da milícia, mas que ainda seriam controladas pelo tráfico. [fica dificil entender a influência das ações comunitárias da vereadora sobre as atividades da milícia, visto que tomando como exemplo seus projetos de lei a maior preocupação dela era criar 'dia do gay', 'dia das lésbicas', 'dia em que a OMS deixou de considerar o homossexualismo doença' e tais projetos com certeza não perturbariam as atividades de uma milícia;
o testemunho está meio sem pé nem cabeça, desconexo  e deve ser examinado com muita atenção.]  

Uma das brigas, segundo a testemunha, envolvia comunidades em Jacarepaguá. A testemunha explicou ainda que o ex-PM é dono da comunidade Vila Sapê, em Curicica, que trava uma guerra com os traficantes da Cidade de Deus. Segundo a testemunha, a vereadora passou a apoiar os moradores da Cidade de Deus e comprou briga com o ex-PM e o vereador, que tem uma parte do seu reduto eleitoral na região.  — Ela peitava o miliciano e o vereador. Os dois (o miliciano e Marielle) chegaram a travar uma briga por meio de associações de moradores da Cidade de Deus e da Vila Sapê. Ela tinha bastante personalidade. Peitava mesmo — revelou. — Orlando era o braço operacional do vereador na Zona Oeste. O vereador continuou a contar com o apoio da quadrilha mesmo depois que o miliciano ser preso ano passado.


A testemunha conta ainda que, um mês antes do atentado, o ex-PM, já na cadeia, teria dado a ordem para o crime da cela de Bangu 9. Primeiro mandou que homens de sua confiança providenciassem a clonagem de um carro. O serviço teria sido feito por dois homens identificados nas investigações. Já clonado, o Cobalt prata foi visto circulando antes do crime próximo ao campo de futebol na comunidade da Merk, na Zona Oeste, controlada pelo ex-PM. A testemunha afirmou que um homem identificado como Thiago Macaco foi encarregado de fazer o levantamento dos hábitos da vereadora: onde ela costumava ir, o local que frequentava e todos os trajetos que Marielle usava ao sair da Câmara de Vereadores.


A testemunha também afirmou que outro assassinato recente, o de Carlos Alexandre Pereira Maria, de 37 anos, o Alexandre Cabeça, foi queima de arquivo. O corpo foi encontrado no último dia 8 de abril, 25 dias depois do assassinato de Marielle, dentro de um carro por policiais militares do 18º BPM (Jacarepaguá) na Estrada Curumau, na localidade conhecida como Boiúna.


Uma outra morte também teria sido queima de arquivo relacionada à execução de Marielle. O PM reformado Anderson Claudio da Silva, de 48 anos, atingido por vários tiros, inclusive de fuzil, ao entrar em seu carro, na Praça Miguel Osório, no Recreio dos Bandeirantes. O assassinato foi dois dias depois da morte de Alexandre Cabeça. Anderson chegou a reagir, e, poucos minutos depois, um ex-PM ferido foi preso não muito longe dali, na Avenida Salvador Allende. Baleado nas pernas, David Soares Batista, também de 48 anos, foi flagrado com uma pistola dentro de um veículo. Anderson foi abordado ao sair de um condomínio e, assim que ligou o motor de sua BMW, um outro veículo (HB20 branco) parou atrás, impedindo que saísse da vaga. Um outro carro não identificado se aproximou, e, em seguida, cinco homens começaram a atirar no ex-PM, que se aposentou como subtenente em 2015, após ser baleado durante uma operação no Complexo do Chapadão. Peritos recolheram uma arma dentro do BMW.


Enquanto PMs faziam buscas atrás dos assassinos, um HB20 branco parava na Salvador Allende chamando atenção de uma patrulha que passava pela avenida. Ao ser abordado, David negou participação no ataque, mas deu informações desconexas. Entre outras alegações, afirmou que, minutos antes, estava numa motocicleta, mas bandidos a teriam levado. Na primeira semana após o assassinato de Marielle e de Anderson, apoiados em detalhes da execução, como o uso de munição especial e no caminho percorrido pelos assassinos, os agentes da Divisão de Homicídios (DH) já suspeitavam de envolvimento de grupos paramilitares no assassinato. Na Câmara dos Vereadores do Rio, eles recolheram imagens de câmeras com especial atenção ao movimentos nos corredores da Casa. Nove vereadores já foram ouvidos no inquérito do caso.

O Globo

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