A tal “guinada” liderada pelo chanceler Ernesto Araújo tem potencial para acabar de vez com o que ainda resta da boa reputação do Brasil no mundo civilizado
[Brasil, antes de tudo, para os brasileiros. A propósito. qual a utilidade da ONU nos dias atuais?
O tal pacto que, é oportuno lembrar, foi rejeitado por vários países, alguns reconhecidamente democráticos, por entenderem que viola a soberania nacional.
Sem contar que foi mais uma das 'bombas' deixadas por Temer. Sem sentido, sacrificar o interesse do Brasil e seus habitantes, para privilegiar os que optar ar por deixar a Pátria Amada.]
O sombrio
ideário que até agora se afigurava como um prenúncio de retrocesso na política
externa brasileira começou a se concretizar em medidas do governo do presidente
Jair Bolsonaro. A menos que haja profunda reflexão no Palácio do Planalto e no
Itamaraty sobre os seus efeitos nocivos, a tal “guinada” liderada pelo
chanceler Ernesto Araújo – que bem poderia ser chamada de “cruzada” – tem
potencial para acabar de vez com o que ainda resta da boa reputação do Brasil
no mundo civilizado. A
Organização das Nações Unidas (ONU) foi comunicada oficialmente pelo governo
brasileiro, na terça-feira passada, de que o País está fora do Pacto Global pela
Imigração, ao qual
o Brasil havia aderido no dia 10 de dezembro do ano passado. A saída do pacto,
por si só muito ruim para o País e, principalmente, para os cerca de 3 milhões
de brasileiros que vivem no exterior – mais que o dobro do número de imigrantes
estrangeiros que vivem aqui –, é ainda pior pela razão alegada pelo governo: o
pacto violaria a soberania nacional.
“A defesa
da soberania nacional foi uma das bandeiras de nossa campanha e será uma
prioridade do nosso governo. Os brasileiros e os imigrantes que aqui vivem
estarão mais seguros com as regras que definiremos por conta própria, sem
pressão do exterior”, escreveu o presidente Jair Bolsonaro no Twitter.
Em
primeiro lugar, caso o presidente da República estivesse tão preocupado com a
soberania nacional não teria sequer aventado a possibilidade de ceder uma
porção de nosso território para uma base militar dos Estados Unidos no País,
como o fez em entrevista ao SBT. Em segundo lugar, o chamado Pacto de Marrakesh
não viola a soberania nacional. Aliás, diga-se que a decisão de aderir ao pacto
foi um ato soberano do Estado brasileiro, então representado pelo ex-chanceler
Aloysio Nunes.
O Pacto
de Marrakesh foi aprovado por 160 das 195 nações que fazem parte da ONU. No
início de dezembro, o ex-chanceler Aloysio Nunes foi enfático ao defender a
adesão do Brasil. “Eu o aprovei porque ele simplesmente contém recomendações de
cooperação internacional para combater a migração irregular e conferir
tratamento digno aos migrantes, entre os quais cerca de 3 milhões de
brasileiros que vivem no exterior”, disse o ex-ministro das Relações
Exteriores. É exatamente disso que se trata. O título integral do acordo fala
por si só: Pacto Global da ONU para Migração Segura, Ordenada e Regular.
Ao
contrário do que dizem seus críticos, o pacto não propugna a abertura
irrestrita de todas as fronteiras das nações signatárias a todo e qualquer
imigrante. O documento é taxativo ao afirmar o “direito soberano dos Estados de
determinar suas próprias políticas de migração e suas prerrogativas para
governar a migração dentro de sua jurisdição, em conformidade com as normas do
direito internacional”. Vale dizer, o Pacto de Marrakesh é um conjunto de
propostas para que as nações lidem melhor com o aumento do fluxo migratório que
tem sido observado em função de crises econômicas, guerras, perseguições
étnicas e religiosas, etc.
O
impressionante número de nações subscritoras, por sua vez, também é eloquente
sinal da oportunidade de um acordo que se presta a lidar com um problema
gravíssimo que, sim, é uma questão que deve ser enfrentada como um desafio
global, e não um problema restrito a determinados países, como crê o chanceler
Ernesto Araújo. O pacto
se coaduna com os princípios da Constituição e, em especial, com a Lei n.°
13.445/2017, a Lei da Migração. Ademais, os princípios e garantias que regem a
política migratória brasileira estão de acordo com seus termos. Ou seja, negar
o acordo firmado soberanamente pelo Brasil, para além do embaraço, é o mesmo que
negar o que determina uma lei aprovada pelo Congresso Nacional e sancionada
pelo presidente da República. [violar leis não é novidade no Brasil - até a CF foi violada várias vezes no governo Temer e em outros, até mesmo com a conivência, ainda que por omissão, do STF.]
Editorial - O Estado de S. Paulo
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