STF terá que definir alíquota máxima da Previdência
[LEMBRETE: os servidores são os 'barnabés', a arraia miúda, os membros dos Poderes e do Ministério Público, não serão alcançados;
se forem, a reforma acaba, antes de começar.]
As grandes novidades da proposta de reforma enviada ontem ao Congresso
pelo presidente Jair Bolsonaro são as alíquotas progressivas de
contribuição para a Previdência Social e a permissão para que a União,
os Estados e municípios instituam contribuições extraordinárias para
equacionar os déficits atuariais dos regimes próprios de seus
servidores. Hoje, a alíquota do servidor que ingressou no serviço público antes de
2013 e não fez opção pela aposentadoria complementar é de 11% sobre o
salário. Com a aprovação da proposta de emenda constitucional (PEC)
apresentada pelo governo Bolsonaro, haverá alíquotas diferentes para
cada faixa de remuneração, da mesma forma que existe atualmente para o
Imposto de Renda das Pessoas Físicas (IRPF).
Para o servidor, a contribuição previdenciária ordinária será de 14%, e
não mais 11%. A alíquota de 14% será reduzida em 6,5 pontos percentuais
para a faixa da remuneração de até um salário mínimo. Ou seja, a
alíquota será de 7,5% (14% menos 6,5 pontos percentuais). Para a faixa
da remuneração acima de um salário mínimo até R$ 2 mil, a alíquota será
reduzida em cinco pontos percentuais (ou seja, será de 9%). Para a faixa
da renda acima de R$ 2 mil até R$ 3 mil, a redução será de dois pontos
percentuais (12%). Acima de R$ 3 mil até R$ 5.839,45, não haverá
redução. Para a faixa da remuneração de R$ 5.839,46 até R$ 10 mil, a
alíquota de 14% será acrescida de 0,5 ponto percentual (14,5%).
Acima de R$ 10 mil até R$ 20 mil, o acréscimo será de 2,5 pontos
percentuais (16,5%). Na faixa de renda acima de R$ 20 mil até R$ 39 mil,
o acréscimo será de cinco pontos percentuais (19%). Para a faixa da
renda acima de R$ 39 mil, o acréscimo será de oito pontos percentuais.
Ou seja, a alíquota incidente sobre essa última faixa de renda será de
22% (14% mais oito pontos percentuais). As alíquotas efetivas da
contribuição previdenciária, obtidas comparando-se o valor pago com a
remuneração total, vão variar desde 7,5% até mais de 16,79%.
No caso do Regime Geral de Previdência Social (RGPS), dos trabalhadores
da iniciativa privada, as alíquotas atuais variam de 8% a 11% sobre o
salário de contribuição. Com a incidência progressiva, as alíquotas irão
variar de 7,5% a 14%, dependendo da faixa de renda. A alíquota efetiva
de contribuição ao RGPS vai variar de 7,5% a 11,68%. "Quem ganha mais
contribuirá com mais", enfatizou o secretário Especial de Previdência e
Trabalho, Rogério Marinho. O governo espera uma arrecadação extra de R$ 33,6 bilhões nos próximos
quatro anos com a mudança das alíquotas do Regime Próprio de Previdência
dos Servidores (RPPS) da União e de R$ 173,5 bilhões em dez anos. No
caso do RGPS, a mudança de alíquotas reduzirá a arrecadação em R$ 10,3
bilhões nos próximos quatro anos e em R$ 27,6 bilhões em dez anos.
A progressividade é uma questão é controversa. O Supremo Tribunal
Federal (STF) cristalizou entendimento contrário ao estabelecimento de
alíquotas progressivas para as contribuições previdenciárias de
servidores públicos, com o argumento principal de que a medida exige
autorização expressa no texto constitucional. A proposta da reforma da
Previdência do governo Bolsonaro pretende justamente mudar a
Constituição para permitir a progressividade. Existe outra discussão no Judiciário, ainda inconclusa, em torno da
alíquota previdenciária máxima que pode ser cobrada dos servidores.
Alguns tribunais têm chamado de abusiva, considerando até mesmo
confisco, alíquota em torno de 20%. O argumento é que, além da
contribuição previdenciária, os servidores também pagam imposto sobre a
renda e os tributos sobre o consumo.
O Supremo ainda não decidiu qual é o limite para a alíquota
previdenciária não ser considerada confisco. O secretário de
Previdência, Leonardo Rolim, admitiu ontem que essa questão dependerá de
pronunciamento do STF. A definição do limite para a contribuição previdenciária do servidor é
uma questão central, pois, além da "alíquota ordinária", a PEC permite
que a União, os Estados e os municípios cobrem alíquotas extraordinárias
para o equacionamento dos déficits atuariais dos regimes próprios de
seus servidores. A PEC não estabelece limite para a alíquota
extraordinária. Em tese, a soma das duas (ordinária e extraordinária)
poderá superar 20%. O déficit atuarial dos servidores da União
ultrapassa R$ 1,2 trilhão, e o dos Estados, R$ 2,4 trilhões.
Se a PEC for aprovada, os servidores também terão que trabalhar mais.
Quem ingressou no serviço público antes de 2003, por exemplo, embora
mantenha o "privilégio" da aposentadoria igual à remuneração que recebe na
ativa (integralidade), terá que trabalhar até 65 anos, se homens, e 62
anos, no caso das mulheres. Não há regra de transição para este caso.
Atualmente, a idade mínima é de 60 anos para homens e 55 anos para
mulheres. Os maiores afetados pela PEC, no entanto, serão os servidores que
ingressaram no serviço público depois de 2003 e antes de 2013 e que não
optaram pelo fundo de aposentadoria complementar. A regra de transição a
que eles serão submetidos exigirá mais tempo de trabalho para ter
acesso à aposentadoria e um tempo de serviço público de 20 anos. Para
eles, a PEC reduz o valor do benefício, pois o cálculo passa a
considerar todas as contribuições realizadas durante o período de
atividade. Hoje, o cálculo considera 80% das maiores contribuições.
Para aprovar a sua proposta de reforma da Previdência, o governo
Bolsonaro terá, portanto, que enfrentar as grandes corporações de
servidores. Foi esse embate que inviabilizou a reforma do ex-presidente
Michel Temer, além, é claro, da denúncia contra ele apresentada pelo
ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot. Para os trabalhadores da iniciativa privada, a proposta de Bolsonaro só é
mais dura do que a de Michel Temer no prazo de transição. Bolsonaro
estabeleceu prazo de 12 anos. Temer propôs 20 anos. A atual equipe
econômica desistiu de desvincular os benefícios assistenciais (BPC) do
salário mínimo, da mesma forma que fez a equipe de Temer. Na verdade,
colocou uma "isca" para elevar de 65 a 70 anos a idade mínima para a
requerer aposentadoria pelo BPC e ter direito a um salário mínimo:
concede R$ 400 para quem está com 60 anos e tem renda familiar abaixo de
1/4 do salário mínimo.
Ribamar Oliveira - Valor Econômico
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