Em depoimento ao Congresso, Sergio Moro deu a volta por cima sobre os diálogos vazados com uma dúvida que percorre os meios jurídicos e políticos e aflige a sociedade: É para anular tudo? Soltar todos?
Ao responder ao senador Fabiano Contarato (Rede-ES) no depoimento ao Congresso, o ministro Sérgio Moro deu um xeque-mate não só na oposição e no Congresso, mas no Supremo, que julgará nesta terça-feira o pedido de suspeição de Moro e a consequente anulação de todo o processo que levou o ex-presidente Lula à prisão. Delegado e professor de Direito, Contarato foi implacável ao citar a Constituição, o Código Penal e a Lei da Magistratura, enfatizou a imparcialidade de juízes como essência da democracia e condenou diálogos que Moro teria tido com procuradores: “Se eu, como delegado, fizesse contato com as partes de um inquérito, sairia preso da minha delegacia”.
Os questionamentos, pertinentes, geraram um momento de tensão, mas Moro deu a volta por cima com uma dúvida que percorre os meios jurídicos e políticos e aflige a sociedade: “O sr., então, quer que se anule tudo?” O próprio Moro destrinchou o que seria esse “tudo”: anular todos os processos de governadores, parlamentares, empreiteiros, altos funcionários e doleiros condenados pela Lava Jato? Até dos pivôs Renato Duque e Paulo Roberto Costa? E devolver todo o dinheiro recuperado, algo próximo de R$ 3 bilhões, para esses condenados e para as empresas?
Xeque-mate, porque é disso que se trata nesse jogo de acusações entre os que condenam Moro pelos diálogos e os que podem até achar que não foram bonitos e corretos, mas nem por isso destroem as provas e o processo de julgamento por tribunais de segundo grau e, no caso do ex-presidente Lula, até pelo Superior Tribunal de Justiça, o STJ. O efeito, inclusive político, da anulação de “tudo” seria devastador. O alerta de Moro vale para o Supremo, mais precisamente para a Segunda Turma, que se reúne na próxima terça-feira, pela primeira vez sob a presidência da ministra Cármen Lúcia, para tratar desse “tudo”. É nessas horas que eu não gostaria de estar na pele desses ministros, sofrendo enorme pressão de fora, de dentro e, em alguns casos, da própria alma, ou coração. [por isto insistimos que seria conveniente um 'tuíte', estilo general Villas Boas, na segunda à noite.]
O pedido de suspeição de Moro, feito pela defesa de Lula em 2018, ganhou
força e impacto com a revelação dos diálogos captados do celular do
procurador Deltan Dallagnol. A PGR já se manifestou contra a suspeição
de Moro e a anulação do processo, até porque há dúvidas sobre a
veracidade integral e a abrangência dos diálogos. Mas a situação
continua muito complexa. Em votação anterior, Cármen Lúcia e Edson Fachin já se manifestaram
contra a petição, mantendo as decisões de Moro e a condenação de Lula.
Eles, entretanto, podem mudar o voto até a publicação do acórdão com a
conclusão do julgamento e teriam, em tese, como alegar que surgiram
“fatos novos”, ou seja, as revelações do site. [FATOS NOVOS = conveniente lembrar que fatos são verdadeiros, expressam a verdade, e as 'conversas' furtadas dos celulares invadidos NÃO TIVERAM SUA AUTENTICIDADE COMPROVADA, portanto, não podem ser consideradas fatos, haja vista a grande possibilidade de sequer terem existido;
argumentar a presunção da verdade, visto a não comprovação de terem sido forjadas, não pode prosperar já que a Constituição Federal proíbe que provas obtidas por meios ilícitos integrem o processo.
Portanto, nenhum dos ministros pode alegar o surgimento de 'fatos novos'.]
Logo, o julgamento recomeça, na prática, do zero a zero, sem comportar
uma saída estratégica e um alívio para os cinco ministros: empurrar o
abacaxi para o plenário. Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski já tentaram
isso antes e perderam. Não há como retomar a discussão. Como o decano Celso de Mello é um “garantista” empedernido, a aposta
seria de três votos a favor da anulação e dois contra. Só que decisões
do STF jamais são simples assim, como uma continha aritmética. Anular
“tudo” seria o fim do mundo, uma convulsão. Qual a aposta? Ou uma
alternativa de meio termo, menos dramática que esse “tudo”, ou empurrar
com a barriga. [o 'garantismo' do ministro Celso de Mello talvez não seja suficiente para ele ignorar o inciso LVI, do artigo 5º da CF - que leva ao brocardo: o que não está nos autos não está no mundo'.
A tendência é empurrar para pós recesso do STF = agosto.]
PS: Aliás, investigadores acham que Lula e o PT, os beneficiados
mais diretos dos diálogos de Moro, não foram os responsáveis pela
invasão das contas de autoridades, que é crime. As suspeitas recaem
sobre os próximos da fila da Lava Jato. Têm muito dinheiro e poder e não
são partidos nem políticos. A ver.
Eliane Cantanhêde - O Estado de S. Paulo
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