Wilson Witzel (Harvard Fake '15) quer um autódromo para o Rio, mas a cidade precisa de outras coisas
Poucas questões refletem a decadência das administrações públicas
nacionais como a crueldade embutida no projeto de construção de um
autódromo no Rio de Janeiro. A ela associou-se o presidente
Jair Bolsonaro. Ganha um fim de semana em Caracas quem for capaz de dizer
que o Rio, falido, violento, com escolas e hospitais em pandarecos,
precisa disso. Criou-se até mesmo uma hipotética disputa com São Paulo, como se as
corridas de automóveis tivessem grande utilidade. Começando pela
história do autódromo de Interlagos, é bom lembrar que o nome da região
foi associado a um ambicioso projeto imobiliário dos anos 20 do século
passado. O empreendimento ruiu e a conta foi para a Viúva. O que deveria
ser um bairro ajardinado virou um autódromo murado. Encravado numa
região populosa, ele é um pouco menor que o aterro do Flamengo.
Enquanto o Rio deve a Carlos Lacerda e a Lota de Macedo Soares a
transformação de pistas para automóveis numa joia da cidade, São Paulo
ganhou uma cicatriz da privataria. A ideia de transformar Interlagos num
parque renasce a cada dez anos, mas acaba travada pelos interesse
sombrios que se movem em torno da corrida. Se o Grande Prêmio de Fórmula
1 for para o Rio, ou para Pyongyang, a cidade de São Paulo ganhará um
jardim público facilmente financiável. São Paulo também não precisa da
Fórmula 1. A Parada Gay, a Marcha para Jesus e a Virada Cultural atraem
muito mais visitantes, com maior participação popular e valor cultural.
Fica então uma pergunta: o Rio precisa do autódromo? Se precisasse, não
teriam demolido o que existiu até 2012. Argumentando-se que voltou a
precisar para receber a corrida de automóveis, cria-se um caso clássico
de rabo abanando o cachorro. A cidade teve os jogos da Copa, com a roubalheira da reforma e
privatização do Maracanã. Logo depois, veio a fantasia da Olimpíada. A
vila dos atletas está encalhada. As arenas e o parque aquático têm menos
visitantes e atividades que as ruínas romanas das Termas do imperador
Caracala.
O Rio fez sua Olimpíada na Barra da Tijuca e para lá estendeu uma linha
de metrô. Quatro anos antes, Londres fizera a sua. Exagerando, as
grandes obras dos ingleses foram para as cercanias de um bairro parecido
com as terras da Baixada Fluminense (sem tiros) e para lá levou-se o
metrô. Criou-se uma nova região, bonita e vibrante. Seu shopping center
tem mais movimento que qualquer similar do Rio ou de São Paulo. A
Olimpíada de Londres legou progresso, a do Rio sacralizou o atraso. Não é
à toa que dois governadores estão na cadeia, onde passou uns dias o
presidente do comitê dos Jogos. Já o prefeito maravilha perdeu a eleição
do ano passado. Foi derrotado pelo juiz Wilson Witzel (Harvard Fake
'15). Afora sair por aí dizendo que quer matar gente, sua ideia mais
pomposa veio a ser a da construção do autódromo. Evidentemente, o custo
seria coberto pela iniciativa privada. Conta outra.
A ideia de dar pão e circo ao povo foi coisa dos imperadores romanos à
época em que a cidade controlava o mundo. Roma teve césares doidos, mas
nenhum deles acreditou nisso quando o tesouro não tinha como pagar suas
contas.
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