O Estado de S.Paulo
Governadores socorrem Ceará e se unem a STF e Congresso para exigir espírito republicano
[20 governadores estaduais, aliados a dois poderes constitucionais - Judiciário (STF) Legislativo (Congresso Nacional), contra o livre funcionamento do Poder Executivo = GOLPE.
Permite que o Chefe do Poder agredido acione o artigo 142, caput, da CF,em consonância com a LC 97.]
O que têm em comum o advogado e ex-juiz Wilson Witzel, do Rio, de
direita e do PSC, e o engenheiro agrônomo e professor Camilo Santana, do
Ceará, de esquerda e do PT? Os dois integram a nova força emergente, e
de resistência, nessa tão emaranhada e preocupante política brasileira: a
frente de governadores.
Bastou o presidente Jair Bolsonaro ameaçar não prorrogar o uso da
Garantia da Lei e da Ordem (GLO) e lavar as mãos diante da crise no
Ceará para Witzel e os governadores de Pernambuco, Paulo Câmara (PSB), e
de São Paulo, João Doria (PSDB), articularem o envio de tropas para
socorrer o colega Santana e a população cearense. [uma palhaçada dos dois governadores é o que define a pretensão tão absurda e inútil - começa pelo efetivo ridículo - pouco mais de 100 homens.
Além da inutilidade do 'socorro' falta amparo legal para um contingente policial se deslocar entre estados e atuar em outro estado.
A GLO, executada por tropas federais - possuidoras da liberdade de deslocamento por todo o território brasileiro - é regulamentada por lei específica e só permite a utilização de forças federais.
O 'motim' do Ceará é problema do Ceará e do governador e do povo cearense que elegeu um petista para governar o Estado.
A GLO tem duração limitada, não havendo obrigação do governo federal manter a garantia até as próximas eleições, ou mesmo além.] Doria se dispôs a enviar 100 homens, 20 viaturas e dois drones da PM
paulista, enquanto fazia consultas à procuradoria sobre o seguro para os
homens da operação em outro Estado. O importante, para os governadores,
era dar o recado para Bolsonaro e não deixar o Ceará ilhado entre
bandidos agindo à luz do dia e PMs amotinados.
Simultaneamente, Camilo Santana estudava entrar com recurso no Supremo
para obrigar o presidente a manter o Exército no Estado, de acordo com a
Constituição. Em live na internet, Bolsonaro referiu-se à “minha GLO”. A
GLO não é dele, muito menos deve ficar ao sabor de disputas politicas,
mas mesmo assim seria drástico jogar o Supremo na mais nova crise entre
Planalto e governadores e mais lenha na fogueira entre os Poderes. Foi pela dupla pressão, dos governadores e da possível interferência do
Supremo, que Bolsonaro decidiu e finalmente anunciou a prorrogação da
GLO no Ceará, onde as negociações entre o governador e os PMs rebelados
empacaram numa palavra: anistia.
Bolsonaro parece tratar tudo isso na base do “bem feito!”. Não percebe
que quem está contra a parede hoje é o petista Camilo Santana, mas quem
poderá estar amanhã é o País todo. Se o Ceará ceder e anistiar facções
de uma força armada que tomaram de assalto quartéis, fecharam o
comércio, tomaram viaturas policiais, desfilaram encapuzados e miraram
para matar num senador licenciado [senador cuja irresponsabilidade deveria ser considerada, no mínimo, falta de decoro - somos levados a pensar que se fosse o presidente Bolsonaro o autor do ato tresloucado, estúpido, provocador, todos estariam querendo o seu 'impeachment'.] isso será um pavio de pólvora.
Bolsonaro não lucra nada com isso.
Em reunião no Ministério da Defesa, quinta-feira, ele ouviu um balanço
da presença da Força Nacional e do Exército no Ceará e tomou para si a
decisão de prorrogar ou não a GLO.
Art. 15. O emprego das Forças Armadas na defesa da Pátria e na garantia dos poderes
constitucionais, da lei e da ordem, e na participação em operações de paz, é de
responsabilidade do Presidente da República, que determinará ao Ministro de Estado da
Defesa a ativação de órgãos operacionais, observada a seguinte forma de
subordinação:....]
No caso dele, uma decisão envolvendo
dados reais, a disputa ideológica e, digamos, o seu jeito de ser. A
vontade irresistível de dar mais um tranco nos governadores. Eu sou
presidente, eu posso... Como pano de fundo, há a complexa questão das PMs, que são militares,
mas não são subordinadas às Forças Armadas e sim aos governos estaduais. [As polícias militares, da mesma forma que o Corpo de Bombeiros Militar, são forças auxiliares e reserva e o Exército.
É legalmente possível, até que o comando das Forças Auxiliares seja exercido por um oficial das Forças Armadas.
Durante o Governo Militar era essa a forma empregada e havia ordem - motins, só em fugídios pensamentos.] Convivem com as regras políticas dos governadores e lembram que são
militares quando, por exemplo, tentam absorver regras camaradas na
reforma da Previdência.
O fato é que 20 dos 27 governadores unem-se ao Supremo e ao Congresso
para defender o equilíbrio da República, a democracia, os bons modos e o
velho princípio de que “respeito é bom e eu gosto”. Os de São Paulo e
Rio dão voz à reação, os do Nordeste tratam de controlar as contas
públicas, atrair investimentos e manter os ganhos sociais. Há muitas
divergências entre eles, mas trabalham o que há de comum.
É isso que Bolsonaro deveria fazer: marcar posição no que há de
divergente, mas atuar em conjunto no que é de interesse do País e da
Nação. Aliás, como ocorre quando governo federal e governo de São Paulo
somam esforços contra um inimigo de todos, o coronavírus. Essa, sim, é
uma ação republicana, ninguém perde, todos ganham. Mas é preciso algo
que parece em falta: postura de estadista, noção da importância e dos
limites do cargo. Ou seja, grandeza política e pessoal.
Eliane Cantanhêde, jornalista - O Estado de S. Paulo
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