A dupla crise sanitária e econômica precisa de uma visão mais técnica, sem o calor do oportunismo político
Assim como o Supremo tirou do presidente e pôs nas mãos de governadores e
prefeitos a administração das medidas preventivas da pandemia, chega a
hora de governadores transferirem aos prefeitos a decisão de apertar ou
afrouxar os controles. Em 20 estados, a situação está parecida com a da
Coreia do Sul. Nos três estados do Sul, com 30 milhões de habitantes,
houve pouco mais de 10 mortes por milhão, as UTIs estão praticamente
vazias e parece ser muito seguro retomar a atividade econômica.
Em 14 estados, a situação está melhor que na Coreia do Sul. Na
região metropolitana do Rio de Janeiro, a situação parece fora de
controle, justificando um lockdown. As regiões metropolitanas de São
Paulo e Fortaleza parece que se estabilizam. Preocupam Manaus, Belém,
São Luís, Recife e Salvador. Sempre regiões metropolitanas. Assim, por
que não transferir aos prefeitos as decisões? Municípios fora de
registros de vidas em risco estão em condições de reativar a vida.
A
dupla crise sanitária e econômica precisa de uma visão mais técnica,
sem o calor do oportunismo político. Vejam o caso da hidroxicloroquina.
Desde 20 de março, só pode ser comprada com receita médica controlada.
Por décadas, era vendida livremente, para malária, artrite, lúpus.
Quando, depois dos chineses, Bolsonaro apostou na hidroxicloroquina, ela
foi carimbada com tarja preta. Num experimento (?) em Manaus,
ministraram superdoses que causaram a morte de 11 pacientes. Superdose
até com aspirina pode ser gravíssima. Pareceu sabotagem contra uma
solução barata e disponível, para desacreditar o presidente. Caso para a
polícia apurar.
A propósito, usei cloroquina
quando cobria guerra em Angola, em 1982, sem sentir reação adversa
alguma. Muitas dessas 17 mil vidas poderiam ter sido salvas com a
medicação logo nos primeiros sintomas, tal como se recuperaram os
doutores David Uip e Roberto Kalil Filho. Se Bolsonaro tivesse execrado a
cloroquina, talvez teria ajudado a salvar vidas, com o remédio
estimulado pela milícia midiática.
O Brasil está
em 28º lugar no número de mortes em relação à população — 76 por milhão
de habitantes. No ano passado, entre 16 de março e 18 de maio, tivemos
55 mil mortes por pneumonia, insuficiência respiratória e SRAG (síndrome
respiratória aguda). Agora, desde 16 de março, temos 67 mil mortes. São
17 mil por covid-19, 29.500 por pneumonia, 15.700 por insuficiência
respiratória, 5 mil por SRAG, em números redondos, segundo registro de
óbito nos cartórios. Ou seja: num mesmo período, 50 mil mortes de outras
doenças respiratórias e 17 mil de covid-19. A covid perde nos números,
mas ganha no pânico imposto, pelo poder de contágio. Contagiou até a
política.
Alexandre Garcia, jornalista - Coluna no Correio Braziliense
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