Leio em O Globo:
A
Procuradoria-Geral da República (PGR) solicitou ao Supremo Tribunal
Federal (STF) que as plataformas de redes sociais apresentem todas as publicações do ex-presidente Jair Bolsonaro referentes a eleições, urnas eletrônicas, Forças Armadas e o próprio STF, entre outros temas.
O
subprocurador-geral da República Carlos Frederico Santos, responsável
pelas investigações dos atos golpistas, ressalta que essa solicitação já
havia sido feita, mas que não foi analisada por Moraes. Por isso,
Santos reiterou o pedido nesta segunda.
(...)
Além disso, quer que as redes apresentem as métricas de cada publicação, como visualizações, curtidas, compartilhamentos e comentários. Ainda foi solicitada uma lista completa dos seguidores de Bolsonaro.
São
70 ou 80 milhões de pessoas (a notícia teria produzido um rápido
crescimento no número de seguidores), mas – calma pessoal! – segundo o
subprocurador afirmou na semana passada, o investigado é apenas o
ex-presidente, e, ademais, a PGR não teria como processar milhões de
cidadãos. Antes do esclarecimento, eu tinha certeza disso. Agora já não
tenho mais, como veremos adiante.
Todos esses
quantitativos solicitados as próprias plataformas disponibilizam por
publicação. As incertezas começam quando aparece a palavra “comentários”
porque estes são individualizados.
Essa história
não tem lado bom. Um lado devassa as opiniões políticas de dezenas de
milhões de cidadãos e o outro rompe com objetivos do sigilo do voto,
inerente às democracias. [entendemos conveniente ressaltar que a nossa democracia é relativa, daquela com alguns absurdos, dos quais destacamos que muitas vezes a pretexto de preservá-la uma autoridade pode causar mais danos do que a infração que busca coibir.]
O sigilo do voto protege o eleitor de quem lhe
possa causar dano (ou recompensa) por suas opiniões não voluntariamente
expressas, que se revelam quando se sabe em quem ele votou ou não votou.
Se “avaliar o conteúdo” se referir apenas ao vídeo do ex-presidente, o
pedido deveria ser de outra natureza; ao incluir os conteúdos dos
comentários, o que acontecerá com as pessoas cujas opiniões não forem do
agrado do escrutinador? Quem deu ao Estado esse direito? Ah, pois é!
A democracia
requer instituições, mas também depende de como elas procedam.
O que
está em curso no Brasil é um arremedo do regime e dos meios de ação
narrados no conhecido filme “A vida dos outros” (Das leben der Anderen,
Oscar de melhor filme estrangeiro de 2007).
Até 1990, o regime comunista
da Alemanha Oriental e seu partido único, o SED, contavam com os
serviços da Stasi, para controlar a vida dos alemães orientais, oprimir
opositores e dar suporte ao SED. A Stasi chegou a dispor de 90 mil
servidores fixos e 170 mil informantes. “Funcionou bem?”, indagará o
leitor. Sim, durou 40 anos, respondeu por 250 mil prisões, sustentou o
luxo da elite partidária e o rotundo fracasso do comunismo na terra do
velho Karl!
Em todos os países satélites atuavam filhotes da KGB, como a
própria SED, a KDS búlgara, a Securitate Romena, a StB tcheca.
Muito me
preocupa o que vejo acontecer. Tenho saudades da Constituição de 1988,
mesmo com seus gravíssimos equívocos.
A cada dia mais e mais esqueletos
são levados para o armário da memória e dos arquivos. As bobagens
proferidas não voltam para a boca e a censura não apaga o que os olhos
viram.
Alguém ainda vai ganhar muito dinheiro com documentários sobre
estes anos loucos e suas fábricas de espantalhos.
Percival Puggina (78), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto,
empresário e escritor e titular do site Liberais e Conservadores
(www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país.
Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia;
Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.
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