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sexta-feira, 25 de novembro de 2022

Congresso e transição Petrobras, armas, até a Bíblia: o Estado se mete em tudo - Gazeta do Povo

Vozes - Alexandre Garcia

A Câmara dos Deputados, como se não tivesse mais nada com que se preocupar, como se não houvesse esse problema da eleição, da contagem de votos, das urnas antigas, aprovou um projeto de lei que proíbe fazer mudanças na Bíblia, no Novo e no Antigo Testamento.  
Esse é um assunto para cada religião, cada igreja tem a sua versão da Bíblia. 
Um dos deputados disse que isso não se mexe. 
Parecia que estava tratando do Corão, lá no Afeganistão.
 
Mas nós não somos uma teocracia. Esse não é um assunto de Estado, é um assunto das religiões. 
Se agora estão colocando a lei acima das religiões, daqui a pouco a lei vai querer alterar também o ritual das celebrações religiosas. Ainda bem que isso ainda vai para o Senado, e os senadores podem corrigir esse engano.
 
Isso é coisa de gente que acha que o Estado pode tudo. Querem outro exemplo? Na equipe de transição, o ex-governador do Maranhão Flavio Dino, que era do PCdoB e agora foi eleito senador pelo Partido Socialista Brasileiro, diz que o Estado pode, que tem o poder de revogar todos os portes e registros de arma. 
Todo mundo passaria a ter arma ilegalmente, assim como os bandidos têm – bandido, aliás, não vai ser afetado, porque não tem nem porte e nem registro. Mas em 2005 o Estado perguntou aos brasileiros em referendo, e 64% disseram “sim” às armas
É desejo da população ter um meio para defender sua vida e seu patrimônio.

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Flavio Dino disse mais: que o Estado tem poder também de revogar uma decisão da Anvisa, por exemplo, que é uma agência autônoma que dá licença para certos medicamentos. [alguém checou a escolaridade do comunista Flávio Dino?] 
Quer dizer que o Estado está entrando até na área médica – aliás, a autonomia deveria ser do médico, nem da Anvisa. É o Estado se metendo cada vez mais em tudo. E o que é o Estado? É uma burocracia que não está produzindo, não está plantando, não está empregando, mas está lá, botando regra. [no caso do Maranhão é o estado e os políticos que o governam, entre eles o tal Dino, que confere àquele estado o pior IDH do Brasil.]
 
Senador já adianta que governo vai interferir cada vez mais na Petrobras  
O senador Jean-Paul Prates, cotado para ser ou presidente da Petrobras ou ministro de Minas e Energia, disse que vão ter de mudar a política de dividendos da Petrobras. Ele está dizendo para o mercado que esse país não é do mercado. E mais, disse ele: a política de preços não é da Petrobras, é do governo. Já percebemos, não?  
Será que essa foi a vontade de 60 milhões de eleitores, tornar o sistema brasileiro estatizante?
Isso é um regime totalitário, quando o Estado é que manda; porque democracia é quando o povo manda, o povo é a origem do poder. Quando o Estado baixa decretos e decisões, alterando liberdades básicas, aí o sistema é outro, não pode ser chamado de democrático.[perguntar não ofende: e quando o Estado adota medidas que violam à democracia, a pretexto de combater atos antidemocráticos?] 
 
Presidente da Câmara vai ao Catar, como se estivesse tudo tranquilo no Brasil
Em plena efervescência desse assunto de urnas, o presidente da Câmara viajou para o Catar, para ver um jogo do Brasil, e volta logo depois. Contando ida e volta, são 25 horas de avião
Pelo jeito está com tempo de sobra, não há problemas na Câmara Federal, não há problemas dos seus representados. [para Arthur  Lira as coisas podem até melhorar. 
Exemplo: seu mandato de presidente da Câmara dos Deputados - condição que o torna o primeiro na linha sucessória, após o vice-presidente, vai até o inicio de FEVEREIRO/2023. 
Tem o quiproquó das urnas, que no limite pode adiar a posse do 'eleito'  e com Bolsonaro e Mourão sem mandato a partir de 1º jan 2023, adivinhem  quem assume interinamente a Presidência da República?]
São os representantes que não estão fazendo jus ao voto dos representados, isso é terrível para a democracia. 
Aliás, esqueci de comentar que a equipe de transição anda falando em criar mecanismos de Estado para defender o Estado. A desculpa é defender a democracia – a mesma desculpa de Stalin, de Hitler, de Mussolini, sempre “defender o Estado”
É a força do Estado se sobrepondo à democracia, à força que emana do cidadão. É bom ficarmos atentos a isso.

Conteúdo editado por: Marcio Antonio Campos

Alexandre Garcia, colunista - Gazeta do Povo - VOZES

 


domingo, 7 de novembro de 2021

De tudo um porco - Revista Oeste

Evaristo de Miranda

Em 2021, o abate de suínos no segundo trimestre foi o maior desde 1997: 13 milhões de cabeças abatidas, aumento de 8% em relação ao mesmo período de 2020

Presunto ou pernil, costela ou lombo, salame ou mortadela, salsicha ou linguiça, presunto cru ou cozido, paio ou salpicão, panceta ou carne de lata, torresmo ou bacon, codeguim ou chouriço… A carne de porco, consumida in natura ou processada, habita o cotidiano dos brasileiros. Ela é uma das maiores marcas da Península Ibérica na cultura culinária nacional e gera riquezas de Norte a Sul do Brasil. 
 

Ilustração: Revista Oeste/Shutterstock 
 
A carne de porco não oferece risco à saúde, como imaginado décadas atrás. Nas granjas, o porco brasileiro está magro e saudável. A Embrapa até desenvolveu o “porco light”, produzido na região de Passos, em Minas Gerais. Ele tem 31% menos de gordura na carne e no toucinho e 10% a menos de colesterol. A carne suína é a mais consumida no mundo. Supera a bovina e a de frango, apesar da proibição de seu consumo pelo islamismo e judaísmo. 
 
De onde vem essa proibição? Quando o Islã surgiu, no século 7, o porco não era um animal abundante na Península Arábica. O livro sagrado dos muçulmanos, o Corão, incorporou regras dietéticas da lei mosaica. A proibição da carne de porco é mais marcada no Islã. Para alguns, a decisão contra os suínos foi de ordem tática: dar ao Islã um ponto de vista claramente distinto do cristianismo, seu principal adversário. Isso lhe permitiria ganhar apoio dos vizinhos judeus do Oriente Médio. E uma eventual conversão dos judeus ao Islã poderia ser encorajada pela manutenção desse tabu. 
 

 Criação de suínos | Foto: Worawut Saewong/Shutterstock
 
Seja qual tenha sido a razão, o porco na Bíblia é desvalorizado. No Antigo Testamento, ele é tratado como animal impuro, símbolo do mundo pagão e dos inimigos de Israel. 
No Novo Testamento, na parábola do filho pródigo, o jovem, depois de dilapidar todos os seus bens, se torna guardião de porcos, algo estritamente proibido aos hebreus, imagem da sua decadência suprema (Lucas 15:11-32). 
Em outro episódio, sobre uma vara 2 mil de porcos (sic), Jesus lança uma legião de demônios, atendendo ao pedido dos mesmos (Marcos 5:12). E mata por afogamento, demônios e porcos. Uma tragédia, sem falar do impacto ambiental: 2 mil porcos apodrecendo nas águas (Mateus 8:28-34). 
 
Seguindo suas raízes gregas e romanas, os cristãos reabilitaram os suínos. E deles fizeram uma arma para combater o Islã, sobretudo na Península Ibérica. Em Espanha e Portugal, os cristãos atacaram os mouros com a espada numa mão e um presunto, ibérico, na outra. De 711 a 1492, as fronteiras sempre se moveram entre a Espanha cristã e a muçulmana. Nada de grandes explicações teológicas para diferenciar os cristãos. Nessa disputatio bastava dizer: “Criamos e comemos porcos!”. Presuntos, linguiças e pernis eram pièces de résistance. Alguns atribuem essa adesão profunda da culinária ibérica aos suínos e cochinillos a uma identidade cultural de resistência à expansão moura, na qual le plat de résistance foi o suíno. Como os suínos nunca decepcionaram, chegaram aos altares. Na iconografia cristã, um simpático e róseo porquinho é representado ao lado de Santo Antão Abade. Como esse leitão foi parar ali, ao lado do Pai de Todos os Monges? Outra história. 
 
Na Terra de Santa Cruz, os porcos trazidos pelos lusitanos sentiram-se em casa. Produção, consumo e exportação de carne suína vão muito bem, obrigado. O abate em 2020 foi de 49,3 milhões de suínos, um aumento de 6,4% (mais 3 milhões de cabeças) em relação a 2019. O agro brasileiro não improvisa: cria e abate quase 50 milhões de porcos por ano!
 
Evaristo de Miranda - Revista Oeste

sábado, 25 de setembro de 2021

Afeganistão: Talibã vai retomar as amputações e execuções de condenados

Os Estados Unidos reagiram com indignação às declarações do mulá Turabi

Antes de 2001, os afegãos condenados por assassinato eram executados por um único tiro disparado contra a cabeçacabia a um familiar da vítima apertar o gatilho. As execuções costumavam ocorrer em praça pública ou em estádios lotados — um espetáculo dantesco para incutir o medo na população e funcionar como exemplo. 
Aqueles suspeitos de roubo tinham uma das mãos amputadas. 
Quem respondia por assaltos em rodovias acabava com um pé e uma mão extraídos do corpo. 
As cenas, dignas da Idade Média, tornarão a ser comuns no Afeganistão comandado pelo Talibã. O mulá Nooruddin Turabi, ministro das Prisões e um dos fundadores da milícia fundamentalista islâmica, admitiu à agência Associated Press que as amputações e as execuções serão retomadas.

“Cortar as mãos é muito necessário para a segurança”, declarou à agência Associated Press o mulá Nooruddin Turabi, ministro das Prisões e um dos fundadores da milícia fundamentalista islâmica. Ele explicou que o regime formulará uma política específica sobre como as execuções serão realizadas. Turabi rejeita qualquer ingerência externa no sistema judicial imposto pelo Talibã. “Ninguém nos dirá o que nossas leis deveriam ser. Nós seguiremos o islã e faremos nossas leis com base no Corão.”

Zabihullah Mujahid, porta-voz do Talibã, disse ao Correio, por meio do aplicativo Viber, que o governo do Emirado Islâmico do Afeganistão decidirá sobre esse tema posteriormente. “No entanto, em nosso país, todas as leis obrigatoriamente estarão de acordo com a sharia (lei islâmica). As preocupações internacionais também serão levadas em conta”, assegurou. [entendemos que sentenças, desde que proferidas com base na legislação vigente (sem interpretações/adaptações criativas) devem ser cumpridas - assuntos internos de uma nação soberana devem ser resolvidos internamente.
A Indonésia -  escolhida como exemplo por ter executado brasileiros condenados por tráfico de drogas - tem obtido êxito no combate àquela prática criminosa.
Outro ponto  que deveria ser cogitado pelas autoridades brasileiras seria o aumento das penas por receptação de produtos roubados e consumo de drogas - na prática porte/consumo de drogas deixaram de ser punidos e a receptação de produtos roubados tem pena ínfima. 
Muitos 'candidatos' a se tornarem usuários de drogas, cientes que serão punidos  com o mesmo rigor aplicado ao traficante, vão pensar cuidadosamente no assunto e, da mesma forma agirão os interessados em obter lucros comprando produtos roubados.]

Os Estados Unidos reagiram com indignação às declarações do mulá Turabi. “(As amputações e execuções) Constituiriam claros e indecentes abusos dos direitos humanos. (…) Permanecemos firmes com a comunidade internacional para responsabilizar os perpetradores desses abusos”, afirmou Ned Price, porta-voz do Departamento de Estado norte-americano. [lembramos que apesar da 'humanidade' transmitida pelo norte-americano, as penas de morte e/ou  prisão perpétua, são aplicadas na maior parte dos estados que formam os EUA.]

Diretor executivo da Human Rights Watch (HRW), Kenneth Roth afirmou ao Correio que, apesar de se apresentar como um “novo e melhorado” grupo, “o velho brutal Talibã continua emergindo”. “Desde que ascenderam ao poder, eles negaram às meninas acesso ao ensino médio e impuseram severas restrições à presença delas nas universidades e ao código de vestimentas”, observou. Segundo Roth, o Afeganistão tem sido palco de execuções sumárias, desaparecimentos e detenções arbitrárias de pessoas associadas ao antigo governo. “O Talibã também prendeu e espancou jornalistas por cobrirem protestos. Muitos deles agora se autocensuram”, lamentou.

Roth instou o Conselho de Direitos Humanos da ONU a deter as atrocidades cometidas pelo Talibã e a estabelecer um mecanismo de monitoramento de coletas das evidências de abusos. “A União Europeia também propõe criar uma relatoria especial para supervisionar o Afeganistão.”

Mundo - Correio Braziliense


quinta-feira, 19 de novembro de 2015

Sangue em Paris

Bataclan foi um ataque ao prazer, foi um ataque a tudo que amamos: a alegria, o sexo, a música, a liberdade, a beleza

A maior descoberta dos assassinos do Estado Islâmico foi a mídia. Foram as redes sociais. A Al-Qaeda dependia da decisão do líder Osama. Hoje não há mais um chefe total, mas milhares de jihadistas em rede. Osama era analógico, o EI é digital. Outra grande descoberta dos ratos de Alá foi o “indivíduo ocidental.” Não há mais um atentado puramente político ou religioso, mas a busca do grande horror que só a morte individual desperta. “Já pensou se eu estivesse lá?”

Como dizia o Stálin: “A morte de milhões é uma estatística; a morte de um só é uma tragédia”.

Eles descobriram o uso da tragédia ao vivo, o furo em nossa compaixão, quando começaram a degolar pessoas diante das câmeras. A descoberta também da mise-en-scène: vídeos de alta resolução com os carrascos vestidos com um “terror fashion”, preto e amarelo, botas, capuzes, impecavelmente vestidos, chiquérrimos diante dos pobres diabos ajoelhados. Eles vêm marchando diante de uma bela praia, lindo sol no mar, e vapt! Degolam.

E isso impressiona os jovens imbecis que enchem o mundo.

Mais de dois mil ratos malucos foram lutar no EI; 500 já voltaram... Que farão eles? Parece que mataram o filho da p... inglês Jihad John, mas outros virão.

Eles também trazem a morte a lugares do prazer. Onde houver alegria traremos a morte — pensam — como na discoteca de Bali (lembram?) ou sexta-feira 13 no Bataclan de Paris. Escolheram Paris, o orgulho da civilização e da democracia. É lá que atacam. Bataclan foi um ataque ao prazer, foi um ataque a tudo que amamos: a alegria, o sexo, a música, a liberdade, a beleza.

Outra coisa que nos fascina/apavora nesses ratos sujos é que eles querem atingir a plenitude do Mal, por si mesmo. Eles querem superar o demônio, desmoralizar o demônio. É preciso destruir a beleza dos monumentos, queimar vivos prisioneiros, cabeças cortadas, eles querem provocar nosso horror e cuspir na imagem de Bem que ainda professamos. Eles querem o mal absoluto. E o mal absoluto não pode ter motivo.

Há alguns anos eu vi um homem sendo decapitado. Chegou um vídeo completo na TV e vi. Um bando de demônios de preto, gritando “Só Deus é grande!” agarram o pobre americano e lhe cortam o pescoço como o de um porco. Ele grita enquanto a cabeça lhe é arrancada, com o sangue que lhes suja as mãos, enquanto eles gargalham de felicidade, porque se sentem mais perto do céu: a cada cão infiel morto à faca eles sobem de ranking para a salvação.

Na religião islâmica, a morte é um prêmio. Quando havia degola na Argélia, eles chegavam ao detalhe de decapitar os inimigos com uma faca rombuda, porque quanto mais o cara gritava, mais se enobrecia o degolador perante Alá. O terrorista também quer ascensão social: um fugaz poder com bombas no corpo, sucesso post-mortem e subida aos céus, para comer as mil virgens, as huris, dançando de odaliscas, enquanto as desgraçadas sem clitóris vestem burca. A guerra de nações está acabando. Agora é a guerra da teocracia contra a tecnologia. Foram atingidos: o ateísmo, o iluminismo, a arquitetura, a paz burguesa, o turismo, a sensação de invulnerabilidade, o consumo.

A partir daí, todo mundo virou cientista político. Surgiram multidões de analistas de bom senso, tentando fazer a tragédia absurda caber numa narrativa coerente. Mas o terror não cabe na razão. De uma forma repugnante, a verdade do mundo apareceu. A América achava que chegaria a um futuro de paz e progresso. Tudo o que fazemos tem o alvo da finalidade, do progresso. Os islâmicos já estão no futuro. Seu futuro é hoje. Não há passado. Nunca estiveram tão presentes como agora.

O Islã não quer progresso. Quer o imóvel, a verdade incontestável. O Islã transcendeu o político há muito tempo. Suas multidões jazem na miséria, conformadas, perfazendo um ritual obsessivo cotidiano do Corão que as libertou da dúvida e da consciência de si. Nós temos a ilusão da liberdade. Eles nem sabem que porra é essa. Graças a Alá — pois Islã significa “submissão”. O “projeto” agora é procurar bombinhas em aviões, localizar bueiros com bombas e cartas venenosas. O Islã está nos expondo ao ridículo.

Acabaram também com o conceito de “vitória”. Não há mais vitória contra inimigos invisíveis. O homem-bomba não existe — ele se volatiliza em segundos. Sua força está em “não existir”. A grande arma secreta do Islã é o suicídio. Não o suicídio melancólico dos ocidentais, mas o suicídio triunfal, feliz, ativo, o suicídio como esperança.
Quem diria que o novo século, tecnocientífico, sucumbiria a essas sinistras macumbas?

Eles trouxeram a peste para o Ocidente. Eles nos odeiam, eles têm inveja de nós, porque vivem no lixo do deserto, nós somos civilizados, e eles, uma barbárie da Idade Média. E vamos parar com o papo meio “esquerdofrênico” de que estamos pagando pelo mal que lhes fizemos no passado. Nada disso. Não são mais “consequência” de nada, eles são a vanguarda de uma nova forma de morte, agora que tiveram a ideia de usar as máquinas do Ocidente, aviões e mísseis contra os infiéis. Pode? A morte não estará mais num leito burguês, com extrema-unção e a família chorando. A morte agora será um cachorro pelas ruas, atacando de repente. Que fazer contra esses ratos que infestam o Oriente Médio? Como atacar esta nova forma de crueldade?

Mas, como resolver questiúnculas políticas lidando com gente como o Putin, por exemplo? Deveria haver uma coalizão séria entre os países ocidentais para ataques maciços conta os canalhas... Em suma, o que deveria ter sido feito logo no início, quando ainda dava tempo para derrubar o Assad. Mas, agora, talvez só reste aos países ameaçados a paranoia.

Eles ganharam todas até agora, porque, como disse o mulá Mohammed Omar, com desdém: “Nós amamos a morte. Você sempre gostaram de viver!”. 

Fonte: Arnaldo Jabor - O Globo


 

quarta-feira, 1 de abril de 2015

Suprema covardia - Estado Islâmico prioriza recrutamento de crianças para a guerra

O Estado Islâmico (EI) recrutou somente neste ano 400 crianças, o dobro da quantidade de adultos (120), para se tornarem combatentes do grupo terrorista, de acordo com o Observatório Sírio de Direitos Humanos (OSDH).

Crianças a partir de cinco anos são levadas para participar da guerra pelos extremistas, que as utilizam em funções de combate e espionagem ou como propaganda violenta, moldando suas mentes influenciáveis.  Segundo um relatório do Escritório do Alto Comissariado dos Direitos Humanos das Nações Unidas (OHCHR) divulgado em novembro de 2014, o EI "prioriza o recrutamento de meninos-soldado, a fim de assegurar uma relação de lealdade em longo prazo, aceitação da ideologia do grupo e a formação de combatentes devotos, que compreendem a violência como um estilo de vida".


O OSDH acredita que os jihadistas podem estar aumentando o índice de recrutamento de crianças pela facilidade de criar combatentes fanáticos e por causa das dificuldades enfrentadas para recrutar extremistas adultos em outros países.  Esta estratégia perversa ficou mais evidente com as sucessivas divulgações de vídeos que mostram crianças aparentemente executando prisioneiros e treinando com armas quase tão grandes quanto elas.

Os terroristas fazem com que assistam execuções de prisioneiros, aprendam a manusear armas de fogo e compreendam táticas de guerra, além de submetê-las aos massivos ensinamentos religiosos de cunho extremista, pregados pelo grupo. Testemunhas disseram às Nações Unidas que em Al Raqqa, cidade síria considerada capital de fato do EI, há campos de treinamentos para centenas de crianças de cinco a 16 anos.

O relatório da ONU denunciou que, por utilizar crianças como combatentes, "o EI violou a lei humanitária internacional e cometeu crimes de guerra em grande escala".  "O EI é um regime totalitário que pretende criar um novo 'ser humano', começando pelas crianças", declarou à Agência Efe Jessica Stern, coautora de "ÍSIS: The State of Terror", um livro recém-publicado nos Estados Unidos sobre o grupo jihadista.

Com o aliciamento de menores de idade, os terroristas pretendem doutrinar seguidores fiéis, capazes de aplicar a violenta interpretação do Corão defendida pelos extremistas sunitas do EI, que controlam grandes áreas da Síria e do Iraque. "O objetivo do grupo é chocar e aterrorizar e, para isso, poucas coisas são tão eficientes como imagens de crianças em frentes de batalhas, participando de execuções ou empunhando armas", comentou Stern, professora associada da Universidade de Harvard e especialista em terrorismo internacional.

A especialista também disse que a utilização desses menores como combatentes faz com que se tornem "vítimas, mas também perpetradores", algo que pode fazer com que sofram punições, além de possivelmente anular sua possibilidade de reintegração no futuro.  A tragédia dos meninos-soldados sírios, agora estendida também ao Iraque, colocou o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) diante de "uma de suas maiores crises", jamais enfrentadas, afirmou nesta semana a porta-voz da Unicef, Juliette Touma.

Juliette declarou que "existem provas de que todas as partes envolvidas no conflito recrutam, de uma forma ou de outra, menores de idade, tanto para postos de controle, como para a frente de combate". Na maioria dos casos, se trata de adolescentes, de 12 a 18 anos.  A escolarização na Síria, que antes do início da guerra civil era superior a 90%, passou para cerca de 50%. Atualmente, a ONU estima que 14 milhões de crianças no país estejam em situação especialmente vulnerável.

A porta-voz da Unicef, que trabalha para permitir que crianças prejudicadas pelo afastamento escolar ou expostas a traumas psicológicos tenham oportunidade de voltar a estudar, afirmou que o principal objetivo da organização é "possibilitar o acesso à educação, para que uma geração não seja perdida".

Fonte: Agência EFE
 

sábado, 17 de janeiro de 2015

Escola de jihadistas ou o risco de receber estrangeiros

Como são formados os jihadistas

A trajetória de radicalização dos irmãos Kouachi, responsáveis pelo atentado terrorista em Paris, é comum a muitos outros extremistas: começa num ambiente de pobreza e discriminação e se intensifica na cadeia, onde os muçulmanos são maioria

Cherif Kouachi tinha vinte e poucos anos e um subemprego como entregador de pizzas quando, em 2003, no auge da “Guerra ao Terror”, os Estados Unidos invadiram o Iraque. Filho de argelinos, o francês morava na periferia de Paris e tinha pouco apego ao islã até conhecer o grupo liderado por Farid Benyettou, uma espécie de guru de uma mesquita próxima. Os rapazes de famílias pobres, desestruturadas e de baixa escolaridade se uniram em torno de Benyettou para conversar sobre jihad, a guerra sagrada, e os abusos do Exército americano no Iraque. Alguns foram para a guerra lutar contra o inimigo ocidental. Cherif estava a caminho do Oriente quando, em janeiro de 2005, foi preso pela polícia francesa. De acordo com o jornal britânico “The Guardian”, ele foi descrito pelos advogados responsáveis pelo caso como um “jovem frágil com poucas ideias políticas reais, psicologicamente manipulado por uma seita.” Na época, Cherif disse ao júri: “Eu queria voltar atrás, mas estava com medo de parecer um covarde”.
ESCOLA DO TERROR - Apesar de representarem menos de 10% da população francesa, 60% dos quase 70 mil presos
nas cadeias do país são muçulmanos

É na prisão de Fleury-Mérogis, no sul de Paris, para onde Cherif foi mandado, que sua trajetória rumo ao extremismo encontra seu lugar, num caminho sem volta. Há duas semanas, ele ficou conhecido como um dos terroristas que invadiram a redação do jornal satírico “Charlie Hebdo”, em Paris, matando 12 pessoas. O outro era seu irmão, Said. Os dois foram mortos pela polícia na sexta-feira 9. No período em que ficou preso, até 2008, Cherif conheceu Amedy Coulibaly, morto depois de assassinar quatro reféns e um policial num supermercado judaico no leste de Paris, dois dias depois do atentado ao “Charlie”. A ação foi coordenada com os irmãos Kouachi. Coulibaly também estava preso em Fleury-Mérogis por assalto à mão armada. Lá eles conheceram Djamel Beghal, recrutador da rede terrorista Al-Qaeda. Naquele ano, Beghal foi preso na França por conspirar um ataque à Embaixada dos Estados Unidos em Paris. Como os Kouachi, ele também tem origem argelina.

Até o dia 7 de janeiro, esses quatro personagens faziam parte de um roteiro cada vez mais comum nos guetos muçulmanos de Paris e das outras grandes cidades europeias. Suas histórias, seus fracassos, seus encontros na prisão e a conversão para um tipo de islamismo cada vez mais radical não são exceção. São, cada vez mais, a regra entre jovens fracassados no processo de integração cultural e ascensão social, que encontram na religião e nos ensinamentos distorcidos do “Corão” a válvula de escape para suas frustrações.

Como acontece com os negros no Brasil e nos Estados Unidos, os muçulmanos são super-representados no sistema prisional francês: correspondem a 60% do total de 66 mil presos, mas não são nem 10% da população geral. Na semana passada, o governo francês informou que 1,4 mil de seus prisioneiros têm tendências extremistas, 152 são considerados islâmicos totalmente radicais e, entre eles, 87 integram organizações terroristas. A ministra da Justiça, Christiane Taubira, aproveitou a ocasião para anunciar um plano de contenção do radicalismo nas penitenciárias. A ideia é isolar os extremistas e treinar os clérigos que visitam as cadeias para ter um discurso mais moderado. A escassez desses religiosos, aliás, é um dos fatores que transformam as prisões em campo fértil para a leitura do “Corão” ao pé da letra. Na França, há 182 clérigos muçulmanos e cerca de 700 cristãos, segundo a agência Reuters.

O contexto por trás do encarceramento envolve uma parte da população que, apesar de ter nascido na França e possuir a cidadania europeia, não se vê integrada à sociedade ocidental. Obrigados a viver nas habitações populares dos “banlieues”, nos subúrbios de Paris, onde a média de desemprego é maior que o dobro do índice nacional, esses franceses são, em geral, filhos ou netos de imigrantes – a maioria vem de antigas colônias como Argélia, Marrocos e Tunísia. O fluxo migratório do início do século XX levava mão de obra da África para a Europa. “Havia um entendimento entre os europeus de que essas pessoas só iriam trabalhar, a intenção nunca foi de uma ocupação permanente”, disse à ISTOÉ Demetrios Papademetriou, presidente do Instituto para Política Migratória (MPI, na sigla em inglês), na Europa, de Bruxelas. “Mas os trabalhadores naturalmente levaram suas famílias e seus costumes. Quanto mais eles se sentiam isolados, agredidos, sem as mesmas oportunidades, mais eles se fechavam em suas comunidades e desafiavam a maioria.” Segundo o MPI, para muitos franceses, os bairros com alta concentração de islâmicos e escolas segregadas funcionam como “sociedades paralelas".

"A integração fracassou”, diz Mohammed ElHajji, professor de comunicação e especialista em questões migratórias e culturais da Universidade Federal do Rio de Janeiro. “Nos anos 80 e 90, os imigrantes recorreram às antenas parabólicas para manter os laços com sua terra de origem. Agora a internet cumpre esse papel”, diz ele, um marroquino radicado no Brasil. Há dez anos vivendo em Paris, o tunisiano Nassim Touns, 31 anos, se sente ainda mais discriminado depois do atentado ao “Charlie Hebdo”. “É como se fôssemos cidadãos de segunda classe”, disse à ISTOÉ. Formado em comércio internacional e economia em seu país, Touns trabalha hoje como pintor de uma empresa subcontratada pelo Grupo Carrefour para reformar as lojas da rede varejista. Ele diz que não sai de Paris porque tem dois filhos – franceses – e que até na Tunísia é difícil encontrar emprego. “Eles preferem ‘francês-francês’.”

Na França, essa “preferência” já foi medida. Um estudo de 2011 da Universidade de Stanford, nos Estados Unidos, concluiu que um cidadão cristão de origem africana tem 2,5 vezes mais chances de ser chamado para uma entrevista de emprego do que um muçulmano igualmente qualificado. Nesses casos, as pessoas com nomes tipicamente franceses têm vantagens sobre quem carrega um nome que soa islâmico. Outras pesquisas já mostraram dificuldades semelhantes para os muçulmanos em aluguéis de imóveis e vendas de carros.

Numa sociedade em que a laicidade, que implica a separação total entre Estado e Igreja, é um valor inegociável, o sentimento de discriminação se espalhou quando, em 2011, a França proibiu o uso do véu islâmico e outros símbolos religiosos em locais públicos. Para Ariel Finguerut, pesquisador do Grupo de Pesquisas Oriente Médio e Mundo Muçulmano da Universidade de São Paulo, esses elementos sociais só reforçam “o estigma do islã como vítima de um Ocidente opressor.”

Desse ambiente, os irmãos Kouachi e seu cúmplice, Amedy Coulibaly, não conseguiram fugir. Eles não precisaram sair da França para se converter ao extremismo. Como acontece com milhares de jovens que vivem nas mesmas condições de vulnerabilidade, o discurso radical lhes ofereceu, enfim, reconhecimento e um propósito de vida. Mohammed Merah, o jovem que matou quatro judeus e três soldados em Toulouse, no sul do país, em 2012, também era um deles. Ciente disso, o governo francês está diante do desafio de repensar a maneira como lida com os fundamentalistas em seu próprio território, a começar pelas políticas de integração das diversas comunidades que ali coexistem.

Fonte: Revista IstoÉ