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sábado, 4 de novembro de 2023

Assassinos - Valdemar Munaro

       Os tristes episódios perpetrados em Israel por terroristas do Hamas podem já ser inferidos e contemplados na fundação histórica do Islã. Conforme biografia sobre Maomé, escrita por Barnarby Rogerson, a Arábia no nascente Islamismo do século VII d. C., era habitada também por muitos judeus. Centenas deles que resistiram à nova fé, foram mortos e degolados na presença do próprio Profeta e com sua aprovação.

A terra sagrada de Meca e Medina guarda, portanto, de modo silencioso e sôfrego, o sangue judaico de decapitados. Judeus e muçulmanos, sabemos, são descendentes e herdeiros do mesmo cavaleiro da fé (expressão de Kierkegaard), Abraão, e se tornaram irmãos pela benevolência e graça de Deus, mas, ao longo do tempo, vergaram-se à desgraça de uma fraternidade assassina que rasga os mantos da comunhão enchendo de dor e medo os amantes da paz e da concórdia.

O terrorismo fere o Islã tanto quanto fere qualquer outra expressão religiosa. A vida do Profeta, por sua vez, honestamente falando, não foi cem por cento limpa, nem pura. Ao se casar pela quinta vez, em 626, com Zaynad, sua linda nora, Maomé rompeu com o mandamento que ele mesmo tinha estabelecido para todos os muçulmanos: ter no máximo quatro esposas. Mas Ele resolveu o dilema com uma revelação que veio em benefício de si mesmo: a sura 33 lhe concedeu carta branca para se casar uma quinta vez: "Ó Profeta", diz o versículo 50, "tornamos legais para ti as tuas esposas (...) e qualquer outra mulher crente que se oferecer ao Profeta e que ele quiser desposar: privilégio teu, com exclusão dos demais crentes (...)".
 
O poeta, Ka'b ibn al-Ashraf, descendente de uma tribo judaica em Medina, ironizou um casamento anterior que Maomé tinha contraído com uma outra mulher, Hafsah, viúva de um homem que pereceu numa batalha muçulmana. O poeta comparou o comportamento de Maomé com aquele de Davi que enviou o general e amigo Jônatas à morte, pondo-o à frente de um conflito, para poder ficar depois com Betsabé, sua esposa. 
Ka'b foi oportunamente esfaqueado e morto por ofender e difamar o Profeta. 
Mas se o Alcorão do Profeta e o Profeta do Alcorão chancelam a eliminação de infiéis, o que se pode esperar de seus discípulos radicais?!

O século VII, nas regiões da Arábia, registrava a presença de muitos judeus, muito embora não existisse, naquele então, o estado de Israel. Na ocasião em que o exército muçulmano se aproximou de Medina para conquistá-la um dos seus guerreiros bradou: "Nós enfrentamos duas coisas: ou Deus garantirá a superioridade sobre eles, ou Deus nos destinará o martírio. Eu não me importo sobre qual seja o destino - pois existe o bem em ambos".

Em outras palavras, é este o leitmotiv da cruzada terrorista: no seu reino deve haver uma só cor, uma só cultura, uma só crença, um só livro, um só povo, um só modo de ser e de pensar. Nos seus ideais não deve haver lugar para meios-termos, meias-luas, pardos, mestiços e miscigenados. Deve ser o tudo ou o nada, a raça pura ou a impura, o fiel ou o infiel. "Os revolucionários", diz o historiador polonês Leszek Kolakowski, "não creem no purgatório; creem na via sacra, no inferno e no paraíso, no reino da libertação total e no reino do mal total".

Pode ser paradoxal, mas foi exatamente esse fundamentalismo extremista religioso que se acrescentou à atividade revolucionária marxista, ateia e materialista, temperando com tentações purificadoras as ações radicais que praticam, desdenhando excrescências maniqueístas de limpeza étnica e cultural. Assassinos, terroristas e revolucionários se assemelham em tudo com seus métodos e objetivos: estrangular violentamente as diferenças, abater sem piedade os desconfortos plurais, instalar pela força as hegemonias ideológicas culturais, políticas ou religiosas.

LER NA ÍNTEGRA,AQUI

*       Em Santa Maria, 03/11/2023

**     O autor é professor de Filosofia

 

segunda-feira, 28 de janeiro de 2019

Diplomacia pode pôr em risco o acesso a mercados árabes

Não faz sentido Brasil entrar em conflito distante de seus interesses e perder espaço no comércio

O período de transição de governo, em dezembro, já demonstrou ao presidente Jair Bolsonaro que declarações suas e de membros da equipe passaram a ter um grande peso. Mexem com mercados, repercutem no exterior. E o país pode pagar um preço por isso. Um exemplo claro é Bolsonaro no caso da mudança da embaixada brasileira em Israel, de Tel Aviv para Jerusalém, desnecessária provocação aos palestinos em particular e aos árabes em geral. Uma juvenil demonstração de que pode repetir os EUA neste movimento. Não pode. [vamos atribuir que foi uma empolgação momentânea - o que não a torna menos inconveniente - do nosso presidente, e que foi devidamente corrigida indo para o balcão de assuntos menores e não urgentes e mostrando a todos que o Brasil vai pautar sua diplomacia interna pela defesa dos seus interesses e não por simpatias políticas.]
O presidente ainda estava em Davos, na terça, quando a Arábia Saudita anunciou a suspensão de importações de cinco frigoríficos brasileiros, sob alegações técnicas. Mas o recado foi evidente: confirmar a mudança da embaixada, o que significa reconhecer toda a Jerusalém como capital de Israel, levará a retaliações no comércio. E o país tem muito a perder bilhões de dólares em exportações e em milhares de empregos no agronegócio e seus segmentos. O Brasil é o maior exportador de carne halal, [uma série de medidas são necessárias para que a carne seja considerada halal e uma delas é que, sempre que possível, o animal steja posicionado na direção de Meca.] termo que significa “lícito”. Os frangos são abatidos conforme ritual, o que também acontece com alimentos kosher, para judeus. Também se exporta carne bovina da mesma forma.

Essas exportações são de US$ 4,5 bilhões anuais e sustentam 150 mil empregos diretos em pequenas cidades do Sul. Concorrentes do Brasil acompanham esperançosos a possibilidade de ganhar espaço neste promissor mercado. Um caso emblemático é o de Palotina, cidade do Oeste do Paraná, em que a cooperativa C. Vale conta com uma unidade halal de abate de frangos. Exporta, por mês, 3,2 mil toneladas. Fatura US$ 3,4 milhões, mantendo 5,2 mil empregos.
Há inúmeros exemplos como este, que ajudam o Brasil a ser um dos maiores exportadores de proteína animal do planeta. Posto que estará ameaçado, se o clima de campanha preponderar em decisões importantes de governo. Neste caso, não afetará apenas o setor de carnes, mas também 135 empresas certificadas para processar produtos halal. Oito exportam açaí para a Ásia e os Estados Unidos, açúcar orgânico para Japão, Coreia do Sul e também para o mercado americano. Até pão de queijo halal consta da lista de exportações.
Ao todo, para nações árabes, as vendas brasileiras passaram de US$ 9,8 bilhões para US$ 13,6 bilhões, em 2017, um aumento de 38%. Se, em algum momento, viera ser resgatado na política externa, em sua integralidade, o pragmatismo que sempre marcou a diplomacia brasileira, é certo que informações como estas serão levadas em conta.
 
Editorial - O Globo
 

sexta-feira, 26 de junho de 2015

O canto da sereia do Estado Islâmico


No imaginário de muitos muçulmanos mais conservadores, os EUA são o ápice de tudo o que está errado com o Ocidente

“Eu os amo muito. Eu não posso viver sem vocês, por favor, voltem para casa!” Esse foi o apelo dramático feito aos prantos por Akhtar Iqbal na semana passada numa entrevista coletiva em Bradford, Inglaterra. “Por favor, me liguem para saber que vocês estão bem, especialmente meu filho de 3 anos Ismail e minhas três filhas.” Ele é um dos três pais de nove crianças e suas mães que desapareceram depois de viajar à Arábia Saudita para fazer uma peregrinação religiosa a Meca. Em vez de voltar para a Inglaterra, as três mulheres levaram seus filhos para a Turquia e depois para a Síria para se juntar aos membros do Estado Islâmico (EI). “Eu não estou zangado. Por favor, voltem. Está tudo bem. Voltem para nossa vida, por favor! Eles são garotos pequenos, de 7 e 5 anos, e, você sabe, eu te amo tanto,” disse Mohammed Shoaib, outro pai. 

As três mães são irmãs. Sugra Dawood tem 34 anos; Zohra Dawood, 33; Khadija Dawood, 30. Seus nove filhos variam de 3 a 14 anos. O que espanta aqui é que todas elas são de classe média e, de acordo com seus maridos, tinham uma vida familiar estável e boa, com nenhum sinal de que estavam insatisfeitas a ponto de planejar a fuga com suas crianças para o EI. Elas certamente não são as primeiras nem serão as últimas muçulmanas insatisfeitas com suas vidas em países ocidentais que responderão ao canto da sereia da vida mais islâmica, justa e completa que o EI prega para atrair cada vez mais muçulmanos do mundo inteiro. Estima-se que o EI consiga mil novos recrutas, entre homens , mulheres e suas crianças, a cada mês, vindos de todos os cantos do mundo para se unir ao que eles acham ser uma utopia islâmica no Iraque e Síria. 

Mas havia um descontentamento com suas vidas num país liberal como a Inglaterra. Uma das irmãs tinha comentado com uma amiga, antes de viajar, que não queria que sua filha crescesse num país como a Inglaterra, que a cada dia se parecia mais com os Estados Unidos. No imaginário de muitos muçulmanos mais conservadores, os EUA são o ápice de tudo o que está errado com o Ocidente: secular demais, muito violento e, sobretudo, liberal demais, deixando a libertinagem tomar conta das vidas de quase todos os americanos. Para essas pessoas, a sociedade americana está corrompida demais com o sexo livre que a revolução feminista dos anos 1960 e 1970 trouxe. [na avaliação do Brasil sob a ótica muçulmana estamos exatamente em uma situação similar à americana; as únicas diferenças entre a destruição dos valores morais, da família e outros entre o Brasil e os Estados Unidos são:
- o Brasil caminha para a miséria, empobrecimento da sua população, devido as drogas que governaram e governam nosso País nos últimos 12 anos;
- a libertinagem, notadamente a sexual, que nos Estados Unidos é na maior parte entre os homens e as mulheres e no Brasil caminha para ser HOMEM com HOMEM e MULHER com MULHER.
A ditadura gay está concluindo a destruição do que ainda resta de bom no nosso Brasil.
Aqui o governo patrocina todeas as iniciativas que visem destruir o que ainda resta de VALORES em nosso Brasil.
Agora mesmo, os ratos que defendem a 'ideologia de gênero' fazem pressão sobre as Câmaras de Vereadores para aprovarem a maldita doutrina que tem como um dos seus pilares, incutir nas crianças que nem são homem nem mulher, não nasceram com sexo - são crianças = sexualmente neutras, indefinidas = só na puberdade é que escolherão ser homem ou mulher.
Nesta ótica nojenta é absolutamente normal, é o desejado, que aos 12, 13 anos, uma menina diga: sou HOMEM;  e um menino diga: sou MULHER.]

Mas é exatamente esta propaganda que é tão atraente: uma nova sociedade está sendo estabelecida pelo EI, um tipo de utopia islâmica em que muçulmanos sunitas podem viver supostamente felizes e em paz, sendo governados por líderes que lhes dão segurança e os serviços públicos básicos como água potável, luz, escolas e hospitais de graça. Para fazer isso, o EI usa todos os meios de comunicação modernos como a internet, redes sociais e vídeos mostrando a vida boa em seus territórios. O grupo também divulga vídeos horríveis, os mais recentes, esta semana, mostrando 15 supostos traidores sendo mortos por afogamento e em explosões. Essas imagens bárbaras e sádicas me lembram aqueles filmes americanos de horror em que um grupo de jovens é capturado por criminosos diabólicos, que começam a matar cada um de um jeito mais pervertido e horrível do que o outro. Esses vídeos servem, infelizmente, para atrair os mais violentos e instáveis entre os muçulmanos. 

Então, o que fazer para combater isso? Os americanos têm tentado monitorar as redes sociais e bloquear as contas do EI e dos seus seguidores mais assíduos no Twitter e no Facebook. Isso é um bom primeiro passo, mas está longe de poder deter a vantagem ideológica que o EI ainda exerce sobre as mentes de muitos muçulmanos. Usar humor contra esses extremistas é uma ótima estratégia, como já vimos no Iraque e agora na Arábia Saudita, onde o comediante famoso Nasser al-Qasabi estreia numa série cômica chamada “Selfie”, em que ele zomba dos excessos mais notórios do EI, como manter mulheres como escravas sexuais. Por isso, ele já recebeu muitas ameaças de morte, mas não se curva diante de tais perigos, dizendo numa entrevista recente que é um artista e está usando sua arte para combater as ideias nefastas do EI.

O que mais podemos fazer para contrariar a mensagem violenta e preconceituosa do EI? Os acadêmicos americanos Jessica Stern e J.M. Berger, autores do livro “Estado Islâmico: Estado de terror”, num artigo na revista “Time” em março 2015 propuseram um plano de seis pontos para contra-atacar a propaganda do EI:
1 — Parar de exagerar a invencibilidade do EI;
2 — Amplificar as histórias de ex-mulheres de jihadistas que ficaram desencantadas e voltaram para seus países de origem;
3 — Desafiar as interpretações torpes das leis islâmicas pelo EI, usando contra-argumentos religiosos para atingir os possíveis recrutas do grupo antes de eles trocarem de lado;
4 — Realçar a hipocrisia do EI, de, por um lado, matar a pedradas mulheres adúlteras; do outro, estuprar mulheres capturadas em batalha;
5 — Documentar e divulgar a violência do EI contra outros sunitas que se negam a cooperar com o grupo. Enquanto o grupo não tem escrúpulo algum em mostrar a violência horrível que empregam para matar xiitas e yazidis, nunca mostra o que faz contra seus próprios irmãos sunitas que não lhe obedecem;
6 — Fechar sumariamente as contas deles nas redes sociais do grupo. Os pesquisadores americanos sustentam que isso tem efetivamente limitado a projeção da propaganda do EI.

Se fizermos tudo isso de um jeito metódico e constante, veremos resultados bastantes cedo. Não basta bombardear diariamente o EI e esperar que isso acabe com eles. Mais do que tudo, essa é uma guerra psicológica, e uma guerra assim nunca foi ganha somente com violência e força bruta.

Por: Rasheed Abou-Alsamh é jornalista