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domingo, 6 de dezembro de 2020

Para exigir minha Bolsa Ditadura, só falta perder a vergonha - Revista Oeste

Augusto Nunes

Quatro dias de cadeia na Aeronáutica me impediram de ser ministro do Supremo

Sentado numa mesa do bar em frente da Faculdade Nacional de Direito, com vista para o Campo de Santana, eu festejava no meio da tarde de 12 de agosto de 1969 o reencontro com a namorada. Sônia saíra de circulação havia um mês, ao saber que tivera decretada a prisão preventiva. Naquela manhã, ela me avisara que a ordem de prisão fora revogada e que apareceria no lugar de sempre na hora do almoço. Nem desconfiamos que aquilo era um blefe, forjado por policiais encarregados da captura da primeira-secretária do Centro Acadêmico Cândido de Oliveira, o CACO Livre. Também eleito terceiro-vice-presidente no ano anterior, eu acabara virando presidente interino porque também o primeiro-vice e o segundo-vice entraram na mira dos defensores da lei e da ordem.

Passeamos algum tempo pelos corredores do prédio que alojara o Senado do Império, conversando sobre o que fazer com o centro acadêmico despovoado pelas circunstâncias. Interessado em tratar de urgências mais excitantes, sugeri que voltássemos ao bar. Eu tinha 19 anos, um copo de chope na mão e, com o fim do sumiço de Sônia, muitas ideias lascivas na cabeça. Já saboreava mentalmente outra noite de pecados quando a mão do destino tocou meu ombro esquerdo para avisar que o castigo chegara primeiro: “Polícia”, resumiu um dos quatro homens repentinamente hasteados em torno da mesa. Nem precisava dizer, pensei ao contemplar os paletós compridos demais e apertados demais. Os sherloques brasileiros sempre se acham mais altos e menos gordos do que efetivamente são. Assim, o ofício que exercem é escancarado por botões explodindo nos subúrbios da barriga e pelo sopé do paletó roçando os joelhos.

Só bem mais tarde eu saberia que eles haviam baixado na faculdade em busca da secretária do CACO. Entenderam que não seria má ideia levar-me como brinde depois de descobrirem que o moço ao lado da perigosa procurada também era um comunista infiltrado no movimento estudantil. Separados, embarcamos em fuscas disfarçados de táxis que estacionaram na sede da Polícia Militar na Rua Frei Caneca, no antigo centro do Rio. Não houve a sonhada noite de luxúria: o que houve foi um interrogatório de oito horas, ao fim das quais fomos transferidos para as dependências da Aeronáutica no Aeroporto Santos Dumont. Na traseira do camburão, Sônia sussurrou-me o lembrete: sempre que perguntassem quem era meu chefe na célula do partido, deveria recitar o nome de algum diretor já engaiolado do centro acadêmico.

Em 14 de agosto, depois de mais dois interrogatórios de oito horas, fomos instalados em pequenas salas de diferentes alas do prédio da Aeronáutica na Base Aérea do Galeão. Fui solto no começo da noite de 16 de agosto (depois de mais dois interrogatórios de oito horas cada um). Sônia ficaria presa 17 dias. “Vou cair na clandestinidade”, contou-me num encontro noturno no Outeiro da Glória. Novamente capturada meses mais tarde, integrou o grupo de militantes libertados por exigência dos sequestradores do embaixador da Alemanha, exilou-se até a decretação da anistia e hoje vive no Rio. Nunca mais voltei a vê-la.

Essa história vale ou não vale uma Bolsa Ditadura? Se muita gente que só ficou presa em congestionamento de trânsito virou bolsista, quatro dias de cadeia no inverno de 1969 merecem uma obesa reparação em dinheiro vivo e uma mesada perpétua calculada com base no que eu poderia ter sido e não fui. Sempre penso nisso ao recordar meus derradeiros minutos no cárcere. Antes de ordenar-me que desse o fora com a mesma roupa com que ali chegara, o major que conduziu o último interrogatório no Galeão releu sem pressa as anotações na minha ficha, empunhou um gordo lápis vermelho e enfeitou a primeira página com a palavra em letras graúdas: COMUNISTA. Procure esse papel, costuma soprar meu lado escuro sempre que ouve o apito do trem pagador pilotado pela Comissão de Anistia. Aquela anotação pode garantir-me a dianteira na fila dos pedintes.

Sim, não fui submetido a sessões de tortura. Mas fiquei horas a fio de cócoras, mãos algemadas sob as pernas, ouvindo perguntas tediosas e insinuações redundantes feito letra de samba-enredo. É verdade que meio mundo viveu experiências parecidas. É verdade que nove em dez integrantes do movimento estudantil conheceram involuntariamente o silêncio imposto a presos incomunicáveis, o cheiro de animal colado ao corpo por muitas horas sem banho, a sensação de impotência absoluta, a vida suspensa no ar. Que sejam todos premiados. Os contribuintes nem vão notar que mais R$ 1 bilhão saiu pelo ralo. Nenhuma despesa é desperdício se destinada a garantir aos sócios do Clube dos Heróis da Resistência o direito a indenizações milionárias, mensalidades de bom tamanho, empregos federais e outras condecorações em dinheiro. Como ensinou Millôr Fernandes, o que parecia ideologia era investimento.

Minha mãe morreu convencida de que eu teria ido longe na vida se escapasse daquele agosto aziago. O diretor da faculdade, ao saber de tudo, avisou em dezembro que me expulsaria se não tratasse já no dia seguinte da transferência para outras paragens. Só o Mackenzie me engoliu. Não engoli o Mackenzie daquele tempo e virei jornalista. Está claro, portanto, que não pendurei na parede o diploma de bacharel em Direito porque a ditadura me transformou em perseguido político. 
Só por isso não fui advogado, juiz, desembargador, ministro de tribunais superiores e dono de uma toga do Supremo Tribunal Federal. Muita pretensão? Não é: até Dias Toffoli chegou lá. Não é pedir demais querer ser aposentado com o salário de ministro do STF. O desertor Carlos Lamarca, ex-capitão, foi promovido a general depois de morto e garantiu uma velhice tranquila à mulher que abandonou.
Argumentos tenho de sobra. Só estão faltando duas coisas.
A primeira é conseguir um advogado esperto, que justifique a comissão de 20%. 
A segunda é perder a vergonha.
 

Revista Oeste - Augusto Nunes, jornalista

 


sexta-feira, 17 de julho de 2020

A responsabilidade do STF no “genocídio” que Gilmar apregoa - J.R. Guzzo

Já faz tempo que os ministros do Supremo Tribunal Federal decidiram, por unanimidade de votos, que nada do que dizem em público precisa fazer sentido.
Por que não? 
Se as suas sentenças são fruto de um livre-pensar que dispensa a presença de vida inteligente, ou de algum tipo de compromisso com as leis do país, é apenas natural que também não se obriguem a seguir a lógica comum em suas declarações ao Brasil e ao mundo.


Na maioria das vezes, ninguém presta mais muita atenção às bulas expedidas pelos ministros a não ser, eventualmente, algum psiquiatra que esteja envolvido na observação de comportamentos suspeitos nas áreas da ruptura com a realidade e da mania de grandeza. Mas a cada manifesto que lhes ocorre lançar sobre o bem e o mal, os integrantes do nosso Excelso Pretório contribuem para congestionar ainda mais o que Millôr Fernandes talvez chamasse de “Acervo Nacional das Declarações Cretinas”. Uma hora vai acabar faltando espaço. O último surto ficou, mais uma vez, a cargo do ministro Gilmar Mendes. 

Num debate do Instituto Brasiliense de Direito Público, escola privada da qual ele próprio é um dos sócios, Gilmar acusou subitamente o Exército brasileiro de ser cúmplice do “genocídio” que estaria arrasando o Brasil com a Covid-19. Denunciou os cúmplices, mas não citou quem seriam os autores do crime
talvez vez seja mais uma inovação que o STF oferece ao direito penal brasileiro – o delito que só tem cúmplices.
O problema, em todo caso, não está aí. O ministro não diz que “genocídio” é esse – será que ele está falando da epidemia mundial que nos últimos seis meses atingiu quase 13 milhões de pessoas em todo o mundo e já causou cerca de 570.000 mortes? Parece que sim, mas não há nenhuma pista sobre a seguinte dúvida: por que diabo a Covid-19 está matando gente nos quatro cantos do planeta, mas só há genocídio no Brasil?

Ninguém sabe, também, o que o Exército brasileiro tem a ver com isso – ao contrário, está trabalhando todos os dias na ajuda ao combate da epidemia, com a ação de quase 35.000 homens. É muitíssimo mais, com  certeza, de tudo o que os onze ministros do STF jamais farão, somados, em todas as suas vidas, para dar alguma contribuição prática nesta tragédia. Pelo retrospecto da sua militância política atual, o ministro Gilmar parece estar jogando a culpa de tudo no presidente Jair Bolsonaro e em seu governo. É mais um mistério: se alguém tem de ser acusado de “genocídio” pelas 72.000 mortes que a epidemia causou até agora no Brasil, seriam os 27 governadores de estado e os 5.500 prefeitos brasileiros a quem o próprio STF, que hoje é quem decide tudo neste país, da nomeação de chefes de polícia à aplicação da cloroquina, entregou a exclusividade do combate à epidemia. O governo federal ficou expressamente proibido de tomar decisões no combate à Covid; como poderia, então, ser responsável pelo desastre? Mais responsável é o próprio STF, já que foi ele quem teve a ideia de entregar tudo à “autoridades locais”.

O ministro Gilmar se declarou inconformado com o fato de não haver um ministro da Saúde efetivo há mais de 50 dias; pelo jeito, ele parece achar que o problema do Brasil é a falta de ministro, e não a presença do vírus. É essa, então, a causa do “genocídio”? Não tem pé nem cabeça. Desde quando o fato de haver ou não um ministro da Saúde, ou de qualquer outra coisa, tem alguma relação com o que acontece de bom ou de ruim na sua área de ação?

Mas nada precisa ter pé nem cabeça quando algum dos onze ministros desse STF que está aí abre a boca para dizer ou decidir alguma coisa. Estão numa “trip”, como se diz. Vão continuar assim, com as suas lagostas, as suas licenças-prêmio e a sua compulsão em declarar inconstitucional tudo o que possa prejudicar o seu bolso. Fica a cargo de cada um estabelecer que grau de imparcialidade alguém pode esperar dessa gente.

J.R. Guzzojornalista - Gazeta do Povo - Vozes




sexta-feira, 24 de janeiro de 2020

Mulheres trans que mantém órgãos masculinos, querem atendimento em clínicas ginecológicas - A jihad da militância trans contra uma clínica de bronzeamento com fita adesiva - Gazeta do Povo

[Mulheres trans que mantém órgãos masculinos, querem atendimento em clínicas ginecológicas, que é negado, por 'limitações técnicas'. ]



Madeleine Lacsko

A Salvador Bronze informou não atender mulheres trans por “limitações técnicas”. Repetimos no Brasil o caso das depiladoras canadenses.

Reflexões sobre princípios e cidadania


"Quando uma ideologia fica bem velhinha, ela vem morar no Brasil", segundo Millôr Fernandes. Trata-se de uma espécie de epidemia absolutamente democrática que agora desembarca no campo do improvável: a briga da militância trans com as mulheres que trabalham na área de beleza e estética. Até a imprensa ajudou a acender aqui a centelha da briga já pacificada pela Justiça no Canadá.

[síntese do problema: os homens que nascem homens - equipados com os órgãos masculinos e concluem que querem ser mulheres e passam a se intitular homens trans, até conseguirem alterar o nome social, mas, não fizeram a cirurgia de reversão sexual;
passam a ser mulheres nos documentos de identidade, mas, continuam com o 'equipamento' masculino.
Passam a se identificar como mulheres trans e querem que mulheres não trans que trabalham em clínicas de procedimentos estéticos, manuseiem seus órgãos masculinos (ainda presentes nas mulheres trans) e as funcionarias não aceitam.]



O caso brasileiro chama-se "Salvador Bronze". Trata-se de uma clínica especializada no glorioso bronzeamento com fita adesiva, modalidade que tomou de assalto o mundo da sensualização há alguns anos. Depende, necessariamente do sol. Por R$ 80, uma personal bronzer monta com fita adesiva um biquíni na mulher e acompanha sua exposição ao sol. Por que alguém faria isso? Para que as marquinhas de sol fiquem bem definidas.



A prática surgiu nas lajes das favelas do Rio de Janeiro, em que as meninas faziam os próprios biquínis com fita isolante. Assim que famosas do mundo da música começaram a copiar o look e até a divulgar vídeos em que faziam bronzeamento com fita adesiva, a prática entrou no coração do Brasil. Clínicas começaram a pipocar por todo o país. Uma delas é a Salvador Bronze, na Boca do Rio, um dos bairros mais violentos da capital baiana.



O inferno da Salvador Bronze começou quando a clínica resolveu avisar que não atende mulheres trans, por meio de uma postagem no Instagram. Bastou um dia de ataques para que o pequeno comércio deletasse sua página. As associações de travestis e transgêneros fizeram uma forte campanha nas redes sociais. Não, não era para convencer a clínica a treinar suas profissionais ou contratar quem tenha treinamento para atender transgêneros, era só para ir lá "denunciar a homofobia". No caso, o chamamento foi entendido como passar o dia xingando as mulheres da clínica de bronzeamento com fita adesiva da periferia de Salvador.



Obviamente a imprensa entrou no caso e teve até pronunciamento da Defensoria Pública, curiosamente sempre muito rápida para casos envolvendo direitos fundamentais como o de se bronzear com fita adesiva em uma clínica específica da periferia de Salvador. Trata-se, claramente, de um problema urgente da capital baiana, famosa por já ter resolvido todos os problemas de direitos fundamentais menos graves que esse.



Depois dos primeiros ataques, a clínica tentou explicar as razões objetivas para não atender mulheres trans. Aparentemente, não funcionou. A página do Instagram acabou deletada e a do Facebook, que permanece no ar, está lotada de xingamentos. Revivemos aqui no Brasil um caso que já transitou em julgado no Canadá: o direito fundamental das mulheres trans de exigir serviços estéticos em seus órgãos genitais, mesmo que eles sejam masculinos. A moda começou com uma ativista super midiática, que conseguiu fechar uma clínica e colocar suas donas, entre elas brasileiras, em uma situação financeira muito difícil. No final, elas ganharam na Justiça e a ativista teve de ressarcir também os danos financeiros.



No caso da Salvador Bronze, ativistas trans disseram que alegar "limitações técnicas" é uma desculpa esfarrapada. Um membro da Defensoria Pública disse à imprensa que não consegue imaginar qual é a limitação técnica. Achei que muita gente conhecia: chama-se PÊNIS.   Mulheres trans não são necessariamente pessoas que passaram por cirurgia de reversão sexual, há pessoas que mantêm o órgão sexual masculino e se identificam como mulheres e trans. Na militância online, começou a ser moda que ativistas nessa condição pedissem serviços estéticos na região íntima para mulheres e, diante da negativa, iniciassem uma jihad contra quem não atendeu, alegando transfobia.



Parece surreal? Não é, está acontecendo diante de nós em uma das bolhas mais agressivas da internet. Assim como gamers, channers, extremistas políticos dos dois pólos, trolls do mercado financeiro e antivacinas, coincidentemente a bolha da militância trans prefere mirar mulheres e fazer ataques pessoais, sempre com a justificativa da causa maior. A distopia chegou ao ponto de gritar contra transfobia porque uma clínica de ginecologia disse que não poderia atender uma mulher trans porque ela tem um pênis, não uma vagina.



A discussão da clínica de bronzeamento no Brasil é a mesma que já foi feita com as depiladoras canadenses: o treinamento para procedimentos estéticos em genitais femininos e masculinos é diferente. Além disso, há mulheres que não querem trabalhar tocando genitais masculinos. Não têm esse direito?   Outra questão, que é a alegada "limitação técnica", está extensivamente debatida no processo do Canadá. E, embora seja óbvio, não custa repetir nesses tempos de pós-verdade: a região íntima masculina é diferente da feminina, inclusive na elasticidade da pele. Para se fazer uma depilação com cera ou se colar uma fita adesiva na região escrotal, é necessário ter o treinamento para fazer de forma adequada. Para fazer procedimentos como esses na área íntima feminina, mais compacta e menos elástica, não é necessário ter tanta experiência ou treinamento.



Pesquisei se há, em Salvador, clínicas semelhantes, de bronzeamento com fita para homens. Há dois tipos: as que fazem com sunga e as que montam um biquíni de fita adesiva. O primeiro tipo é mais comum e aparece até em reportagens na televisão: o homem fica com a sunga e o adesivo é colocado apenas nas bordas para a marquinha ficar evidente. A modalidade biquíni é menos comum, mas também existe em algumas clínicas. Vi fotos e realmente fica uma obra de arte, mas confesso não ter tido coragem de ver o momento em que se arranca o biquíni de fita.



Machistas clássicos e velhos babões devem morrer de inveja da nova modalidade de machismo, que encontra justificativas morais para obrigar mulheres a tocar em órgãos sexuais masculinos até durante o horário de trabalho. A militância trans faz essa proposta justamente no momento em que os brucutus até agora privilegiados começam a ser punidos por humilhar e subjugar mulheres.



Não importa o gênero com que a pessoa se identifique: quem é criado como homem não aceita o mesmo nível de humilhação que nós, mulheres, somos ensinadas a engolir caladas desde o berço. Nossa sociedade ensina os meninos, desde pequenos, a não levar desaforo para casa, falar mais alto e obrigar as mulheres a fazer o que eles querem, mesmo que não tenha nenhum sentido. Funciona perfeitamente: mesmo os que passam a se identificar socialmente como mulheres continuam agindo do mesmo jeito.

Madeleine Lacsko, Vozes -Gazeta do Povo

 


segunda-feira, 5 de agosto de 2019

Chico Buarque fala de Sergio Moro. Millôr define Chico - Millôr Fernandes: "Não confio em nenhum idealista que lucra com seu ideal"

Veja



Chico Buarque, num ato em solidariedade ao jornalista Glenn Greenwald, editor do site The Intercept Brasil, em 31 de julho de 2019:



Millôr Fernandes, no Roda Viva, em 3 de abril de 1989:


Blog do Augusto Nunes -  Veja


terça-feira, 16 de julho de 2019

José Casado - Nova política: De pai para filho

Deve ser o que chamam de 'nova política'

O Globo

Agitava as mãos e gritava: “É palhaçada! Hipocrisia!”. Era contra qualquer tipo de proibição ao empreguismo de parentes no governo, Legislativo e Judiciário. Já havia inscrito mãe, filho e mulher na folha salarial de seu gabinete de deputado federal pelo Rio:
“Eu não estou preocupado, porque meu filho não é um imbecil e minha mulher não é uma jumenta...” 

Seguiu com uma provocação ao plenário: “E as amantes? Vão ficar de fora da proposta? Todo mundo sabe que tá cheio de amante do Executivo aqui.” Ninguém se intimidou. A proposta de emenda à Constituição (nº 334) para proibir o nepotismo foi admitida na Câmara naquela quarta-feira, um 13 de abril de 14 anos atrás. Não foi muito além, porque alguns insistiam na velha política de apropriação de uma fatia do Orçamento público para uso pessoal, privado ou familiar. Nesse grupo se destacavam Bolsonaro e Severino Cavalcanti, presidente da Câmara. 

Com oito parentes pendurados na folha do Legislativo, Cavalcanti inspirava humoristas como Millôr Fernandes: “Mateus, primeiro, segundo e terceiro, os teus”. Nepote, por bastardia, do Barão de Pau Barbado, escravocrata sanguinário.
Cavalcanti, como Bolsonaro, não estava nem aí: “Essa história de nepotismo é coisa para fracassados e derrotados que não souberam criar seus filhos.”
No vácuo do Legislativo, o Supremo estabeleceu regras básicas antinepotismo (Súmula 13), mas deixou brechas. Em seguida, Lula proibiu por decreto (nº 7.203).[FATO: há decisões de ministros do Supremo, posteriores à Súmula 13, declarando que a nomeação para cargos de confiança não constitui nepotismo - se ministros do Supremo não reconhecem ser a Súmula 13 inaplicável na nomeação para cargos de confiança, não cabe ao presidente Bolsonaro decidir em contrário; 
ou será que as decisões de ministros  do Supremo só obrigam o presidente Bolsonaro quando são contrárias a ele ou aos seus pontos de vista?]

Ontem, na Câmara, Bolsonaro reafirmou sua predileção pelo nepotismo: “Por vezes, temos que tomar decisões que não agradam a todos, como a possibilidade de indicar para a Embaixada dos Estados Unidos um filho meu... Se está sendo tão criticado, é sinal de que é a pessoa adequada...”
No plenário, o deputado Eduardo agradeceu. Lembrou que já devia ao pai o mandato: “Sou seu filho, indissociavelmente.”
Deve ser isso que chamam de “nova política”.
 

O Globo - José Casado, jornalista