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quarta-feira, 2 de setembro de 2020

STJ e STF inaugurarão a execução sumária na política? Fascistoides ganham! - Reinaldo Azevedo

Sob o pretexto de se combater a corrupção a ferro e fogo, o Brasil foi se tornando um país arreganhadamente despudorado.

Ficamos sabendo — e é fato — que o governo Bolsonaro intensifica seu lobby junto ao Superior Tribunal de Justiça para que a Corte Especial que vai avaliar o recurso da defesa de Wilson Witzel endosse o seu afastamento cautelar, imposto, monocraticamente, pelo ministro Benedito Gonçalves. [FANTÁSTICO: o presidente Bolsonaro, que grande parte da mídia considerava já impedido e execrava uma eventual pretensão presidencial de se tornar um 'digital influencer',  ganha o status de herói e "influencer of justice".]

Imagem: Reprodução/NEFF

Atentem para uma questão importante: o problema não está apenas no fato de a decisão ser monocrática. Se o STF decidiu, em 2017, que um governador pode ser afastado sem prévia autorização da Assembleia — o que é um erro —, está mantida, no entanto, a exigência de que haja ao menos a aceitação da denúncia — o que tornaria o governador réu. E ele ainda não é réu porque nem sequer foi ouvido. Não se constrói democracia sólida assim. O que se tem é bagunça.

A defesa recorreu, claro!, à Corte Especial do STJ contra a decisão. A coisa deve ser votada na quarta-feira. Até onde se sabe, vai endossar a decisão de Gonçalves. "Ah, aí a coisa não será mais monocrática, então!" Não resolve nada, minhas caras, meus caros! Um governador eleito diretamente está sendo retirado do cargo sem nem ainda ser réu; sem que o próprio STJ tenha apreciado a denúncia. E não se pode tomar o endosso a uma liminar como sinônimo de denúncia aceita.

Há algo de errado num país em que é mais fácil tirar do cargo um governador do que um deputado estadual. Sim, um deputado estadual está submetido à jurisprudência do Supremo que vale para parlamentares federais: enquanto conservar o mandato, não pode ser submetido a medidas cautelares que impeçam o livre exercício do mandato sem a concordância da Assembleia. [a decisão de um ministro do STF de suspender o mandato do ex-deputado Eduardo Cunha e 'pegar carona' na medida ilegal para retirá-lo da presidência da Câmara dos Deputados, foi acatada pelo plenário do STF, passando a existir uma legislação virtual - só acessível por ministros da Suprema Corte - amparando o absurdo.] Que sentido faz impor a um governador uma sanção antecipada como essa?
A pior ditadura é a ditadura do Poder Judiciário. Contra ela, não há a quem recorrer. - Rui Barbosa - PENSADOR

A defesa também recorreu ao STF para derrubar a liminar. A decisão cabe ao presidente da Corte, Dias Toffoli. Ele deu 24 horas para o STJ se manifestar e depois igual prazo para a PGR — cuja resposta já sabemos. Vale dizer: só vai decidir depois da votação da Corte Especial, cujo resultado é conhecido de antemão. Vamos ver o que fará Toffoli se a Corte Especial endossar a decisão de Benedito. Um caminho é considerar o recurso prejudicado porque o que se pedia era a derrubada de decisão monocrática, que monocrática não será mais. Nesse caso, a defesa de Witzel deverá voltar ao Supremo com outro recurso, cuja natureza precisa ser estudada.

Insista-se: o governador Wilson Witzel nem sequer foi denunciado. "E por que não se denuncia logo?" Porque se está ainda na fase da investigação. Não houve tempo.  Deixo aqui uma questão para reflexão: se, do concerto entre STJ e STF resultar uma decisão em que um governador de Estado pode ser afastado do cargo com base em declarações de um delator, sem nem ao menos ter sido ouvido e antes que tenha se tornado réu — já que não existe a denúncia —, então teremos as cortes superiores investindo no baguncismo.

Tanto pior quando se sabe que uma dessas cortes, o STJ, está sob o cerrado assédio do Poder Executivo. Os dois tribunais vão inaugurar a fase da execução sumária para políticos? Quem ganha? Os fascistoides.

Reinaldo Azevedo, jornalista - Coluna no UOL




quarta-feira, 11 de outubro de 2017

Fachin e Barroso adulam extrema direita com votos de extrema esquerda. Vem o 5 a 5? E Cármen?

Votos dos dois ministros deixam claro que, a depender da vontade dos juízes, não se deve levar em consta a Constituição e as leis; desonestidade intelectual de Barroso chega a ser chocante

Enquanto escrevo este texto, não sei o resultado, por óbvio, do julgamento em curso no Supremo.
Espero que triunfe a Constituição.
Espero que triunfe o bom senso.
Espero que triunfe o Estado de Direito.
O ministro Edson Fachin, relator, já votou. E fez o que dele se esperava. Ignorou o Artigo 53 da Constituição.

Ignorou o fato de que o Artigo 319 do Código de Processo Penal, que prevê as medidas cautelares, é alternativo ao 312, que estabelece os requisitos da prisão preventiva. Ocorre que a prisão preventiva de um parlamentar só é possível em caso de flagrante de crime inafiançável.
Não há nenhuma surpresa nisso tudo.

 Ministro deu, quero crer, o voto mais chocante da história do Supremo; não creio que haja precedente. Foto: Nelson Jr./SCO/STF

Ele está errado, sim. Mas a desonestidade intelectual assume uma aparência mais vistosa é com Roberto Barroso.  Qualquer que seja o resultado do julgamento, o conteúdo de sua argumentação não muda. E é um espetáculo de oportunismo, populismo e demagogia. Iniciou a sua argumentação:
a: combatendo o foro especial. Isso não está em julgamento;
b: destacando a gravidade dos supostos crimes cometidos, embora não se esteja em fase de julgamento;
c: afirmando que ou se vota com ele ou se vota em favor do crime;
d: tentando cassar um artigo da Constituição; segundo disse, se o Senado mudar a decisão tomada pelo Supremo, isso significará, sim, um choque de Poderes.

O homem realmente não tem limites. No momento em que escrevo, ele se diz contrário ao ativismo judicial, mas afirma que só o rejeita em matéria de direito constitucional. No mais, vale. 

E aí ele define as condições em que o Supremo poderia legislar:
1: para proteger direitos de minorias;
2: para assegurar a liberdade de expressão;
3: para proteger as regras da democracia.

Acontece que, quando se parte do princípio de que o Supremo pode legislar, qualquer coisa cabe nesses critérios.  No encerramento do seu voto, sem nenhum pudor, Barroso afirma que o que está em jogo é fazer a vontade de um país que quer integridade, idealismo e patriotismo ou então lhes negar tais fundamentos.
Vale dizer: ou se está com ele ou se está do lado da bandalheira.
É asqueroso.

O que ele está a dizer, em suma, é se o tribunal pode, ao arrepio da lei e da Constituição, fora do julgamento, antecipar uma pena. Não por acaso, ele chama as acusações feitas por Rodrigo Janot de “provas”.  Creio que o Supremo viveu o momento mais asqueroso de sua história na exposição de seu voto.

No fim das contas, o argumento de Barroso é um só: se havia medidas restritivas de liberdade aos demais acusados no caso, então que Aécio Neves também recebesse alguma punição. Ao fim de sua exposição, Dias Toffoli, com acerto, observou que já conhecia a concessão de habeas corpus por extensão, mas não a de prisão por extensão.

Se o voto de Fachin e Barroso triunfarem, o Brasil escancara as portas para a insegurança jurídica.  Nota: há um cheirinho no ar de que Celso de Mello resolveu aderir à turma da heterodoxia e do vale-tudo judicial, a saber: além de Fachin e Barroso, contam-se Rosa Weber e Luiz Fux. A ser verdade essa inflexão de Celso, a coisa pode resultar num cinco a cinco: do outro lado, quero crer, estarão, além de Alexandre Moraes, que deu um voto primoroso, os ministros Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes e Marco Aurélio.
O voto de Minerva ficará com Cármen Lúcia.

E então saberemos se, sob a sua presidência, vão se generalizar no país a insegurança jurídica, o baguncismo e a desordem.  A direita xucra, que nunca entende nada, vai vibrar com Barroso, justamente o mais esquerdista de todos os ministros. Não por acaso, os casos em que ele defendeu o ativismo judicial são pautas da esquerda.

A rigor, essa pode ser a maior vitória da esquerda em todos os tempos. Tudo o que os vermelhos querem é o relativismo do ordenamento judicial. Se ele estiver garantido, tudo passa a ser possível. Tudo será permitido. Não por acaso, Barroso é o ministro que resolveu, como direi, fazer uma interpretação extensiva de um simples habeas corpus: ao conceder liberdade a uma mulher que havia se submetido voluntariamente a aborto provocado e a seu médico, ele aproveitou para “legalizar” o aborto até o terceiro mês de gestação.

 Fonte: Blog do Reinaldo Azevedo

sexta-feira, 5 de maio de 2017

Palocci, Edson Fachin, a candidata Cármen Lúcia e o baguncismo

É evidente que não faz sentido transferir para o pleno a decisão sobre habeas corpus ao ex-ministro da Fazenda

Não está marcada a data do julgamento de pedido de habeas corpus do ex-ministro Antônio Palocci. Para que se entenda a demagogia de sotaque populista de Edson Fachin e da presidenciável indireto-direta Cármen Lúcia, presidente do STF, o leitor precisa levar certos fatos em consideração. Vamos a eles. Fachin, todo mundo sabe, combinou a decisão com Cármen. Não é a primeira vez que a presidente do STF opta por cair nos braços do alarido. Com a homologação de baciada das delações da Odebrecht, viu-se o mesmo. A ministra está agora num esforço de popularização de sua imagem.

No programa “Conversa com Bial”, que estreou na terça, na Globo, Cármen, referindo-se à rotina do colégio interno onde estudou, criticou “o tanto de sininho para fazer isso e para aquilo”. A plateia riu. E mais ainda quando a conversa assumiu, assim, ares fesceninos, mas sem nunca perder a toga: “Quando chegou na minha adolescência, que a gente namorava, e alguém dizia assim: ‘Olhe, aquele homem me fez escutar sininhos’. E eu dizia: ‘Nossa! Se me fizer escutar sininhos, eu lembro da madre superiora. Não vai dar, comigo tem de ouvir outras coisas, outras histórias, ainda que mentirosas”.

Falemos de verdades
Num ato extremamente prudente, o presidente Michel Temer
houve por bem indicar o substituto de Teori Zavascki só depois que o tribunal escolhesse o novo relator do petrolão. E por que o fez? Porque, segundo o Regimento Interno, aquele que assume a vaga aberta com a morte ou renúncia de um ministro fica com os seus processos. Logo, o nome indicado por Temer seria o… relator do petrolão. Imaginem o barulho!

Muito bem. O Tribunal está dividido em turmas. Isso só faz sentido se cada uma tiver as prerrogativas do Supremo inteiro, exceção feita aos casos já previstos em que se obriga o voto do pleno. Se não fosse assim, não teríamos o Supremo votando coisas sobre o petrolão, mas apenas “Meio Supremo”.

Quando Temer decidiu que só indicaria o nome para a vaga aberta depois de definido o relator, coube a Cármen Lúcia encaminhar uma solução que surgiu neste blog. Sim, é isso mesmo. Ainda no dia 19, data da morte de Zavascki, escrevi:
Há outra leitura absolutamente consistente e hígida desse trecho do regimento. Em termos de relatoria do petrolão, a “vaga” é aquela que está aberta na Segunda Turma. Foi nesse grupo de cinco ministros que se deu o sorteio.
Assim, um ministro da Primeira Turma poderia ser indicado para a vaga na Segunda, e o Regimento se cumpriria plenamente. Quem são eles? Roberto Barroso, Marco Aurélio, Luiz Fux, Rosa Weber e Edson Fachin.
Nesse grupo, o nome que rende menos polêmica é o de Edson Fachin.

E assim se fez. Observem: de tal sorte se entende que a turma não é metade do Supremo, mas representa o todo, que não se cogitou a hipótese de eventual redefinição. Optou-se por completar o grupo. Nem poderia ser diferente: mudança no Regimento Interno do STF operada no dia 28 de maio de 2014 retirou do pleno a competência para julgar os que têm foro no tribunal, excetuando-se os presidentes dos Poderes e o procurador-geral da República. A decisão foi tomada por unanimidade. Roberto Barroso e Celso de Mello defenderam que até mesmo esses casos fossem submetidos às turmas.

Então ficamos assim. Segundo Fachin e a ministra que não gosta de ouvir sininhos, a turma é tão forte que lhe cabe, sim, a relatoria. Mas não é hígida o bastante para julgar um pedido de habeas corpus…

Excitando a turba
Lamento dizer, mas Fachin e Cármen Lúcia estão dando corda àqueles que acham que existe uma conspiração para soltar Antônio Palocci, o que o impediria de fazer delação premiada.
É um raciocínio de tal sorte asnal que começa por ignorar o óbvio: se o petista fizer delação, pegará uns dois ou três anos de cadeia em prisão domiciliar. Se não o fizer, corre o risco de ser condenado a dezenas de anos. SERÁ MESMO QUE, POR CAUSA DE UM SIMPLES HABEAS CORPUS (QUE LHE GARANTIRIA LIBERDADE APENAS PROVISÓRIA), PALOCCI TROCARIA UNS DOIS OU TRÊS ANOS DE CADEIA POR, SEI LÁ, UNS SEIS OU SETE EM REGIME FECHADO?

Pode-se acusar o ministro de um monte de coisas. Mas nunca ninguém havia dito até agora ser ele um idiota. Acho que não é.

Já se fez antes
O próprio Zavascki recorreu ao pleno duas vezes:
por ocasião da prisão de Delcídio do Amaral, então senador, e do afastamento de Eduardo Cunha da Presidência da Câmara. Bem, no segundo caso, o então deputado comandava uma das Casas do Legislativo. [no caso Zavascki, ele para poder punir Cunha teve que se considerar mais SUPREMO do que nunca e inserir na Constituição Federal, virtualmente, uma punição inexistente - em outras palavras: um SUPREMO MINISTRO foi ao mesmo tempo legislador, juiz de tribunal de exceção e executor de uma punição criada única e exclusivamente para Eduardo Cunha.
Nem o saudoso presidente General de Exército Ernesto Geisel, chegou a tanto,  ou Ulysses Guimarães que foi o único TETRA PRESIDENTE.] No outro, tratava-se de uma decisão das mais polêmicas: no exercício do mandato, um parlamentar só pode ser preso em flagrante. Uma escuta previamente combinada com órgãos de investigação não parece caracterizar flagrante… Fez-se ali uma heterodoxia. E não! Isso não quer dizer que Delcídio não merecesse. Falo de leis.

A questão
Venham cá:
então uma Turma do Supremo, que detém as prerrogativas do pleno em processos dessa natureza, pode condenar alguém a dezenas de anos de cadeia, mas não pode decidir sobre um simples habeas corpus? É ridículo! 

Isso corresponde a apostar na bagunça e na desinstitucionalização. De resto, até onde sei, Palocci fará delação esteja solto ou preso. E se receber o HC e não fizer o acordo? Bem, pior para ele.  Ademais, Fachin precisa definir os critérios para recorrer ou não ao pleno, certo? Quais são? Ou ele vai arbitrando caso a caso?

Encerro
Ah, sim: você quer que Palocci passe muitos anos na cadeia? Bem, a única forma de isso acontecer é ele não fazer delação premiada (na hipótese de o MPF provar as acusações que faz). Como? Você acha que a concessão do habeas corpus o impediria de fazer delação? Bem, se é assim, então torça por isso. A menos que você queira que ele pegue apenas uns dois ou três aninhos.

Essa conversa sobre habeas corpus impedir delação é só mais uma das teses estúpidas lançadas pela direita xucra para mobilizar a militância de Facebook. As esquerdas, obviamente, agradecem. O cenário de degeneração institucional sempre lhes será útil.

Fonte: Reinaldo Azevedo - VEJA