Este espaço é primeiramente dedicado à DEUS, à PÁTRIA, à FAMÍLIA e à LIBERDADE. Vamos contar VERDADES e impedir que a esquerda, pela repetição exaustiva de uma mentira, transforme mentiras em VERDADES. Escrevemos para dois leitores: “Ninguém” e “Todo Mundo” * BRASIL Acima de todos! DEUS Acima de tudo!
A única coisa que interessa, a exemplo daquilo que
acontece nas ditaduras, é transmitir uma doutrina, e apenas uma — sobre
política, sociedade e a vida em geral
Foto: Montagem Revista Oeste/Reprodução
“Bolsonaro prepara a sua Grande Mentira no Brasil”, acaba de dizer em sua capa, dramaticamente, uma revista inglesa que já teve fama, no passado, de ser um dos mais potentes faróis do melhor jornalismo de linhagem anglo-saxônica — racional, objetivo e fiel, acima de tudo, à religião dos fatos.
Que tal a declaração acima, como julgamento jornalístico imparcial?
Este é o título do artigo de fundo; daí para a frente, até o ponto final, só piora.
Justamente no momento em que mais de 1 milhão de pessoas, ou só Deus sabe lá quantas, vão para as ruas de todo o Brasildizer, na mais perfeita paz, ordem e respeito à lei,que querem votar em Jair Bolsonaro nas eleições presidenciais de outubro, a publicação informa que ele prepara um golpe de Estado.
Já está desenganado pelas pesquisas, afirma o texto e, sabendo que vai perder, levanta acusações “sem provas confiáveis” contra a integridade das apurações, com o objetivo de melar os resultados. “Os brasileiros temem”, segundo a revista, que ele incite uma “insurreição” no estilo da invasão do Capitólio por “seguidores de Donald Trump”, após as últimas eleições americanas, ou coisa “talvez pior”.
Que “brasileiros” com medo seriam esses? Não se informa. E como se faria essa “insurreição, na prática?Segundo diz o artigo, Bolsonaro está dando armas aos seus apoiadores. Com “2 milhões” de armas de fogo nas mãos da população em geral, “bolsonaristas poderiam atacar o tribunal eleitoral caso Lula seja declarado vencedor”; eles estão “mais bem armados do que nunca”, informa o texto. O presidente pode contar também com os“400.000” homens da polícia, gente que “gosta de atirar”; uma das razões para esse apoio é que ele “prometeu imunidade legal” aos policiais que “matarem suspeitos”.Essa polícia, de acordo com a revista, poderia se mostrar mais fiel a Bolsonaro “do que à Constituição”; o Exército também. Na mesma balada, revela-se um fato prodigioso, e até agora inteiramente desconhecido dos brasileiros, ou de quem quer que seja no resto do mundo: “45 políticos foram assassinados nos seis primeiros meses de 2022”no Brasil. É mesmo?
Quem são, exatamente, esses políticos assassinados?O artigo não dá nenhuma informação a respeito; apenas diz, imediatamente antes de mencionar essa onda de homicídios, que o presidente “rotineiramente incita à violência”.Conclusão: por tudo isso, e com a desordem, a insegurança e a matança em massa tomando conta das ruas, Bolsonaro vai invocar“poderes de emergência” para “adiar a transferência do governo” para Lula — que é considerado pela revista, é claro, o único ganhador possível e legítimo das eleições que estão aí.
O resto do texto segue na mesma linguagem e com a mesma inteligência de manifesto aprovado em assembleia geral de centro acadêmico estudantil. Bolsonaro é descrito como um possível seguidor do “livro de regras sem princípios” de Donald Trump. Ele “semeia divisão”; o “outro lado”, na sua visão, não é apenas errado — é o “mal”. É um político de “boca suja”,que se elegeu presidente copiando os “truques” de outro homem de “boca suja”, Donald Trump. É “desonesto” no “mau uso” das redes sociais. Constrói uma realidade “paralela”. É uma “ameaça à floresta amazônica”, que estaria sendo destruída a um ritmo “70% mais rápido” do que antes da sua passagem pela presidência. A crítica que Bolsonaro faz a Lula é condenada como sendo “absurda”.
Lula, por sinal, é definido no artigo como um político “pragmático”, que foi um presidente “razoavelmente bom” entre 2003 e 2010.
Não há detalhes sobre as sentenças da Justiça que o condenaram por corrupção passiva e lavagem de dinheiro,nem qualquer menção aos 20 meses que passou na cadeia cumprindo pena; tudo o que se diz a respeito é que ele “nega as acusações” e que o seu caso foi posto de lado pelos tribunais.
Mais: Lula é um “defensor da democracia” e Bolsonaro não é — “por instinto”. Reconhece-se que ele até pode jogar dentro das regras democráticas, mas vive “procurando meios de evadir” as suas exigências. “Os eleitores brasileiros deveriam resistir à atração de um populista desavergonhado”,conclui a revista.
Não se diz nada sobre o fato de que Bolsonaro, em seus três anos e nove meses na presidência, não deixou de cumprir uma única ordem judicial, mesmo as ilegais
Questão de opinião? Opinião não é isso. Opinião, de qualquer um, só vale alguma coisa se estiver baseada na realidade objetiva dos fatos. Senão é apenas repetição de palavras vadias que não preenchem as condições mínimas para serem qualificadas como pensamento — ou, então, é propaganda de maionese barata com pose de análise política. Não há, em todo o artigo, nenhuma tentativa de se aproximar dos fatos. Não se diz que Bolsonaro foi eleito por quase 58 milhões de eleitores — e não por “truques”.
Não há a mais vaga menção à recusa permanente de Lula e do PT em tratarem Bolsonaro como um adversário político — ele é chamado publicamente de “genocida”, de fora-da-lei ou de “inimigo”, na definição de um juiz da suprema corte que faz militância declarada contra a sua candidatura.
Não se menciona, por sinal, a atividade de um STF que usa diariamente a máquina judicial para combater Bolsonaro e seu governo —anula as suas decisões, impede que reduza impostos ou construa ferrovias, e exige, de meia em meia hora, que dê as “explicações” mais extravagantes, sobre qualquer coisa.
Não se diz nada sobre o fato de que Bolsonaro, em seus três anos e nove meses na presidência, não deixou de cumprir uma única ordem judicial, mesmo as claramente ilegais, sem nexo lógico ou de cunho político. Também não desobedeceu a nenhuma decisão do Congresso, nem a qualquer lei ora em vigência do país.
Não se diz que o Brasil tem presos políticos, todos eles aliados ao presidente; é público que um dos seus principais apoiadores está em prisão domiciliar, e que um deputado federal que o apoia ficou preso durante nove meses, além de ser condenado pelo STF a quase nove anos de cadeia.
Como, com todos esses fatos, o Brasil de hoje teria um governo autoritário?
Quem está sendo autoritário aí?
O artigo não menciona o inquérito policial aberto pelo STF contra um grupo de empresários pró-Bolsonaro cujo crime foi falar de política num grupo de WhatsApp— nem da clara e sistemática violação das leis e da Constituição pelo ministro Alexandre Moraes, há mais de três anos, na sua perseguição política a aliados do presidente.
Não há nenhuma referência à atuação repressora do TSE na atual campanha eleitoral — como, por exemplo, a proibição de se exibirem imagens das manifestações de massa do dia Sete de Setembro.
Lula, o homem “pragmático” que fez um governo “razoavelmente bom”, comparou as manifestações a uma “reunião da Ku Klux Klan” — mas é só Bolsonaro, e não ele, que busca a “divisão” do país e que define os oponentes como o “mal”.
O leitor só lê que o presidente destrói a Amazônia. Não é informado que o Brasil reduziu em 25% o total das suas queimadas nos dois últimos anos. Não são números do governo brasileiro;é o que mostra o satélite AQUA M-T da NASA americana, com fotos que estão disponíveis para o público em seu site na internet.
Não se diz que o Brasil vai fechar o ano de 2022 com inflação abaixo dos 7%, um dos melhores resultados na área, em qualquer economia do mundo — e nem que o crescimento estará entre os primeiros.
The Economistnão se distingue mais de qualquer outra aglomeração de prosa, quetem preguiça de pensar e que obedece a todos os mandamentos do “politicamente correto”
A questão central em tudo isso, obviamente, não são as atribulações atuais da revista The Economist, que publicou o artigo acima. Em quase 180 anos de vida, uma longevidade fora do comum para qualquer publicação deste mundo, o semanário inglês se tornou um monumento ao jornalismo de primeira classe e ao espírito humano. Era o veículo, pelo menos segundo o que sempre se acreditou, dos “tomadores de decisão” mundiais.
Cada parágrafo dos seus textos trazia um desafio intelectual genuíno para quem escrevia — e uma demonstração de tremendo respeito pela inteligência de quem lia.
Hoje não há nem uma coisa e nem outra.The Economist não se distingue mais de qualquer outra aglomeração de prosa, entre tantas que há por aí, que tem preguiça de pensar e que obedece de olhos fechados a todos os mandamentos do “politicamente correto” — numa visão do mundo neurastênica, parcial e sem sinais de vida inteligente.
Não fica devendo nada, em termos de neurose e resistência à atividade de pensar, aos melhores editoriais do “consórcio nacional de órgãos de comunicação” a que se resume hoje a imprensa brasileira — ou, então, ao jornalismo do padrão CNN, que diz que o lema da bandeira do Brasil é “Independência ou Morte”, e parece se orgulhar disso. Pode ser triste que as coisas tenham se tornando assim — mas cada órgão de imprensa, em qualquer lugar do mundo, é livre para tomar o caminho que quer, ou que lhe é possível nas condições habituais de temperatura e pressão das sociedades de hoje.
O problema real é a descida de boa parte do jornalismo, através de todo o planeta, ao exercício aberto do totalitarismo.
Não há preocupação em relatar os fatos; ao contrário, danem-se todos os fatos, como neste texto sobre o Brasil.
A única coisa que interessa, a exemplo daquilo que acontece nas ditaduras, é transmitir uma doutrina, e apenas uma — sobre política, sociedade e a vida em geral.
Ou você baixa a cabeça para a “linha oficial” ou cai em desgraça.
É proibido achar, por exemplo, que só as mulheres ficam menstruadas, ou que o progresso social vem da liberdade econômica, ou que cada um tem direito a ter ideias individuais; se achar qualquer coisa dessas, o sujeito é um fascista.
Exercer a sua liberdade de ser a favor de alguém como Bolsonaro, então, é crime político, social e moral inafiançável. É obrigatório, ao mesmo tempo, achar que o celular, o carro elétrico e a tela Retina 4,5 Apple com “Touch ID” foram trazidos até você por Che Guevara ou pela luta de classes — e não pelo capitalismo que os deixa tão indignados. É o mundo da “despiora”, do “descondenado” e, no fim das contas, do “desjornalismo”.
É como querer se informar lendo o Pravda da ditadura comunista da Rússia de outros tempos.
É razoável relacionar a estabilidade e a paz política com a capacidade
de o Estado construir consensos majoritários. E são duas as ferramentas
fundamentais para essa construção:o convencimento da sociedade com e
sem coação. Na vida real, a resultante é sempre uma combinação dos dois
vetores.
Nenhum governo se sustenta apenas com base na força,mas governos que
não têm força tampouco param em pé.E em democracias constitucionais
plurais como a nossa os governos dependem também de uma variável externa
a eles:os grupos sociais hegemônicos, mesmo os opostos, conseguirem
dialogar e alcançar convergências.
Algo como uma mútua aceitação, ainda que implícita.
Não há estabilidade e paz possíveis se largos contingentes sociais e
partidários enxergam-se simplesmente excluídos do edifício
político-cultural quando perdem uma eleição. Tampouco haverá normalidade
política nos sistemas fechados em que um grupo considere insuportável a
convivência com o antípoda. Isso deveria ser óbvio.
A ideia original da Nova República de 1985 era colocar em prática um
pacto informal para garantir a todos os relevantes o acesso ao poder,
por eleições diretas. Ganhar, governar e, quando perder, esperar pela
próxima eleição. E por um período o convívio entre as diversas forças
foi essencialmente institucional, com um soluço: o impeachment de
Fernando Collor.
Os estudiosos um dia diagnosticarão onde a maionese começou a desandar,
mas aquele episódio tem boa chance de figurar com destaque. Ali voltou a
dar as caras uma cultura do “nunca mais”. Cada eleição passou a ser
vendida como a derradeira oportunidade de o país salvar-se do mal. E,
numa imagem especular, escolher um salvador da pátria.
Que, convenientemente, precisa chegar ao poder, ou continuar nele, para salvar a pátria ao livrá-la do indesejável “outro”.
Mas e se o “outro” reúne, digamos, pelo menos um terço do eleitorado? Aí
complica. É muita gente. Veja-se o ocorrido com o Partido dos
Trabalhadores e seu líder, Luiz Inácio Lula da Silva. Não só
sobreviveram à guerra de extermínio, hoje estão em posição eleitoral
auspiciosa.
A mola, quanto mais comprimida, mais acumula energia potencial à espera de se soltar.
A quem antes de tudo interessa a paz política? Ao poder. Seria razoável
então supor que dele viessem as iniciativas para incluir, fagocitar e
digerir as resistências externas. Mas a era da hiperconectividade e das
redes introduziu um complicador: os políticos precisam responder
rapidamente aos estímulos externos, sempre de olho no que a turba vai
achar.
Turba que hoje exibe um poder próprio e invejável.
A violência política explícita(a implícita sempre foi parte do jogo) é
simultaneamente consequência e realimentadora desse arcabouço. E a
ilusão maior é achar que se vai neutralizá-la seguindo no jogo de caça e
caçador até conseguir, finalmente, eliminar o adversário.
Em momentos históricos singulares, alguns países tiveram a sorte de
encontrar personagens capazes de entender que isso é simplesmente
bobagem.
É sabido, e já foi bem estabelecido, que a progressiva degradação
institucional brasileira tem raiz no enfraquecimento terminal do Poder
Executivo precipitado ao longo dos governos Dilma Rousseff e Michel
Temer. O poder tem horror ao vácuo, então este foi sendo preenchido por
atores laterais, mas com apetite e senso de oportunidade. Mesmo quando a
coisa adquiria certo caráter fantasmagórico, pela inadequação dos
personagens.
Assim, entramos há alguns anos na era da disputa feroz pelas atribuições
de poder moderador,formalmente abolido com a proclamação da República,
mas materializado de fato desde então na proeminência do Executivo,
liderado pela figura do Presidente da República, que atua como um
regente da orquestra. Bem ou mal, em períodos ditos democráticos ou nem
tanto, isso funciona como ponto de equilíbrio institucional. [Atualizando: proeminência sepultada em atos do STF sufocando o Poder Executivo, buscando desautorizar o presidente da República e com declaração do ministro Dias Toffoli que o Supremo é o Poder Moderador. (o que ele disse não foi confirmado pelo Congresso Nacional com aprovação da necessária PEC criando um quarto poder. Só que alguns ministros do STF consideraram a Constituição já emendada e o STF confirmado como PODER MODERADOR. A situação só não consolidou de vez devido o presidente da República ter se rebelado contra alguns supremos abusos.)]
O conflito que se desenha entre o Supremo Tribunal Federale o
presidente Jair Bolsonaro em torno da graça ao deputado Daniel Silveira
ensaia ser um marco. Não se vislumbra, por enquanto, uma situação de
empate. A turma do deixa disso anda sem espaço. A dúvida resume-se a
quem vai aceitar se submeter à força superior do outro. Quem capitulará.
E tem eleição presidencial daqui a cinco meses e alguns dias.
Visto que no momento nenhum lado dessa disputa de bonapartismos acumulou
força para impor a capitulação incondicional, uma curiosidade é quem
vai errar primeiro. Quem vai dar o passo que possa cristalinamente ser
caracterizado como fora das regras do jogo. Costuma ser um catalisador
em rupturas. Nesse particular, ambos os contendores vêm exibindo certo
sangue-frio. O que não deixa de ser admirável, dada a quantidade de
fichas sobre a mesa.
Enquanto as torcidas esgoelam-se e arrancam os cabelos, segue a guerra
de posição. Uma guerra de trincheiras, com preeminência para a
artilharia. Quem se arrisca a sair para campo aberto, como Silveira, tem
chance elevadíssima de ser alvejado, restando ao indigitado a esperança
de sobreviver aos tiros e ser resgatado pelas próprias tropas. O
deputado foi, por Bolsonaro. No momento, está ferido mas vivo.
Falar em “desejável” no âmbito da política é correr grave risco de cair
nas platitudes habituais. Dito isso, o desejável é que os fatos se
encaixem num ambiente capaz de preservar a normalidade interna até o
eleitor ser chamado à urna para decidir afinal quem vai ter o direito de
se sentar na cadeira do Planalto por quatro anos a partir de janeiro de
2023. E será desejável que o resultado seja reconhecido por
unanimidade. "Análise de conjuntura" no momento é calcular em tempo real
essa probabilidade.
Em situações assim, é natural que os campos políticos com maior
potencial eleitoral estejam entre os primeiros a querer evitar o
desandar da maionese. Desde que, naturalmente, não se vejam em risco de
remoção do tabuleiro. Já a turma que está em desvantagem, correndo atrás
do prejuízo, precisa criar o chamado “fato novo”. Dar uma agitada no
cenário para ver se algo de diferente faz ressurgir a esperança de
chegar lá.
Vergonhoso. Lamentável. Deplorável. Estupefaciente (sempre quis usar essa
palavra). Esses foram os adjetivos que me vieram de pronto à mente assim que
terminei de acompanhar o pronunciamento do ministro Luiz Fux, presidente do
STF, na sessão de encerramento dos trabalhos do Judiciário este ano. Já posso
encerrar os trabalhos do Polzonoffiário este ano também, chefinho?
Luiz Fux: STF
perdeu qualquer resquício de pudor e hoje se orgulha de ser um “tribunal de
vanguarda” - Marcelo Camargo/Agência Brasil
Como, porém, nos aproximamos de uma época festiva, acho que vale a pena
destacar desde já a única coisa boa do discurso do ministro, isto é, o fato de
ele dizer tudo abertamente, para quem quiser ouvir. Fux e o STF não têm mais
vergonha do ativismo, muitos menos do caráter explicitamente progressista da
corte. Não à toa, já no finalzinho Fux encheu a boca para dizer que o STF hoje
é um “tribunal de vanguarda”. Para bom entendedor, me.
Fora o fato de o STF já não usar mais a máscara simbólica de instituição
guardiã da nossa Carta Magna, não há absolutamente nada que se salve no
discurso de Luiz Fux. Os ministros agem como entes políticos. E nem é como
poder moderador, embora lá no finalzinho do discurso Fux tenha ousado dizer que
o Judiciário é, sim, o garantidor da estabilidade democrática.
Eles agem mesmo
ora como partido de oposição, ora como um Poder Executivo Paralelo, capaz de
determinar ações em todas as esferas da administração pública. “Somos o único
tribunal do mundo com um observatório do meio ambiente”, orgulha-se o
semipresidente, ops, ministro Fux depois de citar várias ações progressistas
que contam com o carimbo orgulhoso do STF.
Só podem estar loucos
O discurso já começou com o ministro Luiz Fux chamando para o STF a
responsabilidade pela gestão “maravilhosa” da pandemia:outra atribuição que,
em termos normais, seria do Poder Executivo. Como num jogo de vôlei solitário,
Fux levanta a bola para ele mesmo cortar e dizer que o STF é a favor da ciência
(oh!) e contra o quê? Sim, ele mesmo, o negacionismo!
Mas tudo bem. No Brasil é assim: os ministros fingem que são uma corte
constitucional inspirada na Suprema Corte norte-americana – e a gente finge que
acredita nesse delírio. Até porque se não acreditarmos podemos incorrer no
gravíssimo crime de “ameaça retórica”, mencionado por Fux para se vangloriar da
ação do Supremo na defesa da democracia. Faz-me rir. Por falar em delírio, logo depois de exaltar a atuação do STF no combate à
pandemia, Luiz Fux melancolicamente revela o quanto o poder isola e cria para
si uma realidade muito particular. Porque, em se acreditando na sinceridade das
palavras dele, o STF de fato se vê como uma instituição de representação
popular. Não, não estou viajando na maionese. Foi o próprio Fux quem disse que
o STF “cumpre a missão conferida pela população brasileira”, para em seguida
agradecer “o amor e a admiração” que a maioria dos brasileiros nutriria pelo
colegiado.
Neste momento fiz aqui no meu caderninho uma anotação triplamente sublinhada
que diz “Só podem estar loucos!!”. Será que isso pode ser considerado “ameaça
retórica”?Por garantia, foi sem querer, hein, ó plenipotenciário ministro! No rol das sandices supremas, não posso ignorar o fato de todo o blá blá blá
envolvendo a proteção da Constituição ter sido acompanhado por uma arrojada
confissão de que é a Agenda 2030 da ONU o que norteia as ações do STF.A Agenda
2030 da ONU, e não a Constituição do Brasil, aquela que pode até ser uma
estrovenga, mas que bem ou mal ainda reflete o que pensa a sociedade
brasileira. O fato de muitos itens da Agenda 2030 entrarem em conflito com a
Constituição não é um problema. Afinal, lembre-se de que no Brasil vigora um
pacto de cinismo e quem disser que o STF não é corte constitucional estará cometendo“ameaças retóricas” contra a instituição.
Atos falhos
Boquiaberto com a fala de Fux, assim que a palavra foi passada ao ministro
Ricardo Levandowski (que, com todo o respeito, sabe bajular como poucos os
colegas) me permiti, primeiro, imaginar como seria o discurso ideal de um
ministro do STF. Antes de mais nada, deveria prezar pela discrição. Ou seja,
nem deveria ocorrer.
Mas já que ocorre, me deixei levar pelo sonho de ter na presidência do Supremo
Tribunal Federal uma pessoa capaz de dizer que, olha, passamos um pouquinho do
ponto este ano, prendendo dissidentes conservadores por crimes que nem existem.
Neste meu delírio, vejo-o saindo de trás da bancada, indo até o ministro
Alexandre de Moraes, puxando a orelha dele e dizendo: “Ai, ai, ai, que feio!”.
Daí contei com a agilidade da minha imaginação para sair da pré-escola e entrar
num consultório de psicanálise, tantos foram os atos falhos de Fux nesse
discurso. A certa altura, por exemplo, ele fala que o STF vai “agir e reagir”.
Quanto a reagir, tudo bem; mas agir, ministro? Ah, claro. Infelizmente insisto
em me esquecer de que a maioria daqueles senhores e senhoras cresceu ouvindo
que deveriam ser agentes de transformação social.
Adiante, e depois de mencionar números que impressionam pelo absurdo (das 95
mil ações julgadas pelo STF ao longo do ano, 80 mil foram decisões
monocráticas), Fux se põe a mencionar mil e uma ações políticas, evidentemente
atribuições de outras esferas. Ao perceber que se perdeu no papel e que aquelas
ações todas revelavam o quanto o STF gostava de passear pelos outros poderes,
ele se sai com um esclarecedor “Agora voltando ao nosso poder...”.
E, já no finalzinho, Fux bota uma medalhinha no próprio peito progressista para
dizer que sua gestão consolida o STF como um “tribunal de vanguarda”. Ou seja,
um tribunal explicitamente revolucionário, composto por ministros esclarecidos
e guiados pelo “projeto global” (expressão de Fux) da Agenda 2030 da ONU, e que
claramente vê o presidente Jair Bolsonaro como um obstáculo às suas ambições.
Diante de neuroses ideológicas tão claras, fico me perguntando qual seria o
diagnóstico desse psicanalista imaginário. E, mais importante, qual seria a
linha de tratamento. Tive um amigo que costumava reclamar da psicanálise,
dizendo que, para consertar um vaso lascado, a psicanálise propunha que o
próprio vaso se quebrasse em mil pedacinhos e fosse pouco a pouco remontado. E
que, antes disso, o vaso tinha de reconhecer a lasquinha que tanto o incomoda.
A julgar pelo
que disse Fux, o STF não reconhece que está lascado e, obviamente, não quer
passar pelo sofrido processo de reconstrução a partir da autocrítica. Ao
contrário, o STF, esse narcisista, segue se vendo no papel de liderar o país
rumo a uma utopia. E ninguém haverá de detê-los.