A Frente da Agropecuária decidiu derrubar os vetos do
Presidente ao Projeto de Lei que regulamenta o marco temporal e trata de
terras indígenas
Agropecuária - (crédito: ED ALVES/CB/D.A Press)
A Frente da
Agropecuária decidiu derrubar os vetos do Presidente ao Projeto de Lei
que regulamenta o marco temporal e trata de terras indígenas, A Frente
tem votos para isso, mas o Supremo pode derrubar a derrubada do veto.
O
presidente da República vetou a essência do projeto-de-lei aprovado pela
Câmara e pelo Senado.
O projeto reage à decisão do Supremo que
considera inconstitucional parte do artigo 321 da Constituição.
Os
constituintes, eleitos pelo povo para fazer uma Constituição,
trabalharam 20 meses e estabeleceram que "são reconhecidos aos índios…os
direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam". Como
aprendemos no ensino básico, ocupam está no presente do indicativo,
portanto, são as terras que ocupam no dia da promulgação da
Constituição. Se quisessem diferente, os constituintes escreveriam "que
tenham ocupado" ou "que vierem a ocupar".
Chamou-se aquela data
—5/10/1988 — de marco temporal.
A intenção dos constituintes era de decidir conflitos
de terra com base na situação naquela data, estabelecendo-se uma
segurança jurídica e sua consequente paz no campo. Essa intenção foi
derrubada pelo Supremo e reerguida pelo projeto de lei que foi vetado
pelo presidente. O efeito agora é o oposto do pretendido pelos
constituintes de 1988: insegurança fundiária e risco de conflitos por
todo o país.
Não aprendemos com o passado. Domingo fez 111 anos que
começou a Guerra do Contestado, em Santa Catarina e Paraná. 8 mil
brasileiros mortos. Causa: insegurança fundiária. Senadores, perguntem
ao seu colega Esperidião Amin o que aconteceu por lá.
Para derrubar veto, é preciso maioria absoluta, isto é,
metade mais um da Câmara (257 votos) e do Senado (41 votos). A Frente
da Agropecuária conta com 303 deputados e 51 senadores, mas os
perdedores podem recorrer ao Supremo.
Em 2015, Dilma vetou a lei do
comprovante impresso do voto, mas 368 deputados e 56 senadores — 71% do
Congresso — derrubaram o veto.
No entanto, numa ação de
inconstitucionalidade movida pela Procuradoria da República, o Supremo
derrubou a decisão do Congresso reafirmada por 424 dos 594
congressistas. A Constituição põe o Legislativo em primeiro lugar,
coerente com o fato de que o poder emana do povo, que o exerce por seus
representantes.
Agora o Congresso tem, de novo, votos para derrubar o
veto. Mas já vimos o poder que emana do povo sendo anulado pelo Supremo. [nem sempre a história se repete e quando se repete, pode sempre ocorrer do resultado final ser diverso do obtido na repetição anterior.]
Insegurança fundiária é insegurança social. A questão é
delicadíssima. Sempre foi motivo de conflito. A Constituição
estabeleceu a pacificação com um marco. Que eliminaria os motivos para
agitação no campo. Agora, como se não bastassem os conflitos que agitam a
Amazônia e o Rio de Janeiro, recria-se a possibilidade de conflito
fundiário, num país com terra abundante para todos. A racionalidade, a
percepção do país real, deveriam se sobrepor às meações ideológicas. A
irracionalidade aposta no conflito.
Alexandre Garcia, colunista - Correio Braziliense